Perdida Em Seu Olhar - (Finalizada) escrita por Eu-Pamy


Capítulo 7
Capítulo seis - Querida Susan...




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/252608/chapter/7

Capítulo seis. – Querida Susan...


Quando comecei a me arrumar eram quase onze horas da manhã. Sai de casa às onze e meia e só fui chegar ao Shopping meio dia e meia. Eu não havia conseguido pregar os olhos naquela noite e muito menos havia conseguido comer alguma coisa depois que o dia clareou. Ali, em pé na frente do Shopping da Gávea, eu sentia minhas pernas tremerem, enquanto uma gota de suor escorria pela minha testa. Fazia um dia de Sol, um dos poucos do mês. Esperei pouco mais de vinte minutos, até que senti alguém colocar a mão no meu ombro, me virei automaticamente e vi um homem. Ele não era o que imaginei. Estava sim de terno e gravata preta, mas era muito jovem para um advogado. Fiquei desconfiada.

– Oi. Você é a senhorita Cllaus? – Reconheci a voz do telefone.

– Sim, sou eu mesma. Você é o advogado Eduardo? – Perguntei. Ele assentiu.

– Sim. Você chegou sedo. Isso é ótimo. – Ele sorriu. – Por favor, será que podemos entrar, é que nesse calor usar terno preto não é uma escolha muito inteligente, mas faz parte da minha profissão, é claro. – Disse, parecendo um pouco envergonhado.

– Tudo bem.

Entramos no Shopping. Ele parecia com pressa, andava muito rápido. Fomos até a praça de alimentação e sentamo-nos em uma mesa. Ele colocou uma pasta de couro em cima da mesa. Abriu e então retirou alguns papeis.

– Me desculpe pelo mau jeito. É que ainda hoje eu tenho que atender um outro cliente em São Paulo. Seria muito bom para mim, se fossemos direto ao assunto. Você se incomoda? – Ele perguntou.

– Não, eu prefiro assim. – Falei. Eu era pelo menos dois anos mais velha do que aquele rapaz.

– Aqui está. – Ele me entregou um papel. – Esse é o testamento. – Explicou. – Você poderia assinar aqui em baixo? – Me passou uma caneta.

Li o que estava escrito no papel, e só assinei quando tive certeza que o documento era verdadeiro. Assinei ao lado do que reconheci ser a assinatura da minha amiga.

– Com esse documento, você poderá de uma vez por todas conseguir a guarda definitiva do menino. Claro, naturalmente deverá levar algum tempo até o processo se concluído, mas isso será bom, pois te dará tempo para se preparar para a chegada dele na sua vida. Você deverá passar por alguns testes, para saber se está realmente qualificada para assumir essa responsabilidade. Entre o que é pedido estão: Você deverá ter um emprego estável, uma casa que possa nutri todas as necessidades de um garoto, não ter nenhum histórico de violência ou rebeldia que possa depor contra você. Ter a ficha limpa diante da sociedade, ter o ensino fundamental e o ensino médio completo, uma renda considerável e uma família disposta a dar amor para essa criança. Depois que você dar abertura ao pedido de guarda, após alguns dias, será mandado um agente do juizado para avaliar se você está realmente capacitada. Esse agente deverá te fazer algumas visitas semanais, para saber se não há nenhuma mudança preocupante no seu comportamento. Depois disso, após passar por todas essas avaliações, o menino Lucas passará a morar junta com você. No primeiro trimestre, um agente será mandado para saber como você está se comportando, e decidir se o menino se habituou bem a nova realidade. Regressivamente, o ritmo das visitas irá diminuir e logo passaram a serem anuais. Se necessário, o governo dará assistência psicológica para essa criança. O importante é que mesmo depois desse trauma, ele consiga ter uma vida normal, como qualquer outra criança da idade dele.

Eu escutei tudo em silêncio. Respirei fundo.

– Só tem um problema. – Falei.

– E qual seria? – Perguntou.

– Eu não quero ficar com a guarda dele. – Disse, olhando nos olhos do advogado. Ele se espantou.

– E-eu... Bem, eu confesso que não esperava por isso. – Ele coçou a cabeça. – A senhorita tem certeza? Essa é mesmo a sua resposta final? Pense no bem que você estará fazendo a essa criança. Pense no favor que você estará fazendo para a mãe dele. Ela me disse que vocês eram muito amigas. – Tentou persuadir.

Enxuguei meus olhos.

– Não. Eu estou decidida. Nesse momento, eu realmente não tenho como cuidar de uma criança. A minha vida não tem espaço para esse menino. Eu não sei o que a Anabela pode ter pensado quando passou essa tarefa para mim. Eu sou a pessoa errada. Não posso cuidar desse menino. Estou decidida, eu não quero a guarda dele. – Aquela era minha resposta final.

Ele respirou fundo, não escondendo sua decepção.

– E-eu... Eu entendo. – Disse triste. Aquela reação não estava me ajudando nenhum pouco. – Não posso obrigá-la a fazer o que não quer. Nem eu e nem ninguém. Mas é uma pena, esse menino é muito jovem, é triste saber que a infância dele será toda dentro de um orfanato. – Ele falou. Suspirei. Eu odiava o que estava fazendo. – A senhorita tem certeza? Não seria melhor eu te dar mais um tempo para pensar, acho que você não conseguiu ter tempo para assimilar tudo.

– Não. Eu já me decidi. – Falei, minha voz falhou.

Ele olhou para o chão. Depois tomando coragem, abriu sua pasta e tirou um envelope de dentro.

– Se essa é sua resposta final, então tudo bem. – Falou. – Essa é uma carta que Anabela escreveu antes de viajar, ela pediu para que eu a entregasse para você. Disse que é importante que você a leia. – Ele fez uma pausa – Por favor, pense mais um pouco nessa decisão. Se você mudar de idéia, me ligue. – Ele me entregou a carta, ela pareceu pesar na minha mão. – De qualquer jeito, foi um prazer conhecê-la, senhorita. – Deu um fraco sorriso. Fechou sua pasta e então levantou.

– Você não vai ficar com o testamento? – Perguntou.

– Não, pode ficar com você. Esse é só uma copia, a original está comigo. Pense bem no que você está fazendo senhorita. Tchau. – Ele fez uma rápida reverencia e então virou de costas e saiu.

– Hei – Gritei, ele se virou. – Você não vai me cobrar pela conversa? – Perguntei. Ele sorriu.

– Eu jamais cobraria para conversar com uma mulher bonita como a senhorita. Além disso, Anabela já havia deixado tudo acertado. Se você me permite, com licença. – Falou, eu sorri e ele foi embora.

Sentei novamente à mesa. Estava me sentindo um pouco tonta. Olhei para o envelope, não havia nada escrito nele. Tomando coragem, eu o abri e de dentro tirei uma folha de papel. Comecei a ler.

15/07/1999

Querida Susan, se você está lendo essa carta, é porque eu não estou mais com vocês. Você não imagina como é difícil para eu dizer tudo o que estou prestes a dizer. Precisei juntar muita coragem para começar a escrever e mesmo assim não sei se vou conseguir.

Primeiramente, queria dizer que estou sentindo a sua falta nesse momento. Queria que você estivesse aqui para me ajudar nesse momento difícil. Eu nunca te esqueci. Você sempre esteve comigo, sempre presente no meu coração. Sempre quando estou triste ou passando por uma dificuldade, eu me lembro da sua força, da sua garra e da sua coragem. Você nunca teve medo de nada. E é me espelhando em você que eu consegui superar todos os obstáculos. Todos esses anos, você me deu forças para continuar. Depois que meu tio morreu, pensei que meu mundo fosse desabar, mas isso não aconteceu, graças a você e graças ao meu tesouro, a coisa mais importante da minha vida, o Lucas. Espero que você já o tenha conhecido. Ele é fantástico, Susan. Fantástico. A pessoa mais maravilhosa que eu já conheci, e não digo isso só porque ele é meu filho, mas porque ele foi o anjo responsável por eu ainda estar viva. Você e ele me ajudaram muito e eu serei grata pelo resto da minha existência. Não sei como descrever o que sinto por vocês. É um sentimento muito grande, um sentimento assustador de tão forte. Parece que meu coração vai explodir, toda vez que penso em vocês.

Lembra quando éramos pequenas, quando eu acabei caindo morro abaixo e quebrei a perna? Eu me lembro de você ir correndo me ajudar e não ter saído de perto de mim nem um segundo. Eu estava assustada, mas você me disse que eu ia ficar bem, e foi só por isso que eu me acalmei. Lembro-me de você segurando a minha mão dentro da ambulância, e lembro que no hospital quando eu abri os olhos, foi seu rosto que eu vi antes de todos os outros. Você estava sorrindo para mim, como se o mundo não pudesse ser mais maravilhoso. Você sempre foi muito mais corajosa que eu.

Isso me fez lembrar o dia que nos perdemos dentro do parque, ficamos mais de dezessete horas perdidas dentro daquela floresta e quase matamos nossas famílias de preocupação. O pior foi que só percebemos que estávamos perdidas quando sentimos falta das nossas bonecas... Eu ainda me divirto lembrando disso.

Você e eu aprontamos muito, não foi mesmo? Coitadas das nossas mães, ela sofreram muito em nossas mãos. Mas o pior era que nem tínhamos intenção de fazer nada daquilo... Quando estávamos juntas, tudo era muito natural e simples. Tudo era perfeito. Eu queria voltar no tempo, para poder viver mais um minuto daquela magia. Mas ambas sabemos que isso é impossível, não é?

Amiga, eu sempre senti saudade de você, mas depois que o Lucas nasceu eu não conseguia ter tempo para nada e meu tio acabou morrendo logo depois disso, o que piorava tudo ainda mais. Eu queria te ligar, queria mesmo, mas me faltava coragem. Eu não sabia o que dizer. Algumas vezes, eu cheguei até a ligar para o seu celular, mas na hora eu não conseguia fazer sair nada da minha boca. Era como se eu tivesse muito medo de você, acho que o certo não é que eu tinha medo de você, mas medo que você tivesse RAIVA de mim. Eu sumi sem te dar explicações, acabei com a nossa amizade de um dia para o outro. Você tem razão de me odiar, mas... Eu acho que não conseguiria suportar saber que você me odeia... Prefiro apenas lembrar de todos os momentos divertidos que tivemos juntas, isso me conforta.

Vivi esse tempo todo pensando como seria minha vida se eu não tivesse me mudado, mas eu sabia que eu não podia voltar. O motivo? O pai do Lucas. É, acho que você já deve ter entendido que eu só me mudei de cidade, porque havia engravidado. Mas o que você não sabe (e nunca vai saber) é quem é o pai. Isso é obscuro demais, prefiro levar esse segredo enterrado junto comigo. O Lucas não precisa daquele sujeito. E muito menos ele merece ter um filho tão precioso como o Lucas. O melhor jeito mesmo, é esquecer esse assunto. Mas quero que você entenda, eu nunca quis me separar de você, mas eu tinha que sumir, se não eu iria perder o meu bebe, e isso eu não podia suportar. Eu fiz tudo para o bem dele. Sei que você deve me odiar, mas no meu lugar eu sei que você faria à mesma coisa, pois você também tem um bom coração.

Bom, como você já deve saber, eu descobri há pouco tempo que tenho câncer. Quando eu soube fiquei desesperada, sem chão, mas agora já estou conformada. O importante mesmo para mim, é que o Lucas esteja bem, por isso procurei um advogado e fiz esse testamento. Eu me preocupo muito com ele. Não quero de jeito nenhum que ele cresça dentro de um orfanato, preferiria ir para o inferno á ver meu filho passar por essa tortura. Ele merece muito mais do que isso, ele merece ser amado, merece crescer ao lado de uma pessoa que se preocupará com a felicidade dele, como eu me preocuparia. Me dói muito saber que não vou poder vê-lo crescer... Que não vou poder abraçá-lo sempre que ele precisar, que não vou poder aconselhá-lo e não vou poder vê-lo se tornar um pintor profissional. Mas o que me reconforta é saber que uma pessoa tão especial como você, Susan, vai estar do lado dele fazendo tudo isso por mim. Eu sempre te considerei a pessoa mais bondosa e responsável que eu conheço, por isso eu te entrego a coisa mais preciosa da minha vida, porque sei que você vai ser tão boa mãe quanto eu seria. Fico muito feliz em saber que ele terá como exemplo uma pessoa como você. Uma pessoa forte, decidida e com um coração tão bom.

Susan, por favor, cuide do meu menino. Isso é tudo que te peço. Por favor. Ele é a coisa mais magnífica que eu já conheci. Ele é tudo que eu tenho. Ele é o meu mundo. Troque uma única palavra com ele e você saberá do que estou falando. Ele tem um brilho no olhar que em toda a minha vida eu só vi em uma outra pessoa. Em você.

Vocês são igualmente perfeitos. Igualmente únicos.

Sei que sua mãe vai ficar nervosa comigo, mas não consigo imaginar meu filho ser criado por mais ninguém além de você. Susan, eu te amo. E amo ele também. O único jeito de eu suportar a idéia de deixar esse mundo, é saber que as duas pessoas mais importantes da minha vida, vão estar juntas.

Sei que o que estou pedindo não é pouca coisa. Mas por favor, dê uma chance para ele entrar na sua vida. Você não irá se arrepender. Por ele, vale a pena lutar.

Amiga, obrigado por ter entrado na minha vida. Eu te amo e sempre amarei. Por favor, cuide do meu tesouro por mim e deixe que ele também possa cuidar de você.

E nunca se esqueça: Eu sempre estarei cuidando de vocês, não importa onde eu esteja.

Que Deus te ilumine.

Beijos, de sua eterna amiga.

Anabela.

Coloquei a carta em cima da mesa. Abri a minha bolsa e então peguei o meu celular, disquei o número e esperei até que alguém atendeu.

– Alô?

– Alô senhor Eduardo, aqui quem fala é a Susan, eu só queria dizer que eu mudei de idéia, eu quero a guarda do menino.



Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Comentem.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Perdida Em Seu Olhar - (Finalizada)" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.