Capítulo X

Processo de Seleção Especial para Aurores

Harry, Rony e Siger passaram pelo corredor ladrilhado e foram em direção a uma porta mais a esquerda que dava abertura a um lance de escadas para o piso inferior.

- Então o senhor trabalha aqui? – perguntou Rony.

- Sim. – respondeu Siger automaticamente.

- Em que departamento?

- Inicialmente o Kingsley me recrutou para assumir o Departamento de Mistérios, e ser o chefe dos Inomináveis. É assim que se chamam não é?

- É assim que nós os chamamos. – Rony ressaltou.

- Bom, o caso é que depois da Batalha Final, a maioria dos Inomináveis foram mortos. E um inclusive se mostrou um agente duplo do outro lado. – Siger desviou o olhar parando no batente da escada. Subitamente sua voz adquiriu uma entonação sombria.  - Roockwood, responsável pela morte do seu irmão Fred, era um Inominável. Um dos motivos, eu imagino, pelo qual Kingsley decidiu fechar todo o nível nove até segunda ordem.

Harry olhou para o lado, Rony se remexia desconfortável.  Siger olhou para trás despertando do seu transe.

- Kingsley, pensei que já estivesse lá embaixo... – Siger cumprimentou com um aperto de mão o homem negro, de capa roxa que exibia um enorme sorriso no rosto.

- Crowe meu caro, Harry, Rony. – Kingsley cumprimentou os meninos. - Tivemos uns problemas – disse a Siger. - e o local da prova foi alterado. Todos os tribunais estão cheios, a equipe do Roger acabou de prender um grupo de ex-Comensais que fugia para o norte. Estão em julgamento agora, dá pra imaginar a confusão que se passa por lá.

- Entendo. – Siger respondeu. – E para onde levo os garotos?

- Venham comigo, eu estava a caminho. – ele os conduziu de volta ao corredor principal, parando de frente da porta preta no final. – Mais cedo pedi que preparassem uma das salas do Departamento de Mistérios para a prova, creio que não haverá grandes dificuldades com a mudança.

Os quatro adentraram pela porta, que dava passagem para uma sala circular já conhecida pelos garotos.  Seis portas iguais, eqüidistantes se encontravam dispostas pela parede de ladrilhos semelhantes aos do corredor. Assim que a porta atrás deles se fechou, as paredes começaram a girar, e tudo virou um borrão.

- E os jurados já chegaram? – perguntou Siger indiferente a rotatória da parede. – Todos eles? – parecia se referir a alguém em particular.

- Ah sim. Chegaram agora a pouco, assim como todos os outros competidores. Eu só estava a espera de vocês três. – respondeu.

- Tivemos um pequeno contratempo. – evadiu Siger. - Desculpe pelo atraso.

- Não se preocupe. – sorriu. – Conheço você o bastante Crowe, para me acostumar com seu problema com horários. – Kingsley disse no momento em que a parede parou de rodar. Parou um instante pensativo, e só então estendeu a mão para a porta da esquerda. – Por aqui.

Kingsley os levou pela porta, que dava abertura para um amplo salão de teto alto. Harry logo reconheceu o lugar, a antiga sala dos Vira-Tempos. Estava igualzinha ao que o garoto se lembrava, exceto pelo fato de estar praticamente vazia. No aposento, no canto mais distante havia uma bancada, e por detrás dela se encontravam seis cadeiras de madeira, quatro delas ocupadas por bruxos com longas capas.

Além disso outras figuras estavam escoradas displicentemente nas paredes, todas apesar de muito diferentes, tinham algo em comum: estavam entediadas. Pareciam completamente a parte do que acontecia ao seu redor, não conversavam entre si, simplesmente ficavam jogadas pelos cantos, esperando algo. Harry logo constatou: eram os outros competidores.

 A primeira que Harry notou – que Gina nem desconfie disso – foi uma garota do seu tamanho, loira de olhos verdes, sentada no chão. O garoto admitiu que ela era muito bonita. A regata justa vermelha tinha um decote “V” que deixava a mostra um par de seios fartos. Os longos cabelos loiros estavam presos em duas Maria-Chiquinhas no alto da cabeça, e escorriam até a metade das costas. No meio da testa tinha tatuado o símbolo do infinito, ladeado pela franja que lhe caía sob os olhos.

A menina o encarou de volta com um meio sorriso e Harry desviou o olhar rapidamente, passando a analisar os outros competidores. Mais a frente um garoto encarava a menina de blusa vermelha com um sorriso malicioso nos lábios. Ele também tinha o cabelo loiro, espetado pros lados. Os olhos azuis e o corpo musculoso o faziam parecer um galã de cinema, o que era acentuado pela camisa risca de giz verde, desabotoada até a metade em conjunto com a calça jeans e o tênis Al-Star. Um típico playboy.

Perto da banca dos juízes, estava o restante dos candidatos. Harry reparou em dois mais perto dele. Uma menina de cabelos castanhos, e olhos cor de mel que tinha o olhar distante. Ela vestia uma camisa folgada, um short jeans curto desfiados nas pontas, e um par de botas marrom estilo militar para completar seu estilo Hippie. Bonita e delicada era assim que Harry a via.

Ao seu lado, havia um menino de cabelos negros arrepiados, com piercings na orelha direita, e braços cruzados. A jaqueta de couro preta produzia um brilho esbranquiçado na iluminação artificial da sala. O cenho fechado denunciava ou muita raiva, ou muita concentração. Harry não sabia dizer, mas preferiu afastar o olhar.

O garoto calculou rapidamente e percebeu que eles estavam em dez, contando com ele e Rony. Ao passarem todos os olhares se voltaram pra os quatro. Os competidores se endireitaram e ficaram de pé, se aglomerando todos no mesmo canto, crentes de que finalmente a prova começaria. Alguns se alongavam, outros murmuravam feitiços, e outros tantos retomavam a conversa que parecia ter acabado instantes atrás por falta de assunto e sobra de tempo.

- Esperem aqui garotos. – Siger foi com Kingsley em direção a bancada. Lá eles conversaram em silêncio com os jurados, que anotavam freneticamente em suas pranchetas.

Harry e Rony foram em direção a uma rodinha de competidores mais perto, meio acanhados, meio nervosos.  Chegaram no meio do papo da menina de blusa vermelha com o garoto dos piercings e a Hippie.

- Pensei que fôssemos apodrecer aqui. – disse a menina loira enquanto alongava os braços. Ela parou o exercício ao ver Harry e Rony e pôs as mãos na cintura, numa pose que fez Harry se assustar. – Não podiam ter chegado na hora não?

Harry se surpreendeu com o tom da menina, que não era nem de longe ressentido, mas sim brincalhão. Ele se aproximou mais descontraído e se dirigiu a todos:

- Desculpem, mas nem sabíamos que esse teste era hoje.

- Coisa do instrutor não é? – a menina perguntou.

- Conhece o Siger? – Rony se manifestou.

- Ah, claro. – respondeu a menina num misto de surpresa e felicidade. Harry se perguntou se ela já sabia quem fora instrutor dele e de Rony ou se apenas jogara verde. – Ele foi meu instrutor também. Meu e da maioria aqui, aliás.

- É típico dele, chegar atrasado... – a garota Hippie disse com um sorriso torto.

- Difícil é fazer com que ele chegue na hora. – o garoto de verde que Harry avistara antes entrou displicentemente na roda, com um sorriso no rosto. A loira rolou os olhos e cruzou os braços, como se achasse um milagre ele não ter se intrometido na conversa até agora.

Pelo que Harry percebeu todos os quatro já se conheciam superficialmente, pois conversavam sem receio. Exceto o menino de preto que continuava calado muito distraído.

- Então ele foi instrutor de vocês também... – Harry voltou ao assunto.

- Ah sim, por um curto período de tempo eu digo. Coisa de uma ou duas semanas. – a Hippie respondeu. – Não sabemos quem instruiu os outros. – ela apontou para outra rodinha mais adiante.

- Provavelmente outro cara misterioso. Mas que não se atrasa. – o de verde respondeu displicentemente.

- Você é o Potter. – A garota loira constatou indiferente ao comentário do playboy de verde. Harry assentiu. – E você o Weasley.  Eu sou a Loren. Loren Price.

- E eu sou o Steven. – disse o garoto de verde passando a mão sobre o ombro de Loren. Intrometido, Harry pensou estendendo a mão para cumprimentá-lo. Rony fez cara feia e estendeu a mão também.

 - Estes são Jessica Aley, e Chris Hareston. – disse Loren ignorando o Steven e apontando para a menina Hippie e o garoto de preto.

- E aí. – disse Chris alheio. Harry e Rony acenaram com a cabeça.

- Oi, prazer. – cumprimentou Jessica. – Ouvi muito falar de você Harry. E é claro de seus amigos também. – ela sorriu pra Rony.

- Ah é claro. Em todo lugar só se ouve falar de vocês. – começou Loren. – Aquela matéria ficou espetacular. E eu me pergunto se tudo que está lá realmente aconteceu e...

- Matéria? – Rony interrompeu. – Que matéria?

- A que saiu hoje de manhã. Da reestréia do... Do... – fechou os olhos tentando se lembrar. - Qual o nome mesmo? Ah, Profeta Diário. – respondeu a menina.

Harry e Rony tomaram café tão depressa, ansiosos como estavam para começarem a jogar Quadribol que nem checaram o correio da manhã. Não voltaram A Toca desde então, e não tiveram a chance de reparar nos noticiários a caminho do Ministério. Mas agora que Harry parou pra pensar, ele se lembrava de ter ouvido algo no Observatório Potter a respeito.

- Vocês não viram? – Jessica, a Hippie, perguntou. Os meninos ficaram calados completamente pasmados.

- Fala Sério! – Loren olhou pros lados procurando algo. – Tinha um exemplar rodando por aqui, acho que o Patrick pegou. – disse apontando pra uns garotos mais adiante. Ela hesitou por um momento, mas depois desistiu de ir buscar. – Ah, vocês vão ver. Mais cedo ou mais tarde.

- Só espero que não estejam criando abobrinhas. – disse Rony para Harry.

- É só o que quero. – respondeu o garoto.

Harry olhou novamente para a mesa dos jurados. Haviam seis cadeiras, então ele julgou que Siger também devesse ser um a ocupar a mesa do júri. Uma mulher de óculos e cabelo arrumado em coque estava na ponta consultando uma pilha de papéis. Do lado, três homens de capa preta discutiam com Kingsley e Siger, e, vez ou outra, anotavam algo nas pranchetas.

- Onde será que guardaram nossa bagagem? – Steven perguntou depois de alguns minutos de silêncio.

- Não faço a mínima idéia. – respondeu Jessica.

- Espero que num lugar seguro... – começou Loren. – Eu não fiz tanto esforço pra encaixar minhas malas numa cabine telefônica pra eles jogarem elas em qualquer lugar.

- Aqui faz muito frio. – murmurou Jessica abraçando os braços expostos. – Queria poder pegar minha blusa.

Chris indiferente tirou sua jaqueta de couro, e a colocou em volta dos braços da garota. Ela sorriu pra ele em agradecimento, mas o menino apenas respondeu com um aceno de cabeça, desviando o olhar para longe e cruzando os braços em seguida. Todos observaram a cena calados, e após um momento de constrangimento Harry quebrou o gelo:

- Vocês não são daqui? – ele indagou reparando no comentário sobre as bagagens, se sentindo surpreendentemente estúpido pela pergunta.

- Sim e não. – respondeu Loren feliz por continuarem conversando. – Todos somos londrinos, mas não moramos na Inglaterra.

- E porque foram recrutados? – Rony perguntou com interesse.

- Pelo que o Kingsley disse mais cedo, - Jessica se manifestou enrolada na jaqueta de Chris. – o Ministério ainda está enfraquecido. Eles estão meio que buscando reforços.

- E essa é a maneira mais rápida e segura de se fazer isso. Trazendo de volta os bruxos que nasceram aqui. – Chris salientou. – Isso evita uma aliança com outros países, e ao mesmo tempo esconde a fragilidade do regime.

- Lá vem você Sr. Crânio. – Loren zombou.

- Só estava comentando. – respondeu sem graça.

- E os outros ali? – Harry perguntou olhando para o grupinho de garotos mais adiante.

- O que tem? – perguntou Steven. – São legais. – completou parecendo não entender o sentido da pergunta. Depois se virou em direção a eles e deu um assovio. – Ei pessoal! Chega mais.

O grupo se virou perante o chamado e assim que reconheceram o Steven vieram caminhando tranquilamente. Um menino mais alto de cabelos negros liderava o bando seguido pelos outros três com expressões brincalhonas.

- Fala aí. – o líder cumprimentou Steven com uma batida de mão.

- Patrick Stane, Anthony Summers, Stuart Greysson e Martin Leston. – Steven os apresentou gesticulando. Depois passou para o outro lado e terminou. – Esses são Harry Potter e Rony Weasley de quem falávamos mais cedo.

Os garotos se cumprimentaram cautelosos. Harry apertou a mão de Patrick e sentiu uma mão calejada, pequena, mas firme. Stuart lhe deu um abraço e uma batida nas costas enquanto Anthony e Martin fizeram uma imitação grotesca do que seria uma reverência.

- Então você é o mais que famoso Harry Potter. – Anthony iniciou sarcástico.

- Até onde sei. – Harry rebateu.

- É um prazer conhecê-lo Potter. – Patrick quebrou a tensão entre os dois olhando para Anthony com cara feia. O outro apenas ficou indiferente.  – Desde que chegamos aqui estávamos lendo e discutindo sua história. Eu já sabia de algumas coisas, mas certos detalhes são realmente surpreendentes.

- Leram no Profeta Diário? – o garoto perguntou.

- Foi. A matéria está realmente espetacular. – ele respondeu. Depois mudou de assunto completamente.  – Inclusive... Tinha uma foto de vocês dois acompanhados por duas garotas no Beco Diagonal. Reconheci a Granger por uma foto dela abraçada com você que rodou os jornais na época do Torneio Tribruxo. Mas e a outra, quem era?

- Gina, - Harry respondeu com um sorriso. – minha namorada.

- Há, pode ir me pagando. – Loren estendeu a mão para Patrick comemorando. – Otário, otário. – cantarolou fazendo uma dancinha com as mãos.

- Droga. – Patrick se deu por vencido, colocou a mão no bolso e tirou dois galeões que relutante entregou a garota. – Apostei com ela que o que estava escrito na matéria era mentira. – explicou perante a cara confusa de Harry. - Que na verdade você devia estar com a Granger.

- A Hermione é MINHA namorada! – Rony disse com raiva.

- Merda. Se soubesse tinha apostado também. – disse Loren chateada. – Ganharia em dobro.

- Vacilou Patrick. – Steven e Anthony riram.

- Foi mal cara. – Patrick se desculpou olhando para Rony com cara de sinto muito.

- Ta na boa. – Rony deu de ombros.

- Vem cá... – Stuart mudou de assunto de novo. – Vocês também tiveram treinamento para esse teste?

- Lá vem... – Loren resmungou no ouvido de Steven.

- Sim. – respondeu Harry sem entender Loren.

- E quem foi o instrutor de vocês? – perguntou Patrick interessado.

- Foi o...

- Não! – Loren silenciou Harry com uma mão, depois se virou furiosa para Patrick e os outros do bando. – Vocês disseram que o nome do seu instrutor era confidencial e blá, blá, blá. Não vejo motivo pra revelarmos o nosso.

- Ah, qual é Loren. – o garoto argumentou.

- Chega! Nem mais nem menos. – disse firme. - Não quero discutir de novo.

- Ok, ok. – o menino se deu por vencido. – Não toco mais no assunto.

- Acho bom. – Loren terminou. Steven passou um braço pela cintura dela e a puxou para perto. Harry preferiu ignorar o sorriso malicioso que ele tinha nos lábios.

Harry deu mais uma olhada na mesa. Kingsley e Siger já haviam tomado os seus lugares e se juntaram aos outros jurados escrevendo nos papéis. Harry reparou na cara zangada do instrutor ao passar uma anotação para a mulher de coque que sentava ao seu lado. Ela tinha a mesma expressão no rosto quando aparentemente riscou todo o conteúdo do papel e o devolveu ao remetente.

- Bom... Vocês estão nervosos? – Jessica perguntou sorrindo tímida depois de um tempo. – Por que eu estou.

- Que tipo de teste será esse? – Rony perguntou.

- Não sei. Eles não disseram nada ainda. – respondeu Loren.

- Verdade. Desde que chegamos está esse silêncio mortal. – disse Patrick.

 – Eu perguntei mais cedo. – disse Anthony. - Mas um dos jurados me respondeu que as explicações seriam dadas quando todos estivessem presentes.

- Traduzindo: ninguém podia saber de nada até vocês chegarem. – completou Steven olhando reprovadoramente para Harry e Rony.

- Então vocês não têm idéia do que vamos fazer aqui? – Harry perguntou ignorando o olhar de Steven.

- Não. – responderam em uníssono.

- Bom, pra falar a verdade eu tenho uma suspeita. – se manifestou Chris. Ele ignorou a reação de surpresa quando do pessoal a sua volta quando ele falou, e se pôs a explicar. – Se vocês repararem no local em que estamos, verão que ele foi previamente preparado. Existem marcas no chão que sugerem que móveis foram arrastados daqui, e a opacidade delas dá a entender que tudo foi feito com um pouco de pressa. Provavelmente para corrigir o tal imprevisto. – ele dirigiu um olhar significativo para Loren.

Os outros competidores olharam ao redor tentando acompanhar a observação do garoto. Chris continuou despejando as palavras num frenesi de informações.

- O espaço amplo que foi criado na sala e a bancada de juízes virada diretamente para o centro dão a entender uma prova prática. Isso é óbvio. – disse o menino gesticulando para os lugares que descrevia totalmente normal como se explicasse quanto são dois mais dois. – Estamos em dez pessoas aqui. Só existem seis jurados. Parece-me um pouco inviável que sejam provas individuais, e a opção que mais se encaixa pra mim é uma competição.

- Que tipo de competição? – Harry perguntou. A única parte que tinha assimilado do longo discurso do menino foi “competição”.

- Duelos. – respondeu simplesmente.

- Deduziu tudo isso só observando a sala Sr. Crânio? – Perguntou Loren sarcástica. Steven apertou ainda mais o braço na cintura da garota num ato de repreensão.

- Digamos que sim. – Chris riu com o apelido. – E acabo de ter minha confirmação. – ele apontou discretamente para a bancada de jurados. – Eles não param de olhar pra cá e murmurar nossos nomes...

- Estão fazendo a grade de torneio. – Harry completou.