Um Par De Olhos Negros. escrita por Jéss mS


Capítulo 20
Memórias


Notas iniciais do capítulo

Espero que curtam e, comentem dizendo o que achou. Desculpe pela demora e, pelo drama que vai rolar neste capítulo... Bom espero que curtam!



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Não abri os olhos, deixei ambos fechados, selados com a dor que eu tinha passado. Eu sentia um tecido sob meu corpo, e um chão completamente gelado sob ele. A dor havia passado e, a fraqueza havia tomado seu lugar. Meu estômago reverberava por meu corpo e, a fome acabava com o restante de forças que provinham de minhas veias recompostas por sangue correndo nelas. A consciência atingiu-me com uma força brutal. Onde eu estava? Estava no Mundo do Além? Estava indo de encontro à Deusa? Algo – com toda a certeza – dizia-me que não. Senti dedos finos tocando um de meus braços, dedos fracos e, ressecados. Encolhi-me em mim mesma, ainda não tinha aberto meus olhos cinzas. O medo me consumia novamente, consumia o sangue de minha veias.

– Precisa acordar. Sabemos que está aí. – Disse uma voz áspera contra mim. Movi minha cabeça em negação. Eu não queria aquela voz contrabatendo em meus tímpanos. Eu queria a voz de Patch nos mesmos; eu queria o cheiro de Patch e, além de tudo o toque morno da pele macia de Patch.
– Acorde de uma vez novata. – Soou a voz novamente. Aquela com certeza era uma mulher, sem dúvida alguma. Abri meus olhos e, avistei um teto repleto de mofo e, umidade. Olhei para meu corpo jogado no chão sobre um lençol de malha fina e, branco. Minha blusa azul do dia de minha morte ainda estava suja de sangue. Do meu sangue.
– Até que enfim. – Soou a voz novamente. – Prazer Nora, menina difícil de acordar. Meu nome é Ariane e, seja bem vinda a sua nova Morada. – Disse a voz com nome de Ariane. Risadas soaram altas quando suas últimas palavras escaparam de seus lábios.
Sentei-me com as pernas esticadas e, olhei detalhadamente para onde estava. Aquele local parecia-se muito com um túnel subterrâneo, pois nenhuma luz ali adentrava a multidão que estava no local. Havia vários “buracos” por corredores um pouco distantes. Onde eu estava; as paredes eram deformadas, com tintas caindo aos pedaços e, pó por todo o chão. Havia vários colchonetes para que pudéssemos dormir, talvez. E a dona da voz veio até mim. Olhei diretamente para uma cicatriz que ia de seu rosto à lateral de seu pescoço; seu olhar parecia violento, mas, seu rosto animado negava tudo.
– Onde estou? – Disse com uma voz rouca, como se nunca realmente tivesse usado minha voz.
– Em túneis, todos vem para cá após suas “mortes”. – Disse ela fazendo aspas com os dedos ao pronunciar a palavra “mortes”. Seus cabelos eram negros e, lisos cobrindo seus ombros e, indo até o centro de suas costas. Seus olhos eram negros e, sua pele branca. Ela era magra, em um corpo quase atlético.
– Eu morri, eu senti a morte, como posso ter vindo para cá? – Perguntei em meio à escuridão que eram aqueles túneis.
– Acredite ninguém morre na Morada, após os temidos planos de nossa Grande Sacerdotisa. – Disse Ariane com raiva em sua voz. – Ela não deixa com que isto aconteça, ela criou um novo Mundo, uma nova Morada e, esconde isto de todos. Estamos aqui nestes túneis nojentos por isto e, por que agora – mais do que nunca – não podemos tomar sol em nossa pele ultrassensível. – Disse ela com uma pitada do que me pareceu sarcasmo. – Está com fome? – Perguntou-me, desviando a conversa. Acenei positivamente com a cabeça. Ela levantou-se – suas roupas estavam parcialmente sujas – e, se encaminhou de frente à uma geladeira. Geladeira? Em túneis? O mundo está louco! Ariane abriu a geladeira e, retirou de lá uma bandeja contendo diversas frutas. Entregou-me as diversas frutas que logo as ataquei com bastante alvoroço. Os gostos atingiam minha garganta com força.
– Ela também nos diz que temos que ficar saudáveis para o que der e, vier. – Disse Ariane e, certa tristeza atingiu seu olhar tão intenso.
– Como assim para o que der e, vier? – Perguntei entre a situação embaraçosa que se formou.
– Ela pretende guerra, contra os humanos. Ela não os quer mais, quer todos mortos. Mas, nós – Disse ela apontando para todos que também estavam com tristeza em seus olhares. – não queremos isto. Assim como você também não quer. Não é? – Indagou-me olhando meus olhos com tamanha profundidade.
– É lógico que não! – Respondi com desespero.
– Ela ficou muito feliz quando você “morreu” e, a trouxe imediatamente para cá. Disse também que todos que ficaram no dormitório estavam chorando. Mas, ela simplesmente amou, porque você é qualificadora dos cinco elementos. – Disse ela com certo brilho nos olhos. Brilho o qual não pude identificar. Não sabia se era de alegria; medo; admiração ou tristeza.
– E, como esta mulher faz isto? – Perguntei. Tudo ainda estava tão confuso em minha mente, que aquela foi a pergunta mais coerente que atingiu meu consciente.
– Bom, uma de suas qualificações é a Cura. Então nós a chamamos de Curandeira também. Assim que você morre parcialmente, ela toma conta de seu corpo e, faz com que você volte à vida. De um modo diferente, mas, volta. E, também há rumores de que nós podemos sair desta situação. De alguma forma nós podemos nos livrar disto tudo. Deste Mundo que esta louca criou. – Continuou dizendo com raiva em seus olhos delicados.
– Temos de fazer algo. – Disse subitamente. – A Deusa diz isto para mim, neste momento. Temos de fazer algo!
– Nós estamos tentando fazer algo, mas, a novata que nos ajuda com as informações quase nunca voltou aqui. Ela tem medo de que a Grande Sacerdotisa a pegue e, acabe com que ainda restou dela. – Disse Ariane encostando-se em uma parede úmida próxima ao seu corpo.
– Pera aí, você disse Grande Sacerdotisa. Qual Grande Sacerdotisa? – Perguntei rapidamente, terminando de comer as frutas da bandeja de alumínio e, deixando a mesma no chão sujo dos túneis.
– Tenho certeza que a conhece muito bem, ela era sua acompanhante. Seu nome é Laurel Neft.
A dor atingiu meu corpo. Como? Laurel? Aquela mulher que parecia ser tão bondosa, como poderia ser ela? Eu nunca vi uma gota de maldade em seus olhos verdes musgo. Ela sempre fora muito bondosa para com todos da Morada Sussurrante. Às vezes via um olhar raivoso voltado para Patch e, nunca para os demais, mas, sempre desconfiei que aquele olhar existia pelo simples fato de ela – de algum modo – saber que suas marcas eram das Trevas tipo 1.
– Ela vem aqui regularmente? – Perguntei ainda perdida em certos devaneios de minha mente.
– Raramente, ela diz que só vem aqui quando realmente houver uma grande necessidade para que ela faça algo do tipo.
– E, a novata? Vem aqui sempre? – Perguntei novamente.
– Ela sempre vem aqui. Ela ficou completamente impressionada quando viu que era você a novata dos túneis. Só não chorou porque não faz muito o tipo dela.
Instantaneamente sentei-me ao seu lado e, logo pude perceber como eu estava magérrima. Meus ossos quase apareciam das órbitas de minha pele clara. Patch nunca iria me querer assim. Nunca. Patch. Será que ele havia cumprido a promessa de cuidar de todos para mim? Vee estava sozinha naquele quarto e, aquilo com certeza deveria ser horrível para ela. Afinal ela viu sua melhor amiga morrendo. E, minha irmã também vira sua caçula morrendo, bem diante de seus olhos azuis. Repentinamente a dor atingiu meu coração que bateu fortemente contra as costelas em desaprovação. Como isto poderia estar acontecendo comigo? De modo repentino minhas lembranças com meus entes queridos passaram por minha mente. Era como se eu estivesse completamente cega. E assistisse um estranho filme. Primeiro enxerguei eu e Vee brincando com nossas bonecas barbie louras platinadas. Nos vi correndo na praia atrás das andorinhas que por ali passavam. Nos vi indo à casa da praia de meu pai Harrison quando éramos crianças. Enxerguei quando Vee me ligou de madrugada dizendo-me com nojo nas palavras que havia sangue entre suas pernas, naquele dia quase raiamos o dia conversando. Me vi entrando em minha antiga escola com Vee atada em um dos meus braços
Segundo me vi recém-nascida no colo de minha irmã com três anos e, meu pai Harrison logo atrás sorrindo. Me vi com cinco anos assistindo à um DVD junto com Stevie e, meu irmão Max ainda recém nascido em seu bebê conforto. Vi minha irmã brigando comigo quando deixei de sair com ela, para passear com Vee. Stevie Rae sempre fora do tipo ciumenta.
Terceiro me vi nos braços longos de Patch. E, aí sim a tristeza atingiu com força as veias pelo meu corpo. Repentinamente vi Patch ao lado de fora do meu quarto, mas, eu não era eu. Eu estava ao seu lado como quando entrei em suas lembranças. Vi sua ira quando comecei a ficar com um rapaz da escola. Vi sua ira novamente quando percebeu Cam nos arredores de minha casa. Vi Patch me carregando para a Morada Sussurrante em seus braços fortes. Vi ele falando com Laurel como se fosse minha avó e, vi quando ele pediu – como se lesse meus pensamentos – para que colocassem o sobrenome Redbird ao invés de McLimbs. Abruptamente a escuridão começou a invadir a lateral de meus olhos e, a cegueira me invadiu deixando permanentes aquelas simples lembranças. As lágrimas rolaram em silêncio por minhas bochechas e, logo senti um braço fino abraçar meu ombro, sem saber o que estava fazendo abracei Ariane com força e, chorei o choro mais desesperado de toda minha vida. Tudo foi retirado de mim, deixei todos para trás, sem meus cuidados, sem mim, sem minha presença e, sem nossos momentos. Não tive nem tempo de presenciar alguns momentos fortes com Damien ou Shaunee e, aquilo também me deixou completamente triste. A dor atingiu-me por completo e, eu chorava forte contra o colo magro de Ariane que passava seus dedos finos por meus fios ondulados em sinal de que tudo ficaria bem, mas, nada estava bem; estava tudo um horror. Eu sentia-me doente, não conseguia ver uma vida sem nenhum deles, eu os queria e, os queria agora. Queria novos momentos, novas lembranças. Novos choros e, risadas ao lado de todos. Eu queria dormir dando boa-noite à Vee e, acordar olhando para seus olhos levemente inchados pelo sono. Queria olhar nos olhos azuis de Stevie Rae e, ali encontrar a verdade que eu sempre encontrei. Queria sentir o odor de lavanda vindo dos poros da pele de minha avó. Queria uma risada ao lado de meu amigo gay Damien. Queria a fiel proteção de Cam, que fazia aquilo com total desejo. Queria Shaunee dizendo-me o que usar naquela noite de filmes no dormitório masculino. E para concretizar tudo isto queria Patch. Queria vê-lo; queria sentir seu toque, assim como Graças a Deusa ele podia me sentir. Queria ouvir o timbre grave de sua voz e, queria escutar sua risada rouca. Queria seus dedos entrelaçados aos meus; ou em meus cabelos. Queria seus lábios colados aos meus. Queria vê-lo dormir, assim como ele me viu certos momentos. E queria ver seu par de olhos negros encarando-me com intensidade. Assim deixei com que as lágrimas salgadas lavassem a dor de meu corpo, que eu sabia que não sairia dali nem tão cedo. A dor da perda é permanente. Ela não passa. Infelizmente a gente só se acostuma com ela. Ela não é uma cicatriz, ela é uma ferida aberta protegida pelo falso sorriso pendendo de nossos lábios.


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Notas finais do capítulo

E aí? Valeu à pena esperar? Espero que curtam e, até amanhã com o link da segunda temporada! Beijos leitores queridos!