Opposite escrita por Giovana Marques


Capítulo 10
Shadow Ocean


Notas iniciais do capítulo

Depois de tanto tempo sem escrever, finalmente voltei. Desculpem mesmo pela demora! A partir de hoje quero começar a postar um capítulo por semana. Eles serão postados geralmente aos Domingos.
Bom, espero que gostem do capítulo! Por favor, me digam o que estão achando.
Beijos e boa leitura. :3



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O Shadow Ocean não é assim tão assustador. Na verdade, nada assustador. Parece comum, como os oceanos do mundo humano, só que de um azul um pouco mais escuro e ondas definitivamente mais fortes.

Estamos no que parece ser um porto e fico indignada com a quantidade de barcos âncorados aqui. Quer dizer, se é cheio de criaturas marinhas abomináveis, por que alguém em sã consciência iria querer velejar num oceano desses?

Faço essa pergunta discretamente à Nina e ela ri baixo ao responder que na verdade, a maioria dos barcos aqui são dos feiticeiros brancos, que por controlarem a água não se sentem assim tão ameaçados assim pelos monstros marinhos. E por essa ser uma parte rasa, não é assim tão infestada como o fundo. Devo admitir que a palavra “infestada” me faz arrepiar por um momento.

Coloco minha mala no chão, cansada pelo seu peso, e bocejo. Eu, Nina, Jeremy, Fred e Katherine esperamos por Therion Darkbloom e Luke, que acertam os últimos detalhes da nossa missão no Palácio Negro. Confesso que me senti um pouco chateada quando Therion disse que queria falar com Luke em particular e nos mandou esperar.

– Que demora! – Jeremy reclama.

– Therion Darkbloom é o rei, ele pode demorar o quanto quiser. – Katherine provoca o irmão mais novo, em tom de zombaria.

– É, mas essa demora já está ficando meio exagerada. – Ele contra-ataca, entediado.

– Relaxe, enquanto tem tempo, Jeremy. – Fred diz e sorri quando percebe que Jeremy faz uma careta.

Olho para até onde meus olhos alcançam daquele imenso e escuro oceano e estremeço. Nina percebe e coloca uma de suas mãos em meu ombro, em uma tentativa de consolo.

– Não perca as esperanças, Emy, nem por um só momento. – Ela fala tão baixinho, de modo que só eu consigo escutar. – Nós vamos conseguir fazer isso.

Sua determinação me anima de certo modo.

– Assim espero. – É tudo o que consigo responder.

***

Ando de um lado para o outro, nervosa com a tal situação.

– Eu preciso ir com vocês. – Peter repete com convicção, segurando uma pequena mala.

Suas palavras me atingem em cheio novamente, fazendo minhas mãos tremerem um pouco. Eu não acredito que ele esteja fazendo isso!

– Não, você não precisa, porque além de ser totalmente perigoso, você seria bastante útil aqui caso não voltemos. – Digo, enfurecida e magoada ao mesmo tempo.

Sra. Gray, que acaba de chegar, se assusta com minhas palavras realistas, mas eu não me importo. Só estou dizendo a mais pura verdade: Pode ser que não voltemos.

– Por favor, deixem-me ir. Andei treinando tão duro durante os últimos dias! Vocês nem imaginam. – Ele praticamente implora.

– Peter, você não está incluído na missão. Desista! – Nina diz, tão aborrecida quanto eu. – Therion teria de autorizá-lo e além do mais, seus pais estão sabendo disso?

– Deixei uma carta. Eles entenderão que parti para o bem de todos os feiticeiros.

Estou extremamente chateada com a teimosia de Peter. Quer dizer, não quero que ele vá, não quero que ele corra os mesmos riscos que três dos meus amigos e eu iremos correr. E além do mais, sua ida não teria o mínimo sentido. Peter não está envolvido, como eu, Luke, Nina e Jer estamos com a missão.

– Qual é? Deixem-o participar. – Jeremy dá de ombros. – Ele está escolhendo o que quer.

– Uma escolha totalmente imprudente. – Katherine admite. – Peter, você não está tão preparado como Luke, Jeremy e Nina. Emily é uma feiticeira branca, portanto será útil na travessia do mar, sem falar que seus poderes são misteriosamente mais fortes do que os poderes de um feiticeiro qualquer.

Peter balança a cabeça de um lado para o outro, incrédulo.

– Está dizendo que sou inútil?

– Estou dizendo que você estaria se arriscando demais. – Katherine diz, sabendo escolher bem suas palavras.

– Quem estaria se arriscando demais para o quê? – Luke pergunta, assustando a todos com sua repentina chegada. Estavamos tão absortos com a polêmica de Peter que nem percebemos sua presença, de Therion Darkbloom e dois de seus soldados. É claro que todos se curvam rapidamente na presença do rei, em um gesto de cumprimento e respeito.

Luke parece um pouco mais irritado que o normal, então ninguém responde no primeiro momento. Ele repete sua pergunta e Peter diz:

– Estavam falando de mim. Eu quero fazer parte da missão.

Luke dá uma risada com sarcamo e por um momento, sinto raiva de sua repugnante atitude. Onde está o bom Luke? Aquele de alguns dias atrás? Que me ajudou em tantas coisas? De verdade, às vezes eu não consigo entender a lógica de suas atitudes.

– Você está falando sério? – Ele zomba de Peter, fazendo-o corar.

– Estou sim, Gray. Por que a risada?

Luke dá um sorrisinho sarcástico e ignora meu olhar de intolerância quando diz:

– Você não duraria um dia.

Peter bufa, ofendido e olha para o chão. Tenho de admitir que sinto um tanto de pena dele e é claro, ódio por Luke tê-lo humilhado daquela forma ainda mais na frente do líder dos feiticeiros negros.

Por mais que não queira que Peter vá, sinto que devo fazer alguma coisa para ajudá-lo. Então eu simplesmente digo:

– Eu discordo totalmente de você, Luke.

Luke parece surpreso com minhas palavras e me encara ranzinza pelo simples fato de eu estar contestando-o.

– Está querendo dizer que ele deve ir conosco?

– Pensando bem, sim. Só não queria que arriscasse sua vida, mas não acho que não conseguiria sobreviver. Muito pelo o contrário, quer dizer, ele também foi aluno de Fred. Assim como você, Luke.

– Concordo com Emily. – Fred me interrompe. – Peter é agil e pode ser sim bastante útil para destruir alguns demônios marinhos. Luke, pense bem no que está dizendo.

Olho de soslaio para Peter e encontro um meio sorriso repentino esboçado em seus lábios. É mesmo um louco, estúpido e inconsequente! Eu acredito na coragem e no espírito aventureiro, mas quando você pode ficar longe de uma situação arriscada, você deve se sentir contente com isso!

Luke admira Fred como se fosse seu irmão mais velho bem sucedido, ou seja, ele faria qualquer coisa que Fred sugerisse. Sugerir que Peter vá conosco, apesar da teimosia de Luke, deve tê-lo deixado bem pensativo.

Therion pigarreia e nos faz lembrar que ele ainda está aqui. Coisa que, sinceramente, eu já havia esquecido.

– Vocês querem decidir isso logo? – Katherine diz, desconfortável. – Quanto mais cedo partirem, melhor.

Luke balança a cabeça, dá de ombros e por fim cede.

– Tudo bem, que seja. Mas você – Ele aponta friamente para Peter. – vai ter de fazer o que eu disser para fazer. Se for para atacar, terá de atacar, mesmo que tenha que morrer para concluirmos essa missão.

Peter balança a cabeça, mostrando que pegou o recado, e com um sorrisinho diz:

– Feito.

É claro que isso me deixa um pouco tensa, mas não posso fazer nada. Afinal, Peter está escolhendo o que quer e se ele está escolhendo arriscar sua própria vida nessa missão suicída, quem sou eu para impedí-lo?

Ele pede a autorização para fazer parte da missão para Therion de maneira tão educada e formal, que o rei não consegue dizer não.

– Finalmente. – Nina diz, roendo todas as suas unhas pela terceira vez atrás de mim. – Podemos partir agora, Luke?

Luke balança positivamente com a cabeça, sugerindo que Therion nos mostre o barco que pretende nos emprestar.

O líder dos feiticeiros negros anda em silêncio até a ponta do cais, onde os barcos possuem um símbolo em preto. Acredito que isso determina os barcos de feiticeiros negros e brancos, já que vejo alguns barcos com símbolos brancos do outro lado.

É claro que estou curiosíssima para conhecer o barco de Therion... Será que é um daqueles navios piratas de filmes? Ou maior? Deve ser imenso, já que estamos indo nessa missão de extrema importância para sobrevivência dos feiticeiros negros...

Mas então, me desaponto ao perceber que andamos na direção dos barcos menores. E fico mais chocada ainda quando Therion aponta para uma velha canoa ancorada por ali. Tão pequena, que não tenho certeza se nós cinco caberíamos.

Arregalo meus olhos e viro-me para Nina, indignada. Ela parece tão desapontada quanto eu e até um pouco assustada. Jeremy também parece incrédulo e balança a cabeça, desacreditado.

– Não está falando sério, está? – Ele diz, meio afobado. Nina dá um chute em sua canela na mesma hora e ele geme de dor.

Luke dá uma risada despreocupada e estranho sua reação.

– Relaxem pessoal, é só uma camuflagem.

Isso com certeza me tranquiliza, mas mesmo assim não entendo muito o que Luke quer dizer.

– Como assim? – Pergunto, curiosa.

O rei é quem responde minha pergunta. Ele caminha até ficar bem próximo a canoa, sendo fielmente seguido pelos seus guardas.

– Isso é bem interessante. – Ele faz um comentário. – Conseguem ver aquele quadrado marcado no fundo do barco?

Olho para a canoa, assim como todos os outros, procurando o tal quadrado com os olhos e o encontro com facilidade.

– É um fundo falso. – Ele completa. – O barco na verdade é um submarino. Fica embaixo d’água e é invisível aos olhos dos seres que estão no exterior dele.

– Então, Vossa Majestade, está dizendo que barco fica submerso embaixo d’água e que não podemos vê-lo se não estamos dentro dele? – Nina pergunta, tão maravilhada quanto eu.

– Isso mesmo. – O rei responde educadamente, com um sorrisinho brincando em seus lábios, orgulhoso em ter algo tão incrível como aquele barco.

– Está dizendo que a única coisa que as criaturas marinhas vão ver é uma velha canoa de madeira flutuando no mar? – Ela volta a perguntar entusiasmada.

– Isso mesmo, srta. Sanchez. – Therion responde mais uma vez e ainda faz um pequeno comentário. – Mas terão de tomar cuidado para não esbarrarem nas criaturas maiores, com a parte invisível do barco. Elas podem acabar percebendo que é um truque.

Olho novamente para aquela pequena canoa sem conseguir acreditar. A magia é mesmo uma coisa incrível! Como eu pude conviver todos esses dezesseis anos sem ao menos desconfiar sobre sua existência?

Terminamos de nos despedir dos demais, e ao ver meus amigos abraçando seus familiares sinto-me um pouco chateada por não ter minha própria família. Se bem que já me despedi de Logan há algum tempo, mas ele não entende sobre toda essa coisa de feiticeiro.

Olho para Peter que está ao meu lado e lembro que a família dele também não está aqui.

– Seus pais vão te matar. – Faço um comentário sincero.

– Eu sei, mas vai valer à pena. – Ele diz, rindo.

Reviro os olhos e balanço minha cabeça em resposta.

Luke termina de abraçar seu pai e vai ao encontro de Therion, que o cumprimenta formalmente e diz:

– Gray, acho que não preciso dizer mais nada. Apenas boa sorte. Eu sei que você vai conseguir, é um homem corajoso e eu confio em você.

– Obrigado, Vossa Majestade. Tentarei fazer tudo o que estiver ao meu alcance. – É o que diz e depois se curva diante de Therion.

Luke entra na canoa e retira a abertura do fundo falso. Fico impressionada quando ele desce por uma escada e desaparece. Meu cérebro simplesmente não consegue registrar aquilo e tenho que chegar mais perto para ver.

Jeremy corre das garras da Sra. Gray, que no momento se acaba em lágrimas, e segue o primo para dentro do barco. Peter vai logo atrás. E por fim, eu e Nina.

Acenamos para os outros, fechamos a entrada com o quadrado de madeira e descemos as escadas até o fundo do barco.

***

É simplesmente incrível como algo tão grande não possa ser visto embaixo d’água.

Termino de descer a escada e dou de cara com uma grande mesa de jantar, certamente exagerada, e um lustre enorme pendurado no teto. Segundo Nina, ele é todo decorado com ouro e pequenas safiras. Dez cadeiras cercam a mesa, o que eu acho um pouco desnecessário já que estamos em cinco pessoas. Há alguns quadros em tons de vermelho e preto decorando as paredes.

À direita da mesa há um balcão e por trás dele, a cozinha, igualmente grande e exagerada para um barco. À esquerda, vejo dois grandes sofás vermelhos de veludo, um grande tapete negro e por incrível que pareça, uma lareira. Não sei como funciona embaixo d’água e isso me deixa mais maravilhada ainda. Também há um lustre por cima dos sofás, porém não tão adornado quanto ao da sala de jantar.

A pequena sala com os sofás e a lareira é diferente da cozinha e da sala de jantar, apesar de estarem todas no mesmo cômodo. As paredes, ao contrário das outras paredes do submarino, são feitas de vidro, possibilitando nossa visão para o exterior do barco. Elas são cobertas por longas cortinas de seda vermelha que neste exato momento estão abertas.

Percebo também uma poltrona negra separada dos outros dois sofás. Em frente à ela, há um grande bloco de metal com um leme para controlar o barco, alguns botões, (que sinceramente, desconheço suas funções) e um visor, bem parecido com o que eu chamo de GPS.

Caminho completamente boquiaberta pelos cômodos já conhecidos por mim, sem me preocupar se pareço uma idiota. A verdade é que estou muito mais do que impressionada. Coisas desse tipo não deviam existir! Não no mundo em que eu estava acostumada a viver. Nina de repente ri com a minha empolgação.

– Isso não é nada comparado ao Palácio Negro.

– Imagino. – Respondo, ainda com os olhos arregalados.

Luke abre uma porta próxima da escada pela qual descemos e entra em um corredor, dizendo que ali estão o resto dos aposentos. Nós o seguimos, totalmente curiosos.

Andamos pelo corredor, cujo teto também é feito de vidro. Ele possui dez entradas para quartos diferentes, cinco em cada lado. Resolvemos ficar com os quartos mais próximos à ala do leme, caso aconteça alguma emergência.

Adentro o quarto da ponta, ao lado direito, e fico deslumbrada. Me encanto com a decoração um tanto quanto gótica do quarto. Vermelho e preto são as cores dominantes, já que são as que representam os feiticeiros negros.

Caminho pelo quarto prestando atenção em cada canto e em cada detalhe dele. Algumas paredes me permitem ver o oceano, mas nem todas. As restantes parecem ser feitas de algum tipo de metal extremamente forte e estão pintadas em vermelho. Um lustre parecido com o da sala de jantar está pendurado no teto e bem ao meu lado jaz uma enorme cama com armação de quatro colunas e dossel de rendas pretas. Também há um guarda-roupa e um grande espelho em uma das paredes. Ao fundo do quarto, vejo uma porta e imagino que seja o banheiro.

Abro o guarda-roupa cuidadosamente e coloco minha pequena mala em uma das gavetas. São seis gavetas, no total, e por pura curiosidade resolvo abrir cada uma delas.

No fundo da terceira gaveta, encontro um colar dourado com um pequeno pingente de rubi. Seguro-o em minhas mãos e o examino cuidadosamente. Alguma coisa em minha mente o reconhece, eu tenho certeza. Só não sei o que, para variar.

Fico ali parada por alguns segundos, olhando o misterioso e exuberante colar e tentando vasculhar minhas memórias em busca por respostas. O que, infelizmente, não funciona. No final decido guardá-lo em um dos bolsos de minha calça.

Termino de procurar nas outras gavetas, mas não encontro mais nada. Fecho o guarda roupa às pressas e corro para a ala do leme.

Todos já encontram-se largados pelos sofás vermelhos, exceto por Luke que ocupa a poltrona preta, diante do leme. Ele olha no visor do bloco de metal bem à sua frente e depois verifica um mapa com algumas anotações. Por fim, pergunta:

– Podemos partir?

Concordamos em uníssono e Jeremy deixa escapar um “finalmente” seguido por um suspiro que nos faz rir.

Então, Luke mexe em alguns botões e move o leme com facilidade, como se soubesse o que está fazendo. Sinto-me um pouco tensa, para variar, e não sei dizer se já estamos nos movimentanto pelo simples fato de eu não conseguir perceber a nossa locomoção. Katherine havia me explicado que o barco é enfeitiçado para que quem está dentro dele não sentir sua velocidade. Isso é de longe uma boa notícia, pelo menos pra mim. Tenho sérios problemas de enjoo dentro de meios de transporte em geral.

Ando até meus amigos, jogados pelos sofás, e simplesmente os imito. Coloco meus olhos nas grandes paredes de vidro e observo a paisagem correndo, confirmando o fato sobre já estarmos navegando.

Nina e Jeremy começam um assunto de repente, mas eu não presto atenção em um palavra do que dizem. Meus olhos ainda estão cravados na paisagem atrás do vidro e minha cabeça gira em pensamentos vagos e confusos, até que eu finalmente caio no sono.

***

Estamos navegando por mais ou menos três horas e acabo de acordar de um longo cochilo. Jeremy, Luke e Peter conversam baixo e Nina lê um livro sobre criaturas marinhas em silêncio. Acredito que o barco esteja com alguma espécie de “piloto automático” ligado, já que Luke não está dando à mínima para o leme.

Fico feliz por Luke e Jeremy estarem incluindo Peter na conversa depois de toda aquela confusão sobre ele vir conosco. Pensei que Luke fosse desprezá-lo ao máximo, mas até que está lidando de forma madura com toda a situação, o que não faz o menor sentido.

Minha teoria sobre a bipolaridade de Luke está cada vez mais confirmada. Eu realmente não consigo entender as atitudes e mudanças de humor do cara! Um dia ele é a pessoa mais compreensível do mundo, em outro, é frio e impaciente. Ás vezes penso no que Nina disse sobre seu comportamento: Que é assim por se sentir pressionado pelos outros feiticeiros negros em relação à missão a que lhe foi confiada há alguns anos atrás.

Para ser sincera, sinto um pouco de raiva dela. Da “garota perdida”. Sei que não a conheço e nem ao menos sei quem é, mas se por um acaso ela está a par de tudo o que fizeram até agora para encontrá-la e mesmo assim continua desaparecida, está agindo como uma egoísta completa. Quero dizer, se ela sabe que sua raça corre um grande perigo, por que não se casa com tal Lightlair, como foi prometida, e acaba logo com isso? Por que tem que nos fazer arriscar nossas vidas indo atrás dela?

Sou acordada de meus pensamentos quando me deparo com três criaturas marinhas através da parede de vidro. Parecem répteis, para ser mais exata cobras. Cobras longas que possuem uma espécie de juba alaranjada em volta de suas cabeças e presas tão afiadas quanto às de um leão. São acinzentadas e gosmentas e não parecem ser as criaturas mais amigáveis do mundo.

Na mesma hora, salto do sofá com um movimento brusco e deixo escapar por entre os meus dentes um grito assustado. Os outros se espantam com a minha reação e me encaram curiosos.

– Monstros marinhos! – Grito, apontando para as criaturas estranhas lá de fora.

Percebo que a minha atitude foi meio desnecessária quando meus amigos riem de mim, como se eu tivesse dito a coisa mais estúpida do mundo. Confesso estar bem envergonhada e volto a me sentar no sofá de veludo com as bochechas já coradas.

– Estão nos seguindo faz um bom tempo. Apesar de não conseguirem nos enxergar, sentem nossa presença. – Nina explica, entre as gargalhadas. – Mas são inofensivos, acredite. Esses são os tipos de criaturas mais simples que iremos encontrar.

Devo admitir que isso me arrepia um tanto. Eu posso até estar exagerando, mas se aquelas coisas esquisitas e alongadas são com o que devemos nos preocupar menos, nem imagino como podem ser as criaturas que teremos de nos preocupar mais.

– Não acredito que se assustou com isso! – Jeremy continua a rir. Ele me zomba, apontando para as criaturas do lado de fora que agora parecem ser bem mais bobas e inofensivas quanto antes.

– Ah, cale a boca! – Jogo uma almofada em sua direção, segurando uma risada.

A almofada acerta o rosto de Jeremy em cheio, fazendo-o rir um pouco mais.

– São serpentes-leão. – Luke explica. – Não são tão inofensivas assim como Nina disse, não se você está em contato com elas. Têm um veneno poderoso que pode causar a morte, mas para destruir o submarino seria necessário um milhão delas.

– Entendo.

Nina volta para seu livro e os meninos para a conversa. E então me lembro do pequeno colar que encontrei no quarto mais cedo. Minha mão vai até o meu bolso e o puxa delicadamente. Estendo meu braço, segurando o colar para que todos possam ver.

– Encontrei isso mais cedo, no guarda-roupa em meu quarto.

Todos olham para mim e depois para o objeto em minhas mãos.

– É bem bonito. – Peter elogia.

– Não é só bonito. – Digo, convicta. – Eu já o vi antes.

Luke parece um pouco mais pensativo após minhas palavras e pergunta:

– Lembra de alguma coisa...?

– Infelizmente, não. – Respondo, chateada. – Só o reconheci mesmo.

E então Luke me dá uma informção que me faz saltar.

– O quarto em que você está costumava ser usado por Blake Darkbloom.

Ajeito-me melhor em meu lugar, sem acreditar no que eu acabo de ouvir. Não consigo entender o que é que essa mulher, Blake Darkbloom, tem tanto a ver com a minha vida. Primeiro, ela é a primeira suspeita de me ter me tirado dos meus pais e me levado ao mundo humado. Segundo, de dez quartos eu escolho justo o dela para ficar.

– O que? – Balbucio, um tanto confusa.

– Esse barco é do rei Therion. Ele, sua ex-esposa e seus soldados costumavam navegar utilizando-o. Não pelo Shadow Ocean, claro. – Luke me explica, como se tudo fosse óbvio demais. – Deve ser dela, quero dizer, o colar deve ser de Blake. E você o reconhece porque esteve algum tempo com ela antes de ser adotada por Carl.

Envolvo o pingente de rubi com uma de minhas mãos e volto a guardá-lo em meu bolso.

– Faz sentido. – Digo, convencida.

É claro que não deixo de me sentir um pouco chateada, já que esperava que o colar tivesse alguma coisa a ver com meus pais e não com a mulher que me tirou deles. Pelo visto, vai demorar um pouco mais do que eu pensava para encontrá-los. Isso se estiverem vivos.

Pensar desta maneira me desanima, então minha cabeça cai de lado e fico em silêncio até ser dominada pelo sono novamente.

***

O resto da tarde não foi muito diferente do começo. Cochilamos bastante, mas de vez em quando acordávamos para conversar com Luke, que estava no comando de tudo e não podia dormir. No fim, ele acabou revezando umas duas ou três vezes com Jeremy para poder descansar um pouco também.

Eu e Nina terminamos de preparar o jantar e tenho de admitir que fizemos um ótimo trabalho, bom, pelo menos é o que o aroma delicioso da sopa diz. Nos sentamos à mesa, junto dos meninos e nos servimos.

Ninguém diz mais absolutamente nada pelo simples fato de nossas bocas já estarem ocupadas pela comida. Devo confessar, estou completamente faminta há um bom tempo. Estivemos tão preocupados com o funcionamento do barco e com a nossa jornada, que esquecemos de comer pelo dia todo. Essa é a nossa primeira refeição depois do café da manhã, e olha que já é tarde da noite.

– Caramba! Eu precisava disso. – Jeremy diz, comendo tão rápido que poderia se engasgar.

– Realmente muito boa. – Peter elogia, com um sorriso, nossas habilidades culinárias. Mais especificamente de Nina, claro.

– Tudo graças à filha da melhor cozinheira de Opposite. – Dou os créditos à verdadeira merecedora deles. – Se eu tivesse feito sozinha, talvez não estivessem vivos há essa hora.

Nina balança a cabeça, sorrindente pelos elogios. Ela realmente leva jeito com esses lançes culinários.

– Exagerada.

Como já está escuro, terminamos de jantar e então resolvemos dormir. Luke diz que já estamos quase na metade do caminho e eu não sei ainda dizer se essa é uma boa, ou péssima notícia.

Jeremy se habilita para tomar conta da ala do leme e vigiar caso algum demônio marinho resolva aparecer para nos perturbar, já que Luke parece extremamente cansado para isso.

Ando até o meu quarto e como já tomei um banho há poucas horas atrás, atiro-me na cama e resolvo dormir do jeito que estou mesmo. Fico observando as criaturas lá fora, atráves do vidro.

As serpentes-leão ainda nos seguem, mas em maior quantidade agora. Há também outras critaturas esquisitas, como misturas de lobo marinho com tubarão, enguias com mais de três caudas e assustadoramente maiores que as enguias comuns e espécies engraçadas de peixes com presas bem grandes. Se não estivessemos utilizando aquele barco, já teríamos virado comida de peixe faz tempo.

Apago as luzes com um estalar de dedos e me cubro com os lençóis. Fico ali por quase uma hora, tentando relaxar e pegar no sono, mas não consigo. Talvez seja porque dormi quase o dia inteiro.

Isso me faz lembrar que por volta dos meus cinco anos de idade as crises de insônia costumavam me atacar. Lembro que saia correndo até o quarto de Logan, para pedir ajuda. Ele sempre dizia para eu não pensar em absolutamente nada até o sono vir, mas aquela tática nunca veio a funcionar. No final das contas, ele acabava pedindo para nossa cozinheira preparar um chocolate quente para mim e me contava algumas histórias até que eu dormir. Às vezes voltava para o seu quarto depois que eu dormia, outras dormia ali mesmo ao meu lado.

E então finalmente percebo quanta falta meu irmão faz.

Sim, talvez ele tenha errado muitas vezes comigo, mas isso não quer dizer que nunca tenha acertado. Repreendo ao meu eu do passado, por querer tanto livrar-se dele.

Enterro minha cabeça em meu travesseiro e choro em silêncio, esperando realmente voltar a ver Logan algum dia.

Depois que as lágrimas finalmente cessam, fico em silêncio por mais alguns minutos, pensando na vida e nos últimos acontecimentos recentes. Então, minha consciência começa a falhar, anunciando a chegada do sono.

Estou por um fio de dormir, porém, sou interrompida por uma sirene e uma luz vermelha que pisca, informando que algo de errado está acontecendo.

Fico paralizada, sem saber exatamente o que fazer. E então, para o meu maior desespero escuto um estrondo, como se algo tivesse se chocado com força ao submarino.

Meu coração dá uma cambalhota dentro de meu peito e já posso sentir minhas mãos ficarem geladas e trêmulas. Algo de muito errado está acontecendo! E eu nem posso imaginar o quê.

Salto da minha cama com rapidez, tomada pelo susto e pela adrenalina e corro em direção à porta. Mas não chego até ela, pois o barco é puxado com força para baixo e então tudo começa a cair. Inclusive eu.


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