Marian acordou novamente sobressaltada. Não ouvia mais vozes mas não conseguia dormir. Levantou-se, jogou água no rosto, vestiu-se e andou até o alpendre para respirar um pouco de ar noturno. Passeou os olhos pela paisagem até a direção da igreja, seguiu... Depois voltou e fixou a vista. Havia algo errado. A coluna brilhante... Tochas! Agora podia distinguir melhor: soldados ingleses, em duas fileiras, com tochas nas mãos, desciam um dos flancos do vale em direção ao centro.

Apavorada, Marian correu até uma das casas vizinhas, começando já a ouvir o som dos cavalos ao longe, se aproximando. Bateu na porta e conseguiu avisar a mulher que a atendeu, sonolenta.

O que se sucedeu a partir daí seria recordado por Marian nebulosamente, como brumas em sua memória. Mais tarde ela se lembraria vagamente do som de pessoas implorando por misericórdia ao som de “morte aos rebeldes!”, crianças e velhos decapitados sem piedade, carroças e casas incendiadas, sua própria casa incendiada, enquanto se escondia atrás de uma das propriedades que já começava a arder. Lembrava-se de ter pego uma faca na cozinha de uma das casas, corrido até um cavalo que havia se soltado da carroça virada, montado e cavalgado durante horas rumo ao sul, onde estavam os outros. Lembrava-se de ter certeza absoluta de que estava sendo seguida pelos soldados e que os estava levando até os outros rebeldes, mas não sabia o que fazer. Tinha que avisar os outros.

Lembrava-se de ter chegado na outra vila, que também ficava num vale, e visto, do alto, que outra coluna de soldados espreitava no flanco direito, a leste, enquanto todos estavam concentrados protegendo a entrada principal, ao sul. Lembrava-se de ter descido enlouquecidamente, encontrado William e praticamente vomitado o relato do que acontecera, entre buscas por ar e fôlego. Ela explicou que vira os soldados em um dos flancos da cidade, que uma tropa vinha pelo sul, e contou-lhe o que havia imaginado: que provavelmente uma terceira viria para fechar a saída pelo oeste. Lembrava-se de ouvir William praguejar, enquanto todo seu corpo doía de cansaço e medo. E lembrava-se perfeitamente da batalha que se sucedeu...