Vitória escrita por Ephemeron


Capítulo 2
O PREÇO DA VITÓRIA




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Talvez ele não imaginasse que seria assim e pode-se dizer que o cavaleiro sonhou com esse momento diversas vezes. Por muitas noites viu aqueles olhos verdes a fitá-lo, mas nenhuma das vezes pensou que seria assim tão intenso.

A deusa não precisava mais de disfarces, então ali estava em toda sua imponente beleza. Longos cabelos negros como o ébano caiam-lhe lisos pelas costas, o vento brincando com alguns fios que dançavam em seu rosto e tez alvos, sua boca era delicada e rubra como sangue, o vestido longo que usava era do mesmo tom jade dos olhos...aqueles olhos pintados.

Séria ela caminhou até o rapaz, e o movimento de seu corpo só não poderia ser mais sensual que o de Afrodite. Era como se Mu estivesse hipnotizado...

- Vejo que trouxe minha encomenda, cavaleiro..

Ela usava algum tipo de sapato de salto, pois se encontrava na mesma altura que ele. O rapaz se inclinou humildemente diante da deusa, entregando-lhe – envolto em linho branco – o medalhão. Há muito descobrira sua origem e significado e, a partir disso, vira também o valor daquele artefato e parte do motivo de ter sido forjado. A deusa faz um sinal para que o mortal se erga:

- Não precisas agir assim, eu que deveria me inclinar em agradecimento, pois foi um trabalho difícil de ser realizado, suponho...

- O mais difícil de minha vida, senhora...

- Sim...

Ela olha o objeto em suas mãos e ele começa a emitir uma energia multicolorida...a deusa então fecha seus olhos e coloca a corrente em seu pescoço. Menos de um segundo é o tempo para que todos os deuses e cavaleiros de alto poder sintam o cosmo dali emanado, o ser ali despertado...foi tudo tão forte e poderoso que chegou a abalar o destino da Terra. Quando o cavaleiro conseguiu olhar para ela novamente percebeu que, de uma forma inimaginável, Niké estava ainda mais bela, radiante...mais real.

- Ficou perfeito, ferreiro dos deuses. E por isso te pagarei de forma justa.

- Ela se aproximou dele, tocando o meio de sua testa com o indicador:

- Diga-me...o que desejas?

Sentiu a deusa vasculhar por seus anseios e vontades mas em nenhum momento sentiu medo. Havia algo em Niké que, sem explicar, o tranqüilizava e intrigava...por outro lado a mulher poderia dizer o mesmo daquele mortal, afinal descobrira que sua encomenda, para ele, já havia sido cobrada há algum tempo...

- Sei que a senhora teve enorme influencia nas ultimas batalhas...sem pedir nada em troca.

- Esta é sua decisão, descendente de Hefesto? Este será meu pagamento?

- Sim.

Mu não hesita diante da pergunta, mas a deusa dúvida desta decisão...por um motivo simples:

- Porque ocorre, cavaleiro, que eu não pedi nada em troca...até agora.

O guerreiro de Áries a encara, surpreso e incrédulo, um segundo antes de perceber-se preso: imóvel e invisível a quem chegasse nas sombras das estatuas no salão...o motivo da magia imposta chegava correndo naquele instante:

- Niké?!

Uma assustada Athena encontra-se a alguns passos da outra deusa, sem se aperceber de Mu...

- O que faz aqui?

Mu não entende porque a expressão de sua deusa está tão conturbada...ao mesmo tempo que percebe que Vitória, interiormente, se diverte:

- Ora, caríssima, nunca deixei-te nestes últimos anos...

As duas cruzam olhares num breve instante e Saori dá um meio sorriso...Mu tentava entender porque Niké o imobilizara, sem ousar se desvencilhar de tal poder...é neste momento que o cavaleiro percebe que aquele meio sorriso de Athena era, na verdade, puro desdém...

- Então...veio pedir minha ajuda novamente?

Niké é muito mais alta do que Athena nesta encarnação e em sua fria altivez, Vitória respira profundamente antes de responder tranqüila:

- Jamais pedi sua ajuda, Athena. Você, ao contrario, se aproveitou do tempo que permaneci contigo para me restabelecer.

Os passos mal podiam ser escutados e Mu observava atônito o embate das duas entidades. Nunca poderia imaginar que a deusa pelo qual lutava também a traíra...também subjugava a Vitória a si. No mesmo tom enregelante, que faz Saori permanecer estática, a deusa de cabelos negros continua:

- Mas agora, minha cara, tenho poder para partir. E é isso o que farei.

- Partir?! Mas você não...

Niké diminuíra a deusa Athena. E o cavaleiro se perguntava como ela conseguira fazer isso...

- Eu posso, deusa.

Aquela mulher tinha uma frieza tamanha e uma falta de demonstração de sentimentos tão particular que o ariano não conseguia perceber se ela seria uma ameaça à vida de Athena ou não...de alguma maneira sentia que não era necessário se preocupar com Saori...por hora. Ele era tão somente o observador, a testemunha...tinha certeza que os motivos de Niké o ter imobilizado eram mais profundos do que ele imaginava.

- Eu sou a Vitória.

- Não!!!...

Uma tremenda energia partindo da alta deusa fez o tempo congelar. Athena tenta impedir, mas o poder é grande demais. Acabavam de entrar num ritual repetido por eras...por todos aqueles que reivindicaram a vitória de uma batalha...não tinham escapatória.

- E a vitória te coube.

- Não bastam as vidas perdidas em batalha, Niké?!

Saori gritava ante o barulho ensurdecedor de vento, luz e magia em turbilhão.

- A vitória da luz e da escuridão.

O medalhão de Niké dançava no vento e suas cores eram intensas...as palavras saiam de sua boca como em câmara lenta:

- A vitória da vida e da morte.

Lágrimas desciam do rosto de Athena, não...não de tristeza, mas de raiva!

- Que Diké, minha irmã, a Deusa da Justiça, dê testemunho!

A voz de Niké ergue-se ao infinito...Mu tremia e suava frio diante de tamanho poder, seu desespero não era capaz de enviar qualquer mensagem fora daquela redoma...estavam isolados.

- ...pois a vitória tem um preço.

O rosto avermelhado pela indignação de Saori se levanta, ela deveria participar agora...aquele ritual era previsto no Olimpo antes mesmo de seu nascimento. Lentamente, então, proclama:

- O que desejas como pagamento, Senhora?

Silêncio. Toda a confusão de luzes e sons pára subitamente. O cavaleiro sente a expectativa em torno daquela indagação, afinal uma deusa exilada como Niké não tinha medo de nada e muito menos nada a perder...era o que imaginava, mas não sabia quais as verdadeiras intenções daquele ato:

- Quero aquele que está presente conosco nesta esfera.

Athena parece não entender e Mu sente seu coração parar por um segundo...

- Quero o descendente de Hefesto.

A realidade toma forma ante ao término do ritual, só neste momento Saori percebe a presença do cavaleiro fiel no recinto...este, mesmo agora podendo mover-se livremente, permanece no lugar...sem saber como agir.

- Impossível!

Brada Athena vermelha de desgosto. Mu mal tem forças para ficar em pé, quanto mais gritar ou se opor àquela decisão. Percebe sua deusa, aquela pela qual já doou a vida, aquela a qual lhe trouxe de volta tentar persuadir Niké de seu pedido. Mas Niké está muito distante de Saori...no sentido de que a primeira é uma forte e independente mulher e a segunda uma frágil menina mortal que precisa de subordinados que a defendam...estes, sentindo as cosmo energias, já a caminho da 13a casa.

- Você me deve, Athena.

Ele sentia que Niké estava no ápice de seu cosmo e que a qualquer instante poderiam iniciar uma batalha ali. Tentava pensar em algo que fizesse com que parassem, pois estranhamente não desejava ver nenhuma das duas deusas feridas...não desejava ver o embate de divindades que respeitava. Sua mente dizia para chamar a armadura e proteger Athena a qualquer custo...mas seu coração falava para acatar a decisão de Vitória e terminar a discussão pacificamente...seu coração...confiava em Niké. Pois ele via o descaso com que Saori tratava a deusa que a ajudou em tantas guerras e não conseguia entender o motivo! Gostaria de entender aquela mulher que encerrara seus próprios sentimentos e forças em um medalhão, que enfrentara o panteão olímpico e pedira a Hefesto para forjar tal artefato! Neste momento de súbita emoção que Mu então tomou uma decisão:

- Deixe-me ir, Athena!

A hostilidade é, então, substituída por surpresa. Saori se vira para o cavaleiro da primeira casa, ao passo que Niké apenas desvia o olhar na direção dele brevemente...sem nenhum alarde.

- Mas, Mu, você é meu...

- Estou disposto, Saori.

Ele sorri à deusa que protege, tentando tranqüiliza-la...tentando dizer que daria um jeito de retornar...

- Kikí já tem idade para me substituir...

Saori engole em seco, olhando para ele sem mais argumentos...

- Não posso dizer porque, mas sinto que a Sra. Niké não me fará mal algum.

Naquele instante o pesado semblante da intrusa se aliviou e ela se encaminhou, então, para o lado do rapaz...

- Como sempre, caríssima, seus cavaleiros são muito mais sensatos do que você.

Poderia-se dizer que o mais irritante em Vitória era essa capacidade de ser cínica e sagaz sem demonstrar...sem um único sorriso ou alteração na voz. Athena treme de ódio como nunca fizera e move o báculo inconscientemente para posiciona-lo em ataque...

- Isso me pertence, não?

Dissolvido em luz dourada, o cetro que ajudou tantas vezes a deusa Athena retorna em forma de energia ao medalhão de Niké. A raiva de Saori era quase palpável. Ouvem-se barulhos no interior da 13a casa, os guerreiros estavam chegando...Aparentemente mais calma Athena retoma a compostura. As duas se encaram, de longe:

- Sabes que jamais poderá reivindicá-lo novamente. É a lei dos deuses.

Saori assente e Mu, ao invés de sentir-se objeto naquela situação, fica tranqüilo ao ver que terminara. Sente a mão de Niké pousar suavemente sobre seu ombro e fecha os olhos...não quis ver os amigos dourados chegando ao salão. Estes, espantados, apenas tem tempo de gritar o nome do ariano enquanto eram ofuscados pela súbita abertura das asas douradas de Vitória.

E nada mais.

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Irlanda do Norte

No segundo seguinte ele pôde escutar o barulho de ondas, um cheiro de terra molhada e maresia, e o leve calor dos primeiros raios de sol...

- Pode abrir os olhos agora, cavaleiro.

- Não sou mais um cavaleiro desde alguns instantes atrás, Senhora...

Mu observa uma paisagem completamente diferente de tudo o que já vira...eram vastas planícies verdejantes em altíssimos paredões onde o mar quebrava incessantemente...

- Sim, pode-se dizer que sim.

Ouvindo a voz muito mais suave do que no templo de Athena, o rapaz visualiza a deusa e percebe notável mudança. A começar pelas vestes, que agora são simples e campestres no mesmo verde anterior. Mas o que mais impressiona é a leveza que agora tem a face de Niké, apesar de ainda séria.

- Vamos.

Impulsionado pela energia da mulher e, também, pela curiosidade e fascínio, Mu a segue, silencioso.

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Santuário de Athena – Grécia

- Não podemos deixar isso assim!!!

Miro estava, no mínimo, indignado com o ocorrido. Athena explicara tudo aos 11 mais Shion, que viera assim que sentiram a explosão de cosmo energias. Dohko e o antigo mestre ficaram calados durante o irritado relato de Saori sobre o “seqüestro” de Mu.

- Não, não podemos. E é por isso que um de vocês irá resgatar o Cavaleiro de Áries das mãos de Niké.

Um burburinho de aprovação e ansiedade por quem iria a missão toma conta do local. Apenas os antigos se olham, suspeitos. Então Shion se levanta e toma a palavra:

- Senhora, meu pupilo JAMAIS iria ser levado facilmente, como aconteceu.

Os dois – mestre e deusa – se encaravam, ela sabia que o antigo mestre conhecera Niké e também que ele entendia a tradição do ritual. Mas ela não se deixaria derrotar por uma exilada:

- Ele estava hipnotizado, Shion. Você conhece o poder dos deuses.

Murmúrios de sim envolveram o local, mas os cavaleiros de Virgem, Gêmeos e Sagitário – mais astutos e observadores – perceberam que havia algo errado.

- Não precisamos iniciar esta batalha, Athena.

Ergue-se Dohko com segurança, mas tranqüilidade. E em meio a revolta de alguns cavaleiros sobre a posição do ancião, a deusa se impõe:

- Duvida de minha ordem, Dohko?

O salão silencia, nunca haviam visto Saori com tamanha força ou autoridade, o cavaleiro de Libra respira profundamente:

- Não, senhora.

- Então está feito. Miro! Aioria!

- Sim!!

Estejam prontos ao amanhecer. Os outros permaneçam em alerta. Traremos Mu de volta...e seremos vitoriosos mais uma vez!

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Salão de Fogo – Olimpo

- Tens a ousadia de me enfrentar novamente, Niké?

Ele observa a deusa caminhando nos prados, juntamente com o rapaz...

- Pode juntar quantos “brinquedinhos” mortais quiser...

Sorve um gole da bebida fumegante...seus olhos são o próprio sol:

- Você não perde por esperar...

CONTINUA...


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Notas finais do capítulo

Alguns esclarecimentos cabem por aqui: esta versão da historia da Niké é minha. Não encontrei em qualquer bibliografia relatos do dito medalhão e do envolvimento dela com outros deuses, menos ainda dela ser exilada. Portanto considerem como patrimônio cultural apenas sua linhagem, que mantive, o restante é MINHA autoria. Peço a gentileza de respeitarem isso.

O pouco envolvimento de Mu neste primeiro capítulo é proposital. Tenham paciência, tudo virá no tempo certo. Mas já aviso: os outros cavaleiros pouco participarão desta fic.

Agradeço a todos que estão acompanhando!XD

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