-De novo! - gritava Marlene pela milésima vez.

Suspirei e voltei para meu lugar inicial, atrás do cenário. Estávamos no Salão Principal da escola, planejando a peça. Com “planejando” quero dizer “seguindo ordens de Marlene”. A aula tinha acabado há uma hora e meia, e eu ainda não sabia se estava ensaiando para João e Maria ou para Rapunzel.

-Vocês não sabem fazer nada, não? - gritava McKinnon, sentada em uma das poltronas fofas da plateia – Vocês são um bando de preguiçosos, isso sim!

-Olha quem falando – murmurei, e James, que estava ao meu lado, riu.

-Posso sabe qual é a graça? - perguntou Marlene irritada.

-Estávamos pensando sobre que tipo de titica deve ter dentro da cabeça de alguns diretores de teatro – respondeu James, e nós dois começamos a rir.

-Chega! Vamos da parte do diálogo principal. Lembre-se, Lily, seu personagem é apaixonado pelo personagem do de James, mas você está disfarçada de homem e não pode deixar ele saber quem você é.

-Ah, então isso é Noite de Reis? - perguntei – Achei que fosse O Conto dos Retardados.

Marlene McKinnon teve uma espécie de ataque, batendo o pé no chão e gritando. Logo em seguida ela pegou sua bolsa e saiu do salão sem olhar para trás.

-Nossa – falou James Potter, quando saíamos da escola. Spencer Smith havia ficado organizando seus figurinos. Seus personagens encluiriam dois pais, um avô, um mendigo, um passarinho e uma viola. - Não sabia que você era tão divertida.

-Á s vezes eu escondo meu verdadeiro eu, com medo que as pessoas me julguem – respondi, olhando nervosa para o chão.

-Pois não devia. Só assim as pessoas poderão ver a pessoa encantadora que você é – ele falou - Tenho que ir, meu ônibus é esse. A gente se vê.

E ele se foi, me deixando sozinha com cara de boba.

“ELE FALOU O QUÊ?” gritou Dorcas pelo telefone, quando eu liguei para contar o ocorrido “Isso é demais, Lil', ele gosta de você!”

-Nada a ver – respondi, deitando na minha cama – Ele só comentou. Deve falar isso para todas as garotas que vê pela frente.

“Ah, é!” ela respondeu “Ele chega na lanchonete e fala para a garçonete que ela é linda e que os dois vão casar e vão ter quatro filhos, Maka, Meka, Muka e Steban!”

-Para de exagerar. E além do mais... Steban?

“É um nome legal. Mas não mude de assunto, mocinha!”

-Até agora eu não identifiquei nenhum assunto.

“Dãã, seu casamento com James Potter! Posso ser madrinha?”

-Não, vou chamar o mendigo – brinquei.

“Getúlio? Aquele que tem uma bola de golfe na testa?”

-Não é uma bola de golfe, acho que é um tumor...

“Parece mesmo uma almôndega, sabe, aquelas que coloca na massa...”

-Sua idiota, vou ter almôndegas no jantar! Só de raiva vou desligar na sua cara.

Desliguei o telefone antes que ela pudesse reclamar. De qualquer jeito, eu estava um pouco atrasada; Me esperavam na SLAM FM.

-Até que enfim – disse Cami, quando eu entrei no estúdio – Achei que tinha se escondido no porão de tanto medo.

-Há-ha – falei – O ônibus atrasou, uma velhinha caiu ao subir e rolou pelo corredor todo. As compras dela caíram todas em cima de mim, e adivinha o que aconteceu com os ovos?

-Uh – ela fez cara de nojo – Omelete de Lily.

Sentei na minha cadeira giratória e coloquei os fones. Tinha que fazer uma seleção parcial de músicas para tocar, caso aconteça algum imprevisto. Muitos ouvintes mandavam seus pedidos, mas um me chamou a atenção.

“The Marauders – It's Time”

The Marauders? Tipo, a banda do James?

Isso mesmo, James Potter é guitarrista de uma banda, que até foi escolhida para se apresentar no baile da escola. E a música foi enviada por seu e-mail. Ok, Lily, respira. James Potter ouve seu programa.

OH MEU DEUS JAMES POTTER OUVE MEU PROGRAMA! Não sei se isso é terrível ou incrível. Mas uma coisa é certa: ele vai estar ouvindo essa noite.

Cami fez sinal na outra sala para eu me preparar. A luz piscou três vezes, e eu estava no ar.

“Eu sou Elly, ao vivo na SLAM FM. Admito que passar esse programa para uma rádio de verdade foi meio aterrorizante. Eu estava com medo do que as pessoas iriam pensar. Sou apenas uma garota tímida que de uma hora para a outra se tornou famosa. Imagine, nem consigo falar para o cara de quem eu gosto o que eu sinto por ele, imagine apresentar um programa para milhares de pessoas? Hoje na escola eu percebi que todos somos rotulados. Os populares, os nerds, o time de futebol. Antigamente ser diferente era especial, e agora todos tentam seguir um padrão, por um motivo que ninguém sabe exatamente qual é. Gente, se esquecermos os rótulos e sermos nós mesmos... Não fazemos ideia do que somos capazes.”

Vi Cami sorrindo da outra sala, e me animei. Olhei para a luz vermelha e tive uma ideia.

“Se você me apoia, use vermelho amanhã. Para dizer que apesar das nossas diferenças, estamos juntos nessas. Agora, fique com The Marauders. Você não está tão sozinho quanto pensa.”

**

-Eu não acredito nisso – falei, ao chegar na escola no outro dia.

Parecia que Jason tinha dado uma passadinha lá e machucado todo mundo, pois não tinha uma pessoa que não estava de vermelho.

-Esperava o quê? - perguntou Dorcas, irônica – Elly é super popular. Ela é ouvida.

-Queria ser mais como ela... - murmurei. Remus e Sirius se aproximaram – Eu não acredito nisso...

-E então, conseguem nos reconhecer? - perguntaram ao mesmo tempo. Eles estavam com roupas vermelhas, absolutamente iguais.

-Quantas vezes temos que repetir, vocês não são gêmeos – disse Dorcas.

-Mas temos os mesmos hobbies! - disse Sirius.

-É, e ás vezes parece que temos telepatia... - completou o outro. Os dois se encararam – Você está pensando no mesmo que eu?

-Batatinhas?

-É, não temos telepatia.

-Lily! - exclamou Dorcas – Você não vai acreditar em quem indicaram para a Rainha do Baile!

-Hum... Marlene McKinnon?

-Não! Bem, ela também, mas foi Elly! A Rebelde da Rádio!

Naquela hora, eu não entendi seus pulinhos de alegria. Ela acabara de me dar uma notícia desesperadora. Para mim, é claro. Todos os outros alunos devem estar super animados, pois finalmente iriam descobrir quem é Elly.

-Ah, não! - falei – Isso não pode acontecer!

-Na verdade, já aconteceu – disse Dorcas.

-Não, você não está entendendo... - agarrei ela pelo braço e a arrastei para um armário de vassouras – A Rebelde da Rádio não pode se tornar a Rainha do Baile.

-Por que não?

-Porque... - engoli em seco – Eu sou a Rebelde da Rádio.

Ela me encarou em silêncio por alguns segundos.

-Não acredito em você.

Suspirei.

-Por que você acha que ela se chama Elly? - perguntei – Com certeza não tem nada a ver com “L”, de “Lily”.

-É só uma coincidência.

-Ah, é? E também é coincidência você não conseguir falar comigo quando a Radio Rebel está no ar?

-Eu...

-Não diga que pe coincidência também! Já não basta eu ter que fazer de tudo para esconder minha vrdadeira identidade, agora você está achando que eu estou mentindo...

-Eu acredito em você.

-Que só estou dizendo isso para me aproveitar da fama da rádio e.... O que você disse?

Dorcas deu uma risadinha.

-Eu disse que acredito em você – repetiu – Se você diz que é a Elly, eu acredito. E acho o máximo!

-Nossa, isso foi mais fácil do que eu imagianava – comentei.

-Mas você tem que provar – ela continuou. Eu suspirei – Me levando no estúdio.

Saímos do armário, andamos meio corredor (com Dorcas saltitando ao meu lado) e eu já fui parada por ninguém menos que James Potter.

-Oi – ele disse, ofegante.

-Oi – respondi, enquanto Dorcas dava meia volta e saia de perto, assobiando.

-Você ouviu a Radio Rebel ontem à noite? - perguntou – Deve ter ouvido, já que está de vermelho - Eu usava uma touca vermelha, e ele uma camisa xadrez, também vermelha – Você notou que ela tocou uma música dos Marauders?

-Ouvi sim, e adorei – falei, sorrindo – A letra é inspiradora. Você devia mandar outra.

-Era sobre isso que eu queria falar – ele tirou da mochila um CD – eu queria saber se você poderia entregar esse CD Demo para seu padrasto, já que ele é da SLAM, e tal...

-Ah, claro – falei, pegando o CD. Ele agradeceu e se afastou.

Deveria ter imaginado. James Potter só se aproximou de mim para poder divulgar sua banda. E eu que tinha pensado que ele realmente gostava de mim. Burra.

-Srta.Evans? Não deveria estar na sala de aula?

Me virei e deparei com a Profa. McGonagall me encarando irritada.

-Na verdade, eu estava indo... - comecei, mas ela me interrompeu.

-Isso é um Mp3? - ela apontou para o fone em meu pescoço. Assenti, e ela ordenou: - Você sabe que proibimos qualquer tipo de música durante as horas de estudo, pode tirar a concentração! Passe para cá.

Relutante, dei meu Mp3 para ela, e me dirigi de cabeça baixa para a sala de aula.

**

-Que demais! Demais! - exclamava Dorcas, ao entrar no meu estúdio.

-Só não estore uma corda vocal – falei, rindo. Depois da escola tinhamos ido para a SLAM, para eu provar para Dorcas que eu era mesmo a Elly, e também eu aproveitava e já ficava para o programa.

-Posso fazer um pedido? Eu queria Relax, do Frank Goes To Hollywood.

-Meu Deus do céu! - exclamei – Dorcas, você tem um talento especial para músicas ruins. Mas essa nem é ruim, é péssima.

-Mas é um classico! - ela revidou, revirando os olhos e sentando em uma das poltronas, enquanto eu organizava a playlist da noite.

-E aí, Lily! - cumprimentou Cami, ao chegar no estúdio. Ela olhou confusa para Dorcas.

-Cami, essa é Dorcas, minha melhor amiga. Ela é a única que sabe do meu segredo.

-Gostei do melhor amiga – riu Dorcas, e as duas se abraçaram.

-E então, pronta para o programa? - perguntou Cami, indo para sua salinha.

-Acho que sim – respondi, colocando no computador o CD de James. Começou a tocar uma música bem legal, mas de repente alguém interrompe a música.

“Gente!” Era James falando “Eu não acho que está legal. Essa música não tem sentido algum.”

“Não precisa ter sentido, James” Peter Pettigrew falando, o vocalista (devo dizer, muito convencido) do The Marauders “Só precisa ser famosa. Vamos, de novo!”

“Não, esperem! Não é o fato de ser famosa que importa, importa a mensagem que iremos passar. O que é uma música sem mensagem?”

“Francamente, nossas fãs não querem saber de mensagem! Elas só querem fazer festa. Vamos do começo. E não me interrompa novamente”.

O CD parou de tocar, e o estúdio ficou silencioso.

-Nossa – disse Dorcas – Acho que alguém deu o Demo errado para outro alguém.

-Dois minutos – avisou Cami – E pelo amor de Deus, não coloque esse CD.

“Aqui quem fala é Elly. Soube que fui indicada para a Rainha do Baile de Hogwarts, e admito que não gostei nem um pouco. Não me agrada a ideia de revelar quem eu sou. Vocês só precisam saber que eu sou uma de vocês, nada mais. Vocês não me conhecem, mas eu os conheço.

Notei que muita gente adotou vermelho hoje, não só em Hogwarts, mas em várias outras escolas também. E fico feliz que nem todo o mundo está perdido. Eu também vi alguém com uma camisa xadrez vermelha de arrasar.

Ultimamente eu tenho pensado muito em letras de músicas, e qual é a mensagem que elas passam. Não importa que tipo seja, as letras sempre vieram do coração de alguém. A música é uma forma de nos expressarmos, e de compartilharmos os mesmos sentimentos. Não deveríamos deixar ela ser tirada de nós, não é? Só esse semestre eu já perdi três fones e um Mp3 Player. Se nossa música for tirada de nós, seria o mesmo que arrancassem nossos corações e comessem de colherinha. Por isso, eu desafio vocês mais uma vez: Amanhã, exatamente ás oito horas, pare tudo que está fazendo e dance. Dance como se sua vida dependesse disso, se expresse. Mostre que eles não mandam em nós."

Coloquei uma música para tocar, tirei os fones de ouvido e respirei fundo.

-Garota – disse Dorcas – Essa foi demais. Mas não sei se "eles" vão gostar que os alunos dancem no meio da aula. É meio perigoso.

-Não faz mal. Meu sobrenome é "Perigo".

-Achei que fosse Evans.

-Se pronuncia "Perigo".