Eu me levantei da cama, no momento em que já estava de pé me senti um pouco tonta, minhas pernas estavam fracas, eu cambaleei um pouco e senti alguém me segurando pelos braços, olhei de um lado mão de Tomaz e do outro a de Thiago, este me soltou logo que viu Tomaz me segurando também, ele foi até a janela do outro lado do quarto. Leandra havia voltado para corporação ela iria ser nossa informante.

Eu me sentei na cama até que tivesse totalmente bem para andar. Podia jurar que Samantha apareceria para rir da minha cara pela minha situação, fraca e meio desnorteada. Olhei em volta procurando-os.

- O que você está procurando, Mary? – Tomaz me perguntou.

- O que houve com Richard e Samantha? – Eu me perguntava, sem responder a pergunta de Tomaz.

- Quem é Richard e Samantha? Você bateu a cabeça Mary? – Tomaz me perguntava, e eu continuava olhando no quarto a procura deles. Meus olhos pararam por um instante em Thiago, ele estava encostado na parede olhando pela janela, e olhava a chuva cair, como eu sempre costumava fazer quando estava confusa ou quando as lembranças ruins vinham à tona. “Será que ele está fazendo como eu? Ou apenas está olhando lá fora?” – eu me perguntava.

- Mary? Você está me ouvindo? – Tomaz colocou a mão sobre meu ombro.

- Estou sim, eu só estou um pouco cansada, nada de mais. - eu dei um leve sorriso.

- É melhor você dormir um pouco. – Ele disse. Eu me deitei na cama, e Tomaz beijou minha testa. – Você tem que descansar. – Quantas vezes eu ficava me lembrando das vezes em que Tomaz ia me colocar para dormir quando eu ainda era humana, ele sempre beijava minha testa e me cobria. Mas não foi a mesma coisa, eu já não sentia o mesmo conforto que ele me passava antes, era diferente agora.

 No quarto haviam duas camas, um sofá e uma velha televisão.

- Pode ficar com a outra cama, Tomaz. – Thiago disse tinha algo na voz dele, parecia que algo o incomodava.

- Mas e você? – Eu perguntei.

- Não se preocupe. – Ele disse ainda encostado na parede olhando para fora. Tomaz não disse nada apenas foi até a outra cama e se deitou.

Eu não estava realmente cansada, eu só não queria ter todos a minha volta me enchendo perguntando a todo o momento se eu estava bem. Deitei-me de lado olhando para onde estava a janela, eles haviam apagado a luz, mas eu podia ver a sombra de Thiago perto da janela. Minha vontade era saber no que ele pensava, estava quieto e imóvel, não podia ver seu rosto, eu não podia ler seus olhos ou lábios, isso me frustrava. Eu vi sua sombra se afastar da janela, me forcei para ver seu rosto, mas estava muito escuro, ele seguiu até o sofá e se deitou pois não pude mais vê-lo pelo encosto que estava na frente. Não havia mais nada para eu fazer então acabei pegando no sono também.

Acordei com um feixe de luz vindo da janela, abri meus olhos devagar me acostumando com a luz que havia no local. Levantei-me, minha cabeça não doía mais, e agora já conseguia ficar de pé. Olhei para a cama onde Tomaz havia dormido, mas ele não estava lá, a cama estava arrumada.

Fui até a janela, não havia quase ninguém na rua ainda. Estava claro, as ruas um pouco molhadas da chuva de ontem.

- Que horas são? – Eu me perguntei, estava totalmente perdida do tempo.

- Cedo... – Uma voz me surpreendeu vindo do outro lado do quarto. Eu me virei na hora. – Bom dia dorminhoca. – Thiago dizia enquanto entrava no quarto com um leve sorriso no rosto.

- Por que ninguém me acordou? Nós só temos dois dias até o alinhamento! – eu me lembrei.

- Relaxa Tomaz se disfarçou e foi até a corporação encontrar Leandra, ele está criando um plano... – Ele se disfarçou? É mesmo a minha habilidade de me transformar eram de Tomaz e foi passada para mim junto com a imortalidade. Eu agora era uma simples mortal, eu sai da janela e sentei-me na beirada da cama. Thiago já estava sentado no sofá, era muito chato ser humana de novo, eu já havia me acostumado com a velocidade acima da normal de um imortal, mas como eu era uma reles humana agora eu me movia numa velocidade que às vezes para mim era irritante.

- E por que você não foi também? – Eu perguntei olhando para ele, que estava no sofá de costas para mim.

- Tomaz e Leandra se preocupam muito com você, até parece que você virou um bebezinho. – dizia ele num tom divertido. – Eles me intimaram a ficar aqui e cuidar de você. Se alguma coisa acontecer a você eu serei punido pelos dois, o que não vai ser muito bom. Por que está perguntando? Por acaso queria se livrar de mim? – dizia brincando. Eu ri um pouco.

- Não, foi só por curiosidade mesmo. E por falar em curiosidade... – Eu me lembrei dele na noite passada, me levantei e sentei no sofá com ele. – Na noite passada...

- Hm... O que tem? – ele me encarou.

- Eu senti algo estranho na sua voz... Havia ou ainda tem algo te incomodando, não é?

- Do que você está falando? – Ele perguntou, me parecia que ele estava escondendo algo de mim.

- Eu te conheço, Thiago. Me diz logo. – Eu insisti. Eu percebi que ele ia dizer algo, mas hesitou, ele desviou o olhar. Agora ele olhava para o nada. Eu continuei o encarando para saber a resposta, ele respirou fundo, mas não olhou para mim.

- Não é nada que você deva se preocupar, isso eu te garanto. – Ao terminar de falar ele olhou para mim e deu um sorriso, não sei por que mais isso não me convenceu, mesmo assim eu não insisti apenas sorri de volta. Ele ligou a TV, e seu olhar agora estava na mesma, eu continuei olhando para ele, seus olhos estavam na direção da velha TV, mas seu olhar estava distante, não prestando atenção ao que passava.

Ficamos um bom tempo em silêncio. Este estava me deixando nervosa, nunca que permanecia esse silencio quando eu estava com Thiago, ele sempre era brincalhão e falava sobre mil coisas comigo, por isso esse silencio dele me deixava nervosa.

- THIAGO, PELO AMOR DE DEUS, ME FALA LOGO! – eu aumentei o tom da minha voz e me levantei do sofá ficando na frente dele. Ele me olhou surpreso rapidamente, mas voltou a sua expressão que agora parecia vazia.

- Falar o que, Mary? – ele perguntou como se não soubesse de nada.

- Corta essa de que não entendeu. Tem algo incomodando você, e você não quer me contar. Você tá com essa expressão vazia, e o olhar distante. Você tá nesse silencio que me deixa nervosa, você NUNCA fica em silencio, você é sempre brincalhão e alegre. O que com certeza você não está sendo agora! Por favor, me diz o que tá acontecendo. – Eu implorava de joelhos no chão agora. Thiago me olhava surpreso, talvez um pouco sem reação. Ele nunca me vira assim desse jeito, implorando desesperada, eu podia ver seus lábios mexendo um pouco, como se formulasse ou procurasse palavras.

- E-eu... – Ele buscava palavras. Respirou fundo. – Eu só estou preocupado com que fim vai ter tudo isso. – Ele disse, não olhando para mim.

- Você está mentindo. Por favor, Thiago. – Eu segurei a mão dele. Ele me olhou. – A verdade.

- Você não parar até eu dizer, não é?mHH – Ele disse se conformando, ou quase.

- Aham. Não precisa me contar exatamente, eu vou me conformar com apenas o que está te incomodando, eu prometo que não vou perguntar o porquê ou como... Essas coisas, eu só estou preocupada com o jeito com que você está agora.

- Promete mesmo? – Eu afirmei com a cabeça. – É por causa de... – Ele hesitou, desviando o olhar, eu odiava quando ele desviava o olhar assim.

- Olha pra mim e fala. – Ele respirou fundo novamente.

- É por causa de você. – ele disse de uma vez. – Pronto, satisfeita? – D-de mim? Eu estava sem palavras, meu corpo estava travado. Eu não entendia, eu ia perguntar o porquê, mas eu havia prometido.

Thiago se levantou e foi até a janela, voltando ao silêncio de antes, de costas para mim, como se quisesse esconder sua expressão. “Eu? O que eu posso ter feito a ele? Ou será algo que eu não fiz... Será por eu ter me tornado humana?” eu me perguntava, simplesmente não conseguia entender. Bom desde que reencontrei Thiago e voltei a corporação eu não entendia muitas coisas, tudo estava tão diferente para mim. Assim como o que eu sentia por Tomaz, ontem eu finalmente pude perceber, eu não o amava como antes, eu tinha agora uma obsessão por ele, achava que com ele de volta a minha vida todas as lembranças ruins do meu passado não voltariam a me importunar todas às vezes, junto com essa maldita chuva. Pensando assim, quando eu procurava Tomaz ontem, as lembranças ruins que eu estava tendo na rua de Janice foram substituídas por memórias felizes de Thiago. “Será que eu...?” pensei, olhei em direção a Thiago. “Não, não pode. É claro que não.” Eu negava para mim mesma, mas não poderia, Thiago sempre foi meu amigo nada mais que isso, “só pelo fato de eu não sentir o mesmo que antes por Tomaz não significa que eu sinta isso por Thiago, que bobagem.”  Eu conclui.