Destino escrita por flavia_belacqua


Capítulo 8
Capítulo 8




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Capítulo dedicado à Looh, Rafaela Nogueira, Andi, mia_kcullen, ÁdriaBlackWeasleyPotter, Ana Black Salvatore, Gui_Lion, Ana Hermsworth Somerhalder, que comentaram. Espero que gostem! Valeu galeris (:

"Deixe que ela chegue

Que ela te ensine

Que ela te consuma

Que ela te domine

Fugir da dor é fugir da própria cura"

Titãs – Não Fuja da Dor


Hogsmeade estava um caos. Os Comensais da Morte foram embora, mas levou muito tempo até que pudessem apagar o fogo, contar os mortos e feridos. Os Aurores cuidaram de tudo com eficiência e pesar, arrumando lentamente a vila em destroços. Quando uma centena de crianças foi achada escondida na Casa dos Gritos, foi um alvoroço sem tamanho. Todas choravam e se agarravam umas nas outras, mas todas elas contaram a mesma história: um rapaz jovem de cabelos escuros as salvara, lutando contra os Comensais para que escapassem. O Herói. Aparentemente, durante o tempo que estiveram escondidas, discutiram sobre o que acontecera e assim o batizaram. Os Aurores imediatamente assumiram que tinha sido um deles, e vários aurores morenos começaram a subitamente se lembrar do acontecido quando uma menina loira, que até então não tinha se pronunciado, falou:

– Os homens maus levaram ele. Levaram o Herói., e começou a chorar.

A frase dita em voz infantil fez cair o silêncio sobre os adultos. Uma vez que alguém é levado para o esconderijo dos Comensais da Morte... bem, eles teriam sorte se achassem o corpo. A história com certeza ia parar nos jornais, e ter a população achando que quem salva criancinhas é morto não é bom para a imagem do Ministério. Um auror de cabelos escuros imediatamente foi escolhido para representar o papel de Herói para todos, mas Dumbledore imediatamente percebeu quem era.

Ele voltou para a escola, enterrando a cabeça nas mãos. O diretor sabia que jamais conseguiria resgatar o rapaz, e se preparou para o comunicado no dia seguinte.

...

Os Marotos, Lily e Alice voltaram para o Salão Comunal cheios de perguntas. Conversaram sobre os ocorridos, mas não conseguiram chegar a uma conclusão. Cada um foi fazer uma coisa, e assim passaram até o jantar. Harry não apareceu. Lílian ficou preocupada, mas não disse nada para não provocar outra discussão com o namorado. Quando foram dormir, à noite, Harry ainda estava desaparecido. No dia seguinte, Lily decidiu que se não tivesse notícias do intercambista até o almoço, falaria com McGonagall.

Ao fim do café da manhã, Dumbledore se levantou solenemente. Todos ficaram em silêncio, esperando o comunicado inesperado.

– Meus caros alunos, tenho o pesar de comunicar que seremos privados da companhia de um colega por tempo indeterminado. Ontem à noite, houve um ataque à Hogsmeade. Muitas pessoas foram mortas, e algumas casas foram destruídas. Voldemort fez isso para nos abalar, para que tenhamos medo e isso nos torne mais fracos. Mas se nos unirmos, só ficaremos mais fortes. Infelizmente, Harry Granger foi uma das perdas. Ele estava na batalha, e foi capturado pelos Comensais da Morte ao tentar ajudar a salvar a vida de meninos e meninas que estavam sendo mantidos presos. Ele conseguiu. À Harry Granger! - ele ergueu sua taça, e todos ergueram as suas, em reflexo.

A maioria dos alunos ficou chocada e surpresa, mas não realmente triste. A enorme maioria nunca sequer o tinha visto ou sabia seu nome. Os poucos alunos do sétimo ano que o conheciam não iam sentir sua falta, conhecendo-o somente a poucos dias. Mas Lily fechou os olhos, contendo as lágrimas. Os Marotos se entreolharam, eles e Alice consolaram Lílian.

À noite, no Salão Comunal, todos se sentaram nas poltronas e deixaram o peso da descoberta cair sobre eles. O silêncio ficou pesado, até que Lily disse em uma voz controlada:

– Ele realmente não era louco, vocês sabem.,

– Lils, nós sabiamos, só que...

– Não, não fale. Ele realmente gostava de você James. Gostava de todos vocês, eu podia ver nos olhos dele. Era estranho até, a intensidade como ele nos tratava. O jeito como ele me defendeu de Snape... Harry era um cara legal, que claramente tinha passado por um bocado de coisas. Ele precisava de nós, e tudo que fizemos foi cochichar sobre como ele era louco. Tentar matá-lo em uma maldita vassoura. E agora sabe Merlin o que ele está passando!, no fim, os olhos dela estavam marejados.

Ela falava em nós, mas seus olhos brilhavam acusadoramente para os Marotos. Saiu da sala, seguida por Alice. Os Marotos se entreolharam culpados, sentindo-se arrependidos.

– E o pior que o que ela falou é verdade, gente. Não é porque ele foi sequestrado, mas acho que nós não devíamos ter agido desse jeito. Nós nem o conhecíamos, e julgamos...

– Acho que eu fui o pior, não fui?, perguntou Sirius. Os olhares dos outros deixaram a resposta clara, mesmo sem ser dita. Aos poucos, foram para o quarto, e se deitaram.

No escuro, de olhos bem abertos, James pensou: espero que você esteja bem, Harry. Eu sinto muito.

Na primeira semana após o sequestro, falaram muito sobre ele. Na segunda, nem tanto. Na terceira, não foi mencionado. Aos poucos, deixou de existir na mente dos poucos que o conheciam. Passou a ser como uma história triste que ouviram uma vez, mas na qual não se envolveram. Mesmo Lily, que era a única que gostava sinceramente dele, parou de pensar no garoto estranho que foi parte de sua vida durante um breve tempo.

Com o tempo, Harry Granger foi esquecido.




Harry lentamente abriu os olhos. A escuridão da cela não o deixava ver nada, mas ele já conhecia cada canto de cor. Onde estava a porta, as quatro paredes. E só. A cela minúscula era sua única casa havia tanto tempo que Harry já não tinha mais noção sobre o que eram dias e noites. Avaliou os estragos da última sessão de tortura esticando os membros, e decidiu que não fora tão ruim. Pelo menos dessa vez ele podia se mexer, ainda que um pouco. Se arrastou para a tigela com um fundo de água que ele estava guardando, e sem forças para erguê-la, lambeu, como um cão. O pouco de líquido que conseguiu ingerir foi como um pedaço do paraíso no meio do inferno. Era exatamente ali que Harry estava, afinal. O cheiro de seu próprio sangue e suor, da comida podre, de urina e fezes. Do medo... O cheiro do medo carregava o ar com gritos mudos. Quase palpável, o ambiente ali era todo sobre a dor, o medo e desespero. Harry já tinha estado perto de Dementadores muitas vezes antes, mas ali parecia que uma centena deles estava em você e jamais sairia de seu coração. Era o inferno. Tudo o que você teme, por quem você teme, seus piores pesadelos. Tudo era descoberto e usado contra você, sempre.

No começo, Harry tentou se proteger com Oclumência. Mas eles eram fortes demais, bons demais para se deixar parar pela fraca resistência que ele oferecia depois de dez minutos sob Cruciatus. Aos poucos, dia após dia, descobriram tudo e todos que ele amava. Havia uma poção na comida que fazia com que lembranças do que não tinha acontecido invadissem sua mente. Remus e Sirius mortos. James e Ron presos e torturados. Lílian capturada. Gina e Hermione sendo mortas e estupradas por Comensais. Cedrico morrendo no cemitério. Sirius caindo sobre o véu. Ginny morrendo na Câmara Secreta... Imagens verdadeiras e falsas dominavam sua mente quando comia qualquer coisa que lhe serviam. Ele não conseguia discernir o que era real e o que não era, e vivia num mundo de desespero impotente, assistindo seu mundo ser destruído vez após a outra em sua mente. Quando por fim descobriu que a fonte das alucinações era a comida, parou de ingerir qualquer coisa. Dias de jejum e tortura acabaram com seu corpo já frágil, e ele percebeu que morreria rapidamente. Não se importou. Mas os Comensais conheciam esse método de suicídio, muito comum entre os prisioneiros, e o forçavam a comer, querendo ou não. E as lembranças voltaram.

Agora, Harry já tinha aprendido a lidar um pouco melhor com elas. Quando comia alguma coisa, jogava patronos imaginários no ar, tentando se lembrar de todos os momentos felizes que teve. De que seus amigos e seus pais estavam bem. Mas ele não tinha certeza absoluta disso, e tudo começava novamente. Imerso pelo inferno psicológico, Harry às vezes quase desejava a tortura física pela qual passava. Quase. Porque quando ela vinha, ele sentia o desespero nascer dentro dele como um verme, e ele não tinha o que fazer a não ser esperar passar.

O menino alquebrado estava jogado no canto da cela, e permaneceu lá o dia todo, consumido por seus fantasmas. Os olhos desfocados mostravam que estava lá, no mundo de memórias em que a água batizada com a poção lhe enviou. Depois de algumas horas, ele ficou inconsciente. Então eles vieram, arrastando seu corpo desacordado pelo chão bruscamente. Levaram-no para a sala de tortura, que o garoto já conhecia muito bem. Belatrix Lestrange acordou-o com um aceno de varinha, e executou o feitiço que o manteria acordado por tempo suficiente para que ela se divertisse. Eles o prenderam, nu, nas algemas que pendiam do teto e no chão, os quatro membros esticados no ar. Harry viu a posição em que estava, e Belatrix diante dele, e o medo surgiu na boca do estômago de forma familiar. Ela era a pior, a mais sádica, se deliciava com aquilo. Era ela que pensava nas piores formas de tortura, os jeitos mais criativos de causar dor. E ela odiava Harry com toda sua alma. Porque ele se recusava a gritar.

Não importava quanta dor ela lhe infringisse, quanto ela lhe humilhasse, de que forma ela o torturava. Na presença de Belatrix, ele nunca deu sequer um gemido. Hoje, ela esperava reverter a situação. Esticado daquele jeito, Harry se sentiu com muito frio e exposto, e não tinha idéia do que ia acontecer. Então ele ouviu o crepitar do fogo, e percebeu. A mulher vinha na sua direção com um pedaço de carvão em brasa, o olhar vibrante. Aparentemente, já que os métodos mágicos de tortura que ela conhecia não funcionavam com ele, ela resolveu tentar os trouxas. Harry sentiu uma dor insuportável na barriga, o cheiro de carne queimada subiu por suas narinas e sabia que era sua. Fechou os olhos, se concentrando em não deixar escapar nenhum som. À medida que ela continuou, queimando seu corpo todo aos pedaços, ele permaneceu quieto, morrendo silenciosamente. Quando ela lhe pôs sob a Cruciatus mais vezes do que ele poderia contar, ele ficou quieto. Os lábios crispados, em silêncio absoluto. Ela gritava com ele, xingava e cuspia, louca. Durante horas, ele permaneceu ali. Sendo queimado, cortado, rasgado, violado das piores formas que a mente doentia de Belatrix Lestrange podia imaginar. Mas ele nunca, nunca daria a satisfação de deixá-la perceber sua fraqueza. Não para aquela vadia que matou Sirius. Que torturou os Longbotton até a loucura. Pensando sobre isso, ele percebeu que a loucura era desejável agora. Não. Não é, porque tem gente lá fora que precisa de você são e lutando., repreendeu a si mesmo. Subitamente ele arregalou os olhos de susto e dor quando sentiu uma faca lhe rasgar a carne. Ele podia sentir a serra arrebentando sua pele e seus órgãos, puxando para fora. Quase desfalecendo com a dor, ele sentiu a faca entrar novamente, desta vez em sua coxa. Desmaiou.

– Achei que nunca ia apagar., resmungou um comensal loiro e enorme que estava esquentando as brasas durante a tortura.

– É. Vamos ver quanto tempo ele vai demorar pra começar a fraquejar., ela sorriu. Mas por dentro, ficou preocupada. Não sabia o que fazer. Tentou de tudo. Tudo o que ela conhecia, tudo no que pode pensar, e o rapaz não cedeu. Desta vez, ela sabia que era a última. Não podia mais ficar gastando tanto tempo torturando o garoto, e soube que ia precisar por um fim nisso. Da próxima vez que ela pusesse as mãos nele, o mataria.

– Cuidado, nesse ritmo você vai acabar matando o sujeito e o Lord vai ficar aborrecido. Você sabe que ele queria fazer isso.

– Sei melhor do que você os planos do Lord das Trevas, McAllister! Suma da minha frente! – ela cuspiu, descontrolada.

O Comensal loiro levitou Harry até sua cela, e suspirou. Trancou lá dentro o corpo quebrado do rapaz e pela primeira vez, pensou se escolhera o caminho certo. Sacudiu a cabeça para afastar os pensamentos perturbadores e foi embora.

...

Muitas horas depois, Harry estremeceu ao acordar. A cela curava automaticamente os ferimentos fatais, de modo que o deixassem vivo, mas agonizando. Sentiu falta de suas roupas esfarrapadas de prisioneiro. Sem querer, colocou a mão sobre uma das piores feridas, e sentiu espasmos de dor atravessarem seu corpo. Seus olhos encheram de lágrimas não derramadas, e os ombros se encolheram com o frio, a dor e o choque. Seu corpo todo agora parecia tremer, e ele vomitou em seco, com nada no estômago. Não conseguiu mais se mexer, não conseguiu mais pensar. Até que ele aceitou a dor. Ele deixou que ela o envolvesse como um manto, penetrando em sua pele e ossos. Deixou que ela violasse sua mente, destruindo suas defesas. Deixou que ela enchesse o ar, e tudo o que ele estava consciente era de sua própria dor. Que o consumisse. Naquele dia, a dor passou a ser uma parte incontestável de Harry Potter. Ele sabia que ele estava ali, sabia que nunca mais se livraria daquilo. Mas soube também que, como qualquer parte dele, ele podia controlá-la. Ele podia usá-la a seu favor, e foi isso que ele fez.

Pensou em toda a dor que sofreu. Não só nesse inferno particular, mas em toda a sua vida. Pensou em seus pais mortos em sua própria casa, em Gina consumida por algo muito maior do que ela. Em Cedrico, e em Sirius. Nos gritos de Hermione sendo torturada na Mansão Malfoy. Finalmente, nas sessões de tortura cada vez mais brutais no cativeiro. Nos pesadelos induzidos em sua própria mente. E juntou tudo aquilo, somando suas dores em uma bola crescente no peito. De repente, aquilo não cabia mais dentro de seu corpo. Sua dor explodiu para fora em forma de energia, arrebentando todos os feitiços da cela. Quebrado, ferido e nu, Harry aparatou para Hogsmeade.



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