Toda mulher reserva, de fato, essa busca quase incessante de um braço contornando seu ombro numa caminhada, de duas mãos segurando sua cintura e olhos nos olhos. É um tipo de segurança que nos gera contentamento, e então gera uma alegria que se tornará uma nova segurança.

Ad eternum.

E para sempre ter esse sistema de confiabilidade por perto, a gente enxerga como melhor idéia a possibilidade de juntar, num só lugar, todas as nossas roupas e coleções de discos e livros. Em cinco ou seis meses de romance a gente já (supõe que) consegue definir quem deixamos abrir a nossa porta e se aconchegar em nosso sofá-coração.

Ângelo sempre fora mais reservado. Eu, o inverso. Talvez estivesse aí o equilíbrio da nossa relação. Nunca acreditei em alma gêmea, cara-metade, par perfeito, a tampa da panela. Acho que Ângelo também não.

Mas sabíamos, em algum momento, que juntos estávamos bem. Nem tão iguais e, ao mesmo tempo, nem tão diferentes. Mas estávamos bem. E era o suficiente.

Dizem que os opostos se atraem. Mas também dizem a mesma coisa sobre os semelhantes. No fundo, todo mundo se atrai e se acerta de alguma forma.

Eu nunca teria olhado diferente para Ângelo caso já não nos conhecêssemos. Ele sequer preenche oito dos trinta itens que compõem minha lista de homem ideal. Talvez nem eu preenchesse a dele.

Das minhas caixas de som soavam The Cure, New Order, Depeche Mode, Echo & The Bunnymen. Das dele, Jeff Buckley, Elliott Smith, Radiohead, Sigur Rós.

Eu queria dançar. Ele, contemplar.

Eu bebia doses de bourbon e absinto, enquanto ele se debulhava em Cabernet Sauvignon.

Eu tinha ânimo saindo pelos poros. Ele, o talento da elegância e discrição. E, diferentes ou não, vivíamos num verdadeiro comercial de margarina, esbanjando beleza e sorrindo até o limite do possível. 

Tudo conspirava a nosso favor.