Always Attract escrita por Lena Portela


Capítulo 12
Interlúdio




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3 anos antes

You left a shattered mirror (você deixou um espelho despedaçado)/ And the shards of a beautiful girl (e os pedaços de uma garota bonita)

Pretty Hurts, Beyoncé.

Olhar para ele doía.

Dafne não sabe ao certo qual aspecto daquele garoto era o que a fazia sentir a dor. Talvez fosse a beleza simples de seu rosto; os cabelos cacheados, o sorriso preguiçoso, aqueles olhos castanhos escuros brilhantes. Talvez fosse a tensão que irradiava de seu corpo a cada palavra que Dafne dizia, os olhos bonitos seguindo o rosto dela, brilhando, admirando. Olhando. Olhando. Olhando. Como se ela fosse o sol e ele não se importasse de se queimar.

Mas a garota desconfiava que o motivo certamente era o sentimento naquele olhar. A tristeza transbordando através de suas pupilas, uma decepção pesada repuxando o canto daquela boca, os lábios que algumas vezes se mexiam silenciosamente em um tipo de prece sem palavras que ela sabia – Deus, ela sabia exatamente pelo que ele estava pedindo – que se tratava de um murmúrio de desespero.

— Não consigo acreditar, - ele começou a dizer só para parar logo em seguida. Parecia como se ele tivesse sido atingido por um tremor e o reprimido por pura força de vontade. - que você vai jogar fora tudo o que construímos porque, Jesus... porque você quer ser a rainha da popularidade ou algo assim. – Os dedos dele pressionaram a ponta do nariz e ele fez um som no fundo da garganta. Parecia enojado.

Um arrepio se arrastou pelos braços de Dafne, que ela ocultou com uma passada de mão pela pele. A garota respirou fundo, engolindo um bolo amargo de medo e fazendo-o descer diretamente pela sua garganta, justo como ela fazia algumas vezes com as pílulas milagrosas de sua mãe. Aquela que trazia o sono e o esquecimento por horas. Ela virou as costas para o garoto sentado em sua cama, que continuava com aquele olhar de dor, que trazia dor, que queimava dúvidas dentro dela, só para se encontrar encarando a si mesma.

Olhos azuis tão claros que ela mesma confundia com cinza algumas vezes, perfeitos cílios, perfeitas sobrancelhas, perfeitas maçãs de rosto, um nariz perfeitamente proporcional, uma boca rosada, perfeitamente desenhada; o lábio inferior era mais cheio, como ditava a regra. Cabelo divino. Um pescoço perfeito, um corpo perfeito, uma estatura perfeita. Uma garota perfeita. Porque Dafne trocaria o seu lugar dentro da perfeição do momento em que vivia por algo tão incerto quanto esse sentimento? Quanto esse garoto?

— Você não entende. – Ela disse a ele, encarando a si mesma e ao garoto através do grande espelho. — Eu não te amo como você pensa que eu te amo.

Ela ouviu um som grosseiro de desdém vindo dele, antes que ele pronunciasse as próximas palavras. — Isso é a porra de uma mentira! —ele exclamou, - Eu sei exatamente o que você sente por mim e você sabe que eu sei.

— Eu não...

— Cala a boca, Dafne! – ele a cortou com um grito. Suas mãos de pele morena bagunçaram os cachos em sua testa. Ele baixou o olhar, encarando o final das pernas dela, as costas dos Louboutin's altos que calçavam os pés da garota. Ele abriu a boca e então a fechou. Não sabia o que dizer. Dafne soube disso porque viu a hesitação na mordida que ele deu em seus próprios lábios; tinha se arrependido de ter gritado com ela, mas não recuaria. — Eu sei como você se sente sobre isso, sobre o que sua mãe fez pra você...

— Minha mãe não fez nada.

– … quando forçou esse conceito de mais alto, mais perfeito, melhor é mais feliz. — Suspirou. – As vezes até eu penso dessa forma. - ele disse bem baixinho. — Mas não é o certo, gatinha. Você está se machucando nessa sua corrida desenfreada pela perfeição, pela popularidade, aquela porcaria de coroa de rainha do baile. – Jogou as mãos para o alto, um sinal de frustração. – Você quer uma coroa? Eu compro uma dessas besteiras para você, mas, por favor, pare com essa obsessão e essa ideia de me empurrar para longe só porque eu não sou um dos babacas do time de futebol.

Dafne fechou os olhos por um ou dois momentos, então os abriu. Deus, ele não sabia o quanto isso era difícil para ela? O quanto machucava quando ela pensava sobre a diferença entre o que ela queria e o que ela precisava? — Você não é o bastante. - ela sussurrou.

— O quê? – Douglas perguntou, seus olhos encontrando os dela no espelho. Ela viu gelo no dela, alarme no dele. Ela viu desejo no dela, esperança no dele. Ela viu desespero nos dela, amor nos dele. Ela viu dor nos dela e também nos dele. — O que mais você quer, Dafne?

— Coisas que você não pode me dar.

— Eu posso te dar tudo.

— Não, você não pode. - ela disse através dos lábios perfeitamente adormecidos, o gosto de medo persistia em sua língua. O amor não era o bastante, ela sabia, mas a perspectiva de perdê-lo, de viver sem ele, era equivalentemente degradante. — Eu quero andar por cima, eu quero que todos saibam o meu nome, eu quero ser a rainha, eu quero meu rosto na mente das garotas quando elas precisarem de um modelo para se inspirar. Eu quero um namorado que todas queiram, que invejem. Eu quero um romance perfeito, - Dafne tentou sorrir suavemente, como quando ela ganhou o concurso de beleza mais importante da sua cidade natal, mas seus lábios permaneciam congelados, tingidos de rosa pálido da cor do medo. E em vez de sentir vontade de rir, queria vomitar com as imagens de suas palavras criando vida em sua mente. - onde as pessoas olharão e dirão “eles são perfeitos juntos”. Ele precisa ser atlético, popular e fazer parte do time de futebol. A família dele precisa frequentar o Country Clube. No futuro, ele ganhará uma bolsa para Yale ou em outra faculdade importante em NY. Eu serei a Miss e serei a esposa do maior jogador de todos os tempos. E quando eles contarem nossa história na TV, dirão aquelas palavras: “eles são perfeitos juntos”, e eu estarei no topo.

Depois do discurso de Dafne, o silêncio se instalou no quarto dela até que uma risada estrangulada fugiu da garganta de Douglas. — Parece que você já tem tudo planejado e eu certamente não me encaixo nesse seu quadro. — Os olhos do garoto miraram os sapatos dela novamente. — Mas você teria que substituir esse jogador de futebol pelo príncipe William, porque normalmente os jogadores tem mais esposas que...

— Vê? É isso que há de errado com você! – Dafne levantou a voz. — Você não se importa nem de tentar chegar ao topo, ou ser popular ou entrar para o time de futebol...

— Você não vai querer me ver jogando futebol, confie em mim.

Ela o ignorou. — Você não está nem ai para a opinião dos outros! Você é uma bagunça! — Dafne jogou os cabelos platinados por cima dos ombros, frustrada. - e nem se esforça para concertar.

Um suspiro. — Mas eu te amo. - ele disse. O coração de Dafne bateu mais forte e então mais fraco e, por fim, voltou a sua constância. O orgão funcionava de modo bagunçado, igual ao garoto que a amava. — Eu me importo com você. Você é linda, tão linda, e não por causa de todo o seu esforço, mas porque é você. E eu faria qualquer coisa por você, menos te empurrar ainda mais para essa loucura.

— Eu sou melhor que isso. – Dafne disse em uma voz quebrada.

— Sim, você é.

— Eu sou melhor que você.

— Sim, você é. – Douglas repetiu em uma voz intensa. — Você é tudo. Você é o meu coração e os meus beijos e as minhas carícias e o encaixe na minha alma. E você continuaria sendo o meu amor mesmo que não fosse a princesa dentro do seu castelo de gelo. E eu continuaria te amando mesmo quando o brilho do seu corpo se fosse, porque o que eu amo não é substancial, é você, mas é você inteira e não só a parte de fora.

Dafne colocou os braços em volta de si mesma. Em sua cabeça ouvia a mãe murmurando coisas sobre sempre ser a mais bonita, a melhor, a maior perfeita. Murmurando esses desejos como se esses fossem uma necessidade. O amor é um jogo perdido, a mãe de Dafne dizia, segure seu sorriso e a sua coroa. No final, é tudo o que importa.

— O amor é um jogo perdido – Dafne sussurrou, os olhos fechados.- e eu quero ganhar.

— Dafne, - ela ouviu quando Douglas se levantou, se aproximando. - por favor.

— É melhor você ir.

Um suspiro, meio molhado, meio desesperado. — Dafne, não se machuque...

— Você é surdo ou só tem problemas de compreensão? — ela virou-se para encará-lo, raiva e dor fazendo suas palavras duras. — Eu não quero ser vista como aquela com uma relação patética de amor. Eu não quero ser vista com um perdedor.

A mandíbula de Douglas trincou enquanto ele segurava o que quer que fosse dizer para a garota. Ele balançou a cabeça para cima e para baixo em uma concordância muda. Deu as costas para ela e caminhou até a porta, mas antes de sair, parou. Virou-se, olhou para Dafne. Os olhos castanhos escuros raivosos, magoados, cheios de dor. — Só me diga uma coisa, Dafne. — Ele disse em uma voz pensativa. — Quando você se encontra sozinha no escuro sem ter como olhar a sua perfeição, quando estão só você e seus pensamentos tortuosos, você está satisfeita consigo mesma? Está feliz com si mesma? Você diz que é a melhor, a mais bonita e eu te amo com toda a porra do meu coração idiota, mas você ama a si mesma?

E foi embora.

Assim que a porta se fechou, Dafne desmoronou no chão, suas pernas parando de funcionar como se ela fosse uma boneca quebrada. O coração batia e ela nem sabia como. Ela respirava e tentava entender o porquê. Nada do que se passava pelo seu corpo, pela sua mente e pela sua alma fazia sentido. Não depois de ouvir a porta de seu quarto se fechar. Não era só Douglas; era o amor, a felicidade e a chance de sobreviver sendo ela mesma e não se importar com o que tinha de enfrentar pela frente. Dafne pensou no que seria daqui adiante. Pensou nas competições, nos concursos, e principalmente nos momentos que ainda teria pela frente e percebeu que estava sozinha.

Do fundo de seu estômago e, ela suspeitava, de um lugar escuro bem escondido em sua alma, aquela urgência familiar começou a crescer dentro dela, seus olhos procuraram pelo quarto. Ele foi embora. Dafne procurou dentro da gaveta do criado-mudo. É tudo sua culpa. Procurou dentro do porta-joias. Quando a localizou, reparou que a coisa brilhava como se pertencesse àquele lugar, mas Dafne sabia melhor. Pegou-a e procurou em seu braço por uma fina linha quase imperceptível. Uma cicatriz suavizada pela medicina. Colocou a lâmina em cima da pele e pressionou; quando a primeira gota de sangue fluiu de seu braço, um pensamento sobre marcar a sua pele ser algo errado sussurrou em sua mente. Tinha sido um desastre da última vez. Em sua mente, ouvia a mãe perguntar o porque tinha feito aquilo, dizendo-lhe o quanto custaria para ajeitar a pele onde Dafne havia estragado. Afinal, quem acharia uma garota cheia de cortes bonita? Ninguém vê beleza nas cicatrizes e a perfeição é imaculada.

Dafne deixou a lâmina cair no chão, a coisa atingiu o azulejo com um barulho fino, manchando o piso com um pouco de vermelho do sangue de Dafne. A urgência ainda continuava a arranhar em suas veias, um zumbido em seus ouvidos, um sussurro vicioso em sua mente. Dafne levantou-se do chão e correu cambaleante pelo quarto até onde estava o banheiro. Encarando a privada limpa, cinza, insignificante, a garota levou a mão a boca, colocou o indicador na garganta. Assim que a paredes de sua garganta reclamaram contra aquela invasão, o seu estômago derramou para fora de seus lábios o almoço de ainda há pouco. Quando voltou a si, doente, tremendo no chão frio com estômago revolto e a sensação gelada e escura como a morte rastejando e se misturando ao seu sangue, a voz de Douglas perguntou claramente dentro de seus pensamentos:

Você ama a si mesma?

Você ama a si mesma?

Dafne sabia que não.

N/A: Estou muito ocupada com a faculdade no momento para postar regularmente. Peço desculpas a quem acompanha e peço também paciência. Estou trabalhando em um capitulo novo da forma que posso. O que posso dizer no momento é que talvez, talvez, esse casal venha a ter sua própria história no futuro. Estou bastante animada com as ideias. :)


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