Aurora Azul escrita por Dauntless


Capítulo 36
Capítulo 35 - Estude assim até o próximo verão




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O carro atingia uma velocidade de cem quilômetros por hora pela autoestrada que permite a entrada para o Arizona. Depois de discutirmos por algum tempo na quinta-feira, decidimos ser discreto com a entrada, sem chamar a atenção de Zachary. Will e Eric estavam sentados no outro lado do caminhão, cujo a parte lateral de fora tinha uma banner de uma marca de frango. O restante dos agentes chegarão em voos comerciais, juntos com Hayden na liderança e protegendo Tereza.

Após passarmos por uma discussão sobre ficar em Nova Iorque, preferi mantê-la perto para que Zachary não nos surpreendesse. Tive a ideia de mandá-la para o Havaí, ou para fora do país, mas ela recusou. Se eu soubesse que pessoas com quem me importo estão correndo perigo, também recusaria.

Tudo indicava que era sábado, cerca de trinta e sete horas depois que terminamos o esquema de resgate. Ou seja, com o prazo de quarenta e oito horas dado por Zachary, ainda tínhamos sete horas para agir, o tempo exato para chegar em Phoenix.

O interior do caminhão é bastante largo, com cerca de dois metros de largura e altura, e dez de profundidade. Empilhado no chão de ferro, estavam três camas infláveis e no lado esquerdo, tinha uma cabine com um banheiro. Uma lâmpada fraca, pendurada no meio do teto, iluminava o ambiente. Havia uma mesa extensa, presa na lateral esquerda com um conjunto de armas e computadores para a comunicação. Espio rapidamente a tela que transmite as imagens do lado de fora e tudo o que eu vejo são árvores e pedras. Uma grande montanha sendo deixada para trás. No canto superior, ''Novo México'' brilhava em amarelo. Estávamos perto.

Will se dirigia á Eric com gestos, alguma coisa distante demais para que eu pudesse compreender. Meus pensamentes estavam inconstantes, uma hora, mergulhavam profundamente em procura de um plano B e C e D e E... Mas depois de analisar todas as opções, eles boiavam de volta para a superfície.

Meus olhos miraram Eric.

Seus cabelos castanhos ondulados, da mesma cor que os meus, quando não os tinha tingido de loiro, os olhos verdes, tão escuros quanto os meus, e seus traços faciais. Como eu não percebera? Como não notara a semelhança? Ele é tão parecido comigo agora que estou o encarando... agora que estou o analisando, detalhe por detalhe... Era inacreditável, e ainda mais inacreditável aceitar a hipótese de George ser o nosso pai biológico. Ele sumira sem deixar rastros, como se não estivesse mais na Terra. Porém, eu também já sumi do mapa, assim como ele. Então não somos muito diferentes, eu sou igual a ele.

O pensamento me aterrorizou e aperto o banco em que estou sentada até sentir a minha mão doendo.

–Danna? - a voz de Will me faz despertar. - Você está bem?

Fitei-o e consegui perceber em seu corpo, a mesma tensão do meu. Sua mãe e sua irmã foram sequestradas, ele devia estar desesperado por dentro. Will não devia se preocupar comigo.

–Estou - respondo, perdida na minha própria resposta.

Desviei o olhar para Eric e ele me lançou um pequeno sorriso.

Não tivemos muito tempo para sermos irmãos, nem conversar sobre isso diretamente. Saber que compartilhávamos o mesmo sangue, não mudou nossos laços. Sempre fomos e sempre seremos irmãos, independente de ter ou não o mesmo sangue. Saber que George era o nosso pai, nos deixava ainda mais enfurecidos. Eu, estava furiosa com a minha mãe, o que me fez sentir mais falta dela durante esses dias. Eu queria saber o que realmente aconteceu com o amor verdadeiro que ela e Joseph Walker compartilhavam, durante todo esse tempo, pensei ser o fruto de um amor puro, que a história deles era real, que meu pai realmente resgatou uma donzela francesa. Mas agora eu não tinha mais nenhuma certeza. Will não possuía o mesmo DNA que eu, e isso significava que ele não era filho de George. Quem será seu pai?

Fiquei observando a porta do caminhão enquanto ouvia o barulho de animais do lado de fora, então com um súbito desejo, abro-a para apreciar a paisagem. Me sentei na beirada, com os pés balançando para fora e encosto a cabeça na lateral.

Estávamos atravessando o país e não tive tempo de ver muita coisa, nunca falaram muito para mim sobre o Novo México. Uma revoada de pássaros está voando pelo céu, fazendo manobras com as asas, circulando todo o terreno de plantação ao redor da estrada. O dia estava começando e o sol brilhava ao leste.

Ouvi sons de passos atrás de mim e uma figura se abaixou para se sentar também. Seus olhos verdes o denunciaram e ele jogou as pernas para fora, assim como eu.

–O que você está fazendo aqui? - O vento batia no meu rosto e jogava meus cabelos para trás.

–É uma vista muito bonita. - disse ele. Assenti com os ombros e o encarei.

–Por que você nunca me contou que era um super agente especial?

–Porque ninguém pode saber que existe agentes super especiais. - Por alguma razão, ele estava sorrindo. - O FBI é um disfarce, você sabe disso.

–Sim, eu sei.

–Isso tudo é uma loucura não é? Eu nunca achei que poderia ter uma irmã, porque nunca achei que encontraria algum familiar biológico. As coisas foram tão por acaso, você é a minha irmã, e eu já fui apaixonado por você. - damos risadas e empurro ele com o ombro. Como nos velhos tempos.

–Dizem que proibido é melhor.

–Está insinuando alguma coisa, Caramelo?

–Não sei, estou? - levantei uma sombrancelha e ele dá outra gargalhada.

–Seu namorado está bem ali. - sigo o seu olhar até Will, que ainda está sentado no banco, vidrado no celular. Percebi o quanto fiquei feliz e aliviada por ouvir aquilo, só de ser mencionado, já me trás um certo conforto. Fiquei contente também por saber que duas, das pessoas que eu mais amava no mundo, estavam comigo, perto de mim. - Mas já que você é a minha irmãzinha, não quero que faça essas insinuações.

–Eric, você vai dar uma de irmão mais velho super protetor?

–Com certeza, também vou colocar uma coleira em você para que não fuja de perto de mim, então saberei de tudo o que está fazendo.

–Você não faria isso. Tereza te mataria. - O caminhão passou por duas vacas que comiam pasto na lateral da estrada. Era assim que acidentes aconteciam.

–Na verdade, eu acho que não. Tereza mudou bastante desde a sua... - ele estava prestes a dizer morte. - não-morte. Ela cresceu, estou muito orgulhoso dela.

–Por isso que está com ela? - Não tive muitas oportunidades em perguntar sobre sua relação com ela, antes. Mesmo estando distante no último ano, eu sabia que estavam juntos e mesmo antes de desaparecer, eles construíram um relacionamento.

–Também. Além de ser engraçada e inteligente do seu jeito, bonita e encantadora, irritante com algumas coisas, uma companhia agradável e é sempre uma boa amiga. - Sabia do que ele estava falando.

–Meu Deus, você está realmente apaixonado por ela! E pior, você roubou a minha melhor amiga!

–Ei! - ele me deu um tapa no braço. - Você também roubou o meu melhor amigo!

–Eu não roubei Will de você. Eu nem sabia que vocês eram tão próximos assim.

–Não venha com essa, estamos quites.

Olhei novamente para trás e vi o quanto eu era sortuda e o quanto estava orgulhosa por ter roubado ele de Eric.

–Tudo bem.

Ficamos em silêncio, observando a estrada que deixávamos para trás, dos carros que seguiam pela mesma rota e do sol que estava dando o seu show novamente.

–Ele te tratava bem?

–O quê?

–George, ele... - hesitei - te tratava como um filho?

–Sim. - Eric respondeu brevemente, não querendo entrar em muitos detalhes. - Ele de alguma forma foi bom para mim. Quando os Palmer davam festas, ou quando saiam para as férias, George sempre me levava como uma companhia para Will, ele dizia que Will se entediava fácil com esses tipos de eventos e que um amigo perto seria bom.

Olho para baixo e encolho os ombros, mais por frio do que qualquer coisa. Me coloquei e me imaginei no seu lugar, não por estar com inveja, mas por ser algo inacreditável. George sendo carinhoso e preocupado comigo, algo que nunca, em nenhum momento o vi demonstrar. Por que minha mãe largaria um outro filho? Por que ela não criou Eric assim como me criou? Eram muitas perguntas para nenhuma resposta.

–Danna, não fique pensando muito nessas coisas. Eu não tive mais que você, eu nem sabia que ele era o meu pai biológico. Pra mim é e sempre será Garret Jackson, o homem que me mostrou o que era ser um pai de verdade, não um que abandona o filho ou a filha.

–George nunca foi com a minha cara - sorri.

–George nunca vai com a cara de ninguém, não sei como nossa mãe conseguiu algum afeto da parte dele. - Ao dizer ''nossa mãe'', senti um leve tremor na espinha. Nunca vi minha mãe como a mãe dele, ainda não. Dora era só a minha mãe e a de mais ninguém, era assim que eu via. Mas agora as coisas mudaram... Ela teve um filho antes de mim.

–Você sabe como ela... se foi? - as palavras saíram fracas.

–Você me disse que ela ficou doente, mas reafirmou depois que ela se suicidou, não é?

–Xavier me mostrou uma imagem dela segurando veneno.

–Eu sinto muito por ter presenciado aquilo. - ele me envolveu as minhas costas com o seu braço e me deu um beijo na testa. Talvez para ele, a dor seja menor, por não ter conhecido ela, mas sinto como se ele não sentisse nada, como se fosse uma história qualquer da morte de alguém.

–Por isso que preciso me vingar, por todo o mal que George Palmer e Zachary Hill tem nos causado, para também acabar com tudo isso, a guerra que dura há anos.

–Danna, - ele se afastou - você sabe que também estou nessa. Mas vingança nunca é a solução para a justiça. Também não fará com que o passado mude.

–Eu sei, eu não quero justiça. Eles não merecem ser mortos por justiça, mas por vingança para pagar pelo que fizeram. Para honrar a minha mãe e o meu pai.

–É isso o que ela iria querer para você?

–Todas as coisas que aconteceram na minha vida, foram por causa das decisões dela, por causa do que ela quis. Eu não vou fazer o que ela quer agora, vou fazer o que eu acho certo, independente das consequências. Independente se eu tiver que pagar com a minha vida para acabar com tudo.

Suspirei e Eric voltou a colocar o braço em volta de mim.

–Eu tenho uma irmãzinha que ás vezes me assusta. Pra cacete.

–Então você precisa conhecer o nosso não-avô. O problema é que não sei onde encontrá-lo, ele é a pessoa certa para nos dar respostas. - Comecei a me lembrar de quando acordei no avião, depois do acidente, de como Robert se apresentou como meu avô. Mesmo que tenha mentido, ele ainda era o pivô de toda a verdade, pois nesse ano em que estive com ele, aprendi que Robert Walker sabe de tudo o que acontece com as pessoas.

–Não-avô? Quer dizer aquele velho que todo mundo quer pegar?

–Esse mesmo!

–Ele deve ser um vovô muito legal.

–Sim, o vovô já tentou me matar e sequestrou pessoas com quem me importo. Vovô começou com tudo isso, e também me deu uma casa que foi detonada, um carro conversível que está perdido por aí, e uma mesada de quatrocentos milhões de dólares. - Ele deu uma risada e o som foi bem familiar, sua risada me levava para casa.

–Ta bom, eu realmente preciso conhecer o não-vovô. Talvez ele também me dê uma grana dessas, já que ele dá quantias tão bondosas para não-netos.

Soltei uma breve risada.

–Você sabe que agora é meio dono também, não é? Se George...

–Eu estou bem, Danna. - disse Eric, em um tom sincero. - Não quero ter isso pra mim, nem o dinheiro, nem o poder.

Senti o seu coração batendo no peito e sua respiração balançando o meu cabelo junto com o vento.

–Mas vou sempre estar aqui. Se for preciso que eu tome posse de algo, eu vou. Se isso significa que irei manter minha família junto comigo, farei isso e muito mais.

–Eric, você sempre foi assim. Como consegue não mudar? Como faz para continuar sendo sempre essa pessoa boa?

–Nós não mudamos, é o mundo que muda a gente, Caramelo, é o mundo.

O mundo ainda não corrompeu Eric, ainda não.

–Falando nisso, eu acho que não devia mais te chamar de Caramelo.

–Por quê?

–Você não tem mais aquele cabelo fofo, Danna, olha pra você, está loira!

–Eu sei. Não tive tempo de voltar pro antigo eu. Ainda sou Dianna Banister, a garota misteriosa que chegou em Phoenix para se vingar de todos os idiotas que foderam com a vida dela.

–Como seu irmão mais velho, te proíbo de usar termos tão feios e inadequados.

–Ah, vai se foder!

Ele soltou uma riso tímido e depois de um tempo, acompanhando a estrada ir embora, o sol chegou no auge de seu show e abaixamos as portas do caminhão. Dessa vez, Eric não se sentou ao lado de Will, então eu o fiz. Enrolei os meus braços no seu tronco e joguei minhas pernas por cima das suas. Não estava frio, mesmo com a aproximação do inverno, Will vestia uma calça jeans e uma regata debaixo de seu casaco de couro, que estava jogado no outro lado do banco. Afaguei seus bíceps do braço e beijei o seu ombro.

–O que está fazendo? - perguntei.

Ele abaixou o celular e me puxei para mais perto.

–Falando com as equipes que já estão em Phoenix.

Me senti culpada por não estar ajudando.

–Alguma novidade? - Will balançou a cabeça.

Eu queria abraçá-lo e beijá-lo para o confortar e para aliviar um pouco a sua tensão.

–Nós vamos encontrá-las, Will e fazer com que paguem por isso. - Enterrei a minha cabeça em seu ombro, com uma mão sobre o seu peito, sentindo as batidas de seu coração. Elas estavam calmas e na medida em que me aproximava, elas aceleravam. Will beijou a minha mão e encostou a sua testa na minha.

Naquele momento, ele precisava do meu abraço, ele precisava da fusão de nossos corpos, para saber que não estava sozinho e que eu estaria ali para sempre, ou enquanto vivermos.. Will roçou o nariz na minha bochecha e aproveitei a proximidade do seu pescoço para sentir o seu cheiro. Tão limpo e tão familiar...

Não me lembro de quanto tempos ficamos ali, daquele jeito, ignorando totalmente a presença de Eric, até que o caminhão parou abruptamente.

Soltei Will depois de alguns minutos, quando o caminhão não ligou novamente, meu corpo ficou em alerta e vi Eric, que estava dormindo, dar um pulo para fora do banco. Caminhei até o fundo do caminhão e bati na parede de aço. Nenhuma resposta.

–Vou checar a situação, fiquem aqui. - Will começou a levantar a porta, mas nem eu, nem Eric, ficamos parados. Will olhou para nós dois e viu que a teimosia fazia parte do nosso material genético.

Descemos do caminhão banhados pelo sol. Will foi na frente e sacou a arma, que percebi ter pego na mesa. Como eu fui tão estúpida para descer desarmada? Olhei para o lado e Eric também segurava uma arma. Caminhamos lentamente pela lateral do caminhão, com cuidado para não fazer barulho.

Percebi que algo estava errado assim que chegamos perto da porta direita da cabine. Não estava aberta, e o terceiro motorista ainda estava ali. Olhei para a frente e me surpreendi com um batalhão de caminhonetes pretas e uma fileira de soldados como escudo segurando fuzis com a boca na direção da cabine. No meio deles, um homem de cabelos grisalhos estava vestido com um pulôver familiar e com os braços para trás. Ele sorria sem mostrar os dentes.

–Robert?

–Danna, querida! - ele se aproximou, Will e Eric que estavam do meu lado, apontaram para ele, o que fez o escudo de soldados apontarem para nós três. - Está tudo bem, não há necessidades disso, quanta grosseria minha. Eles irão abaixar as armas se vocês também abaixarem as suas. Sejam cidadãos educados, por favor.

Ninguém cedeu, então olhei para os dois e ordenei que abaixassem as armas. Will hesitou, mas no final, guardo-a no cinto, com uma expressão de raiva.

–O que você quer?

–Cumprimente o seu avô, Danna.

–Você não é o meu avô, Robert. Eu descobri a verdade, e ela é bem dura não é? George, ele é o meu pai.

Ele parecia surpreso, mas sabia como controlar as suas feições e emoções externas.

–Vejo que as últimas semanas sem mim foram bastante produtivas. Podemos conversar sobre isso? - Ele não parecia assustador, ainda não.

–Conversar sobre isso? Foi você quem me disse pra não te procurar mais. Não tenho interesse no que você pretende por na minha cabeça.

Robert se manteve ereto e desviou o olhar, para Eric.

–Eric Jackson, ou melhor dizendo, Eric Palmer. É mais parecido com Dora do que imaginava. Sempre quis conhecê-lo pessoalmente, muito prazer - Robert levantou a sua mão para cumprimentá-lo. - É falta de educação recusar o cumprimento de um velho homem. - Então Eric a apertou e ele se afastou, voltando seu olhar pra mim. - Receio que tenha um interesse mútuo pelo que vou lhe falar, principalmente para William. - Ele não olhou para Will.

–Se você sabe porque estamos aqui, então sabe que estamos perdendo tempo.

–Oh, não, não estão. Na verdade, estou aqui para adiantá-los.

–Nos adiantar? - falou Will.

–Eu sei aonde sua mãe e sua irmã está

–A preço de que? - perguntei.

Robert nunca ajudava alguém sem uma retribuição.

–A preço nenhum. - Robert nos encarou. -Austin está desaparecido.

–O quê? - De repente, me aproximei o suficiente para olhar no fundo de seus olhos.

–Despertei o seu interesse?

–Nós estamos falando de Austin, de uma criança. O que que aconteceu com ele? Como ele desapareceu?

Uma imagem de Austin, do menino prodígio se materializou na minha cabeça, da mesma maneira como eu me lembrava dele, sempre vestindo um jeans que ia até a altura da canela, uma camisa polo, as bochechas fofas e rosadas com o cabelo comprido e cacheado. Lembrei-me da última vez em que o vi, em sua casa na cidade vizinha chamada Florence. Austin estava vivendo a sua vida novamente, com a mãe e me deu pulseiras que bloqueava o sinal de rastreamento do meu chip.

Foi o seu último, dentre muitos presentes para mim.

–Um grupo de homens armados, - disse Robert, despertando novamente a minha atenção. - invadiu sua casa e infelizmente, o capturou.

–Como você pode deixar isso acontecer? Pensei que a casa dele estivesse sendo vigiada vinte e quatro horas por dia! - falei, sem perceber que aumentava o volume de voz. Robert odiava quando alguém fazia isso e seu rosto estava rígido, com um olhar escuro e raivoso.

–Quanto mais se exaltar, mais iremos demorar. Sugiro que reveja os seus modos para que possamos prosseguir com a conversa. - Robert soltou as duas mãos de trás das costas e ajeitou o colarinho. Robert era alto, uns sete centímetros a mais do que eu. Seus cabelos rigidamente penteados estavam voltados para trás e o vento os desbotavam do lugar.

–Me desculpe. Eu não quis ser rude. Podemos continuar? O que você quer de nós?

Robert olhou por trás dos meus ombros e voltou a ajeitou as mãos novamente para trás.

–Zachary Hill sequestrou Austin e o colocou junto com Brittany e a filha. Preciso que você o resgate para mim. - disse rigidamente.

Ainda não se passaram quarenta e oito horas... Como ele pode fazer isso? Zachary não era um homem de palavras, ou simplesmente era impaciente.

–E por que você mesmo não mandou as suas equipes para o resgate? - A saliva em minha boca tinha um gosto amargo e senti cada segundo passar como um carro sem freio. - Por que... - olhei para trás dele - esse arsenal todo? Não podia ter ligado ou algo do tipo?

–Um homem de honra precisa mostrar a sua presença física para que o outro também o honre. - Senti Will e Eric inquietos atrás de mim. Eu sabia que eles podiam ouvir tudo e que queriam que Robert revelasse logo o local. - Hill só deixará que entre sozinha, caso o contrário, ele explodirá o lugar.

–Explodir o lugar? Quer dizer que o local... - franzi o cenho - está cheio de explosivos?

–Sem chances dela ir sozinha. - grunhiu Will e logo se posicionou ao meu lado. - Há alguma maneira de desarmar o local?

Robert não se surpreendeu com a abordagem de Will e de repente, vi no seu olhar algo de estranho, uma coisa que nunca vira o velho transmitir antes. O momento foi tão rápido que passou de despercebido.

–Não acha que já não teríamos feito isso, William? Não subestime o seu velho. - Olhei para ele, confusa. - Zachary sabe o quanto Austin é essencial para nós e está levando a sério a sua mensagem.

–Para você, ele é essencial só para você. - falei

–Como podemos saber que isso não é uma armadilha? Você já ordenou a morte de nós dois, como vamos saber que isso não é mais uma blasfêmia? - as palavras foram cuspidas da boca de Will. Depois daquele dia em que contei toda a verdade a ele, de como Robert me usou e torturou por durante um ano, Will o detestou ainda mais.

–Saiba que está perdendo tempo. Ligue para a mãe do menino se quiser, ela irá confirmar a história, vocês saberão que estou dizendo a verdade, ou não teria vindo pessoalmente para correr o risco de ser morto. - Robert soava frio e indiferente.

–Que bom que você sabe que não somos amigos.

–Você é uma pessoa boa, William. Lamento não termos nos conhecido antes. Seu pai o teria criado de uma maneira mais apropriada. Ele não tinha maldade no coração.

Will congelou. Olhei para ele e segurei o seu braço para confortá-lo. Ele fitou Robert com os punhos cerrados e seu olhar era mortal.

–Meu pai?

–Precisamos ir agora, antes que mais alguém se torne um alvo.

Robert estava prestes a se virar quando Will puxou o seu braço. A fileira de soldados apontou as suas armas para ele e senti um frio na barriga ao imaginá-los puxando o gatilho.

–Me diga a verdade.

–Honra o que acabei de lhe oferecer e irei honrar o que você quer saber.

–Robert, Will merece saber a verdade. - Encarei-o - Você nos deve a verdade.

–Me perdoe se eu for grosseiro, pessoas sábias não adquirem dívidas pelo qual não compreendem o valor, dívida é uma coisa pelo qual se deve pagar, porém, aqueles que são tolos, concordam em se endividar, pois não possuem valor próprio, e eu, não devo nada á ninguém. Então, podemos continuar com a viagem ou querem se sentar para um longo bate-papo?

~Peter~

Jorrei o resto do cereal de bolinhas coloridas no leite, até os farelos do fundo do saco. O leite da tigela rapidamente mudou de cor. Pena que não ficou colorido, meu dia começaria tão bem se eu engolisse um arco-íris...

Olhei para o calendário preso com um ímã na geladeira e observei o círculo vermelho marcado com canetinha no dia de hoje.

02/12/13.

Era uma ótima data e tinha mais números com círculos em volta.Depois tinha um nos dias sete e oito de dezembro. Significava que os The Rockers iriam tocar em algum lugar pela cidade, ou que abriríamos algum show de alguma banda ou cantor que estivesse passando por Phoenix. Os círculos vermelhos eram reflexos do trabalho que temos feito nas últimas semana com a gravadora, que também está trabalhando bastante para nos promover. Duck está trabalhando em algumas músicas originais escritas por nós quatro e, todas as reuniões tem dado certo. Exceto quando Donald faz alguma piada sobre o quanto o cabelo de Potato está rídículo.

Potato, o garoto forte que sempre raspou a cabeça, está deixando o cabelo crescer. Quero dizer, o quão bizarro é isso? Imagine uma melancia com fios de cabelo, ou uma uva, ou um ovo com cabelo? Imagine qualquer superfície lisa e brilhante com algum tipo de pelo. É a mesma coisa que o senhor batata sem o bigode. Fica muito bizarro. Porém, tentamos ao máximo evitar piadas. Potato diz que é para criar uma boa imagem de si quando virarmos astros da música e que as meninas preferem homens de cabelo do que sem. Pra falar a verdade, ele fica ridículo com cabelo e mais durão careca, talvez ele só esteja alucinando.

O nosso produtor já providenciou panfletos para espalhar por todo o Arizona e logo, quando terminarmos o colegial, poderemos ir á Los Angeles, ou Londres, onde quisermos. Em uma votação, estamos empatados, então será pelas circunstâncias.

Esperei a minha vida toda por isso. Desde o dia em que ganhei aquele pequeno violão, desde quando toquei os meus primeiros acordes. E nada poderá me impedir, nem minha mãe, nem o meu pai, nem ninguém. Dessa vez, as coisas estavam realmente dando certo.

O meu celular começou a tocar e confiro a mensagem que recebi de Potato. Era a última semana de aula antes do recesso de inverno e combinamos de fazer uma pegadinha com os calouros antes de partirem para as férias.

Quando terminei o café, jogo a tigela na pia e ouço passos vindo da escada. Inclinei a cabeça para saber quem era, mesmo já sabendo de quem se tratava.

Era o meu pai.

Seus passos eram pesados, sempre foram.

Após confessar que se mudou para Phoenix para se reatar com a minha mãe, eles estão vivendo como se nunca tivessem se separado ou tido aquelas agressões verbais. Me lembro claramente das brigas que os dois tinham, há uns bons anos atrás, quando eu mal sabia o que significava a palavra ''porra''.

Nunca irei me esquecer de como os dois gritaram um com o outro, ou como ele disse que não a amava mais. A relação dos dois era e sempre será complicada, ou talvez seja só o amor. Então eu volto a me lembrar de Danna Walker e de como ela conseguiu enganar todo mundo. Eu deveria parar de pensar nela, mesmo tendo todos os motivos possíveis do mundo, mas eu não sou forte para isso. Todo mundo diz que uma garota como ela, que foge e que não me dá valor, não merece o valor que eu dou para ela. Todos dizem que após a banda estourar em sucesso, muitas meninas viriam atrás de mim, fãs e muitas fãs. Mas eu não sou todo mundo, como filosofa a minha mãe. Não devo ouvir todo mundo, mesmo que eles tenham razão. Mesmo quando a minha própria mãe está incluída no ''todo mundo''.

A última vez que a vi, foi no hospital, quando ela foi torturada. O pensamento fez com que eu soltasse uma expressão igual ao das pessoas que ingerem algo amargo. O estado dela estava feio, mas ela não estava feia, não para mim.

Eu enfrentaria aquele mundo por ela. Eu seria capaz de fazer tanta coisa por ela...

E estava desesperado em vê-la de novo. Pelo menos uma última vez, para gravar o seu rosto na minha memória, para se um dia, ela não aparecer nunca mais, eu não a esqueça. E isso está acontecendo.

–Acha que foi bem nos testes? - a voz de Harry me despertou de meus pensamentos. Ele vestia uma camisa de flanela, jeans caqui e seu cabelo grisalho estava bagunçado. Seu cabelo sempre estava bagunçado de manhã. Para um pai quarentão, ele era estiloso e ainda estava em boa forma. As pessoas dizem que me pareço com ele, apesar de não ver nada similar em nós.

–Não sei. Mas eu estudei, se foi o suficiente, eu não sei.

Ele passou por mim e foi até a pia, lavar a minha tigela.

–Todo esforço vale a pena. - ele me lançou um sorriso. Sim, era difícil me acostumar com aquilo. Meu pai some, e depois aparece, como se tivéssemos comprado ele em uma loja.

–Minha mãe está acordada? Ela não tem um julgamento hoje?

–Sim, ás nove. Ela já está se arrumando.

–Bom, volto mais tarde pra pegar as coisas do show.

–Tentaremos chegar lá a tempo, tenho alguns negócios para resolver no centro e não sei quanto tempo vai levar.

Harry está dando uma de pai atencioso e bonzinho.

–Tudo bem. Não vou ficar chateado se não aparecerem, é só um show.

–Não é só um show. É o seu show. - Miranda apareceu e ficou ao lado de Harry e seus olhares se encontraram por um breve momento. - Queremos testemunhar seus primeiros shows para contarmos no futuro o quanto você se esforçou e o quanto nos deixa orgulhosos.

O humor da minha mãe é sempre uma surpresa.

–Ou seja, queremos estar do seu lado quando ganhar o primeiro Grammy, queremos assentos na primeira fileira ao lado da Beyoncé e Justin Timberlake. E também queremos um discurso de agradecimento com os nossos nomes. - Harry se virou e envolveu a cintura da minha mãe com o braço. Um gesto desse na minha frente? Eles nunca fizeram isso.

–E eu quero poder mover objetos com telepatia.

Me virei para a sala pra pegar a mochila. Potato chegaria a qualquer momento.

–Ah qual é, seja positivo. Nós acreditamos em você. Acredite em você também.

Dei um rápido aceno com a cabeça para eles e voei porta a fora. Aquele clima era meio esquisito. Na verdade, muito esquisito.

A melhor parte é não ter mais que aturar Phillip. Aquela abóbora ambulante cheia de sardas era o capeta em pessoa, e não ter que mais chamá-lo de irmão, era uma das poucas dádivas que um garoto de dezoito anos receberia.

Era uma pena ele ainda estar no Arcadia High School, depois que meu pai deu um fora na mãe dele, pensei que iriam voltar pra Los Angeles.

Esperei por Potato na esquina da outra quadra de casas para facilitar a sua rota e ele chegou cerca de cinco minutos depois. Com a sua careca e os tufos de cabelo. Me controlei para não rir.

–Não ria. Se eu ouvir algum som, eu te soco até a sua carne ficar bem macia.

–Ah não, por que eu iria rir? Não tem nada de engraçado por aqui que seja motivo de risada, você sabe né? E sabe que eu quero muito rir mas que não posso porque provavelmente você me expulsaria do carro?

–Exatamente. Você é um menino muito sagaz.

Patrick entrou no estacionamento amplo ao redor do prédio do Arcadia High School, doze minutos depois. O colégio ficava no centro residencial de um bairro de classe média alta, no qual eu não fazia parte. Os alunos se aglomeravam em diferentes lugares do estacionamento para discutir ou fofocar, a maioria era garota, e me lembrei do último ano que estive aqui, antes de fugir para Londres.

As pessoas ainda nos perguntam o por quê de Londres se tínhamos Los Angeles e Atlanta como ponto de referência. A questão é que não há tantas oportunidades assim, essas duas cidades estão lotadas de grupos musicais e cantores talentosos em busca de oportunidades, e com muita, muita sorte, talvez alguma surgisse para nós.

Não queria que o The Rockers se tornasse apenas uma banda que escreve músicas boas de vez em quando para fazer aquele sucesso pequeno entre uma cidadezinha e outra. As melhores bandas do mundo surgiram em Londres, como os Rolling Stones e os Beattles, não que sejamos tão bom quanto, mas era esse tipo de sucesso que queria, daquele que arrasta multidões de fãs por todo o mundo, fãs apaixonados por nossa música. É o que eu quero e que vou conseguir.

–Sabe aquela gata que tem um lenço sempre preso nos cabelos castanhos, e que anda com mais duas garotas que não tem o menor senso de moda? - perguntou Potato entrando numa vaga de baixo de uma árvore, no fundo do estacionamento.

–Hum... sei. Michelle Dexter, realmente muito gata. O que tem ela?

Ele me fuzilou com os seus olhos para mim, como se quisesse me espancar ou algo do tipo. Dei um leve sorriso para ele na tentativa de não virar um saco de areia.

–Convidei ela pra sair. - Ele tirou a chave da ignição e saímos de seu carro andando um do lado do outro. Pessoas corriam para todos os cantos com os celulares na mão. Logo na esquerda, havia um grupo de meninas se posicionando para tirar fotos, todas sorridentes, o que me fez lembrar de já ter sido assim. Já do outro lado, um garoto de cabelos cacheados e com roupas desengonçadas, carregava uma grande máquina de alguma coisa que eu não sabia para o que servia. Provavelmente para algum trabalho de ciências ou física.

–Ela disse que não? - passei a mão nos cabelos -que precisavam de um corte- para ajeitá-los.

–Ela disse que sim. E vai para o show hoje. - senti Potato sorrindo, e ele quase nunca esticava aqueles lábios.

–Não brinca? Esse é o meu garoto! - empurrei-o com o braço, mas seus músculos duros e tensos causaram uma dor horrível nos meus. Tentei disfarçar com um sorriso.

–Frangote.

Entramos no pátio e o som de pessoas conversando encheu os meus ouvidos.

–Todo mundo merece um presente de natal, não é?

Ele entendeu o que eu estava falando e rapidamente mudou de assunto.

–E quem disse que você não merece um presente de natal também? Olha aquela mina ali - ele apontou com o dedão sobre os meus ombros e me virei para ver para quem ele apontava. - Alex Graham. Um metro e setenta, olhos e cabelos castanhos, grandes pernas e um bumbum bem definido. - Ela estava de salto, tinha as expressões suaves e vestia um cardigã e uma saia na altura dos joelhos.

–Cara, aquilo é artificial.

–Como você sabe que é artificial? - perguntou espantado.

–Porque eu conheço ela. Já tivemos um... não tivemos nada, só nos beijamos uma vez e eu pude sentir aquilo. E não é de verdade.

–Ah, eu me lembro. Foi naquela viagem que fizemos até o Utah, quando todo mundo estava na fogueira e vocês dois sumiram. Agora eu sei o por quê.

–Não foi nada demais, eu estava no banheiro e nos esbarramos sem querer. Ela estava afim, eu estava afim, e rolou. Não foi nada muito...

–Ta, ta. - Potato olhou ao redor, em procura de outra pessoa. - Que tal aquela? - ele apontou com o queixo para a esquerda. - Maggie Campanella.

Eu me lembrava desse nome também. Maggie era ruiva e era baixinha, não muito inteligente, mas também não era líder de torcida.

–Beijei ela na festa de James. No verão retrasado, estávamos bêbados e no dia seguinte, ela agiu como se eu fosse um estranho que nunca viu na vida. E é bem metida.

Potato me olhou incrédulo.

–Você e Maggie Campanella? Isso está ficando interessante, Peter. Vamos tentar de novo.

Olhei ao redor procurando, junto com ele, até que apontou outra vez para a esquerda. A multidão de alunos se dispersava enquanto o sinal tocava.

–Lá. Molly espinafre.

Molly tinha esse apelido porque certo dia apareceu no Arcadia com um monte de espinafre entre os dentes e não percebeu até que um de seus amigos do clube a avisou. Era constrangedor dizer para alguém sobre coisas assim, mesmo para um amigo. Ela sempre andava com uma meia três quartos branca e um tênis esquisito. As duas tranças pretas a deixava mais estranha ainda.

–Bem, na verdade...

–Não me diga que você beijou ela também? Meu Deus Peter, tem alguém nesse colégio que você ainda não beijou? - começamos a andar até o andar superior.

–Nós não nos beijamos. Longe disso! - enquanto subia, uma menina com os braços cheio de livros esbarrou em mim e nem sequer pediu desculpas. - É que... ela me viu pelado.

Potato começou a rir e depois a gargalhar.

–Qual é a graça? - perguntei, chegando ao meu armário.

–Você tentando transar com Molly espinafre.

Após colocar a senha, peguei os livros e seguimos para o armário de Potato, no fim do corredor.

–Eu não estava tentando transar com ela, isso foi há muito tempo! Wesley convidou algumas pessoas para jogar verdade ou consequência quando éramos calouros e o babaca aqui, escolheu consequência. Tive que sair pelado na rua e correr dois quarteirões. A minha sorte era que estava de noite, mas o por outra lado, Molly mora em frente á casa de Wesley e viu tudo pela janela. Quando conclui as voltas, ela estava lá na porta de sua casa, me esperando, olhando para mim como se eu fosse de comer, e ainda elogiou o meu pinto.

–Isso é estranho, muito estranho. Tentaremos mais tarde, acho que estamos atrasados.

Fiz uma careta para ele e seguimos para a primeira aula. Quando entramos na sala, Senhor Papagaio já estava lá. Ele não suportava atraso de aluno, muito menos os meus. Mas Papagaio estava olhando para os papéis em cima de sua mesa e pareceu ignorar a presença de nós dois, então nos sentamos na última fileira, perto da janela, Potato atrás de mim, e esperamos pela bronca. Mas ela não veio e ele sequer...

–Peter Mayer, está atrasado. - tudo bem, Senhor Papagaio não foi abduzido por extraterrestes, não que fosse uma ideia ruim. - Já reservei um trabalho para você. - ele levantou o olhar e me fitou. Odeio quando ele só se dirige á mim, porque Potato também chegou atrasado.

–Me desculpe Senhor Pa... Lewis. - Chamamos tanto ele de Papagaio que quase me esqueci do seu nome verdadeiro. - Problemas em casa.

Essa era a famosa desculpa de que seus pais andaram brigando ou que seus pais estão com problemas, quando na verdade, você estava no pátio falando sobre garotas.

O professor de história é dono de um nariz enorme que parece crescer a cada ano. Com a sua postura rígida, ele emagrecia ao mesmo tempo que envelhece, os fios de cabelos brancos já não era novidade e alguns alunos afirmam que ele está próximo de uma aposentadoria.

–Sabe Sr. Mayer, não é nada sugestivo os seus atrasos. - ele começou a caminhar em minha direção com uma pilha de folhas brancas no braço, e entregou algumas para alguns alunos ao meu redor. No momento, a atenção de todos estava voltada para mim, o que me fez ficar irritado. - Porém, há outras coisas mais que se sobressaem.

Por fim, ele chegou até a minha carteira e colocou uma folha em cima da minha mesa. Era a prova final de história. Arregalei assim que pus os meus olhos na letra enorme da parte superior da folha, indicando a nota. Senti que Patrick se esquivava para ver e ouvi o seu ar de espanto.

–Meu Deus playboy, um A em história? - comecei a analisar todas as questões com os certos marcados em caneta vermelha.

–Isso é inacreditável! Eu odeio história...

–Não é inacreditável sr. Mayer. - disse Papagaio me fazendo perceber que ele ainda estava na minha frente. - Você me surpreendeu garoto, meus parabéns pelo esforço, me sinto honrado por poder te dar um A pelo menos uma vez na vida.

Tudo bem, meu professor de história, aquele que tem um histórico rígido de reprovação, acabou de me elogiar ou o que?

–Eu poderia te dar um beijo agora mesmo.- falei, erguendo as sobrancelhas para ele.

Os alunos começaram a dar risadinhas, e senti os olhos de Papagaio se arregalando, mas ele logo voltou para a sua postura, terminando de entregar as provas.

–Sou casado sr. Mayer, sinto muito.

Quando virei a folha para analisar as últimas questões, me deparei com uma observação.

''Estou orgulho de você Peter Mayer, suas respostas foram dignas da nota mais alta.. Estude assim até o próximo verão.''

A mensagem me fez sorrir e percebi que Papagaio não queria acabar com a sua reputação espalhando elogios por aí em público, e para mim, então resolveu escrever.

Mas aquilo não foi a coisa mais estranha que aconteceu no Arcadia. As coisas mudaram tão drasticamente desde quando Dianna, Danna saiu que se ela voltasse, não acreditaria no que estaria vendo. Aquele amigo dela, Jimmy, parou de perguntar por ela, até mesmo ele não aguenta mais seu desaparecimento e a vida não pode parar. Jimmy começou a sair com um garoto chamado Tod e parece estar bem feliz com o novo companheiro.

Descobri que as líderes de torcida e o time de James repetiram o ano porque também fugiram. Para onde, eu não faço ideia, mas o problema envolveu a justiça federal e grandes autoridades, o que deu um grande, grande problema. Alguns dizem que foram parar numa casa para menores de idade até os pais fazerem algumas ligações.

Mas nada disso se compara ao que aconteceu algumas semanas atrás.

Lauren apareceu com o seu cabelo natural no Arcadia, longos fios castanhos escuros, sem nenhuma pista de que já foram oxigenados. Ela saiu do time das líderes de torcida e está vivendo como qualquer estudante normal, até parou de usar roupas que mostram o umbigo. No dia em que ela saiu como uma garota normal de seu carro, Lauren arrancou suspiros até de mim. Ela estava linda e com uma pele delicada como a de um bebê, sem nenhum tipo de maquiagem e eu nunca a tinha visto tão... Natural. Ela virou assunto por dois dias, mais do que quando ainda loira e até me cumprimentou como um ser humano normal. Lauren também terminou com James, deixando o tão furioso que foi suspenso por descontar no vestiário masculino.

Isso, é a coisa mais estranha que aconteceu no Arcadia, todos especulam, uns dizem que não é a Lauren, e sim uma sósia, outros afirmam que fizeram uma lavagem cerebral nela enquanto dormia, mas ninguém sabe de verdade o que aconteceu.

Mais meio ano, mais meio ano, mais meio ano. As férias de inverno começam na semana seguinte e junto com ela, vem a virada do ano, o que significa que logo estarei fora do colégio, para sempre.

É um alívio.


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Notas finais do capítulo

Já que está acabando, vou escrever algumas cenas deletadas no final para explicar esse paradeiro de Lauren.



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