Diary Of A Journalist escrita por Shorty Kate


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Como sempre os rapazes divertem-se e desta vez aproveitam-se do pobre do Brian...



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(…)

–Tudo bem então?

–Tudo…- Virei-me para que ele não visse o sorrisinho que ia esboçar. – Johnny love. – Ele gaguejou qualquer coisa (só o Paul o chamava assim, daí o espanto dele!) e eu repliquei. – Eu disse que tu e o Paul pareciam um casal…

Sempre odiei viagens de comboio. Deixam-me melancólica e sonolenta e essa sensação fica em mim mesmo após a viagem acabar. E para piorar a situação, uma viagem que deveria demorar quarenta e cinco minutos, no máximo, uma hora, estava de momento suspensa. O comboio deu um solavanco e parou no meio do nada. Aparentemente tinha acontecido um problema e ainda não sabiam quanto tempo demorariam a resolvê-lo. Graças que estava acompanhada com os Beatles; com eles não há um instante morto. Um deles trouxe um baralho de cartas e então nos entretemos a jogar.

Aprendi umas coisinhas naquele jogo. Os vencedores alternavam única e exclusivamente entre o John e o George. Mas Lennon era o maior batoteiro que já tinha visto, tendo sempre literalmente uma carta escondida na manga. Já o George era bom, não sei, se calhar habilidade de guitarrista na ponta dos dedos, mas ele era bom mesmo. Não posso dizer se ele fazia batota porque nunca vi, ao contrário do John, que vi pelo menos quatro vezes a tirar uma carta da manga do casaco, e ele todas as vezes negou.

Agora, o Paul e o Ringo eram o extremo completamente oposto um do outro. Se o Ringo tinha sempre uma sorte inexplicável com as cartas que recebia, o Paul não podia dizer o mesmo. O que o safava era ser um bluffer espetacular, que conseguia aguentar até à última, mas que acabava por desistir por ter fraco jogo. Com o Ringo, cheguei até algumas vezes a ir ajudá-lo, tapando-lhe a boca para ele não sorrir. Ele simplesmente não conseguia esconder o sorrisinho quando tinha uma boa mão, e todos acabavam por o apanhar. Eu fiquei maioria das vezes a ver os jogos, e acabamos por chegar ao nosso destino eventualmente…só que chegamos lá três horas depois!

Eu saí do comboio como passageira normal, ignorando toda a gritaria, choro e ânsia das fãs. E eles saíram também, muito descontraídos, acenando como se fossem a rainha. Pelos vistos aquelas manifestações eram prática habitual do dia-a-dia, e os rapazes aprenderam a viver com isso. Chegamos ao hotel, exaustos, e eles queriam sair do quarto logo após saberem que o hotel tinha uma piscina exterior. Porém, o Brian impediu-os de ir, pelo menos nas próximas horas já que havia ainda muitas fãs do lado de fora. Os nossos quartos eram seguidos, e eu acabei por me juntar a eles para passarmos a tarde.

Os rapazes andavam nos seus afazeres, e eu admito que não consegui perceber quais eram porque eu só tenho dois olhos e seguir aqueles quatro irrequietos não é fácil. Só sei que o Ringo estava à janela, a acenar às fãs e o George apenas lhe dizia enquanto fumava.

–Sai daí! – Ringo ria-se na cara, claramente a espicaçá-lo. Depois entendi que George Harrison e gritaria não resultavam muito bem. O garoto, um ano mais novo que eu, sorria ao ouvir as fãs berrar, mas por dentro estava desejoso por lhes tapar a boca. Era de entender: não devia ser fácil ter vinte anos e centenas de raparigas a berrar o nosso nome. Mas ele não se importava muito com isso; ele é bom e sabe disso, pelo menos não é gabarolas. Percebi, embora com alguma pena, que ele, ainda tão novo, tinha três paixões: a guitarra, a comida e o tabaco. Se ele continuasse a fumar àquele ritmo, não sei quantos mais anos duraria…

E foi então que ele tirou a vez ao John no papel de piadista e fez ele uma peripécia. Ele pegou no pente e penteou o cabelo da frente para trás. O que ele não contava era ficar com o pente embrenhado no espesso cabelo.

–Há quanto tempo não cortas o cabelo mesmo? – Eu perguntei, aproximando-me dele que se estava a ver ao espelho e fazendo umas caras feias enquanto tentava tirar o pente.

–Algum…Muito! – Ele esperneou um bocado quando eu puxei o pente. – Mas a Betty não veio hoje.

–Confias-me uma tesoura? – Eu perguntei séria.

Ele encolheu os ombros. – Acho que sim…

Enquanto ele foi procurar uma tesoura, o Ringo continuava a caminhar de lado para lado, alegando que o quarto deles era muito mais pequeno que o meu. E eu, pela sexta ou sétima vez expliquei que eles tinham que partilhar o quarto, daí ele parecer mais pequeno. Mas ele continuava sem se acreditar, voltando a acenar à janela, para depois volta a contar as passadas e insistir comigo mais uma vez.

–Há alguma coisa que não saibas fazer? – Pela primeira vez deitei os olhos no Paul que estava sentado na beira de uma das camas, a desenhar.

–Sei fazer um bocadinho de tudo. – E tomei um lugar ao lado dele. – Mas já perdi a prática em algumas, como por exemplo, desenhar.

Ele pôs o lápis na minha mão e agarrou nela, fazendo-me desenhar uns riscos. Vi que ele desenhava as feições de uma pessoa e que levantava os olhos. Então decidi fazer o mesmo e percebi o silêncio e calma que reinava no quarto: o Paul desenhava o John. – Uau, ele está bem quietinho! – O Paul riu com o meu comentário, mas o outro nem reagiu. – E vestido? Achei que com tanto atrevimento ele fosse posar nu!

–Não lhe dês ideias, por favor!

Continuamos a desenhar a duas mãos enquanto o George foi molhar o cabelo para que eu o pudesse cortar. Quando ele regressou, enxugando-se com uma toalha, penteei-lhe o cabelo para que ele percebesse o quão comprido estava, cobrindo-lhe já os olhos. Então, finquei os dedos pelos fios de cabelo e acabei por lhe fazer um popa na brincadeira. O John levantou-se e entrou na casa de banho enquanto o Paul disse:

–Ele já teve assim o cabelo, no tempo de escola ainda. Era o estiloso do pedaço!

Ele riu e olhou-se ao espelho. – Hei, o que acham que o Brian diria se eu fosse amanhã para o concerto assim?

Ringo olhou para trás e comentou. – No mínimo matava-te!

–No máximo matava-te e despedia-te! – O sarcasmo tomou conta do Paul.

–Ou na melhor das hipóteses, - Ouvi a voz do John a vir da casa de banho e ele vinha a secar o cabelo, tentando fazer o mesmo penteado que o George. – ele desmaia e nós rimo-nos um bocado! – Ele olhou para mim e inclinou a cabeça. E, assim, sem mais nem menos, o Ringo saiu da janela e o Paul largou o lápis. Ambos entraram na casa de banho e vieram a tentar imitar o penteado dos outros dois. -Podes ir chamar o Brian? - Porque é que tinha a sensação que estava prestes a meter-me numa alhada? -Olha, - O John disse com um largo sorriso ao ver o Brian entrar na porta. – os penteados são definitivos. Gostas?

Eu fiquei completamente chocada com a reação do Brian. O homem caiu redondo no chão, os rapazes riam divertidos e eu continuava pasma. – Espero bem que ele só tenha desmaiado. É que não quero ser cúmplice de homicídio! Nem sei como esconderíamos o corpo.

–Quanto a isso não há problema, - Ringo disse, espreitando à janela. – tem ali fora uma boa centena de pessoas que não se importariam de se livrar do corpo dele por nós!

–Sai daí e para de acenar senão parto-te a mão! – O George bufou irritado.

–Precisamos de um baterista, Georgie. – O Paul advertiu. – Não lhe partas a mão!

–Eu penso noutra coisa então!

–Vocês são incríveis. – Eu resmunguei. – O homem ali desmaiado no chão e vocês na mais amena cavaqueira como se nada fosse. Eu vou buscar-lhe um copo de água e quando voltar é bom que ele esteja sobre a cama.- Quando voltei eles tinha obedecido ao meu pedido e deixei o copo sobre a mesa-de-cabeceira. – Vá, venham lá cortar o cabelo antes que ele acorde e tenha outro ataque!

Quando o empresário voltou aos seus sentidos, já Paul, John, George e Ringo tinham os cabelos cortados e no seu penteado original. Devo dizer que os mais fácies de aparar foram os do Paul e do Ringo pois eram cabelos muito finos. Se bem que o baterista não me deixava a início tocar-lhe no cabelo. Fiquei a saber que ele tinha complexos com pessoas a mexer-lhe no cabelo, nos anéis, na bateria, tinha complexos em ser pequeno e com o nariz. Citando o John, ele simplesmente tem demasiados complexos! Era óbvio que tanto ele como os outros estavam a exagerar.

–Então, - Eu disse, agarrando o copo de água enquanto me sentava na beira da cama. – melhorzinho?

Brian levantou a cabeça, aflito. – Onde é que eles estão?

–Estão aqui, Brian. – Eu apontei para o fundo da cama onde os quatro estavam de pé, sorrindo. – E todos com o cabelo direitinho!

–Desapareçam-me da vista! – Ele rosnou entre dentes. – Desapareçam antes que eu vos mate pelo susto que me pregaram!

–Podemos ir para a piscina então? – O John perguntou que nem criança.

–Desapareçam, simplesmente vão. – E antes que eles saíssem da porta, ele disse rapidamente. – Mas voltem!

–Vens também?

–Talvez depois. – Eu respondi ao Paul. - Agora vou ficar um bocadinho com ele e vou escrever umas coisas.

Brian deixou a cabeça cair sobre a almofada, suspirando. – Oh, Deus, eles matam-me! Isto foi ideia do encrenqueiro do John, não foi?

–Os outros alinharam também-

–Mas é claro que alinharam. – Ele interrompeu-me, sentando-se na cama e arrancando da minha mão o copo. – O que um fizer os outros seguem! E pior ainda quando vem do Lennon. Mesmo que todos sejam igualmente importantes e talentosos, ele é como se fosse o líder da banda, logo eles seguem atrás dele. E pior é que ele parece que tem gozo em me azucrinar!

–Eles seguem-se assim tão facilmente?

–Se um se atirar de um poço, os outros vão atrás. – Brian tomou mais um gole de água e eu senti que a frase não estava acabada.

–Nem que seja para o salvar…

–Nem que seja para o salvar. – Ele repetiu depois de mim, perdendo-se vagamente. – Eles são que nem irmãos, mas irmãos mesmo de verdade. Daqueles que brigam e batem e pregam partidas mas que se defendem uns aos outros com unhas e dentes. Nunca ninguém conseguirá atacar um Beatle e esperar que os outros não reajam. – Eu lembrava aquilo que tinha vivido com eles naquelas horas. Era realmente verdade tudo o que ele dizia, só que eu mergulhei tão fundo nos pensamentos que nem reparei que Brian já não falava.

–Isto vai para a reportagem, não vai?

–Vai pois. Isto é bom! Agora, quanto tempo me vais deixar andar com eles?

–Amanhã durante a manhã e a tarde eles vão ter entrevistas. À noite dão o concerto e seguimos para estúdio na manhã seguinte. – Eu fitei-o, procurando algo mais na resposta dele. – Acho que não fará mal se nos acompanhares.

–Será para mim uma honra vê-los trabalhar. E já fiz a promessa a mim mesma de não atrapalhar em nada.

–Não haveria problema também. Eles quando se concentram trabalham muito bem. Já tiveste oportunidade de os ver em palco? – Eu acenei que não com a cabeça. Era um das coisas que teria ocasião de fazer já no dia seguinte pela primeira vez. – Bem, mas eles lá em cima são sem dúvida os reis. Eles são os senhores. E são autênticos àquilo que são todos os dias: empenhados em dar um bom concerto, interessados em tocar bem e sem nunca se esquecerem de lançar umas piadas! Sou um sortudo por os ter encontrado.

–Depois ainda gostava de saber muito bem como é que os encontraste mesmo.

–Hoje ao jantar terei todo o gosto de contar essa história. - O empresário levantou-se e caminhou para a porta. – Bem, eu vou para baixo, apanhar um bocadinho de ar depois deste susto. Oh, e Kate? – Ele segurou na maçaneta e olhou para mim. – Promete que os tens sempre debaixo de olho quando eu não estiver.

–Vou fazer os meus possíveis, Brian.

Após ele sair deitei-me para trás sobre a cama e fechei os olhos por uns momentos. Estava a ter a maior das sortes: ter a oportunidade de escrever um exclusivo que me poderia, finalmente, garantir carreira, e poder estar com aquele quarteto extraordinário. Achei que fosse adormecer ali mesmo, mas com aqueles quatro, nem tive chance de sentir a melancolia e sonolência que as viagens de comboio me provocam.

Fui até ao meu quarto e peguei a caneta, o caderno e a máquina fotográfica. Ia apontar aquilo que tinha agora ouvido do Brian, e umas coisas ou outras que os rapazes disseram no comboio e que achariam não ter interesse. E, de certeza que ainda terei mais coisas que rabiscar no papel até anoitecer. O caderno ficou já comigo pois sabia que só me levantaria das espreguiçadeiras para ir jantar. E para quê a máquina, perguntam vocês? Ah, quem sabe a fortuna que um dia poderei fazer com umas fotografias dos Beatles só em calções de banho?


                                                                   (Para quem não lembrar o penteado do George Harrison...Imaginem agora o John, o Paul e o Ringo assim também...!)



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Notas finais do capítulo

A Betty era mesmo a pessoa que cortava o cabelo dos nossos Beatles, portanto ela é personagem real e não minha invenção.
Review bem pequenino? Eu aceito qualquer comentário, vá lá. Diz se está gostando ou odiando, diz o que precisa ser melhorado.



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