A Monitora escrita por Aislin Le Fay


Capítulo 2
Monitorando de Álgebra




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15 de Setembro de 2006.

Mais um maldito sábado de aulas, quando deveríamos ter folga no fim de semana.

Mais um bendito volume de jornal publicado, sem que eu tenha feito parte dele.

Mais uma tentativa inútil de estudar matemática, mesmo eu sabendo que isso nunca vai entrar na minha cabeça.

Nota adicional: Odeio a álgebra.

 

    - Vamos lá, Kyoujyu, eu estou implorando – Gemeu o rapaz, no tom de voz mais dramático que conseguira – Eu preciso aprender álgebra até o mês que vem ou vai ser minha cabeça!

    - Sinto muito, Takao, eu estou realmente atarefado por aqui – Respondeu a voz do outro lado – Estamos preparando uma exposição cientifica e todos esses preparativos estão me deixando louco! O colégio é muito puxado, você sabe...

Takao não sabia, mas sabia que jamais iria querer saber. Kyoujyu começara a cursar o colegial em uma espécie de “escola exclusiva para crânios”, como Kinomiya costumava chamar; só aceitava alunos muito acima da média, especialmente os que se davam bem no campo de eletrônica e robótica. O tipo de lugar pelo qual Kinomiya Takao preferiria nunca precisar passar, nem mesmo para uma visita rápida. Todos aqueles CDFs reunidos discutindo sobre circuitos e computadores era mais do que sua cabeça de aluno mediano podia suportar, mesmo após tantos anos de convivência com o pior deles, Manabu(1). Ambos se conheciam desde o primeiro ano do primário, e já então o garoto baixinho e atarracado, de grandes óculos e franja caindo pelos olhos, se mostrava mais avançado do que os outros alunos da sala. Era sempre ele quem ajudava Takao com os deveres de cálculo, os quais o Kinomiya sempre detestou – e, com o tempo, os outros alunos se acostumaram a lhe pedir ajuda também, o que rendeu a Manabu o apelido de “Kyoujyu”, o “professor”.

Mas agora Kyoujyu estudava naquele bendito colégio especial, na cidade vizinha, e Takao ficara sem seu precioso suporte para matérias chatas, dentre as quais álgebra era a pior das piores.

Jogou-se na cama, frustrado. Agora que Kyoujyu não estava mais disponível para lhe socorrer, ele não teria outra escolha... continuaria tendo aulas com sua ‘adorável’ monitora de álgebra.

 

&&&

 

    - Kinomiya-kun, está atrasado mais uma vez. O sinal tocou há um minuto – Disse Keiko-sensei.

A professora era uma pessoa afável e gentil, e não se importava realmente com os pequenos atrasos constantes do aluno, contanto que ele chegasse antes que a aula começasse. Na verdade, parecia até mesmo achar graça no modo como o rapaz chegava, sempre esbaforido e derrapando pelo piso. Era quase um ritual: ela entrava logo após o sinal, dava um alegre ‘Bom dia’ aos alunos e se sentava à mesa, pegando a lista de chamada. Nesse momento a porta se abria, com um Takao ofegante quase desabando por ela, e então olhando em volta apenas para constatar que, novamente, chegara depois da professora.

Nesse dia não havia sido diferente, e Takao abriu um grande sorriso amarelo ao perceber a professora encarando-o sorridente, como se estivesse apenas cumprimentando-o e não o repreendendo.

    - Hã... Gomen Nasai? – Disse ele, arrancando algumas risadinhas divertidas dos colegas.

    - Desculpas aceitas – Disse Keiko-sensei, ainda sorridente – Agora pode se sentar, Kinomiya-kun, e vamos fazer a chamada.

Obedecendo, ele fez uma pequena referência de respeito antes de se dirigir até o seu lugar, na penúltima carteira, sorrindo divertido para dois ou três colegas que brincavam dizendo “Tenta de novo amanhã, Takao, você consegue!” ou “A esperança é a última que morre, não é, Kinomiya-kun?” quando passava por eles. Como de costume, Max se sentava logo atrás dele, e naturalmente não poderia deixar de estar sorrindo.

    - Foi quase hoje, hein, Takao? – Disse, ao mesmo tempo em que Mao, na carteira ao lado, respondia um “Presente!” – Qual foi problema dessa vez, um carrinho de cachorro-quente no caminho? – Brincou, rindo.

    - Falei com Kyoujyu – Ele gemeu, lembrando do motivo de sua frustração anterior – Ele não vai poder me ajudar.

    - Eu te disse, ele mal tem tempo para respirar – Max concluiu, em tom de quem sabe de tudo – Eles arrancam a pele dos alunos naquela escola, você sabe.

    - Eu sei – Admitiu, entre dentes – Mas ainda tinha esperanças.

    - Hnn... Acho que você não tem muita escolha agora, ou tem?

    - Não – O outro concordou enfim, resignado – Vou ter aulas com a bruxa, digo, com minha querida monitora – Corrigiu, sarcástico, com uma careta de aversão – Presente, professora.

Max riu, mas logo tratou de abafar o riso e lançou um olhar furtivo para Hiromi, numa das carteiras da frente, como se temesse que ela pudesse ouvi-los apesar da distância.

    - É melhor você não dormir dessa vez – Disse, cauteloso – Parece que o novo cachorrinho da mãe de Tachibana-san destruiu um caderno dela ontem, e, bem, ela não está de bom-humor. Presente! – Disse mais alto, levantando a mão.

Takao grunhiu baixinho, voltando a se virar para frente na carteira.

    - Era só o que me faltava.

 

&&&

 

    - Muito bem, alunos, hora do seu intervalo – Disse o professor de física, Gideon-sensei – considerado por muitos o mais sinistro dos professores do colegial –, quando todos ouviram o toque do sinal. – Estudem o capítulo seis até a próxima aula. – Disse, e sem mais delongas apanhou seus livros sobre a mesa e saiu. Alguns alunos mais afoitos o seguiram, enquanto outros ainda guardavam seus livros ou apanhavam o lanche nas mochilas.

Observando de esguelha enquanto Hiromi guardava cuidadosamente seus cadernos, para que não amassassem, Takao engoliu em seco ao pensar que provavelmente teria que passar a maior parte da tarde cercado por aquele perfeccionismo.

    - Boa sorte, campeão – Max disse, dando uma última tapinha nas costas do amigo antes de sair da sala, sem nenhum obentou. Max preferia comer nas cantinas da escola, onde tinha a opção de se entupir de coisas calóricas, mesmo que Mariam ralhasse com ele por isso depois.

Resignado, o moreno respirou fundo e caminhou lentamente até a frente da sala.

    - Então, Tachibana-san – Ele começou, parando em frente carteira da colega, esforçando-se para parecer gentil – Podemos... continuar nossa aula hoje?

Hiromi o encarou, desacreditada, enquanto terminava fechar sua mochila.

    - Bem, não acho que se possa continuar algo que não se começou, a menos que você esteja me convidando para tirar uma soneca, Kinomiya-kun – Hiromi nunca usava o ‘-kun’ no nome dele, assim como Takao normalmente não colocava ‘-san’ no nome dela, sinal de que percebera sua débil tentativa de parecer mais polido do que realmente era – E se você me dá licença, eu tenho muita coisa pra fazer agora. – Disse, apanhando seu obentou sobre a mesa e se retirando da sala, o que deixava Takao sozinho com suas lamúrias internas.

Que ótimo, Takao, realmente brilhante!” – Pensou, contendo o ímpeto de jogar seus bolinhos de arroz no uniforme impecavelmente limpo da representante – “Bruxa, godzila, chata! Maldita seja você e a sua álgebra!

    - Agora sim eu tô perdido... – Murmurou consigo mesmo, marchando sem ânimo até o pátio.

Quando voltou do intervalo, porém, Takao encontrou um bilhete em cima de sua carteira. “Na biblioteca, dez minutos depois da aula. E nem pense em se atrasar!”. Bom, isso significava ter de encarar aquela bibliotecária insana de novo. Devia ser seu dia de sorte.

Mas aquilo não deixava de ser uma surpresa, afinal, ela tinha deixado bem claro que não queria vê-lo nem pintado de ouro, não foi? Ou será que não? Droga, como as mulheres eram confusas! Por que ela o tinha deixado com cara de tacho se ainda pretendia ensiná-lo? Não poderia, quem sabe, ter simplesmente dito “Tudo bem, nos vemos mais tarde”? Aquela garota precisava de um interpretador!

    - E aí, conseguiu? – Max acabava de chegar, ainda acabando um refrigerante – Ela vai ter dar aula?

    - Vai – Respondeu Takao simplesmente, embora ainda tivesse lá suas dúvidas – Depois da aula.

O outro atirou a latinha vazia no cesto de lixo, antes que o professor chegasse e o visse com a prova do crime. A aula agora era com Balthez-sensei, de matemática, outro que engrossava a lista de temido pelos alunos e extremamente rígido com as regras.

    - Legal, assim você não leva outra bronca do professor por ter conseguido se livrar da pessoa que ele acabou de arrumar para te ensinar. – Disse, divertido.

Takao fez uma careta; não queria nem imaginar a cara de Balthez se soubesse que ele quase perdera sua monitoria.

    - Droga, eu tinha esquecido isso! – Exclamou, desarrumando os próprios cabelos – Se a Tachibana resolver se queixar para ele, eu sou um monitorando morto!

Max iria responder algo, mas nesse momento toda a sala ficou quieta, quando a porta se abriu e por ela entrou Balthez-sensei, com todo seu poder intimidador em pleno funcionamento.

    - Todos aos seus lugares. – Disse, desnecessariamente, já que todos já estavam preocupados em se sentar o mais rápido possível.

Torcendo para que Balthez não voltasse sua atenção para ele, Takao se encolheu um pouco na carteira, tentando parecer o mais invisível possível.

    - Ah, Kinomiya-kun – Maldito fosse! – Estava curioso para saber como está se saindo nas suas aulas extras de álgebra.

Eu devia definitivamente ter ficado na cama hoje”, pensou Takao, ao perceber como praticamente toda a atenção da sala tinha se voltado para ele. Bom, agora todos já sabiam que ele precisava de aulas extras. Precisava se lembrar de agradecer ao professor por isso, quem sabe, colocando cola no apagador.

    - Então, Tachibana-san – O professor continuou, agora se dirigindo a Hiromi, com um meio sorriso torto que o fazia parecer um tanto sádico – Como o nosso querido monitorando está se saindo?

Takao quase não conteve as ganas de interromper. Se toda a sala ficasse sabendo do incidente na biblioteca, ele com certeza seria alvo de piadinhas sem graça por semanas!

Hiromi levou um segundo para responder, como se ponderasse sobre o que dizer.

    - Estamos começando a progredir, sensei – Disse enfim. Cruzou os braços, lançando um bastante repreensivo olhar de esguelha para o fundo da sala – Mas acho que ainda temos muito trabalho pela frente.

O queixo de Takao caiu ao perceber que o professor parecia extremamente satisfeito pela resposta.

    - Ótimo, ótimo – Disse, dando a volta em sua mesa – Tenho certeza de que vai se sair bem no próximo teste, Kinomiya-kun. Tachibana-san é uma ótima professora. – Concluiu, com seu sorriso maléfico – Você é um rapaz de sorte.

Ele ainda não tinha certeza disso, mas sabia que dessa vez, escapara de um bom apuro.

 

&&&

 

Na biblioteca, Takao tentara, sem sucesso, ler um pouco do capítulo do dia anterior. Desistiu antes mesmo de terminar o parágrafo, como era de se esperar, completamente frustrado. “Isso não é uma matéria, é tortura!” Pensou, insatisfeito.

Ele fora da sala direto para a biblioteca, para não correr o risco de chegar atrasado. Podia sentir o olhar reprovador de bibliotecária para ele, mas definitivamente não queria passar por outra situação como a da aula com Balthez. Ele precisava aprender álgebra, nem que fosse para esquecer tudo logo depois da prova. E se para isso precisasse de ajuda, mesmo que fosse da “sargentona” da sala, bem, ele certamente poderia superar esse trauma depois que estivesse passado por média.

Esperou alguns poucos minutos até que Hiromi apareceu na porta da biblioteca, exatos dez minutos depois do fim do horário, carregando somente o livro da matéria e alguns papéis, além do seu estojo vermelho com corações. O tempo era provavelmente para que pudesse guardar o restante de suas coisas no armário, antes de ir até a biblioteca, Takao concluiu. “Ela está realmente levando isso a sério.

Hiromi não demorou a encontrá-lo, e sorriu com satisfação ao perceber que ele chegara na hora. “Viva,”, Takao pensou, “finalmente marquei um ponto a meu favor.”. Ela se dirigiu até a mesa do rapaz sem muita pressa, sentando-se na cadeira que estava em frente à dele, e pôs o livro sobre a mesa.

    - Então, Kinomiya – Disse, séria – Vai levar a aula a sério dessa vez?

Ele ergueu os olhos, encarando diretamente os olhos castanho-escuro amendoados. Ela parecia ser exatamente o que ele achava que era: enérgica, determinada e tirana.

Sem muito ânimo para discutir, Takao apenas levantou as mãos em sinal de paz, desinteressado. Hiromi fechou um pouco mais a cara.

    - Estou avisando, Takao – Ela resmungou, emburrada, e ele se surpreendeu ao ser chamado pelo primeiro nome – Que se me fizer de boba de novo, digo ao professor que desisto de te ensinar!

Takao sentiu um leve arrepio na espinha ao lembrar-se de como, na aula mais cedo, imaginara as possíveis consequências que isso poderia ter. Sabia que o professor o detestava, assim como detestava a todos os outros alunos por detrás de sua máscara malfeita de simpatia. Balthez adoraria deixá-lo em detenção até o fim do ano, se conseguisse um bom motivo para isso.

    - Estou levando a sério – Murmurou. E, diante do olhar cético da garota, complementou: – Qual é, Tachibana! Eu não quero passar o resto da minha vida em detenção! Vou prestar atenção na aula dessa vez.

    - Que ótimo. – Ela disse, num tom que fez Takao ter certeza de que não levara fé nele, enquanto colocava o livro de pé na mesa, procurando a página que queria. – Sabe fazer gráficos de função?

    - Não. – Admitiu a contragosto.

Ela abaixou um pouco o livro para que pudesse olhá-lo, fitando-o como se fosse um cãozinho que precisava ser domesticado.

    - Esse é o assunto do semestre passado. Você deveria saber.

Takao torceu involuntariamente o rosto em uma leve careta, amaldiçoando mentalmente as noites do semestre anterior que passara jogando Nintendo Wii na casa de Max.

Hiromi não pareceu se importar com a óbvia insatisfação do seu “aluno” (Takao detestava essa palavra), voltando a folhear o livro distraidamente, até achar uma página que parecia lhe interessar. Depois de analisá-la por alguns instantes, sorriu, satisfeita.

    - Aqui. Vamos começar pelo capítulo 14.

Ele concordou com a cabeça, tentando passar a impressão de que sabia, pelo menos, do quê tratava o tal capítulo 14. Mas enfim não precisou fingir, porque Hiromi voltou a colocar o livro deitado, dessa vez virado de forma que Takao pudesse ler.

    - Vamos começar fazendo algumas contas simples – Ela disse, aparentemente empolgada (Fato que Takao atribuía à suposta possibilidade de provar sua superioridade em relação a ele). Ele suspirou, conformado.

    - Certo – Concordou, se esforçando para parecer sério (Na maior parte do tempo lhe diziam que ela parecia um crianção). Pelo menos começariam com os exercícios fáceis, pensou. Não poderia ser tão ruim assim.

 

&&&

 

    - Koniichiwa, Takao-kun!! – A voz de Mao parecia extremamente feliz quando ela adentrou a biblioteca. A bibliotecária lhe lançou um olhar feio, mas a rosada sequer reparou. – Koniichiwa, Hiromi-chan!

Terminando de organizar seus papéis dentro do livro e com um ar igualmente feliz, Hiromi voltou os olhos cor de chocolate para a amiga com um grande sorriso satisfeito nos lábios.

    - Koniichiwa, Mao-chan – Respondeu, observando-a com um ar maroto – E por que tanta alegria agora no fim da tarde?

    - Ah, você sabe. Coisas de repórter. – E lhe dirigiu uma piscadela – Logo logo você vai saber.

    - Hnn, você já me deixou curiosa – A outra disse, rindo, enquanto se levantava com o livro seguro em seus braços – Eu tenho que ir agora, mas nós fizemos grandes avanços esta tarde, Kinomiya-kun.

    Só então Mao reparou que o garoto não parecia tão contente, com a cabeça deitada na mesa, os olhos fixos e calado. Se Hiromi não estivesse tão feliz – prova disso era tê-lo chamado de Kinomiya'-kun' em vez de só Kinomiya – , ela poderia jurar que o garoto tinha dormido em aula de novo, só que com os olhos abertos dessa vez. Não duvidava de que ele conseguisse isso.

    - Hey, Takao – Mao se inclinou de lado para que sua cabeça ficasse no nível da dele – Você ainda tá vivo?

    Só o que obteve em resposta foi um resmungo alto.

    - Ele está um pouco cansado, mas é porque nós estudamos muito hoje – Hiromi continuava sorridente, ignorando a situação – E eu vou pra casa, reconstruir meu caderno de geografia. Sayonara, minna.

    - Jaa Nee, Hiromi-chan! – Mao se despediu, observando a garota se afastar dando 'tchauzinho'. Quando ela sumiu porta afora, voltou a olhar Takao, estranhada. – E você, hein? Entrou em estado vegetativo agora ou o quê?

    - Ela quer me matar, Mao – Ele murmurou de repente, ao que ela ergueu as sobrancelhas – Ela quer me matar e não vai demorar pra conseguir! – Berrou, dramático, conseguindo um “Silêncio!!” da bibliotecária. – Chata, mandona, sabe-tudo... Murmurava

    - Mas de quem você está falando, criatura!? – Mao perguntou, começando a ficar nervosa. Ou talvez fosse só curiosidade de repórter mesmo. Mais provável.

    - De quem mais poderia ser? – Ele a encarou com uma expressão infantil, esperando que ela se desse conta do óbvio. Como a garota continuava o olhando interrogativamente, perdeu a paciência: - A Tachibana!! Ela me odeia e quer me matar! Você não sabe o que passei hoje!!

    Takao achava que não podia ficar mais indignado, mas logo percebeu que se enganara quando Mao começou a rir.

    - Do que você está rindo? – Ele perguntou, emburrado, parecendo uma criança que perdera no vídeo-game.

    - Então é isso? – Ela agora tentava segurar o riso, sentindo o olhar da bibliotecária queimar sobre suas costas – Você acha que a Hiromi quer te matar?

    - Eu não acho, eu tenho certeza. – Respondeu, fazendo sua melhor pose de garoto sério. Mao quase não resistiu a outro acesso de riso.

    - Ah, Takao, às vezes você é tão infantil – Ela balançava a cabeça negativamente – E por que toda essa convicção assim, de repente? Ela te apontou uma arma, por acaso? – Zombou.

    - Há, há, há. Estou morrendo de rir. Ela não me apontou arma nenhuma, mas me fez passar duas horas da minha vida resolvendo páginas e páginas de exercícios de álgebra! Talvez eu até preferisse a opção da arma.

    - Tããão exagerado... Você devia ficar feliz por ela ter tanta disposição em te ensinar, sabia? A prova é em menos de três semanas e, pelo que eu tô vendo, você não sabia de nada mesmo! – Mao comentou, observando a quantidade de papéis de rascunho sobre os quais o rapaz estava deitado há pouco, completamente preenchidos por cálculos, sendo que praticamente todos eles tinham partes rasuradas e corrigidas com a tinta rosa da caneta de Hiromi. Takao bufou.

    - Você deveria estar do meu lado, sabia? Eu sou mais seu amigo do que ela! – Resmungou. – E não fique me lembrando a data dessa prova toda hora, faça-me o favor.

    - Eu sou amiga dos dois, mocinho – Ela corrigiu, juntando os papéis que o moreno aparentemente não fazia questão de arrumar – E você deveria me agradecer, afinal, me deu um bom trabalho convencer a Hiromi de que valia a pena continuar te ensinando, sabia?

    Takao arregalou os olhos para a rosada, incrédulo.

    - Foi você? Você convenceu a Hiromi? Por isso ela mudou de ideia depois do intervalo?

    - Você entendeu rápido!! – A outra riu.

    - Ah... Acho que desperdiçou se tempo – Murmurou, voltando a apoiar a cabeça na mesa – Eu não vou aprender isso nunca! Tô ferrado nessa prova. Eu devia era desistir logo, sabe, falar pro professor que tudo bem ele me reprovar, me expulsar do jornal e tal, eu mereço isso mesmo... – Takao em seu momento emo(2).

    - Ah, mas era só o que me faltava! – Mao bramiu, puxando a gola do uniforme do colega para obrigá-lo a e sentar ereto outra vez – Vai ficar deprimido a essa altura do campeonato? Vamos lá, garoto! Levante e sacuda a poeira! Eu nem ia querer ver se a Mariam te encontrasse nesse estado...

    A imagem da colega e auto-declarada “chefe” o olhando como se fosse um montinho obsoleto de ferro velho o despertou.

    - Aaaf! Não me faça imaginar uma coisa dessas! – Ele se levantou, apanhando sua mochila e entocando de qualquer jeito suas coisas e os papéis que Mao acabara de juntar, amassando-os. Jogou a mochila nas costas. – Tá, você me convenceu. Mas vamos embora que eu só quero cair na minha cama e dormir até Segunda-feira.

    Mao riu, se divertindo com toda a tempestade em copo d'água que o amigo estava fazendo. Takao sempre havia sido muito exagerado.

    - Preguiçoso! Não tem vergonha, não? E ainda se diz um repórter? – Brincava, acompanhando-o para fora da biblioteca – Os jornalistas também têm que estudar, sabia? Você precisa treinar sua mente!

    - E no que saber álgebra vai me ajudar na minha vida, se eu me tornar um jornalista? – O rapaz rebateu, apanhando seus tênis no armário e tirando sem cuidado os sapatos que usava dentro do colégio, para então jogá-los no armário. – Eu vou publicar matérias sobre análise combinatória e vetores, por acaso? – E se abaixou para amarrar os tênis, apertando bem os cadarços, como costumava fazer. Do alto, Mao o encarava com um gesto negativo de cabeça e um “Tcs, tcs”.

    - Que infantilidade. – Comentou, virando-se para abrir seu próprio armário, o último da fileira, mas por pouco não caindo para trás (E por cima de Takao) ao bater em alguém que dobrava o corredor, aparentemente, com pressa o suficiente para não se preocupar com os possíveis “obstáculos”.

    Mao escapou do tombo, mas não conseguiu evitar que sua mochila caísse, deixando escapar papéis, canetas e seu mp3 pelo fecho que ela acabara de abrir para retirar o que iria pôr no armário. Ainda agachado (e por muito pouco não atropelado), Takao espiou acima e reconheceu o cabelo azul bicolor do colega de classe, vestido com o uniforme do time de basquete da escola, indiferente. A rosada levou alguns milésimos de segundo para se recuperar do susto e, percebendo o estrago com suas coisas, encarou o garoto, irritada.

    - Seu besta, olha só o que você fez!! Não olha mais por onde anda não, Hiwatari!?

    Apanhando algumas canetas que, por estar agachado, vira quando rolaram para debaixo dos armários, Takao parou automaticamente para espiar a reação do todo-poderoso Hiwatari Kai. Ninguém gritava com ele, nem mesmo os professores levantavam a voz para o rapaz, mesmo porque todos o consideravam um aluno exemplar, por mais que ele muito raramente prestasse alguma atenção às aulas. (Mas não é que Takao estivesse reparando, é só que os repórteres têm que estar atentos a todos à sua volta!) O infeliz sempre tirava notas altas, mesmo ignorando totalmente as explicações das matérias. Takao não podia nem imaginar como o Hiwatari conseguia fazer isso, mas adoraria poder ver como ele pretendia se safar agora.

Para decepção do moreno, foi mais simples do que esperava. Depois de encarar a garota furiosa por alguns curtos instantes, Kai só se abaixou calmamente e recolheu os objetos caídos com uma velocidade que Takao julgou espantosa, para logo erguer-se de novo, imperturbável, e entregar a mochila agora cheia à dona, que continuava de cara amarrada, batendo o pé. E como ele fizesse menção de sair assim que ela segurou sua mochila, Mao se apressou a bloquear o caminho, ainda irritada.

    - Seu grosso! Você praticamente me atropelou. Peça desculpas! – Ela ralhou, ameaçadora.

    Abaixado junto aos armários, Takao já tinha pego todas as canetas que haviam escapado para longe, mas ainda não se atrevia a se levantar. Era quase como se tivesse receio de que isso poderia romper aquela cena que, tinha certeza, não só ele mas noventa por cento dos estudantes daquela escola classificariam como sendo completamente bizarra. Ainda mais agora porque, ou ele estava ficando louco, ou Hiwatari Kai parecia quase curioso. Era mais provável que estivesse louco.

Loucura ou não, era certo que havia algo diferente. Praticamente todas as vezes em que vira Kai, seus olhos vermelhos só demonstravam frieza ou indiferença. Agora ele encarava a garota emburrada com uma expressão diferente, que Takao não poderia definir com precisão, estava entre a indiferença e a curiosidade. Parecia analisá-la. Por fim, deu de ombros e se desviou da garota, continuando seu caminho pelo corredor.

    - Desculpe, – Ele disse, numa voz sem emoção e sem olhar para trás – mas também não é culpa minha se você resolve ficar parada no meio do corredor.

    Kai não demorou mais do que alguns segundos para sumir em outra esquina de corredores, tão velozmente quanto antes, embora não parecesse ter pressa. Mao ficou estática durante esse tempo, tentando se convencer de que tinha realmente ouvido aquilo.

    - Mas quem ele pensa que é?? – Ela rosnou como se fosse um gato prestes a atacar, enquanto Takao enfim levantava e lhe devolvia as canetas que apanhara, as quais ela enfiou na mochila de qualquer jeito – “Não é culpa minha se você resolve ficar parada no meio do corredor”!? Ele que não tem olhos! Aquele malcriado! Ele vai ver só uma coisa!!

    Mao já estava no meio do corredor, com Takao indo atrás, ponderando se devia tentar pará-la ou não, quando mais alguém apareceu na esquina que ficava ao lado do armário da rosada, parecendo apressado.

    - Hiwatari-kun!! Onde você está? – A garota bronzeada, de olhos grandes arredondados e voz fina, olhava para os lados sem saber para onde dobrar, ou se devia seguir em frente – Ming Ming ainda não terminou de contar sobre o baile!!

    A menção do nome “Hiwatari” fez Mao parar. Ela observou a garota perdida por um instante, analisando a situação, até que abriu um grande sorriso.

    - Hey! Ming Ming!! – Ela foi até a recém-chegada, cumprimentando-a com uma expressão absolutamente simpática (O que fez descer uma grande gota em Takao ao ver sua mudança relâmpago de humor) – Está procurando alguém? – Perguntou, no seu ar mais inocente. (Nova gota gigante em Takao)

    - Estou procurando o Hiwatari-kun – Ming Ming disse, esperançosa – Vocês não o viram por aí, viram?

    - Hiwatari-kun... – Mao fingiu pensar por um instante, então estalou os dedos – É isso! Ele foi por ali – Disse, apontando o corredor que o Hiwatari dobrara um minuto antes – Se você correr alcança ele!

    - Wonderful! Thank you!! – Ming Ming agradeceu, contente antes de disparar na direção apontada. Mao parecia extremamente satisfeita consigo mesma.

    - Pensei que você ia atrás do Hiwatari – Takao disse, confuso. A rosada só sorriu mais

    - Ah, ele vai ter o que merece – Riu consigo mesma, com ar maquiavélico – Ming Ming o estava procurando para falar do baile. Dá pra imaginar como ele odeia essas coisas!

    Takao percebeu que a garota falava mais com ela própria do que com ele, mas quando pensou em todos os anos nos quais o Hiwatari nunca aparecera para os bailes da escola, entendeu que ela queria dizer.

    - Certo... Mas por que a Ming Ming o procuraria para falar do baile? Falta um mês ainda, ninguém começou a convidar os pares...

    Mao deu de ombros, desinteressada.

    - Bom, a Ming Ming é uma das organizadoras do baile, agora ele eu nem faço ideia. – Disse, apanhando algumas coisas do armário e guardando outras (Depois de conferir que ninguém vinha dobrando o corredor) – Provavelmente ela quer opiniões das pessoas “populares” do colégio, você sabe como a Ming Ming é.

    Ele sabia. Como repórter do jornal da escola, seria impossível não conhecer Ming Ming, envolvida na maioria das fofocas locais, vocalista da banda formada por alunos da escola e chefe das líderes de torcida, auto-declarada (e apoiada) a garota mais popular do colégio.

Particularmente, Takao a achava meio estranha. Não gostava nem desgostava dela, só a achava... esquisita. Não convivia muito com ela porque a garota era um ano mais nova e estava uma série abaixo, mas havia muitos boatos de que a menina sofria de dupla personalidade. Contudo, na maior parte do tempo ela era alegre, simpática e falante, uma verdadeira paty “filhinha do papai”, como diziam. Nenhum aluno sabia seu sobrenome, que ela escondia por “marketing”, dizia, como a Madonna, e etc... É claro que o jornal da escola tentou descobrir, mas sem sucesso. Ming Ming era ao mesmo tempo o nome mais falado do colégio e um verdadeiro mistério.

    - A propósito, eu quase ia me esquecendo, mas o Max nos convidou para ir assistir uns DVDs na casa dele amanhã de noite. Você vai? – Mao perguntou, enquanto os dois passavam pelos portões do colégio.

    - Claro que vou! Não tenho mais nada para fazer mesmo. Nós três?

    - E a Mariam.

    Takao sabia que era quase impossível que Mariam não fosse à casa do namorado, mas ainda tinha uma pequena esperança de não precisar encarar a “chefinha” tão cedo. Bom, não se pode ter tudo.

    - Ótimo. Que horas?

    - Umas sete, por aí. Mas se você se atrasar muito, nós começamos o primeiro filme sem você, hein?

    - Ei! Por que já acha que vou me atrasar? – Ele reclamou.

    - Porque você sempre se atrasa – Ela respondeu, rindo, enquanto esperava o sinal abrir para que pudesse atravessar. Era ali que se separavam, ela seguia em frente e o Dojo Kinomiya ficava três quadras à direita. – Até amanhã, e vê se leva muita pipoca de microondas!!

    - Ok, ok. – Ele fez um gesto de rendição, ao que ela sorriu e lhe deu “tchauzinho” antes de atravessar, enquanto ele continuava seu caminho pelo outro lado, satisfeito por ter algo com que pudesse se divertir no outro dia. Domingo era o único dia que tinham livre, longe do colégio e suas preocupações.

    E claro, o mais importante: o único dia sem álgebra!

 

CONTINUA...

 

 

 


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Notas finais do capítulo

(1)– Para quem não sabe, o verdadeiro nome do Kyoujyu (aka Kenny/Chief) é Manabu, Saien Manabu. Kyoujyu é um apelido, significa “professor” em japonês. (Dá pra entender porque chamam ele assim agora, não?)
(2)– Eu não resisti!! (Risos) Takao fase emo!! Mas esse papel era do Rei... Nah, o neko nem tá nessa fic mesmo.

Yaaaaaaaayyyyy!! (Aislin extremamente feliz) Eu acabei! Uhuuu!
Eu sei que demorou um pouquinho, mas é que eu acabei de trocar de computador e, além do inferno que vocês devem saber que isso representa, eu passei uns dias sem editor de texto até que tive um tempinho e resolvi baixar o OpenOffice. Depois de tantos anos de convivência, confesso que ainda sinto um pouco de falta do Word, mas o Writer quebra o galho muito bem!
Diante disso nem demorou tanto, nee? Mas sinto dizer que talvez o próximo demore um pouco mais, porque é época de prova na facul (Deprimida) Mas prometo me esforçar! (Decidida)

Agora falando do capítulo... Confesso que eu não estava gostando dele, mas aí me empolguei escrevendo e agora ele me parece simplesmente fantástico! (Modéstia de escritora louca, liga não...) É tão bom conseguir ficar feliz com o que eu escrevo. Acho que isso me faz muuuuito bem! (Risos) Mas claro, eu ainda preciso muito da opinião de vocês também, certo, gente? Não se acanhem em comentar! É o jeito mais fácil de fazer um ficwriter a pessoa mais feliz do mundo, provoca atualizações mais rápidas e rejuvenesce. Efeitos comprovados! (Mostrando pesquisa de Harvard)
O Takao está tão deliciosamente dramático, exagerado e rabugento! São os hormônios (Risos) Aqui ele tem quinze aninhos, contra doze do anime original (Fim da fase G-Revolution). Não tivemos muita evolução... Tivemos? (Pensativa) De qualquer forma, eu amo o Takao! Ele é um personagem maravilhoso de se trabalhar, me diverte pacas e não é de tão difícil controle quanto o Kai. A coisa com ele flui muito facilmente. Será que eu estou me apaixonando? (Risos)
Oh yeah, consegui colocar o Kai nesse capítulo!! (Soltando foguetes) Uma cena minúscula e problemática, mas mesmo assim uma cena. E eu nem faço ideia de onde me saiu a Ming Ming, mas ela caiu como uma luva! Não acho que ela vá ter muita importância na história, mas me vai ser bem útil. Girl Poweeeeeer!
E parece que a Hiromi não é a úncia esquentadinha da história... a Mao andou se estressando. Mas eu amei quando ela resolve mandar a Ming Ming atrás do Kai, tão diabólica (Risos)
Para os que estão pensando que a Hiromi aparece muito pouco, eu aviso que no próximo capítulo ela vai ter sua vez! Esperem pra ver...

E como eu tenho que vender meu peixe, vou pedir a todos que gostaram desse capítulo que leiam meu novo fic, “Meu Primeiro Beijo Teve Sabor de Sangue”. Estrelando Julia Fernandez! (Momento Propagando2)

De resto, todos vocês já sabem, não? Para comentários, elogios, críticas construtivas, convites de MSN, desafios e etc, mandem um lindo e saltitante review! Sayonara!

Aislin Le Fay



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