Rosas escrita por Larissa M


Capítulo 29
Capítulo 28 - Dúvidas Infiéis


Notas iniciais do capítulo

aee, demorou, mas saiu! Mas poxa, deem um desconto, com Natal, escrever 4 mil palavras não é fácil... aproveitem!



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As palavras de Reymond não foram, de modo algum, ignoradas por Isobel; elas tiveram profundo efeito em suas reflexões, e ocuparam boa parte delas por um longo tempo após serem pronunciadas. Era impossível, para alguém de caráter tal qual o de Isobel, ignorar as mudanças que tal comentário fizera em seu modo de pensar, mesmo que fosse a respeito do próprio noivo. Qualquer um estaria sujeito a uma avaliação de atitudes e sentimentos mais meticulosa, se tratando de Srta. Lopes, e tendo uma dúvida sido plantada em sua mente.

As afirmações de Reymond poderiam ser mesmo fundadas naquele que afirmava que a amava, aquele que dera firmeza em seu noivado? Não seriam elas injustas? O impasse entre acreditar na inocência de sentimentos de Ricardo ou nas duras acusações de Reymond permeava a mente da jovem senhorita naquele fim de tarde de um dia quase findo em total calma. Calma, essa, que só fora quebrada mesmo pela disparidade de pensamentos de Isobel.

Como era usual na paixão, aquela insanidade desprovida de qualquer tipo de lógica ditava que ela abraçasse seus sentimentos, ignorasse sua hábil tendência ao pragmatismo e retornasse a isenção de dúvidas e a Ricardo. Porém, seu caráter marcante não a permitiria que o fizesse; sabia dos perigos de se entregar a simplicidade dos sentimentos, e já estava acostumada a revirar um pensamento até que concluísse a questão. Iria duvidar de Ricardo se fosse preciso, mesmo que não quisesse nem fosse egoísta o suficiente para fazê-lo. É natural refletir sobre uma dúvida tão cruel quanto aquela.

Ainda estava se perguntando até onde uma pessoa teria a coragem e hipocrisia para fazer o que Reymond estava sugerindo quando seus pensamentos foram interrompidos. A campainha da mansão soou alta por toda a extensão da casa, chegando até mesmo na varanda adjacente ao quarto de Isobel. Como era fim de tarde de um dia de semana, ela não esperava ninguém àquela hora, e ficou surpresa ao ouvir o aviso sonoro. Seu pai teria um jantar mais tarde para congratular um oficial do exército que retornara a Valliria, mas ainda era muito cedo para se esperar alguém.

Não tardou a cobrir a distância entre sua varanda e a frente da casa, se perguntando quem seria. Torcia para que fosse o oficial. Soubera apenas aquela manhã que era Ralph Hayes quem seu pai estaria congratulando, quem não via fazia anos. Ela sentia falta da presença do irmão mais novo de Reymond, o qual sempre fora seu preferido, e quem lamentara a partida prolongada. O irmão mais velho nem sequer avisara a ela, e nem dera garantia ao coronel de que estaria presente... Isobel chegou a porta da frente, e, sem querer deixar a visita esperando, abriu-a, incerta sobre quem iria encontrar.

Reymond Hayes vinha a frente, numa pose relaxada, e já até mesmo sem seu chapéu. O irmão mais novo, Ralph Hayes, vinha um pouco atrás do primeiro, numa pose austera de militar, os braços cruzados atrás das costas e o cabelo avermelhado cuidadosamente penteado sob o chapéu.

- Senhorita Lopes. – o segundo irmão se adiantou, estendendo a mão em cumprimento. – Como vai?

- Ralph! Vou bem, sim. – Isobel exclamou, ignorando toda a formalidade de seu interlocutor e apertando a mão dele efusivamente – Seu irmão não me disse absolutamente nada sobre o seu retorno. Descobri hoje de manhã, quando meu pai me contou. – ela olhou para Reymond com um olhar acusador.

- Posso confirmar diversas qualidades de meu irmão, – Ralph respondeu, seguindo o olhar de Isobel, mas desprovido de qualquer desaprovação – porém, nunca poderia chamá-lo de comunicativo.

- Não fale assim, Ralph, senão Isobel vai me confundir com uma personalidade tímida. – ele falou, sorrindo ironicamente.

- No entanto – Ralph se aproximou de Isobel e falou, num tom confidencial – seria impossível negar que meu irmão tem uma tendência ao uso deliberado da ironia.

Isobel sorriu para Ralph, assentindo para mostrar que sabia bem a personalidade de Reymond Hayes.

- Entrem, você dois. – ela convidou. – Pedirei para que chamem meu pai; sei que está em casa, nunca foi muito ativo, nem tem o costume de vir abrir a porta para visitas, se me perdoam...

- Isobel, conhecemos bem o Coronel Lopes. Não são necessárias desculpas. – disse Ralph, com intuito de tranquilizá-la. 

Os três sentaram-se na sala de visitas da mansão, os irmãos Hayes num mesmo sofá e Isobel numa poltrona. O cômodo era espaçoso e bem arejado, com três compridas janelas que miravam diretamente para o jardim da frente da casa. Outro janela, para a lateral, onde se estendia uma pequena varanda.

- Eu lamento não ter tido conhecimento anterior de sua vinda, Ralph. – Isobel falou depois que eles haviam se acomodado.

- Eu não. Assim pude surpreendê-la hoje. – ele sorriu. – Não é nada fácil fazer isso, saiba.

- De fato, Isobel, se há algo em você de mais admirável é sua incapacidade de se deixar surpreender. Sempre tão atenta a tudo que fica difícil... – Reymond comentou. Sua voz estava desprovida de qualquer tipo de ironia; ele falava sério. Isobel estudou seu rosto por alguns segundos em busca de qualquer sinal do contrário, mas não achou. Por um momento, o antigo sentimento de prazer em estar na companhia dos irmãos resurgira nela.

Isobel sempre soubera que Reymond conseguia ser agradável quando queria, e conseguia brincar e ironizar de modo a entretê-la, não irritá-la. Porém, já provara de sua capacidade de ser implacavelmente ácido, e conhecia esse lado dele o bastante para não querer vê-lo outra vez. Agora, ela interpretou seu elogio como sendo um resquício da antiga amizade, talvez um recomeço.

Ela sabia também o quanto Ralph era agradável, educado, e absolutamente nunca irônico. Entendia a ironia, mas preferia não usá-la, e sabia muito bem fazer brincadeiras, apenas de um teor completamente diferente das de Reymond. Tinha um quê de timidez que lhe dava um ar extremamente charmoso, sempre comedindo em elogios e ao emitir suas opiniões a respeito de algo. A condescendência dele compatibilizava com a teimosia de Isobel, e sua paciência era infinita quando se tratava dos caprichos dela. No entanto, tinha força de vontade e perseverança, o que o garantia uma boa função no exército.

- Muito obrigada, aos dois.  – ela respondeu. – Ralph, me conte mais sobre seu retorno...

O mais novo tenente do exército contou, sem conseguir refrear um pouco do orgulho de si mesmo, que o seu superior lhe dera um tempo de folga, segundo ele, por “seu esforço e empenho”, pouco depois de ele ter sido promovido.

- Meus parabéns, Ralph! – Isobel exclamou com sinceridade – Não tenho dúvidas de que realmente merece o cargo, tanto quanto as férias.

Ralph agradeceu com modéstia, dizendo que precisava dos ares de Valliria para descansar. O sol forte do clima quente da região litorânea e a constante exposição a esses fatores não lhe agradava. Até mesmo ganhara mais cor, e estava com a pele bem mais amorenada que seu irmão, deixando-o ainda mais bonito aos olhos de Isobel.

A curta conversa que os irmãos Hayes tiveram com Isobel até então foi precedida pela chegada do coronel Lopes, que não recebeu menos atenções que sua filha, nem careceu de exemplos de boa educação da parte dos jovens.

Os Hayes eram uma família com precedentes apreciados pelo coronel, e o ingresso de Ralph no exército só fez aumentar esse apreço. Reymond era “um ponto baixo” devido a sua profissão, mas não deixava de ser considerado uma presença muitíssimo agradável. No todo, o coronel estava feliz com a visita.

- Correndo o risco de entediar nossos outros dois acompanhantes, Ralph, conte-me mais sobre suas experiências.

Ralph prontamente lhe contou e deu detalhes, numa narrativa que a princípio chegou a ser interessante aos demais presentes, porém, assim como o coronel houvera previsto, começou a entediar-lhes pouco depois. A solução foi duas conversas paralelas, sendo uma delas iniciada com um pouco de receio por parte de um de seus participantes.

- Reymond, eu pensei no que me falou.

- Chegou a uma conclusão, então? Não esperava que você admitisse tão ligeiramente meus argumentos e se dispusesse a refletir sobre eles. – ele respondeu aos sussurros, mesmo estes não sendo necessários; a voz imperiosa do coronel era alta demais para se ouvir qualquer outra coisa além dela.

- Eu não os admiti, porém ainda reflito sobre eles. – Isobel respondeu.

- Você parece um pouco mais bem humorada do que ontem a noite. Esse semblante lhe cai bem. É a presença de meu irmão?

- Ralph decerto sabe ser muitíssimo agradável.

- Coisa de família. – ele retrucou com um sorriso.

Isobel devolveu o sorriso, sem saber se queria mais passar escárnio a Reymond ou se queria ser simpática. Estava começando a tolerá-lo com mais facilidade, e, de fato, estava de bom humor.

Isobel ainda não havia se decidido se a estadia prolongada dos dois era motivo para sua alegria ou se ela deveria recear ficar mais tempo com Reymond. Toda aquela solicitude a restaurar a amizade parecia suspeita aos olhos atentos de Isobel, e ela garantiria que não se deixaria levar pelas aparências dele.

O resto da tarde transcorreu serenamente, e logo que o céu deixou seu alaranjado para trás e admitiu o negror noturno, os outros convidados do coronel começaram a aparecer.

Oito, ao todo, reuniram-se ao redor da mesa para o jantar, que foi servido pontualmente, de acordo com a preferência do coronel. Não era raro que ele convidasse antigos conhecidos seu do exército, ou algumas de suas personalidades preferidas de Valliria e reunisse a todos para um jantar ou uma comemoração. No caso, era Ralph o homenageado, recebendo todas as congratulações e comentários a respeito dele de modo muito modesto, assim como Isobel se lembrava que ele era.

O jantar transcorreu animado, para todos os presentes, até mesmo Isobel, que conseguia se distrair na companhia dos dois irmãos Hayes. Ambos eram divertidos, assim como ela se recordava de quando passava mais tempo na companhia deles, e sabiam conversar sobre os mais variados temas. Claro, o tema em que todos a mesa prestaram atenção e mais participaram foi no momento em que Ralph partilhava suas experiências, e o coronel, sempre com aquela nostalgia, se lembrava de seus tempos no exército.

Mais tarde naquela mesma noite, o grupo reunido deixou a sala de jantar, e todos se dirigiram para a sala de visitas, com bebidas em mãos e novas sendo servidas. Eles se dispersaram pela sala, formando pequenas duplas ou trios entre si, e mais uma vez Isobel ficou ao lado de Ralph.

- Isobel, você não mudou em nada. – Ralph disse a ela, pouco depois de se acomodarem em lugares próximos a janela, no mesmo sofá que ele e seu irmão ocuparam mais cedo.

- E isso é bom ou é ruim?

- Ambos. É bom saber que a memória que conservo de você ainda é a mesma.

- E o lado ruim? – ela perguntou.

- Isso eu deixarei que você descubra. Seja o que for, Isobel, sua companhia ainda me será um prazer. – ele falou, deixando-a sem jeito de responder.

Sob pedido do coronel Lopes, foi armado o gramofone na sala, sem nem que os dois jovens conversando percebessem. Só quando, ao som de uma música clássica, do gosto partilhado e a pedido de vários convidados ali presentes, foi que os dois se viraram, a tempo de ver um primeiro par a caminho de dançar. Outros pares se formavam, já fazendo Isobel olhar par Ralph em expectativa. O jovem militar levou certo tempo, talvez mais por acanhamento do que falta de vontade de o fazer.

- Gostaria de me acompanhar na dança? – ele perguntou.

De longe, encostado no parapeito da janela, Reymond acompanhava a tudo, atento, sem ninguém para conversar e sem ninguém para dançar. Ele escolhera assim, pois, se quisesse, poderia muito bem ser mais rápido que seu irmão e convidar Isobel, ou se aproximar das outras jovens. Porém, preferiu manter distância.

Recostava-se ali, assistindo a agitação de todos por alguns minutos, quando, ao se cansar e a sala se tornar demasiadamente abafada, ele caminhou calmamente até a varanda lateral, dando a volta pela borda da sala para não atrapalhar ninguém.

Gostava da serenidade da noite, da penumbra que se formava no jardim. As únicas fontes de luz eram a luz amarelada da sala atrás de si, e a luminosidade prateada que a lua cheia jogava sobre o jardim. Era uma bela cena de se assistir, e assim ficou Reymond, parado na varanda, sem se dar conta da passagem do tempo.

Uma sombra lhe chamou a atenção. Vinha da frente da casa, de onde uma luzinha de uma lâmpada iluminava o fim da varanda. Crescente, e sombra foi tomando forma humana, até que se concretizou num homem, caminhando com passos incertos na grama do jardim.

- Reymond, o que faz aqui?

- Creio que essa pergunta cabe mais a mim do que a você, meu amigo.

Ricardo La Fontaine olhou ao redor de si, depois, buscou enxergar o que ocorria dentro da casa.

- É um dos jantares do coronel que acontece. – Reymond deu mais alguns passos na varanda, de modo que conseguia enxergar o que acontecia lá dentro e observar Ricardo.

- Sim. Compreendo. Foi por causa daquele seu irmão que voltou, não é mesmo? – Reymond pensou ouvir uma ponta de ciúmes na voz de Ricardo, e não o culpou por isso. – Eu vim aqui à procura de Isobel... Nem sequer sabia que ela estaria ocupada.  – ele completou.

- Ela não mencionou que não poderia recebê-lo?

- Não nos falamos desde antes da festa de ontem. – Ricardo fez uma pausa, que emendou num longo suspiro. Chegando mais perto, disse, num sussurro – Você descobriu, não?

- Não posso culpar Isobel por não ter lhe contado, já que não se encontraram...

- Então ela estava certa. Quando é que ela não está? – ele perguntou, retoricamente.

Ricardo tirou o chapéu e segurou-o junto ao peito. Seu olhar ainda estava perdido na janela da casa, tentando enxergar algo. Conseguia discernir os vultos dançantes, e ouvia a música que saía de dentro do recinto.

- Estão dançando? Aos pares?

- Sim. – agora Reymond poderia ver claramente os ciúmes na voz de Ricardo. – Aos pares; é música clássica.

Ricardo ficou em silêncio, olhando pela janela, assim como Reymond.

- Eu não contarei nada a ninguém, se este é seu receio. – o último falou.

- Prefiro que conte. – ele retrucou – Quero só ver a reação do coronel quando toda Valliria souber... Quem sabe eu dou a sorte de estar aí dentro como convidado de honra que é seu irmão. Não é assim que funciona para o coronel? – ele perguntou, cheio de amargura.

- Sua namorada não irá gostar. – Reymond observou – Se eu fosse você, não teria tanta...

- Pois você não é. Diga-me, Reymond, já esteve numa situação parecida? – ele próprio respondeu – É claro que não... Miriam o aceitaria tão logo a pedisse em casamento, e o consentimento dos pais dela viria logo depois.

O fotógrafo ficou em silêncio. Sabia ser verdade a acusação que o outro lançava sobre ele, e, de fato, planejava pedir a mão de Miriam já fazia algum tempo. Nem adiantava negar, mas ele não guardaria silêncio para sempre:

- Não adianta ficar amargurado, Ricardo, isso não resolverá a situação. – Reymond não sabia como abordá-lo sem fazer com que se irritasse ainda mais, portanto, tentou ser neutro, mesmo tendo exposto suas suspeitas a Isobel quanto à pessoa que estava conversando.

- E o que resolverá?

- Não me pergunte isso, se empenhe em achar a solução. Pessoalmente, não acho que o coronel seja uma pessoa fácil de se dissuadir, mas, apresente os argumentos certos e ele consentirá seu casamento. – Ricardo suavizou a expressão, admitindo um ar de ponderação – Não me espanto que ele tenha achado essa união... estranha – Reymond continuou – Eu mesmo fiquei surpreso quando vi vocês dois.

- Só porque ela é filha do coronel Lopes...

- Não é por questão de nascimento. – Reymond retrucou – É só que, conhecendo Isobel como eu conheço, e um pouco de você também, Ricardo, me espanto que os dois tenham se unido.

Ricardo franziu o cenho, sem entender aonde o outro gostaria de chegar.

- É verdade, possuímos certas características diferenciadas...

- Até mesmo poderiam pensar, se caísse no conhecimento geral, que teria algum tipo de ganho maior de uma das partes... – ele insinuou, ainda com um olho na sala, e outro em Ricardo.

Sem que o marceneiro tivesse a chance de responder, os dois homens que conversavam foram surpreendidos por Isobel, que saía para a varanda a fim de se refrescar.

- Reymond, você estava vendo? Tinha me esquecido do quanto Ralph é um pé de valsa. – ela riu, caminhando para o lado de Reymond. – O que faz aqui fora? Nem estava dançando...

Com um leve gesto de cabeça, Reymond se inclinou na direção de Ricardo, ainda parado no jardim abaixo da varanda.

- Ricardo! Eu não estava te esperando hoje. – ela falou, surpresa, assim que o notou. – Esqueci de mencionar para você que meu pai faria mais um de seus jantares...

- Não tem problema. Amanhã eu venho vê-la, pela manhã. – Ricardo recolocou o seu chapéu. – Vou-me indo antes que o coronel note minha presença. – com um olhar que misturava morbidez com desgosto, Ricardo fitou Reymond, que retribuiu o olhar. Sua noiva só recebeu um aceno de cabeça antes que ele desaparecesse na penumbra do jardim.

- O que houve com ele? – Isobel falou assim que seu noivo se afastou – O que você fez, Reymond?

- Eu? Tenho culpa se ele se irritou por ciúmes? – ele retrucou, omitindo parte da verdade.

- Ciúmes! – Isobel exclamou – Não dei razões para ele ter ciúmes.

- Seu pai não o convidou para o jantar, o que é o esperado, no entanto ele se sentiu ofendido; você estava dançando e rindo a não mais que dois minutos atrás; ainda por cima, com meu irmão.

- Não há nada de errado com Ralph. Impossível que Ricardo esteja sentindo ciúmes dele. – ela retrucou – Seu irmão é uma personalidade tão agradável...

Reymond ergueu uma sobrancelha para ela, fazendo-a notar sua própria contradição.

- Ele pode ser agradável, mas não o bastante para gerar dúvidas na cabeça de Ricardo! – ela exclamou, irritada. – Falarei com ele amanhã. Por agora, só gostaria de saber sobre o que conversaram.

- Conversamos sobre vocês dois, para ser sincero. Ricardo não gostou nem um pouco de minhas suspeitas. – Reymond resolveu ser direto.

- Não é de se espantar que não tenha gostado, nem que tenha te olhado daquele jeito. – ela vagarosamente fez um gesto de desaprovação com a cabeça. – Reymond, aonde quer chegar?

Antes que Reymond pudesse responder, ou dar uma desculpa e sair daquela situação, seu próprio irmão atrapalhou. Saiu para a varanda, buscando por Isobel, dando falta de seu par.

- Conversamos mais tarde. – Isobel cobrou a Reymond, antes que Ralph a puxasse para dentro.

O Parque das Rosas não serviu para outro encontro entre o casal. Com Reymond tendo tomado conhecimento da união dos dois, o que antes já era perigoso crescera de perigo, passando a ser muito mais presente na mente dos dois. Não tornariam a se beijar em lugares públicos, somente andar na presença um do outro, e mesmo assim, com cuidado. Não costumavam expressar carinho num lugar como o Parque das Rosas, mas, estando ele tão deserto quanto no dia em que Reymond os vira, assumiram que não haveria perigo. Infelizmente, a sorte pendera para o outro lado.

Cedo na manhã, Ricardo já aparecera pela mansão Lopes, e fora recebido por Isobel. O coronel estava fora, o que dava a eles certa privacidade muito almejada. Ricardo não a cumprimentou com um beijo, como era costume fazer. Ao invés disso, se mostrava muito mais sério, e Isobel mal um sorriso recebeu.

- Você estava alterado ontem à noite. – Isobel acusou-o, assim que ambos haviam se estabelecido na mesma sala de visitas que servira de palco para danças na noite anterior. Não queria dizer que ele ainda estava agindo de modo diferente, pois queria primeiro que se explicasse. Ela sabia que Reymond havia exposto as razões a ela, mas não se daria por satisfeita até que ouvisse Ricardo.

- Reymond Hayes não foi muito agradável. – ele resmungou em resposta – Pensava melhor dele antes de ontem.

- Ele pode ser tanto agradável quanto desagradável, dependendo da pessoa em questão. – ela esclareceu. – Já pude vê-lo dos dois jeitos.

- Presumo que agora ele esteja sendo agradável, assim como o irmão mais novo está, não é mesmo? – Ricardo retrucou, e Isobel notou ressentimento em sua voz.

- Sim, pelo o que eu sei, Ralph é galante com todas as mulheres. – dando ênfase no “todas”, elas respondeu, e acrescentou – Ricardo, não acredito que você possa estar sentindo ciúmes dele.

Ele desviou o rosto para baixo, evitando o olhar dela. Com um suspiro, falou, depois de passar certo tempo refletindo:

- Em um ponto você está errada: não são ciúmes dele que estou sentindo, não em questão de duvidar do seu amor. Estou sentindo ciúmes por não fazer parte dos jantares de seu pai. Pelo coronel não ter consideração por mim.

- Ricardo, com o tempo, meu pai irá se acostumar com a ideia de tê-lo por perto...

- É exatamente o que aquele Reymond disse. Disse para eu dar tempo ao tempo, e depois emendou me acusando de ser mal intencionado nesse casamento.

Isobel não respondeu; se seguisse adiante se fingindo de desentendida estaria mentindo, se dissesse que havia acatado as dúvidas de Reymond, não ficaria bem a frente de Ricardo. O noivo dela a fitou, incerto sobre o que ela estaria pensando. Conseguiu ler em seu rosto e em seu silêncio a verdade:

- Ele já havia te dito isso?

Ela desviou o rosto, momentaneamente desprovida de coragem.

- Sim, ele havia mencionado.

Ricardo manteve o silêncio.

- Você tem que concordar, Ricardo, a argumentação de Reymond é válida quando não se conhece as coisas como nós conhecemos. – ela decidiu-se por ser franca, mas mantendo o seu tom de voz o mais imparcial possível. – Estando na posição que nós estamos, é mil vezes mais difícil duvidar um do outro.

- Então você acha que o argumento dele tem lógica, mesmo estando noiva de mim? – Isobel sabia interpretar bem as emoções de Ricardo, e sabia reconhecer quando estava irritado com ela.

- Ricardo, eu nunca disse isso com certeza...

- A incerteza pode ser tão cruel ou pior do que uma recusa direta, Isobel. Se a sua certeza não pender a meu favor, então quais de suas crenças me restam para ater-me e amá-la seguramente?

Isobel abriu a boca para responder, mas não saiu nada. Sentia-se mal consigo mesma, e tinha Reymond em ainda pior conceito.

- Você desconhece o poder persuasivo de Reymond. – ela retrucou, ressentida consigo mesma. – E se fosse o contrário, Ricardo? – tentou argumentar a seu favor. – Não duvidaria, nem por um segundo, de mim, mesmo que a pessoa mais astuta que você conhece o avisasse disso?

Ele se manteve parado, sem dizer nada. Foi o que bastou para Isobel considerar como uma confirmação.

- Sei que isto não me isenta de culpa, mas ainda assim ameniza meu fardo. – ela sentenciou, e ele não ousou discordar. Quando se tratava de questões lógicas, nada revertia um argumento de Isobel Lopes.

Ricardo se levantou num gesto brusco. Começou a andar em círculos pela sala, estando sempre em frente à Isobel. Essas ações que denotavam sua absorção em pensamentos falavam por si sós, pedindo silêncio, que sua noiva concedeu, permanecendo sentada no sofá.

- Eu sinto, querida, que seu pai não compreenderá. Foi sempre muito orgulhoso para admitir que sua filha se cassasse com alguém de quem ele não gostasse, alguém que nem sequer conhece profundamente... – ele nunca falara do pai de Isobel sem todo o devido decoro, e, agora que cometia essa falha, parecia mais aliviado em fazê-lo do que envergonhado – Talvez tenha sido o exército que o deu mania de superioridade, ou que o fez trazer essa autoridade descabida para casa. – ele continuou, assombrando-a com sua ousadia, com aquela frieza que ela antes nunca provara. – Mas eu não suporto não ser bem tratado pelo meu futuro sogro... E, agora, só o que me faltava, minha própria noiva com dúvidas sobre mim plantadas por um enxerido insolente.

- Ricardo...

- Deixe-me terminar. – ele pediu, com um quê de autoridade intimidante na voz que a fez se calar – Isobel... Desmancharei esse noivado que nunca teve nenhum sinal de que algum dia viria a dar certo, e espero que me compreenda...

- Compreendê-lo? – ela repetiu, fora de si de tão magoada que estava – Ricardo La Fontaine, que fujamos agora mesmo dessa cidade, dessa maldita sociedade, dessas restrições, sem nem olhar para traz! Venha comigo, e iremos tão longe quanto imaginar, meu querido! Por mais que eu ame meu pai, por mais que tenha consideração por ele, por ti e por seu emprego, essa seria a melhor das soluções! Não desmanche algo que me empenhei tanto... que nos empenhamos... – ela se levantou no meio do discurso, aproximando-se dele à medida que parava de falar. Procurou seus braços, o aconchego de sua proximidade, mas tudo o que ganhou em troca foi duas firmes mãos lhe segurando a uma distância que por si só dizia que aquele era o fim.

- Não irei, não posso ir... Seu pai para sempre nos odiaria, eu perderia o emprego e todo o dinheiro e oportunidades... – lentamente, Ricardo beijou-a no topo da cabeça, e, com um último afago em seus cabelos, saiu da sala, deixando-a solitária em toda a vastidão de sua mansão.


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Notas finais do capítulo

Gostaram? Reviews? Terá apenas mais um capítulo "no passado", depois eu retornei ao "presente", ok? Feliz Natal atrasado! kkk