Mar de Lírios escrita por Jajabarnes


Capítulo 2
Um Desenho Desaparecido.


Notas iniciais do capítulo

Aqui o segundo capítulo! Espero que gostem!

OBS: Capítulo revisado, editado (bastante) e republicado em 20/12/2021. Não muda o curso cronológico da história, porém muda o contexto da relação da Susana com os pais. Espero que gostem!



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Não dei por mim quando peguei no sono. Acordei abrindo os olhos devagar, as cortinas na janela ainda aberta balançavam ao vento frio que enchia o quarto. Já era noite, o quarto todo estava frio e mergulhado em breu. Sentei ainda sonolenta, respirando fundo o ar da noite. A casa estava em silêncio, mas gradativamente ruídos foram chegando aos meus ouvidos. Eram passos, vindos do primeiro andar, em seguida vieram vozes que pude reconhecer como as de meus pais. Acendi o abajur de cabeceira e busquei o relógio logo abaixo dele. Vinte horas. Ouvi meu nome ser dito ao longe, então decidi levantar e ir cumprimentá-los. Como única filha morando na casa, havia um banheiro conjugado ao quarto à minha disposição, era um dos poucos privilégios de que gostava. Fui em direção a ele e lavei o rosto, passei a mão nos cabelos e deixei o quarto, seguindo descalça rumo às escadas, sem causar ruídos.

—Acho que ela pode estar dormindo – disse minha mãe, lá em baixo na sala – Sobre o que você estava falando com o Sr. Stewart? – continuou ela. Ouvi alguém sentar, jogar-se no sofá. Papai, com certeza. Ele suspirou.

—Você viu Susana e Phil conversando hoje. Não lhe pareceram formar um belo casal?

Parei no topo da escada, meio escondida atrás da parede, cedendo a curiosidade apesar de saber que não deveria.

—Sim, realmente. Mas Susana não me pareceu muito confortável. – pontuou mamãe.

—Você sabe de algo, Helen? – perguntou ele – Susana está na idade em que as moças costumam buscar um pretendente, mas já venho observando há algum tempo e percebo que ela não parece estar aberta a ninguém que tenha se aproximado dela. Pergunto-me se, por acaso, não ficou alguém na Inglaterra.

Colei-me ainda mais à parede, como se fosse cair.

—Já tentei conversar com Susana sobre esse assunto, mas você sabe como ela é reservada demais – contou mamãe. Não podia negar, ela realmente tentara, e por mais que eu quisesse falar sobre, não seria possível. – Sempre que tento ela se torna escorregadia e aproveita a primeira oportunidade para mudar de assunto.

—Não entendo porque seria um assunto tão terrível assim. Sabemos que chegará a hora de ela arrumar um marido. – disse meu pai. Meu coração apertou no peito. É claro que eu sabia, mas o plano imediato era adiar essa ideia o máximo possível.

—Ela só tem dezesseis anos, querido. – ponderou minha mãe, em tom ameno. – Conhecendo Susana creio que ela tenha outras coisas em mente.

—Você tinha essa idade quando nos casamos – argumentou ele. – Em sua última carta, Lúcia contou que a filha dos Wales se casou na primavera, e a filha dos Miles está noiva. Você se lembra delas, não? Estudaram com Susana.

—O que lhe preocupa exatamente, Raphael?

—Susana não segue o mesmo ritmo das amigas, ou das outras moças – começou ele – Não me entenda mal, você sabe que isso me agrada. Tenho muito orgulho de minhas filhas, mas ao mesmo tempo Susana me preocupa.

—Entendo o que quer dizer – mamãe se pronunciou. Busquei na mente qualquer coisa que poderia ter levantado preocupação além do óbvio, mas não encontrei nada. Nada cujo motivo pudesse ser dito abertamente, é claro.

—Susana é uma ótima moça, mas está sempre sozinha. Isso tem me preocupado bastante ultimamente. Susana não é tão aberta a conversas quando algo a incomoda. Ela ter evitado suas conversas só me preocupa mais – falou papai. – Seria mais fácil se ela fosse como Lúcia nesse ponto.

Um silêncio recaiu na sala.Eu queria, pai, queria realmente ter a mesma facilidade de Lúcia. Sua fé, inclusive. Respirei fundo devagar. A troca de cartas com meus irmãos não eram suficientes para conversar sobre o que me afligia e essa era a principal desvantagem de estar aqui. De fato, me sentia só.

—Eu estive observando o filho dos Stewart. Phil. É um ótimo garoto, vem de boa família e quando o vi conversando com Susana hoje pensei que dariam um ótimo par, se viessem a ser, claro.

—E você não se oporia? Era sobre isso que você estava falando com o pai dele?

—Ora, querida, você, mais do que ninguém, sabe que para mim não existem homens completa e totalmente dignos das minhas meninas. Mas sei que a hora vai chegar. O próprio George disse, nas palavras dele, como seria “um bom negócio” se os dois fossem mais a frente.

—Ora, mas eles se conheceram hoje e Susana não me pareceu muito à vontade com ele. Não seria cedo demais para pensar em um relacionamento? – quase pude ver o cenho franzido de mamãe, só por seu tom de voz.

—Ele parece ser um bom rapaz, mas também não o conheço o suficiente.

—Seria bom para ela fazer amigos, pelo menos – comentou mamãe –Ela anda estranha de uns tempos para cá– contou, como um desabafo.

—Estranha como?

—Só... Estranha. Susana sempre foi de poucas palavras, mas não distraída. Ultimamente parece que tem a cabeça nas nuvens.

—Deve ser só um momento.

—Não, é algo mais que isso.

—Já experimentou perguntar à Lúcia? Ela e Susana são muito unidas, talvez ela saiba o que está acontecendo com a irmã – o ouvi se levantar e preparei-me para finalmente descer as escadas.

Não adiantaria perguntar nada à Lúcia, claro. O que me leva ao ponto que estava evitando havia tempo: pensar em algo para fazer. Estive evitando isto por dois motivos, primeiro, estaria me colocando entre contar a verdade, continuar omitindo e consequentemente mentindo, ou agir conforme todos esperavam, como se tudo não houvesse existido. Segundo, nenhuma opção era confortável.

—Ah, olá, querida! – cumprimentou papai quando comecei a descer as escadas tranquilamente. Sorri de leve.

—Como foi lá? – perguntei ao abraçá-lo e receber um beijo no alto da cabeça.

—Muito agradável, querida – respondeu mamãe – Você está bem?

—Sim, acabei pegando no sono.

—Se você tivesse ficado mais um pouco teria feito mais amizades, tenho certeza. Você causa uma perda tremenda aos jovens dessa cidade não lhes permitindo sua amizade.

—Não exagere, pai – pedi, depois de rir alto.

—Eles terão outras oportunidades – mamãe falou, sorrindo. Sorri-lhe de volta.

—Phil certamente terá mais uma – complementou papai, baixo, como quem diz por acaso. Cruzei os braços.

—O que o senhor está tramando?

—O que? Só porque você tem dificuldades em fazer amigos não quer dizer que eu fico de tramoias por aí, meu bem.

—Eu o que?

—Céus, parece que estou diante de Edmundo! Vou fazer um chá – mamãe se levantou para se dirigir a cozinha.

—Convidei George e a família para vir aqui tomar chá no domingo – falou meu pai. Ergui a sobrancelhas involuntariamente.

—Meu bem, estar aqui é uma grande oportunidade que você poderia aproveitar mais.  No melhor sentido de todos. Mas sua mãe e eu achamos que há algo lhe incomodando. Sabe que pode nos contar por que você está tão distante.

Suspirei, descruzando os braços e pensando em algo sensato a dizer.

—Não há nada–sussurrei, pondo uma mecha de cabelo atrás da orelha e tentando sorrir levemente. Espero ter conseguido. – Sinto falta de meus irmãos, só isso.

E lá estava a mentira. Não completa, fatiada, mas estava.

—Quem nada é peixe, Susana. Acha que não percebemos que aconteceu alguma coisa? Somos seus pais, Susana, pode contar. – minha mãe tentou, falando lá da cozinha, logo sendo abafada pelo apito da chaleira.

—Não é nada. Nada mesmo. E dizer que não Fiz amigos é um exagero – insisti– Jane, da casa em frente, é uma ótima pessoa.

—O que achou de Phil? – mamãe lançou, direta e sem rodeios, pousando a bandeja com o chá e as xícaras na mesa de centro, deixando-me atordoada com a pergunta repentina. Engasguei brevemente, com a mente em branco.

—Bom – maneei, ganhando tempo para ordenar as palavras enquanto servia-me de chá – parece ser uma boa pessoa.

—Seu pai acha que formariam um belo casal.

—O quê?! – grasnei, lívida. Não esperava que fossem tão diretos assim.

—Helen! – protestou papai, com a xícara a meio caminho da boca.

—Isso é ótimo – falei voltando a equilibrar a xícara com cuidado – Já tenho um motivo para passar o dia no quarto domingo.

—Ora, não fale assim. Não é para tanto. – mamãe disse, dispensando com um gesto de mão. Eu tomei outro gole, erguendo as sobrancelhas para papai por trás da porcelana.

—Ora, é apenas um chá, está bem? – concluiu ele – Vamos recebê-los para o chá e ter uma tarde agradável. E, gentil do jeito que é, seu que tratará bem o rapaz, e consequentemente vai dar a oportunidade de conversarem, é algo natural. E então, se virarem amigos, será natural também. – deu de ombros e gesticulou com a mão, descontraído, do jeito que falava quando queria deixar seus pensamentos de forma subjetivamente claros.

Respirei devagar, levando a xícara a boca e torcendo para que o chá trouxesse certa calma frente o aperto em meu peito. Meus pais estavam criando expectativas, normalmente elas viriam com o tempo mas eu não estava disposta a atendê-las. Não ainda. Tinha certeza que Phil podia ser um bom pretendente, não se tratava dele. Eu só não estava preparada, e duvidava que algum dia estaria de fato.

Querer evitar seguir a vida a todo custo não estava nos meus planos. O sonho de um dia voltar para Nárnia e viver uma vida inteira – com Caspian – já havia parado de conduzir minha vida, não havia mais essa esperança ardente. Eu pretendia seguir, é claro. Queria ter uma profissão e sabia que poderia ter uma família um dia. No entanto, apesar disso, confesso que uma parte de mim queria adiar esse momento. Regressar para lá e viver uma vida conforme sonhei já havia deixado de ser uma esperança.

Desde que voltara para a Inglaterra, tentei várias coisas para manter a mente ocupada e de todas elas, somente o desenho havia conseguido chegar perto do objetivo. Desde então pratico com frequência, tornou-se uma forma de expressão silenciosa, as minhas preferidas. Aproveitando o silêncio da casa quando meus pais se recolheram e a falta de sono por conta da tarde, sentei à mesa que tinha próxima a janela e retomei o último papel, ainda incompleto.

Quando cheguei aos Estados Unidos, intensifiquei ainda mais e pude continuar me aventurando no registro de lembranças nossas na Inglaterra, em Nárnia, até que um dia a memória adormecida de um momento me compeliu a desenhar o dono de sua expressão. Depois de três anos, via novamente o rosto de Caspian, embora estivesse no papel. No entanto, um belo dia algum tempo atrás, o desenho desapareceu.

[...]

Quando o domingo chegou, mamão apareceu na porta atrás de mim. Olhei-a pelo espelho, confirmando que já desceria, então ela desceu, mas não sem antes me lançar uma piscadela provocando-me um riso contido. Apanhei o anel sobre a penteadeira, pondo-o lentamente no dedo anelar da mão esquerda. Era o meu preferido, Pedro me dera no natal passado, ele só servia naquele dedo e escolhi-o propositalmente, embora ele combinasse com minha roupa. Suspirei, o chá já não me preocupava mais. Havia procurado o desenho por toda parte, não fazia ideia por onde mais olhar, e já temia que fosse encontrado por mais alguém.

Dei uma ultima olhada em meu reflexo, levantei e fui rumo à porta. Caminhei pelo corredor em passos tranquilos. Suspirei mais uma vez chegando ao topo da escada, revisando mentalmente onde deveria procurar novamente. Desci com uma mão no corrimão e logo encontrei todos na sala de estar.

—Ah! – meu pai sorriu. – Aí está ela!

Pude ver George, Laura e Phil todos com roupas elegantes para aquela tarde de verão. Mamãe veio da cozinha. Sorri gentil, parando ao lado de papai para cumprimentá-los. George e Laura responderam com educação e sorrisos enormes, Phil, por outro lado, entregou-me um beijo no dorso da mão e uma fala simples e educada.

Mamãe chamou a todos para sala de jantar, pois o chá já seria servido. Fui ajudá-la na cozinha e não havia discrição alguma em seus sorrisinhos em minha direção. Para minha sorte, Laura veio nos ajudar e mamãe parou com as gracinhas. Com tudo pronto, retornamos para a sala de jantar e assumimos nossos lugares e o chá foi servido.

—Sua mãe me disse que você pretende ir para a Universidade. O que pretende cursar? – perguntou Laura, gentilmente. Não tive pressa em terminar meu gole de chá, sorrindo levemente e descobrindo que meus pais haviam falado mais do que eu imaginara.

—Ainda não me decidi– sorri dando outro gole.

—Ora, tenho certeza que seria uma professora maravilhosa, se quisesse! –comentou George.

—Igualzinha ao seu pai – comentou mamãe. Sorri para ela e vi papai sorrindo, pelo canto do olho.

—E você, Phil, soube que você já está na faculdade. – desconversou ele, servindo-se novamente.

—Sim, eu estou no segundo ano de direito. – respondeu Phil. Ele me pareceu levemente desconfortável, mas tranquilo.

—Direito? Isso é ótimo! – começou meu pai enquanto eu me escondia atrás da xícara de chá em outro gole.

— E qual seus planos para o futuro, Susana? Certamente uma profissão ocupará muito do seu tempo – Laura perguntou, inclinando-se em minha direção enquanto os homens entretiam-se com outra conversa. Isso, aquela era uma reunião muito, mas muito, estratégica. Os pais do rapaz sondavam a moça e os pais da moça sondavam o rapaz. Phil e eu estávamos na berlinda bombardeados por perguntas – Pretende casar, ter filhos...? – pousei a xícara no pires.

—Bom, não penso em casamento ainda. Quero me formar em alguma coisa, ter um emprego, talvez depois eu pense em casamento. – respondi.

Novamente de esguelha, pude ver quando Phil escondeu o riso bebendo um gole de chá. Laura pareceu um pouco surpresa com minha resposta, mas sorriu um pouco, educadamente e assentiu uma vez.

—E você, Phil – mamãe mudou de assunto, um pouco alto demais. Phil foi pego de surpresa. - Seus planos para o futuro...?

—Bem, pretendo terminar a faculdade, casar... Filhos? Quem sabe? – tomou mais um gole.

—Parece um bom plano também. -disse mãe, simpática, pondo mel em seu chá.

Sem querer, meu olhar se cruzou com o de Phil. Vi refletido ali a mesma sensação que encontrava em mim. Estávamos os dois em uma situação que não gostávamos, mas que decidimos enfrentar com cordialidade e maturidade. Ele sorriu, compreendendo. Sorri de volta para ele.

—Raphael, e seus outros filhos? Espero que estejam bem na Inglaterra – falou George, mudando de assunto.

—Ah, estão bem. Pedro, o mais velho, foi para a casa de um velho amigo meu estudar. Os mais novos, Edmundo e Lúcia estão na casa de meu irmão, Arnaldo.

—Aposto como eles devem estar bem crescidos. – Laura sorriu. – Com quantos anos eles estão?

—Pedro fez dezenove há alguns meses. Edmundo completou quinze e Lúcia catorze. – respondeu minha mãe, orgulhosa.

—Lembra, George? A última vez que os vimos eles eram tão pequenos, Lúcia era apenas um bebê! Ela deve ter se tornado uma linda moça, assim como a irmã. – me lançou um olhar de canto. Eu sorri de leve, agradecendo.

—Eu tenho fotos deles aqui, deixe-me lhe mostrar. – mamãe levantou e foi até o armário de onde tirou um álbum pesado.

Então meu pai, George e Phil, entretidos outra vez, foram para o gabinete, conversando sobre alguma coisa enquanto nós mulheres permanecemos na sala. Mamãe sentou ao meu lado e Laura ao seu lado. Helena Pevensie abriu o álbum sobre o próprio colo e procurou a foto em que estava Lúcia, Pedro e Edmundo. Eu também estava, só que atrás da câmera.

Papai havia comprado uma máquina fotográfica havia pouco tempo, e usei para tirar aquela foto para trazer para os Estados Unidos. Lúcia estava sentada sobre a mesa do escritório com um livro aberto sobre as pernas, os cabelos longos e avermelhados estavam jogados por cima de um dos ombros e ela sorria para mim. Edmundo estava sentado na cadeira de papai com os pés sobre a mesa, olhando-me com um sorriso torto e a mão no queixo. Pedro estava de pé, mexendo na estante cheia de livros atrás da mesa quando eu o chamei para a foto, ele virou parcialmente para mim com a mão em um dos livros da estante, sorriu, e eu tirei a foto.

Sorri sem notar que o fazia, olhando a foto, enquanto Laura fazia comentários sobre meus irmãos, comentários que eu não ouvia. A saudade bateu marteladas no peito e eu impedi as lágrimas. Mamãe virou a página e eu reprimi o susto. Ali estava o desenho que eu vinha procurando há alguns dias. Os olhos escuros e cabelos na altura dos ombros, dono de um olhar penetrante, que olhava para longe, acima de seus olhos estavam as sobrancelhas levemente unidas, completando a expressão séria do rosto direcionado para o lado, usava uma camisa larga, medieval e branca. Os traços do desenho se estendiam até o final da folha, até a espada em sua bainha. Passei a mão no desenho, apanhando-o.

—Está aí! – falei, mais para mim, de supetão.

—É um dos seus? – perguntou minha mãe, desconfiada.

—Hm... Sim – respondi, dobrando o desenho, sem vincar a folha.

—Quem seria esse rapaz? – perguntou Laura.

—Hm... é só um desenho. Eu vou levar isso lá para cima, com licença. – levantei e subi as escadas. Fechei a porta do quarto e escorei-me nela, apertando o papel contra o peito.

Respirei profundamente. Em seguida, um riso engasgado escapou da garganta. Havia certo humor em ficar tão apreensiva por um desenho desaparecido. Olhei a imagem novamente. Que hora para aparecer, não?

Dei três largos passos até minha mesa, abaixo da janela, abri a gaveta e tirei de lá o maior caderno. A capa era de couro e seu lacre era uma delicada fita de cetim rosa. Desatei o laço abrindo onde as folhas de meus desenhos estavam soltas. Subitamente, um vento entrou pela janela, agitando os papeis que voaram espalhando-se pelo quarto. Suspirei. Estiquei-me por cima da mesa até fechar a janela e em seguida ajoelhei-me pelo chão para catar as folhas.

Ouvi um barulho vindo do banheiro. Era a torneira aberta. Um arrepio percorreu meu corpo. Pus-me de pé e fui até lá, fechando-a. Assim que o fiz, o chuveiro abriu, jorrando água. Fechei-o, tentando me molhar o menos possível. Voltei para o quarto fechando a porta do banheiro. Um susto. Na mesa, meu caderno estava fechado com todas as folhas dentro. Exceto uma. O desenho de Caspian estava sobre a capa. Em passos lentos eu cheguei até a mesa e peguei o desenho em minhas mãos olhando-o confusa.

—Mas o que...?

Um rugido fez meus cabelos balançarem. Com o coração a galope, sorri sem acreditar.

Água respingou em meu rosto. Virei para ver de onde ela vinha: jorrava do quadro pendurado na parede. Era meu quadro preferido. Nele, Lúcia retratou o Espelho d’Água com um navio ao fundo. Havia chegado junto com uma carta dela mês passado, dizendo que serviria para eu “viajar para Nárnia quando eu quisesse”. A principio, meu ceticismo fez-me aproximar da parede, andando com cuidado pela água que já chegava aos joelhos, e afastar levemente o quadro, apenas para confirmar i que já sabia: não havia conexão alguma com a parede.

O quarto continuava enchendo rápido e eu já tinha a água na cintura quando afastei. Eu sorri quase rasgando as bochechas. Sim, era exatamente o que eu pensava. Afastei-me mais do quadro, devagar, recuando em direção a porta, sem dar as costas a ele. No entanto, um jato forte de água saiu da pintura, me derrubando já na profundidade considerável. Afundei mais metros do que o chão do quarto permitiria. Impulsionei-me, nadando em direção a superfície cada vez mais longe. Quando cheguei até ela, em vez do teto, deparei-me com um lindo céu azul, o oceano de águas tão azuis quanto o firmamento, se estendia a perder de vista, e em minha direção vinha um grande navio.


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Notas finais do capítulo

Então, o que vocês acharam?! Queria agradecer a todas que deixaram review!!! Amei cada um dele!!!
E quem não recebo mais nesse cap, né?
Beijokas!!!