Vesti o casaco grosso e fechei o zíper até o pescoço. Era possível ouvir o som fraco e ritmado da chuva batendo contra as janelas, escurecendo o céu daquela manhã de quita-feira. Aquele estava, definitivamente, sendo um outubro frio e molhado. Principalmente para Fort Lauderdale.

Terminei de descer as escadas do mezanino e caminhei com passos lentos até a cozinha, onde Madison se ocupava com algo que eu não pude ver.

– Bom dia, amor. – Falei, me aproximando dela.

– Bom dia. – Ela disse e eu dei-lhe um beijo nos lábios.

Ela me entregou uma caneca com chá quente – que, julgando pelo cheiro, era mate – enquanto tomava um gole de café com leite da sua.

Depois de quase um ano, eu podia afirmar que era estranho morar com Maddy. Ótimo, mas estranho. Era como viver uma vida de casada, só que com dezessete anos.

– Tá muito frio para ir para a escola! – Ela reclamou, fazendo-me rir.

– Concordo plenamente, mas a gente tem prova hoje. – Coloquei a caneca sobre a bancada, envolvendo sua cintura com um braço logo depois. Ela colocou a cabeça no meu ombro.

– Que triste. – Murmurou. – É prova de quê mesmo?

Soltei uma risada.

– Biologia, História e Matemática. – Falei.

– Nossa, que nerd. – Ela revirou os olhos, um sorrisinho brincando nos lábios.

Tomei os últimos goles do meu chá.

– Vamos, a gente está atrasada. – Falei, andando até o sofá e pegando a minha mochila ali.

– Ai... ok. – Maddy murmurou e praticamente se arrastou até a mesa, pegando sua bolsa. Andamos até a porta e eu peguei as chaves do carro antes de sairmos do apartamento.

Nós entramos no elevador de mãos dadas, dando de cara com uma mulher que nunca havíamos visto antes. Ela tinha uma expressão cansada no rosto, mas seu olhar era firme e severo. Os braços cruzados também ajudavam na imagem assustadora que ela trazia. Olhei para Maddy arqueando uma sobrancelha e ela sacudiu os ombros em resposta.

Deve estar visitando alguém, eu pensei e sacudi os ombros, abraçando a cintura de Maddy e beijando com delicadeza o seu rosto. Ela sorriu, colocou um braço ao redor da minha cintura e apoiou a cabeça no meu ombro, o que fez a mulher olhar para nós soltar um ruído que parecia um engasgo.

– Que horas são, amor? – Perguntei, ignorando aquilo.

– Com licença, como vocês se chamam? – A mulher nos interrompeu.

Eu e Maddy trocamos um olhar rápido.

– Madison. – Ela respondeu.

– Victoria. – Falei logo depois.

– E quantos anos têm?

– Dezessete. – Respondemos em uníssono.

– E vocês são amigas, irmãs...?

– Namoradas. – Maddy respondeu, apertando o braço ao redor da minha cintura. Ainda não havíamos saído da nossa posição.

A expressão que aquela mulher fez ao ouvir essa simples palavra era de puro desprezo e asco. Nem os olhares que Jordan lançara para mim se pareciam com aquele.

– Vocês são muito jovens para decidir isso, não acham? – Ela perguntou, seu tom de voz era baixo e tinha notas dos mesmos sentimentos transmitidos no olhar.

– Na verdade não. – Respondi com a voz firme. – Eu a amo. E ela também me ama. Acho que não há problemas em amar alguém aos dezessete anos.

– O problema não está em amar alguém, querida. – A última palavra veio com um leve tom irônico. – Está em amar uma mulher sendo uma mulher. Isso é errado.

– Sinto, mas vou ter que discordar da senhora. Amor é amor. Acima de qualquer outra coisa. – Respondi.

O modo que ela olhou para nós lembrava o olhar de alguém para algum tipo de extraterrestre bizarro.

Revirei os olhos e dei o meu melhor sorriso irônico, ouvindo um ruído estranho sair daquela mulher.

– Vocês estão erradas. Isso não existe. É triste que não aceitem, mas é errado.

O elevador finalmente chegou ao térreo. Entrelacei meus dedos nos de Madison e nós saímos dali, ignorando a mulher e suas colocações preconceituosas.

Do lado de fora do prédio a chuva havia engrossado. Nós tivemos que correr até o carro e, mesmo assim, acabamos nos molhando. Já dentro do carro, começamos a rir disso.

– Droga, molhei meu cabelo todo! – Reclamei, passando os dedos pelo meu cabelo. Agora ele estava um pouco mais comprido, batendo na nuca.

– Quem mandou esquecer o capuz? – Maddy riu enquanto eu dava a partida no carro.

Não demoramos muito a chegar à escola. A chuva ainda caía fortemente, e graças a ela o pátio coberto estava cheio.

– Tori! Maddy! – Ouvi a voz de Yuri assim que entrei ali.

Eu e Maddy viramos para trás e logo o vimos, andando em nossa direção. Antes que ele pudesse chegar, eu joguei minha mochila no chão e corri até lá, pulando em seu pescoço.

– Parabéns! – Quase gritei, fazendo-o rir.

– É... obrigada? – Ele arqueou uma sobrancelha logo que eu me afastei.

– Parabéns, Yuri. – Maddy aproximou-se de nós.

– Valeu, Maddy. – Ele deu um sorriso tímido, que logo se transformou em um daqueles sorrisos radiantes. Não precisei nem olhar para trás para ver que era Tom que estava chegando.

– Bom dia Tori, Maddy. – Ele disse enquanto se aproximava, trazendo uma não muito grande caixa de presente azul.

– Bom dia. – Respondemos baixo em uníssono, e depois eu completei. – Vamos deixar o casal em paz. Vem, Maddy. – Puxei-a pela mão.

Ao olhar para trás, vi Tom com os braços ao redor do pescoço de Yuri, beijando-o sem a menor cerimônia. Nas mãos do garoto mais alto era possível ver um ursinho de pelúcia.

– Sienna! – Ouvi Maddy chamar e me virei. Ela e Kori vinham lado a lado em nossa direção.

– Feliz aniversário! – Sorri.

– Obrigada, Victoria. – Ela agradeceu, abraçando-me.

– Parabéns, Sienna. – Maddy disse logo depois.

– Obrigada também, Madison. – Ela sorriu e abraçou-a também.

– Cara, como você deixa a sua namorada abraçar elas? – Kevin aproximou-se, parando ao lado de Kori.

Ele era um garoto que havia entrado na escola há alguns meses e era meio ressentido comigo e Maddy graças ao fora que levara dela e à minha vitória sobre ele na pista de skate.

– O que tem eu abraçar Victoria e Madison? Até onde eu sei, elas são minhas amigas. – Sienna cruzou os braços, colocando-se em nossa defesa.

– Mas... vocês sabem não é? – Ele deu de ombros, colocando as mãos nos bolsos em uma atitude displicente.

– Na verdade eu não sei. – Kori colocou-se ao lado de Sienna, encarando Kevin com uma expressão assustadora.

– O que houve, gente? – Yuri perguntou, aproximando-se de nós de mãos dadas com Tom. Ao lado de Sienna, era possível ver que o moreno era quase meia cabeça mais alto que Kevin.

Aquilo definitivamente não daria certo.

– Não foi nada, não é, Kevin? Só um infeliz comentário. Você já estava até saindo, certo? – Interrompi a pequena tensão que se formava, empurrando o braço do garoto de cabelos morenos antes que aquilo piorasse. Ele deu de ombros e saiu dali.

Balancei a cabeça negativamente.

– Hoje é o dia. – Madison comentou, fazendo-me soltar uma risada.

Minutos depois o sinal tocou e nós nos encaminhamos para as nossas salas.

...

– Às oito horas, ok? Não se esqueçam! – Sienna exclamou.

– Você disse isso o dia todo, Sienna! É impossível esquecer! – Yuri balançou a cabeça negativamente.

– Não enche, Yuri. – Ela revirou os olhos e ele e Tom riram.

– Eu já vou indo. Vou passar na casa de Amber para levar a matéria para ela ainda hoje. – Louie sorriu. – Até mais tarde, gente.

– Até. – Todos nós respondemos em uníssono.

– Eu também já vou. Até logo, amor. – Tom disse, dando um beijo rápido em Yuri, que sorriu logo depois.

– Até logo. E obrigado pelo presente. – Yuri agradeceu e Tom também sorriu, acariciando a bochecha do namorado com carinho.

– Tchau, gente. Até mais tarde. – Ele acenou para nós e saiu andando pela rua.

Logo que Yuri e Sienna foram embora, Kori tomou o caminho da sua rua e eu e Madison seguimos até o carro.