Kuroi Crystal escrita por Luciane


Capítulo 8
Capítulo 7 - O cristal de Natsu




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No apartamento provisório da família Charpentier em Tóquio, uma festa acontecia já há algumas horas, reunindo um seleto grupo de sócios do dono da residência e suas respectivas esposas e filhos. Nathalie sempre achara esses eventos sociais incrivelmente chatos, mas dessa vez era diferente. Pela primeira vez, ela não se sentia sozinha. Jean era sua companhia. Ainda achava incrível como duas pessoas de criações e gostos tão diferentes pudessem ter tanto assunto um com o outro. No momento, falavam sobre a recente mudança para Tóquio.
-E quando voltará a estudar? – O loiro indagou.
Cruzando elegantemente as pernas sob o vestido verde, a mestiça respondeu:
-Marie me disse que te passará as instruções e amanhã deverá me acompanhar para conhecer a nova escola.
Jean mostrou-se empolgado:
-Aposto que vai adorar essa escola. Fará novos amigos e quem sabe até um namorado.
Já Nathalie, não parecia animada com aquela idéia que Jean repetia desde Okinawa.
-Ao menos o namorado você pode descartar. É uma escola feminina. Um colégio de irmãs, pra ser mais exata.
O francês franziu a testa, abismado:
-Nossa... Sério?
-Meu pai é ultra-tradicional, como eu já lhe contei.
-De qualquer maneira, nada impede que faça amigas no novo colégio.
Nathalie concordou e eles logo mudaram de assunto, falando sobre a festa, os convidados, sobre a nova casa (que era incomparavelmente menor do que a residência de Okinawa), entre outras coisas.
A certa distância, Marie os observava em silêncio.

*****
Eles riam. Cada um deitado em sua cama, em um dos três quartos da república. Conversavam sobre a outra vida, onde eles eram grandes amigos.
-...Lembra daquela vez que nós colocamos uma aranha no quarto das meninas?
-Não, Yuuhi. Lembro que VOCÊ colocou uma aranha no quarto das meninas.
-É, fui eu! – Yuuhi abriu um largo e orgulhoso sorriso – Você e Aki eram meio manés pra essas coisas.
Hideki o encarou com o canto dos olhos.
-É, mas na hora do castigo nós dois acabávamos entrando junto com você.
-Amigos são pra essas coisas, né? Tempos bons aqueles! – De repente, a expressão de Yuuhi tornou-se séria. – Escuta, Hideki... Maaya e você não tiveram mesmo nenhuma notícia de Akemi?
Também ficando sério, Hideki pôs-se a encarar o teto. Ficou em silêncio por alguns segundos, antes de responder:
-Nenhuma.
-É estranho que ela não tenha voltado como sua irmã. Eu sei que isso era o que ela mais desejava nesse mundo.
Hideki também sabia. Akemi era muito ligada à família.
-Meu único irmão nessa vida era o meu pai da outra. – Respondeu, por fim.
-É, o destino tem dessas. – Yuuhi fez uma pausa, pensativo – Pelo menos, Natsu voltou como minha irmã... Ou pelo menos como minha quase-irmã.
-Acha mesmo que Sakomura é Natsu?
-Acho, não: tenho certeza! Pelo menos fico mais tranqüilo em saber onde ela está.
-É... E eu também ficaria tranqüilo se soubesse onde está Akemi.
Yuuhi sentou-se na cama, olhando para o mais velho.
-Vocês dois eram muito amigos, né? Coisa estranha pra dois irmãos.
Hideki riu.
-“Estranho” por quê? Você também era amigo de Natsu.
-Mas era diferente. Eu a odiava acima de tudo. Só gostava dela bem lá no fundo meeeeesmo. ¬¬’ Você e Akemi não! Vocês sempre se deram bem. Nunca os vi brigar.
-Já viu Akemi brigando com alguém?
-É, realmente... Cena rara! Sua irmã era uma garota encantadora.
-Era, não: ainda é. Onde quer que esteja.
-May me disse que o destino trará todos para cá... Acha que trará Akemi também?
-Se a minha mãe falou, você ainda duvida?
-Não. Sei que ela virá. A vida vai ter que colocar Akemi no meu caminho novamente, cara! Eu sei que vai!
O ruivo sorriu de leve. Vendo que a conversa estava tomando um rumo um tanto depressivo, tratou de puxar outro assunto. Mas de nada adiantou, pois Yuuhi logo voltou a falar sobre a vida passada. O adolescente estava empolgado demais com isso para conversar sobre qualquer outra coisa.

*****
Na manhã seguinte...
-Entre.
Ele já havia acordado há algumas horas. Estava no pequeno escritório do apartamento, lendo alguns contratos, quando ouviu alguém bater à porta. Já esperava que fosse alguma empregada trazendo seu café, mas não esperava que fosse justamente ela.
-Podemos conversar, senhor? – Perguntou Marie, deixando a bandeja de café sobre a mesa.
Louis Charpentier tirou os óculos que usava para leitura e os deixou em cima do contrato. Olhando para a governanta, respondeu calmamente:
-Claro, Marie.
Ela foi breve e direta no que queria:
-Acho que seria melhor que Jean voltasse para Okinawa.
O patrão não compreendeu a sugestão.
-Não vejo razões para isso, Marie.
-A atitude dele ontem, senhor... Confesso que me senti incomodada ao vê-lo entre os convidados de sua festa.
-Mas ele de fato estava na festa como meu convidado. Qual o problema nisso?
A governanta sabia que aquele não era o maior problema. Então, tentou ser mais direta:
-Para ser sincera, senhor, acho que meu filho e a menina Nathalie estão se dando bem demais.
-E isso não é bom? Achei que a intenção fosse essa.
-Sim, eu o indiquei para o trabalho exatamente com essa intenção, mas não imaginava que isso fosse ultrapassar os limites de uma relação profissional. Nathalie e Jean são de mundos diferentes, de classes diferentes... Ele é empregado dela. Não está certo quererem ser amigos.
Louis riu, achando graça do modo com que a empregada dissera aquelas palavras.
-Marie... Você está falando do jeito que a minha mãe costumava falar. Eu realmente não vejo nada que impeça os dois de serem amigos. Pelo contrário: fico muito feliz que minha filha agora tenha alguém a quem chamar assim.
-Se fosse apenas isso, seria aceitável. Mas o senhor não parou para pensar que... Que talvez essa relação dos dois, com o tempo, venha a passar de uma simples amizade?
Louis ficou pensativo diante daquelas palavras. Sua filha e Jean tendo um relacionamento amoroso? Mas Nathalie era apenas uma garotinha. Pensando mais um pouco... Não, ela não era mais uma criança. E não seria nada improvável que um dia viesse a se apaixonar por aquele rapaz.
Por fim suspirou, respondendo:
-Realmente isso pode acontecer.
-E o que o senhor fará caso isso aconteça?
-E o que acha que poderei fazer? Se os dois realmente se apaixonarem, só cabe a mim aceitar. Afinal, amor não escolhe classe social. E eu não me sentiria no direito de condená-los. Até porque, a própria mãe de Nathalie não era uma mulher de posses.
-Mas não era sua empregada.
-Não. Mas eu já me envolvi com uma empregada no passado.
Os olhos dos dois se encontraram por um breve momento, mas Marie logo desviou os seus, olhando para baixo, visivelmente perturbada com aquela situação.
-Sim. Exatamente por isso o senhor deveria saber que esse tipo de relação não tem como dar certo.
-Marie, entenda: os dois são jovens, e nós vimos que não se importam com a diferença social que existe entre eles. Deixe que sejam amigos! Não creio que a relação dos dois chegue a passar de uma simples amizade, mas, se isso acontecer, deixemos que eles sejam felizes. Não é isso o que queremos para os nossos filhos? Que encontrem a felicidade?
Marie suspirou. Ainda não havia se dado por vencida. Sabia que aqueles dois não poderiam se envolver... Porém, talvez seu patrão tivesse razão: talvez tudo não passasse mesmo de uma cisma infundada de sua cabeça. Jean e Nathalie eram apenas amigos... E não havia impedimento algum para que o fossem. Aquilo, com certeza, não passaria de uma simples e boa amizade. Mas, se por acaso passasse, ela não mediria esforços para impedir que tal relacionamento fosse adiante.
Por fim, olhou novamente para o patrão.
-Sim, senhor. É o que queremos para os... Nossos filhos. Agora, com sua licença, vou voltar ao trabalho.
Louis ainda a observou enquanto ela saía do escritório, pensando em o quanto Marie era radical em seus valores.

*****
-Vai faltar à escola de novo?
Yuuhi fez que sim e Tiemi bufou. Tomavam o café da manhã na república, lado a lado, na enorme mesa da cozinha.
-E por que vai faltar desta vez?
-Porque estou a fim, ora essa.
No outro lado da mesa, frente a eles, Maaya e Hideki trocaram olhares e riram disfarçadamente... É, parecia que “Yuurei” não havia mudado em nada.
Tiemi, entretanto, não se deu por vencida com o argumento do irmão:
-Geralmente você não vai por preguiça de acordar cedo. Já está acordado! O que custa vestir o uniforme e assistir nem que seja uma aula? As provas tão chegando, sabia?
-Eu não quero ir à escola, peste, vê se entende.
-E por que não? Dê-me um motivo.
Ele a olhou por um breve instante, logo voltando a olhar para sua comida.
-Não vai rir?
-Não. Fala logo!
-É que... Não estou a fim de encontrar com a Manami.
-Ué... E por que não?
-Por quê? Aquela garota mais parece uma coelha! Eu mal chego e ela já sai me agarrando que nem uma tarada psicopata! Ò_ó
-... E daí? O.o
-E daí que hoje eu não tô a fim. ¬¬
-O.o... Yuuhi Kawamoto? O garanhão? O pegador? O tarado? O hentai-mor? Fugindo de mulher? – Ela piscou algumas vezes, tentando processar aquela informação. Depois caiu na gargalhada.
-Eu disse pra não rir! ¬¬’ Hoje eu não tô a fim, apenas isso.
-Tá na TPM, tá? XD
-...Tu não tava atrasada pra aula, peste? ¬¬
Ainda rindo, a garota levantou. Despediu-se dos três e saiu.
Maaya e Hideki olharam sérios para Yuuhi.
-Que foi? – Quis saber o bad boy.
Hideki questionou, autoritário:
-Quem é Manami?
-...Uma amiga O.o.
-Sua namorada? – Questionou Maaya, compreensiva.
-Não, Maaya. Bem, digo... Mais ou menos.
-E por que está fugindo dela, querido?
-Porque agora isso parece estranho. Vou me sentir traindo a Akemi se me envolver com outra mulher.
-Eu entendo, querido. Mas não acho que seja justo você fugir da menina desse jeito. Converse com ela, ou dê mais um tempo antes de terminar.
Hideki olhou para sua mãe, totalmente horrorizado com aquelas palavras.
-Ei, pera lá! Não vou admitir que esse cara desrespeite minha irmã desse jeito!
-Meu filhote, quanto tempo tem que você despertou suas lembranças?
-Acho que uns cinco anos, por quê?
-E depois disso, com quantas garotas “ficou” naquelas festinhas que ia durante a adolescência? ^-^
-É diferente, mãe! ¬¬
Yuuhi fez-se de horrorizado com aquilo:
-Como é que é? Deixa só a Naoko saber disso! O.o
-Ela não vai saber! ¬¬’
-Com a irmã dos outros a coisa é mais fácil, né? ^^ – Comentou Maaya, rindo.
-Mas que espécie de mãe você é? ¬¬’

-Da espécie paranóica, como todas as outras, mas numa medida aceitável. E não vejo mal algum em o Yuuhi continuar com sua rotina normal. Quando ele reencontrar a Akemi, aí sim ele se endireita. Enquanto isso, deixa o garoto curtir a vida, Hideki!
-...Tudo bem, vai! – Hideki concordou, vencido pelos argumentos – Até porque, onde a Akemi estiver, também deve se envolver com outros caras.
-Outros caras? O.o – Murmurou Yuuhi, antes de se levantar revoltado – Mas nem ferrando! Ò_ó
E ele saiu caminhando em direção ao corredor.
-Aonde vai? – Perguntou Hideki.
Yuuhi voltou-se para ele, respondendo com determinação:
-Vou procurar pela minha Akemi! Ò_ó
-Não creio numa coisa dessas... ¬¬
Maaya riu.
-Querido, como acha que vai encontrá-la?
-Não disse que ela está em Tóquio? Vou revirar essa cidade atrás dela!
-E como acha que vai reconhecê-la?
-Eu reconheço a Akemi em meio a milhares de outras garotas! *-* Ela é a mais linda, a mais doce... – Ele fez uma pausa, notando o quanto aquelas palavras soavam estranhas quando ditas por ele – Cara, não tô me reconhecendo O.o... Enfim, não é difícil encontrá-la! Só ela sorri daquele jeito! Só ela tem aquela expressão tão serena, tão doce! *-* Sem contar, que ela, com certeza, deve estar envolvida em alguma campanha de caridade, ajudando velhinhos a atravessar a rua ou cuidando de animais abandonados. Ah, tão bondosa minha Akemi! ;___; Enfim, vou atrás dela. Ò_ó – Determinado, ele voltou-se para o corredor – AKEMI, ESPERE POR MIM, MINHA DEUSA!!!
Nessa mesma empolgação, ele saiu. Na cozinha, Maaya e Hideki mal podiam acreditar naquela cena.
-Não sei se rio ou se choro. – Resumiu Hideki.
Maaya ficou com a primeira opção.

*****
-Caim, caim, caim...
Após ser “delicadamente” chutado, o vira-lata saiu correndo, literalmente com o rabo entre as pernas.
A autora do chute, após ter tirado o animal de seu caminho, seguiu entrando em seu novo “lar”.
Sentou-se em seu canto de sempre, comendo um sanduíche que comprara na rua. Nem ao menos tocara nas frutas que Hideki lhe havia levado. Tirou um aparelho MP3-player da mochila e o colocou para tocar... Nada. As pilhas estavam fracas. Sendo assim, guardou-o novamente e pegou um livro qualquer, começando a ler.
Ficar naquele lugar já estava virando um verdadeiro tédio.

*****
No dia seguinte, bem que Yuuhi tentou novamente, mas a insistência (e os convincentes argumentos) de Tiemi foram tantos que ele, vencido, acabou se aprontando para ir à escola. No final das contas, era a garota que estava tendo que cuidar do irmão e não o contrário, como ele havia prometido a Mitsuki.
Ignorando totalmente as lamúrias do garoto, que não parava de reclamar pelo fato de ter acordado tão cedo, a ruiva tagarelava sem parar, contando sobre a nova professora de Geografia:
-...E a aula dela é sensacional! Geografia não é bem a minha matéria preferida, mas eu consegui tirar todas as minhas dúvidas. Ela é bem melhor do que a antiga professora... Nhá, que descanse em paz! ;___; – Ela lacrimejou – Tão triste o que aconteceu com ela, né, Yuuhi? ;___; ...Yuuhi, tá me ouvindo? O.o ...YUUHI! Ò_ó
-Ãh... – Distraidamente, ele a olhou – Falou comigo?
-É, né? Falei! ¬¬’ O que deu em você, hein? Desde anteontem que cê anda mó distraído.
-Né nada não. Tô na boa! Fala... O que dizia sobre a tal professora?
-...Então, ontem ela passou um simulado, pra ver como andam nossos conhecimentos na matéria. Disse que dará aula extra pros alunos com baixo rendimento. Legal, né? É bom, porque fui tão mal na primeira prova... Agora preciso me recuperar.
-Ah... E como você foi no tal simulado?
-Acho que fui bem. Pelo menos um ‘sete’, creio que deu pra tirar.
-Legal...
E Tiemi continuou a tagarelar, até que chegaram ao colégio. Ainda no portão, encontraram a famosa professora, Kitamura Hitomi. Tiemi puxou seu irmão, aproximando-se dela.
-Bom dia, Kitamura-sensei. ^-^
De forma simpática, a professora respondeu ao cumprimento:
-Bom dia Sakomura.
-Esse aqui é meu irmão de quem eu te falei. – Ela apontou para Yuuhi, que não pareceu muito feliz com o que ouvia.
-Falou de mim pra sensei? – Resmungou, não percebendo o olhar intrigado que Hitomi lhe lançava.
-Então você é o famoso Kawamoto?
-Famoso eu sou mesmo! ^-^ - Yuuhi sorriu, orgulhoso de sua “fama”.
-É, soube que suas notas são as piores do segundo ano. – Explicou a professora, ainda simpática, destruindo toda a animação do adolescente.
-Geografia não é o meu forte ¬¬’. – Ele retrucou.
Ao seu lado, Tiemi bufou:
-Nada é o seu forte, não é, “maninho”?
-Cala a boca, peste ¬¬!
Sorrindo, a professora tornou a olhar para Tiemi.
-Querida, eu sinto informar que a sua nota no simulado também não foi das melhores. Tirou quatro.
A ruiva desesperou-se ao ouvir aquilo. Ao seu lado, Yuuhi sorriu com implicância, e zombou:
-E disse que tinha tirado pelo menos sete, hã?! >D
-Cala a boca, tapado! Ò_ó – Tiemi olhou para Hitomi – Mas, mas... Kitamura-sensei, eu achei que tivesse ido tão bem! ;___; Eu não posso ficar reprovada em Geografia, não posso!
Parecendo se compadecer com o desespero da garota, Hitomi mostrou-se prestativa:
-Não se preocupe, querida. Eu vou te ajudar. Que tal uma aula de reforço hoje, depois da escola?
-Faria isso por mim, sensei? ;___; Obrigada!
Em silêncio, Yuuhi moveu a cabeça negativamente, abismado com tudo aquilo. Perguntava-se o que levava uma pessoa a aceitar ter mais aulas depois do horário da escola. Tiemi poderia simplesmente pedir emprestado o caderno com as anotações de aula de algum CDF, ou levar algum “material ilícito para consultas” no dia do exame. Mas, não! Ela tinha a estúpida mania de seguir as regras e, apesar de não gostar tanto assim de estudar, era esforçada a ponto de se prestar a esses sacrifícios.
Ele pensou em dizer alguma coisa, mas foi impedido por Manami que chegava naquele momento e, como de costume, já o agarrava pelo braço, puxando-o para a direção oposta à entrada da escola. Olhando para aquilo, Tiemi suspirou constatando que seu irmão iria matar mais um dia de aulas.
O que a menina não percebeu é que a professora Kitamura também seguia o rapaz com os olhos.
-Kawamoto Yuuhi... Então, é ele. – Hitomi sorriu.

*****
O sinal finalmente tocou, anunciando o final de mais um dia de aula. Tiemi despediu-se de suas colegas e saiu da sala. Ao passar pelo portão da escola, encontrou com Hitomi, como havia combinado. Esta se desculpou, informando que não poderiam usar as dependências do colégio para a aula extra. Sem ao menos contestar a informação, a garota entristeceu. Contudo, a professora prontamente apresentou uma sugestão:
-Mas podíamos ir para a minha casa. Moro aqui pertinho, a duas estações. Estou de carro, a gente chega lá em cinco minutinhos. Algum problema para você?
Como o esperado, Tiemi prontamente se alegrou com a idéia:
-Imagina, problema algum! Obrigada, sensei!
Sorrindo, Hitomi levou Tiemi até o seu carro e as duas seguiram, a caminho do apartamento da mais velha.
Assim que chegaram ao local, Hitomi pediu que Tiemi se sentasse no sofá e esta assim o fez.
Enquanto Tiemi percorria o ambiente com os olhos, a professora permaneceu de pé, observando-a. Aquela garota lhe seria bastante útil... Seria a chave para que ela conseguisse o que tanto planejava: o fragmento do cristal que estava com Kawamoto Yuuhi.
-Ai, Deus! Não acredito que fiz isso! – Exclamou de repente, chamando para si a atenção da aluna.
-O que foi, sensei?
-Esqueci meu planejamento de aulas na escola!
-Ah, e agora?
-Se importa em esperar por aqui? Eu vou lá buscar e volto em dez minutinhos.
-Ah, claro. Eu espero.
-Fique à vontade, viu? Se estiver com fome ou com sede, a cozinha é logo ali. – ela apontou para um corredor - Pode se servir com o que quiser. Assista um pouco de tevê enquanto espera.
Dizendo isso, Hitomi saiu. Tiemi ligou a televisão e continuou sentada no sofá, enquanto aguardava o retorno da professora.

*****
Lentamente, Manami passava o dedo pelas curvas do corpo do rapaz que dormia ao seu lado na cama de um motel barato nas proximidades do colégio.
Apesar da pouca idade, Manami era uma menina bastante popular entre os garotos. No entanto, nenhum deles tinha uma sintonia tão perfeita com ela como Kawamoto Yuuhi. Ele era, indiscutivelmente, o seu preferido e o mais especial. E já se sentia mais do que realizada por saber que tal sentimento era recíproco. Apesar das inúmeras garotas na vida dele, Manami sabia que ela era a número um, e isso já lhe bastava.
Beijou de leve os lábios dele e, com isso, ele pareceu começar a despertar. Ela o beijou novamente. Sonolento, ele se espreguiçou, enquanto murmurava:
-Akemi...
Ela afastou-se subitamente dele, sentando-se na cama. Estaria ouvindo coisas, ou Yuuhi realmente tinha dito o nome de outra mulher?
Obteve a confirmação quando ele repetiu:
-Akemi... – E foi subitamente acordado, quando Manami começou a estapeá-lo – AIÊ!!! QUE ISSO, NAMI?? PÁRAAAAAA!!!
Ainda esbofeteando-o, ela gritou:
-Como foi capaz de fazer isso comigo? Como???
Ele segurou fortemente as mãos dela, obrigando-a a parar. Totalmente confuso, perguntou:
-Isso o que, Nami?
-Eu... Eu nunca fui tão humilhada em toda a minha vida!
-Mas o que eu fiz?
Se antes ele estava apenas confuso, logo Yuuhi sentiu-se terrivelmente culpado ao ver lágrimas começarem a brotar dos olhos da garota.
-Nunca, Yuuhi! Nunca nenhum cara me chamou por outro nome. E eu nunca poderia imaginar que justo você fizesse isso comigo.
-Er... Eu fiz? O.o
-Fez! Então me diz, quem é essa tal de ‘Akemi’? Quem é a cachorra?
-Cachorra não! Ò_ó Pera lá!!!
-E você ainda a defende!! Eu... Eu fui trocada por uma criatura com o nome mais brega que já ouvi na minha vida! – Ela cobriu o rosto com as mãos e seu choro tornou-se mais intenso, o que comoveu Yuuhi.
-Ei, peraí, Nami... Pára de chorar, vai!!
-Você não gosta de mim! Você não gosta nem um pouquinho de mim!
-É claro que eu gosto, Nami! Não chora, por favor! – Yuuhi já beirava o desespero. Poucas coisas o afligiam tanto quanto o choro de uma mulher.
-Não! Pra você, eu sirvo apenas para te dar alguns momentos de prazer e nada mais. Eu... Eu não sou nem um pouco especial pra você.
-É claro que é, minha linda. Não fala assim, não.
-Então me prova que sou especial pra você.
-Provo O.o. Só se for agora! >D Vem cá, vem! – Ele a abraçou, apenas para ser empurrado.
-Não me refiro a fazer isso de novo ¬¬’. Quero outra prova.
-Mas que tipo de prova, Nami?
Ela o encarou firmemente, antes de responder:
-Quero que... A partir de hoje,... Eu seja... Sua namorada.
Por alguns segundos, Yuuhi ficou sem fala.
-... Er... Namorada? Bem... É que...
-Tá vendo? Eu não sou especial o suficiente pra você querer abrir mão das outras mocréias como essa tal de Akemi.
Tentando ignorar o fato de sua amada ter sido novamente ofendida, Yuuhi apavorou-se com a idéia de Manami voltar a cair no choro.
-Er... É claro que você é especial, Nami! Mas é que...
-Eu te dou um tempo pra pensar, Yuuhi. Quero a sua resposta até amanhã. Mas fique sabendo de uma coisa: ou eu passo a ser exclusivamente sua e você exclusivamente meu... Ou nós nunca mais ficaremos juntos novamente. Entendeu?
-Er... Isso seria cruel, né?! ó.ò
-Então, tem seu tempo para pensar. Agora vamos embora. Perdi a vontade de continuar aqui.
Vendo que de nada valeria tentar argumentar, Yuuhi levantou-se da cama, começando a vestir sua roupa.

*****
Ele ainda se ofereceu para acompanhá-la até a casa, mas a garota recusou. Ela realmente estava uma fera... E não era para menos!
-Também, seu idiota, como pôde chamá-la de Akemi? E agora, o que vou fazer pra resolver essa situação?
Falando sozinho, ele seguiu rumo à república. No entanto, ao virar em uma esquina, viu seu caminho bloqueado por um carro. Uma das portas do veículo se abriu e de lá saiu uma mulher que Yuuhi logo reconheceu... Era a professora que Tiemi havia lhe apresentado pela manhã. Mas... O que ela fazia ali?
Sorrindo para o rapaz, ela anunciou:
-Preciso ter uma conversa séria com você.
A sensação de desconfiança por parte de Yuuhi foi automática. Não saberia explicar os motivos daquilo, mas algo naquela mulher o incomodava profundamente.
-Fale. – Ele pediu, de forma seca.
O sorriso dela não se desfez.
-Siga-me. Vamos para um local onde poderemos conversar mais reservadamente.
Embora desconfiado, Yuuhi a seguiu rumo à escola onde estudava.

*****
Tiemi já começava a ficar impaciente. Olhou para o relógio, notando que já havia se passado mais de vinte minutos desde que Hitomi saíra.
A tevê continuava ligada. Contudo, ela não prestava a mínima atenção ao que se passava no aparelho.

*****
Enfim, chegaram ao colégio. Yuuhi continuou a segui-la até entrarem na sala da diretoria, que se encontrava vazia. Após fechar a porta, Hitomi sentou-se na cadeira do diretor, enquanto Yuuhi permaneceu de pé, diante da mesa. O estudante notou que havia um pequeno televisor sobre a estante atrás da cadeira onde a suposta professora estava, e tal fato o causou ainda mais estranheza. Já havia estado incontáveis vezes naquela sala e nunca antes notara a existência de uma tevê ali.
-Parece tenso, querido. – Disse Hitomi, quebrando o silêncio – Por que não senta e relaxa um pouco?
Ele a encarou com ainda mais desconfiança.
-Estou bem de pé. O que quer comigo?
A professora sorriu antes de responder:
-O pingente de seu colar.
Os lábios do rapaz entreabriram de susto diante do que acabara de ouvir. Estava certo de que seu colar mantivera-se o tempo inteiro escondido por baixo de sua camisa. Sendo assim, como Kitamura poderia saber da existência de tal objeto?
-Não sei do que está falando, sensei. – Ele respondeu, tentando mostrar-se calmo – Se é apenas isso que queria, eu tô indo nessa, valeu? Fui!
Dito isso, ele deu meia-volta e dirigiu-se à porta. Assim que pôs a mão na maçaneta para abri-la, deteve-se, curioso, ao ouvir a risada de Hitomi e voltou-se para ela.
-Você é um jovem muito rebelde. – Ela disse, ainda rindo – Tão diferente de sua irmã...
Ouvindo-a mencionar Tiemi, Yuuhi largou a maçaneta da porta e se aproximou da mulher. Dessa vez, a encarava sem fazer a menor questão de disfarçar sua desconfiança.
-Se está falando de Sakomura Tiemi, ela não é minha irmã. – Ele afirmou.
-Então... Não se importa se algo acontecer a ela?
Após a pergunta, Hitomi sorriu novamente ao notar o leve traço de medo que passou pelos olhos de Yuuhi. Antes que ele dissesse qualquer coisa, ela pegou um controle remoto na mesa e apontou-o para trás, ligando a tevê.
Assustado, Yuuhi apoiou as mãos sobre ela, olhando para a imagem de sua irmã na tela do aparelho.
-TIEMI! – Gritou.
Para sua surpresa, a garota voltou os olhos para a câmera, como se também estivesse vendo a imagem de Yuuhi... O que de fato acontecia: na sala do apartamento onde estava, ela olhava abismada para a televisão, ao ver seu irmão ali, e, o que era mais incrível: olhando e falando com ela.
-Yuuhi? – Ela o chamou. Levantou-se do sofá e se aproximou da tevê. – Kitamura-sensei? Onde estão?
-Onde você está, Tiemi? – Perguntou Yuuhi, aflito.
-No apartamento da Kitamura-sensei.
-Está sozinha?
-Estou.
-Então dá o fora daí, peste! AGORA!!!
Aquela ordem a deixou ainda mais confusa. Contudo, notando que Yuuhi parecia MUITO preocupado, ela não ousou questionar os motivos daquilo e virou-se para sair do apartamento. Nisso, se deparou com um obstáculo.
Tratava-se de um homem forte, alto e de cabelos compridos, que, com os braços cruzados, parecia não ter a menor intenção de deixá-la passar pela porta.
-Er... De onde esse armário saiu? O.o – Ela olhou novamente para o televisor – Yuuhi, me explica... O que tá rolando? É uma pegadinha? Porque se é, não tem a menor graça!
Yuuhi cerrou os dentes com força, numa tentativa de conter seu nervosismo. Assim, tornou a olhar para Hitomi que, ainda sorrindo, informou:
-Tente qualquer gracinha, e meu amigo dá um fim na sua irmãzinha postiça.
Ele fechou os punhos com ódio. Olhou novamente para o televisor, encarando o homem que estava parado em frente à porta. Parecia bem forte. Com certeza não precisaria de nenhum tipo de arma para ferir Tiemi, afinal, ela não sabia se defender, era tão pequena, tão frágil... Se quisesse, aquele sujeito a mataria sem a menor dificuldade.
Tornou a olhar para Hitomi, ainda tentando controlar seu ódio.
-O que quer de mim?
-Eu já disse o que quero: seu cristal... Katsura Yuurei.
-Yuurei... – Sussurrou Tiemi, parada de frente para o aparelho de tevê. – ...Katsura? – Sentia como se aquele nome lhe lembrasse algo... Mas, o quê?
Yuuhi puxou o colar de dentro de sua camisa. Os olhos de Hitomi brilharam diante daquele pedaço de cristal azul.
Mas a falsa professora não foi a única a fixar sua atenção naquele pendente. Tiemi também olhava para aquilo, tendo a estranha sensação de que sua mente queria se lembrar de algo, mas, por qualquer motivo, não conseguia.
Kawamoto tentou tirar o colar de seu pescoço, apenas para demonstrar a Hitomi que não havia jeito de fazer isso.
-Terá que arrancar meu pescoço pra isso sair. – Ele comunicou – E suponho que saiba que, se me matar, não poderá usar a energia contida no cristal.
-Energia... Cristal... – Sussurrava Tiemi enquanto assistia àquilo. Era como se cada vez mais sua mente quisesse se lembrar de alguma coisa.
-Dê-me logo esse cristal. – Ordenou Hitomi, parecendo não compreender o que o rapaz havia acabado de dizer.
-Você é surda ou o quê? Tô te dizendo que essa porcaria não sai. – Ele repetiu, impaciente.
-Dê o seu jeito.
-Já disse que só arrancando meu pescoço. Essa praga não sai nem por decreto.
-Dê-me o cristal agora, ou ordeno que matem a garota.
-O CRISTAL NÃO SAI! Ò_ó
-Me entregue!
-Mas tá difícil de entender, hein? ¬¬’
-Awano. – Chamou a professora, sem desviar os olhos de Yuuhi.
Ele voltou a olhar para o televisor, vendo aquele homem caminhar em direção a Tiemi, que permanecia de pé diante da tevê, totalmente distraída e sem nem ao menos notar que o inimigo se aproximava.
-TIEMI, ATRÁS DE VOCÊ!
-Hm? – E a garota finalmente pareceu despertar. No entanto, não teve tempo de virar o rosto para trás. Tudo o que pôde sentir foi uma enorme mão agarrando o seu frágil pescoço e suspendendo o seu corpo.
-TIEMI! – Gritou Yuuhi, apavorado.
Hitomi soltou outra risada.
-Me entregue agora o cristal, ou diga adeus à pequena.
Ele socou fortemente a mesa com as duas mãos, assustando Hitomi.
-Eu já disse que não tenho como tirar o cristal. Agora mande aquele infeliz soltar a minha irmã!
-Dê o seu jeito. Se eu não tiver o cristal, a menina morre.
Ele tornou a olhar, apavorado, para o monitor. Com os olhos fechados, Tiemi ainda lutava inutilmente para soltar a mão daquele homem de seu pescoço.
Percebendo que, à distância, não teria como lutar contra aquele sujeito, Yuuhi fez a única coisa que poderia ser feita: aproximou-se mais do televisor, segurando com força o aparelho, enquanto gritava:
-Tiemi!!! Tiemi, reaja! Reaja! Tiemi!!! ... NATSU!!!
Ela abriu um pouco um dos olhos, repetindo num sussurro o nome que Yuuhi havia dito:
-Natsu...
E, como num flash, imagens e vozes invadiram sua mente.
Então, tudo fez sentido.

-AIÊ!
Novamente, ela caiu de encontro ao chão e seu irmão a puxou pelo braço, ajudando-a a se levantar. Estavam no antigo dojo que havia pertencido ao pai deles. Um local que os dois frequentemente usavam para brincadeiras e treinos.
-Humpf... Continua a mesma fraca de sempre.
Uma vez de pé, ela sacudiu a poeira de seu kimono, colocando-se novamente em posição de luta.
-Mais uma vez! – Disse, com convicção.
Yuurei cruzou os braços e franziu de leve a testa, espantado com a determinação da irmã caçula.
-Não se cansa nunca, pirralha?
-Não me chama de pirralha! Ò_ó
-É uma pirralha, sim! Só tem oito anos.
-E você, com nove, já se acha o adulto, né? ¬¬
-Isso não interessa. O fato é que você precisa aceitar a realidade de que nunca irá me vencer.
-Vou, sim. Se continuar treinando, um dia serei forte que nem você.
-Há... Vai nessa, pirralha.
-Não me chama de pirralha! Ò_ó E vamos lutar de novo.
-Acho que por hoje chega, não é? – Disse uma voz feminina, se aproximando deles.
Os dois olharam para a direção em que aquela voz vinha. Encontraram uma mulher, cujos cabelos compridos estavam presos por um alto rabo de cavalo, com duas mechas soltas caindo sobre o rosto. Seu nome: Shiawase May. Morava na casa ao lado e praticamente cuidava deles desde que seus pais haviam morrido, há pouco mais de um ano.
-É o que eu estou querendo dizer pra essa pirralha, May.
-Pirralha não! Ò_ó
-Pirralha sim! ¬¬
-Porque, ao invés de ficarem brigando, não vão lá pra casa? – Sugeriu May – Tem uma comida deliciosa esperando por vocês.
Os jovens irmãos, intrigados, voltaram seus olhos para May. Yuurei fez a pergunta que se passou pela cabeça de ambos:
-Você quem fez?
-Não... Foi o Genki. – Respondeu May, desanimada.
Os irmãos sorriram de orelha a orelha. Esquecendo-se da briga, correram juntos em direção à casa de May. Ela riu e os seguiu.

-Tiemi? Tiemi? – Ele continuava a chamá-la, ainda preocupado.
Com a respiração ofegante, Tiemi sentiu-se cair de joelhos no chão. Levantou o rosto e abriu os olhos, olhando um tanto assustada para o rosto do irmão no monitor, ao mesmo tempo em que se deu conta de que não estava mais sendo enforcada. Estava livre! Olhou para trás, encontrando seu agressor caído no chão, esfregando com força os olhos.
Voltou a olhar para Yuuhi e perguntou, confusa:
-Quem me salvou?
Ele sorriu aliviado, antes de responder:
-Seu cristal te salvou.
-Meu... Cristal? – Ela olhou para seu busto, encontrando ali um colar com um pedaço de cristal igual ao que Yuuhi carregava, só que, em vez de azul marinho, era rosa. Olhou novamente para trás, a procura do homem que tentara matá-la, mas não mais o avistou. Ele havia fugido.
Ao ver aquilo, Yuuhi também percorreu seus olhos pela sala onde estava... Hitomi não estava mais lá.
-Yuuhi?
Ao ouvir a voz de Tiemi, ele tornou a olhar para o monitor. Viu que ela parecia confusa e sorriu de leve, tentando acalmá-la.
-Fica tranqüila, koneko-chan. Tá tudo bem agora. Acho que temos muito que conversar.
-Acho que sim. Vamos pra casa?
-Nos encontramos lá. Mas, antes de mais nada, esconda esse cristal. E tome cuidado, viu?
Ela fez que sim e saiu do apartamento onde estava. Yuuhi também saiu do colégio, indo para a república.

*****
-Demorei?
Ele sorriu ao ouvir aquela voz próxima ao seu ouvido. Levantou-se da pedra onde estava sentado e virou-se para ela, abraçando-a com força. Quando se separaram, olharam em silêncio um para o outro durante algum tempo.
Umi estava com quinze anos. Seus cabelos castanhos tinham uma tonalidade um pouco mais clara e batiam abaixo da cintura. Seus olhos carregavam certo ar de ingenuidade.
Aki era um ano mais velho que ela. Tinha os cabelos negros, lisos e longos, que ele mantinha presos por um rabo de cavalo. Seu olhar tinha um quê de mistério... Para os demais. Umi era a única que conseguia de fato compreender exatamente o que se passava na mente daquele rapaz sem família e sem passado.
-Não posso demorar, Aki. – Disse a jovem quebrando o silêncio. – Sabe que não tenho autorização para ficar noiva.
-Não tem autorização para ficar MINHA noiva, você quer dizer.
-Não é isso. Meu pai acha que sou muito jovem ainda, e...
-Pelo que sei, quando sua irmã tinha a sua idade, já estava comprometida com o Hinoky.
-Exatamente... Com o Hinoky.
-É, foi o que eu disse. O problema do seu pai é exatamente comigo.
Ela suspirou. Sabia que o rapaz dizia a verdade. Seu pai não aceitava a idéia de uma de suas filhas se casar com um homem que ninguém sabia ao certo quem era, nem de onde vinha.
-Ouça, não se preocupe com o meu pai. Um dia ele terá que aceitar.
-E até lá...
-Até lá, temos que continuar nos encontrando escondidos... Vai, não faz essa carinha!
Ele sorriu. Era impossível ficar chateado quando estava na presença de Umi. Aproximou lentamente seu rosto do dela, mas antes que os lábios dos dois chegassem a se tocar, eles se assustaram ao ouvir gritos e passos se aproximando.

Sonolenta, Luna abriu os olhos, percebendo que havia adormecido debruçada sobre os livros espalhados pela mesa da cozinha. Olhou para o relógio e respirou aliviada por ter despertado ainda a tempo de ir para a faculdade.
Enquanto ajeitava seu material, a loira perdeu-se em pensamentos, preocupada com o que ela e Harumi fariam para, em tão curto espaço de tempo, arranjar outro local para morarem. Apenas com a ajuda de custo do Consulado, isso fatalmente não seria possível. Precisavam de um emprego, mas ela não fazia sequer idéia de onde começar a procurar.
Terminando de arrumar os livros, ela foi tomar um banho. Enquanto a água quente do chuveiro caía sobre seu corpo, Luna fechou os olhos, relembrando do sonho que acabara de ter.
“Umi”, “Hinoky”, “Aki”... Esses nomes soavam-lhe estranhamente familiares.

*****
-Senhor? Telefone.
Acenando de leve a cabeça, Shouta Kosugi dispensou a empregada. Após ela sair de seu escritório, ele atendeu ao telefone em sua mesa. Do outro lado da linha, uma voz feminina que ele logo reconheceu.
-Hitomi? Quantas vezes já lhe pedi para não ligar para minha casa?
-Achei que lhe agradaria saber sobre Katsura Yuurei.
A menção a tal nome de fato despertou o interesse do homem.
-... O encontrou?
-Sim. E também descobri quem é Katsura Natsu. Mas não consegui que me entregassem os cristais.
Kosugi bufou, incrédulo.
-É lógico que não! O cristal não pode ser retirado deles por qualquer pessoa.
Uma breve pausa ocorreu, antes que a mulher resmungasse:
-... E é só agora que você me conta esse “detalhe”?
-Tudo o que quero é a confirmação da identidade desses jovens. Mais do que isso, quero saber tudo sobre suas atuais vidas. Amigos, namorados, família... O máximo que puder descobrir.
-Cuidarei disso, não se preocupe. Mas, de que adiantará tudo isso, se não podemos tirar os cristais deles?
-Existe alguém que pode. A possuidora do cristal negro. Mas, enquanto não a encontrarmos, continue investigando tudo sobre os Katsura.
-Tudo bem. Nos vemos amanhã.
-Até amanhã.
-Sonhe comigo, queridinho.
Ela desligou a ligação. Kosugi acendeu um cigarro e colocou os pés em cima da mesa, tentando relaxar um pouco... O que era impossível, pois sua mente não parava de pensar acerca de fatos ocorridos no passado... Em um passado distante... Em outra vida.

*****
-Precisam tomar mais cuidado.
Esse foi o comentário de Maaya, após Yuuhi e Tiemi terminarem o relato sobre o ocorrido horas atrás. Estavam, juntamente com Hideki, reunidos em um dos quartos: o que Tiemi estava usando. Havia nele quatro camas de solteiro. As três que sobravam, logicamente, destinavam-se às futuras colegas de quarto da garota.
Tiemi e Maaya estavam sentadas em uma das camas. De frente para elas, na cama ao lado, ficavam os dois rapazes.
-Não esquenta com isso, Maaya. Aquela mulher não é louca de continuar dando aula naquele colégio. – Garantiu Yuuhi.
-Sei que não, querido. Mesmo assim, vocês já sabem que o perigo está rondando. E agora que eles já sabem quem vocês são...
-Já disse pra não se preocupar, ‘mulé’! – Yuuhi a interrompeu – Deixe que eu sei me cuidar. E sei cuidar dessa baixinha também.
-Baixinha é a mãe. ¬¬ – Retrucou a mencionada.
-Bem, deixemos esse assunto pra outro momento. – Pediu Maaya – Já passou da hora de preparar o jantar.
-Jantar? O.o... Er... Tô sem fome. – Anunciou Tiemi, assustada.
-Eu também! O.O – Concordou Yuuhi, igualmente assustado.
Hideki se levantou, tranqüilizando os jovens:
-Não se preocupem. Quem cozinha aqui sou eu. Não dava pra ser de outro jeito, né? A Maaya não sabe nem ferver água.
-Mãe. ¬¬’ – Corrigiu Maaya, irritada.
-... Minha MÃE não sabe nem ferver água. u.u – Ele se corrigiu.
Os irmãos riram. Hideki saiu do quarto e Maaya o seguiu. Quando ficaram sozinhos, Yuuhi voltou seus olhos para Tiemi, preocupado.
-E aí, baixinha? Tá tudo bem mesmo?
-Tô meio confusa ainda... Mas acho que tô bem, sim.
-Aquele camarada não te machucou?
-Fica frio, Yuuhi. Tá tudo bem.
-Menos mal, então. Afinal, se algo acontece contigo, como eu explico depois pra Mitsuki?
-¬¬’... É essa a sua preocupação?
-Lógico. Qual outra seria u.u?
-Devia ter imaginado ¬¬”.
Yuuhi não disse nada e Tiemi estranhou aquilo, afinal, seu “irmão” não costumava perder uma oportunidade de continuar a irritá-la. Notou que o olhar dele ficou distante, como se estivesse preocupado com alguma coisa.
-Que foi, Yuuhi?
Ele saiu de seu “transe” ao ouvir a voz da garota. Olhou para ela e respondeu, de forma séria:
-Amanhã eu vou oficializar o meu lance com a Manami...
-Como é? – Surpreendeu-se a ruiva.
Yuuhi contou a ela tudo o que havia acontecido. Quando terminou, notou que Tiemi parecia um pouco chocada.
-...Então foi isso. ...Fala alguma coisa, peste! O.o
-Eu... Não... Acredito...
-No quê?
Ela levantou-se subitamente, apontando seu dedo indicador para o irmão.
-Como você pode estar na cama com a MANAMI enquanto pensa na AKEMI? Ò_ó
-Er... Eu tava meio dormindo ainda O.o... Acontece, né?! ^^”
-Acontece o caramba! Como pôde fazer uma coisa dessas com a minha melhor amiga? Ò.ó
-Pow, foi mal. E eu já pedi desculpas pra Nami por isso.
-IDIOTA! Eu tô falando da Akemi Ò_ó! Como você pode pensar nela enquanto tá na cama com uma vagaba qualquer?
-“Vagaba qualquer”? ¬¬’ Achei que Manami também fosse tua amiga.
-E é. Mas não deixa de ser uma vagaba qualquer. u.u
-Ela não é uma “vagaba qualquer” ¬¬’. E... E ela gosta mesmo de mim.
Ao ouvir aquilo, Tiemi desfez sua expressão de irritada, sentando-se novamente na cama.
-Mas... Mas você gosta dela?
-Eu adoro a Manami, Tiemi.
-Mas não é amor. Você ama a Akemi, lembra?
-Mas onde está a Akemi, Tiemi? Quem me garante que ela também não tá com outro cara?
-Ela pode até estar com outro... Sabe por quê? Porque é quase certo que ela ainda não recobrou a memória antiga. Esteja certo de que assim que ela se lembrar de tudo, ela não vai sossegar enquanto não te encontrar. Ela te amava demais, Yuuhi. Você sabe disso.
-Eu também a amo, Tiemi. Mas o que eu vou dizer pra Nami? Que não posso ficar com ela porque tô à espera do meu “grande amor do passado”? Ou então, que eu não quero ficar apenas com ela? Você conhece a peça, sabe como ela é. Se eu disser isso, ela vai entrar na maior neura, achando que é algum problema com ela, e a última coisa que quero é fazer a Nami sofrer.
-E se nesse meio tempo a Akemi aparecer?
-Se isso acontecer... Eu largo tudo pra ficar com ela.
-E a Manami não vai sofrer do mesmo jeito?
-Bem, Tiemi-chan... O lance é que, quando isso acontecer... Eu vejo o que faço. Um problema de cada vez. – Ele sorriu tranqüilamente.
-Você é tão prático... ¬¬’
-Viva o momento! O depois... Depois a gente resolve. ...Bem, vou dar uns rolés por aí.
-Tá... Mas vê se não volta de madrugada, viu?! Tá esfriando e armando mó chuva. Além do mais, sabe que pode ter gente atrás de você.
-Deixa que seu irmão aqui sabe se cuidar. Vou nessa. Fui...
E ele se levantou, saindo do quarto. Tiemi deitou na cama, olhando para o teto. Deixou sua mente viajar lembrando-se de sua vida passada como Natsu.


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