Commentarius Angeli - Um Testemunho escrita por Francisco Lima


Capítulo 16
Capítulo 16 - O Segredo dos Templários.


Notas iniciais do capítulo

Espero que este capítulo não decepcione as expectativas criadas em torno dele.



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Capitulo XVI – O Segredo dos Templários.


Às vezes tenho a impressão de que as pessoas a minha volta sempre sabem de algo que eu não faço ideia de que esteja acontecendo, e às vezes, acho que as pessoas a minha volta sabem que não desconfio de nada. No trabalho, na faculdade, entre os amigos, quantas vezes não nos deparamos com as consequências de fatos que aconteciam bem diante de nós sem que nos déssemos conta.

            O brandir da espada de Thomas e de seu oponente faziam zunir o som do vento cortado por suas laminas antes que essas se chocassem com força uma contra a outra ou contra os escudos marcando os brasões de suas respectivas ordens. Thomas se esquivava de investidas diretas e bloqueava rápidos golpes feitos pelas diagonais, mas mesmo sendo capaz de se defender dos ataques de seu rival, seus golpes acabavam tendo o mesmo destino daqueles que ele mesmo havia acabado de bloquear. A verdade é que ambos os estilos de manusear as armas eram muito parecidos, quase idênticos.

            - Está prestando atenção Micael? – Pascal me perguntou com uma voz que não deixava disfarçar o aborrecimento.

            - Estou! – Eu respondi.

            - E o que tem a dizer sobre o estilo de luta de Thomas? – Ele perguntou.

            - Que ele é rápido e se defende bem! – Respondi, mas logo pensei que aquilo não seria o suficiente para Pascal, qualquer um poderia dizer isso vendo Thomas lutar, a minha avó poderia dizer isso vendo Thomas lutar, depois de tantos dias de treino, eu deveria ser capaz de dizer algo a mais, um detalhe que fosse. – Parece que... Ele se movimenta muito rápido para os lados com passos curtos, e move muito as pernas e os quadris.

            - Você me surpreendeu! – Ele comentou me olhando com o canto do olho esquerdo. Ele voltou a olhar diretamente a luta de Thomas e retomou sua fala. – Não esperava que fosse considerar todos esses pontos, muito bem!

            - O que? Cara você tá bem? – Eu perguntei com um sorriso que não conseguia segurar nos lábios, e uma suave sensação de vitória que eu não poderia deixar de aproveitar, pois estava certo de que aquele era um momento raro. – Você acabou de dizer que eu fui muito bem, tem certeza que não precisa da ajuda de Raphael? Ele está aqui conosco, está sentindo gosto de ferro na boca? Ela não está sangrando? – Minha veia sarcástica fazia varias frases como essas surgirem e explodirem em minha mente a cada segundo.

            - Eu estou bem! – Pascal respondeu. – E sim eu admito você está observando bem, para um novato, eu sinceramente pensei que você fosse parar de falar depois que disse: “Que ele é rápido e se defende bem!”. Qualquer um teria dito isso, a minha avó teria dito isso.

            - É eu sei! – Eu respondi e olhei novamente para Thomas, um sorriso torto que começava a se formar em minha face desapareceu imediatamente em reflexo a tensão causada por estar ali assistindo aquela luta.

            Thomas se defendia com o escudo e com sua espada. Girava seu corpo diante do outro cavaleiro e tentava encontrar espaço em sua defesa. O som dos escudos e das espadas se chocando se intensificaram e ressoavam com ferocidade. O cavaleiro da Cruz Pátea e o cavaleiro da Lua Minguante duelavam com a destreza e a perícia que se esperaria de dois experientes cavaleiros.

            - Notou como Thomas movimenta os pés? – Pascal me perguntou, estava claro que ele queria me fazer analisar bem o estilo de luta de Thomas, concordo que devemos conhecer as habilidades e limitações uns dos outros.

            Thomas parecia mover os pés a cada golpe que desferia com sua espada, e a cada defesa que realizava com seu escudo. Seu oponente por sua vez, realizava movimentos tão similares aos de Thomas, que a luta entre os dois chegava a parecer uma coreografia ensaiada.

            - Note que antes de cada golpe, Thomas força o pé contra o chão, este movimento provoca uma tensão que se estende pelos músculos do corpo e isso gera uma força maior do que a que ele poderia causar sozinho. – Pascal apontava para os dois e explicava o estilo de luta dos dois como se pudesse ler em um livro a descrição exata das cenas que assistíamos. – Veja como eles movem os quadris, esse movimento desloca o peso de seus corpos de modo a encontrar um maior equilíbrio e também a adicionar mais força e velocidade em seus movimentos.

            De fato olhando atentamente, o estilo de luta dos dois se mostrava mais complicado do que parecia, uma combinação de pequenos e ágeis movimentos complementava os movimentos mais visíveis, e a realização destes movimentos mais curtos com velocidade e precisão necessárias para um combate como aquele era algo que só poderia ocorrer naturalmente com muitos anos de treino.

            - Sabe, o que há de mais fascinante neste estilo dos dois é algo realmente difícil de enxergar. – Disse Pascal, já assistindo a luta com uma discreta admiração.

            - O que?- Eu perguntei sem desviar o olhar da luta. Thomas defendeu um golpe lateral com sua espada e usou o escudo para acertar seu oponente o fazendo abrir os braços, desarmando sua base, então Thomas girou diante dele e fez um corte em sua camisa branca com a ponta de sua espada, que não demorou muito para se manchar com o sangue que escorreu de um pequeno corte superficial, mas o ferimento era pequeno e não podia-se considera-lo sério.

            - É ele está indo bem! – Pascal comentou e então voltou a sua explicação. – O que há de mais interessante e um fator decisivo em batalha no manuseio da espada que estes dois estão executando é algo que você só poderia ver se conseguisse imaginar um rastro de luz, ou uma linha que fosse traçada pela ponta da lâmina de suas espadas. É claro que a menos distância entre dois pontos é a linha reta que os une, mas qual é trajetória de máxima velocidade entre estes pontos?

             Eu olhei para Pascal com o canto dos olhos e voltei minha atenção novamente para a luta dos dois cavaleiros.

            - A curva braquistócrona? – Perguntei com ar de incerteza.

            - É serio que você consegue se lembrar de um nome complicado como esse assim como se fosse? A coisa mais natural do mundo?- Pascal me perguntou, com tom de surpresa. Eu não respondi, na verdade me lembrei do nome desta curva por acaso.

            - Sim, você acertou! – Pascal disse satisfeito. – A braquistócrona, a curva de máxima velocidade, ou a curva de menor intervalo de tempo entre dois pontos. Diferente do que nossos instintos nos fariam acreditar, a trajetória em forma de cicloide. O movimento dos quadris, o deslocamento de equilíbrio, são habilidades que contribuem para que trajetória realizada pela espada de um cavaleiro templário seja descrito por esta curva, dando ao movimento a máxima velocidade possível. Mas a maioria dos cavaleiros não chega a ser treinado para manusear sua espada desta forma, apenas uma seleta minoria conhece esta técnica em sua integridade.

            - Por que os estilos de luta dos dois são tão parecidos? – Eu perguntei e notei um discreto sorriso de Vinicius.

            - “Ordo Pauperum Commilitonum Christi Templique Salominici”. – Vinicius falou em uma língua estranho que depois de pesquisar confirmei minhas suspeitas e agora sei ser o latim. – Aproveite que este é um assunto no qual você já esta bem instruído pela convivência com Thomas e conte a ele sobre as ordens as quais estes dois pertencem.

            - Bom, por isso perguntei sobre o que você sabia sobre os Cavaleiros Templários! –Pascal respondeu.

            - Sei que a Ordem dos Templários foi uma das mais famosas Ordens Militares de Cavalaria. – Comecei, mas logo não consegui terminar por ter a atenção redirecionada a luta dos cavaleiros diante de mim, o cavaleiro que ostentava o brasão da Lua Minguante conseguiu fazer com que Thomas perdesse o equilíbrio e batesse com o joelho esquerdo no chão, ele então tentou atingir Thomas com um golpe vertical, mas sua lamina se encontrou mais uma vez com o escudo do templário, que mesmo escapando deste ataque mortal, não pode evitar um forte chute contra o peito que o derrubou. O confronto voltou ao equilíbrio anterior, mas este momento fez surgir uma tensão no ar.

            - A Ordem existiu por cerca de dois séculos na Idade Média, e foi fundada durante a Primeira Cruzada com o propósito original de proteger os cristãos que voltaram a fazer a peregrinação a Jerusalém após a sua conquista. – Começou mais uma vez Pascal com sua aula de história. – A organização era conhecida como “Ordem dos Templários”, ou como “Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão”. Agora... Já ouviu falar sobre “O Livro de Salomão”?

            - O Livro de Salomão? Não sei nada sobre isso! – Eu respondi tentando imaginar o que poderia significar. – Existe um livro de Salomão na bíblia certo?

- Sim, mas me refiro a outro livro. – Pascal respondeu. – O Livro de Salomão a que me refiro continha uma série de símbolos criptográficos e rituais para invocação de anjos e demônios, orações poderosas para exorcismos e purificações, além de outras praticas como identificações, rastreamentos, e coisas assim. – Aquela com certeza não era a melhor forma de se concluir a citação de exemplos. – As orações e símbolos contidos neste livro eram instrumentos de combate contra entidades malignas, e seus manuscritos foram encontrados e traduzidos depois de muitos anos por padres da época. A Ordem foi então fundada por membros anônimos da igreja e Hugo de Payens foi escolhido para figurar a fundação da Ordem junto com mais oito cavaleiros e Balduíno II, rei de Jerusalém.

- Se não me engano os Cavaleiros Templários reuniram mais riquezas do que a própria igreja, e depois da perda da cidade sagrada para os muçulmanos eles tiveram sua imagem enfraquecida e o apoio que a eles foi reduzido, até que o rei da França na época convenceu o Papa a extinguir a Ordem. – Comentei o que consegui puxar pela memoria dos meus tempos de vestibulando.

- Em parte você está certo, e o rei da França naquela época, que estava consideravelmente endividado com a Ordem, se chamava Filipe IV. – Pascal falou. – Ele fez serias acusações de heresias, além de fortalecer rumores que assustavam a população sobre a cerimónia de iniciação secreta dos Templários, e dizem que isso pressionou o Papa Clemente V a tomar providencias contra eles. A caça e extermino aos membros da ordem feita de súbito contribuiu pra uma série de especulações na época, algumas delas existem até hoje e foram bem exploradas por alguns romancistas do século XIX.

            Novamente o rival de Thomas encontrou uma brecha em sua defesa e a explorou com mais um golpe vertical, Thomas apenas conseguiu se esquivar por se transportar alguns centímetros para o lado. Surpreendendo seu oponente após o movimento que o fez baixar a guarda, Thomas se transportou mais uma vez, agora para se aproximar mais de seu inimigo o acertando mais uma vez com um golpe usando seu escudo e fazendo-lhe um corte no braço esquerdo, pouco abaixo do ombro.

            - Ele parece estar indo bem, mas esta luta esta demorando muito! – Eu comentei.

            - Eu também não gosto de ficar só assistindo! – Pascal flou depois de mim. Ficar apenas como espectador por outro lado, não parecia incomodar muito Vinicius.

            - Bom, mas, então a ordem acabou? – Perguntei voltando ao assunto anterior.

            - Na verdade nem toda a Ordem foi condenada pelo Papa, o lugar que teve o maior numero de membros mortos foi a França, mas mesmo lá, antes da execução dos membros, muitos cavaleiros foram ajudados pela igreja a fugir, assim como em outros países. O fato é que muitos cavaleiros inocentes morreram, mas a Ordem não era exatamente o alvo da igreja. Eles fugiram pra países como Portugal, Itália, e até desenvolveram o sistema bancário da Suíça. Mas haviam segredos sobre os templários que até mesmo boa parte dos templários desconheciam! – Afirmou Pascal e então ele fez uma pausa para respirar, o que pareceu demorar muito por causa da curiosidade que ele fez surgir em mim.

            - Como assim, segredos que os próprios Templários desconheciam? – Perguntei com presa de saber a resposta.

            - A verdadeira função da ordem era a de estudar e desenvolver os conhecimentos contidos no Livro de Salomão e então transmitir todos os conhecimentos obtidos a uma certa cúpula da igreja. Apenas um pequeno grupo de pesquisadores fazia parte dos legítimos Templários e poucos eram integrados a este grupo que permanecia secreto mesmo dentro da própria ordem. Dentre os cavaleiros da “Ordem de Fachada” apenas os de extrema confiança sabiam realmente que sua verdadeira função era encobrir as atividades reais da Ordem. Porem, se uma coisa pode dar errado, por que ela perderia esta oportunidade, certo?

            Neste momento encarei Pascal diretamente, estava claro que ele faria agra uma revelação importante.

            - Dentro do grupo de pesquisas do Livro de Salomão, houve uma divisão de opiniões sobre que tipos de conhecimentos se deveriam desenvolver. Então em uma reunião com o conselho Papal, alguns membros deste grupo de pesquisas propuseram o aprofundamento de conhecimentos voltados para o aprisionamento e a utilização de demônios como armas e instrumentos no combate a outros demônios e entidades malignas. – Esta revelação feita por Pascal foi de fato chocante, acho que qualquer um ficaria chocado com isso.

            - Então as acusações de heresias estavam certas? – Perguntei.

            - Não estava prestando a tensão? – Pascal chamou minha atenção. – Apenas alguns membros eram adeptos dessa ideia. Porem o conselho de pesquisas do Livro de Salomão e o conselho Papal censurou esta ideia. Mas esta negação do conselho não impediu estes membros de seguir com seus planos, mas sem o conhecimento dos  demais. Quando os outros mestres da Ordem descobriram esta traição e as dimensões que ela estava tomando, não tiveram escolha a não ser extinguir a Ordem junto ao Papa e usaram as acusações do rei da França como pretexto para casar os membros traidores. Porem nem todos os traidores foram mortos, e depois de conseguirem fugir se reuniram novamente e fundaram uma nova Ordem adotando um símbolo pagão, a Lua Minguante, que representa a morte, o fim de um ciclo de vida e a preparação para um novo ciclo. Eles se intitulam “Cavaleiros da Ordem dos Renascidos”.

            - E essas ordens são rivais há séculos! – Eu concluí.

            - Exatamente! E perigosos! – Pascal concordou.

            Thomas se movia cada vez mais rápido para acompanhar a também crescente velocidade de seu adversário, até começar a se transportar com curtíssimos intervalos de tempo, agora com transportes ainda mais rápidos dos que os fetos na luta contra Allan e não sendo usados apenas para se esquivar, mas também para surgir pelas costas de seu oponente ou em pontos onde sua defesa estivesse desarmada.

            - Estas habilidades de “portões celestiais” que você está usando estão muito além dos ensinamentos de sua Ordem, cavaleiro! – Disse oponente de Thomas depois de se atirar para trás, para evitar um golpe diagonal que com certeza lhe provocaria um dano sério, mas não o fez sem evitar um corte no ombro direito. – Já que não vamos nos limitar a usar as técnicas de combate de nossas Ordens, vou lhe mostrar o poder que os Cavaleiros Renascidos têm em mãos! – Ele passou o polegar sobre um de seus ferimentos, e expos um colar com diferentes símbolos presos a ele, então passou o dedo sujo com o sangue sobre um deles e fez uma curta oração sem tirar os olhos de Thomas.

            Surgindo dos cantos, por trás das pilastras, de dentro da estrutura abandonada da fabrica, como se já estivessem ali desde o inicio daquela luta só esperando o momento de se revelar, saindo das sombras, oito homens usando capuzes pretos como carrascos, sem camisa, com os corpos sujos e cheios de cicatrizes, se apresentaram armados com espadas e lanças, e um deles, o maior, com pouco mais de dois metros de altura, carregava um grande machado com de batalha com uma ponta perfurante no lado oposto da lamina e uma longa haste de madeira que ele apoiava sobre o ombro.

            - É, parece que a luta vai passar para um outro nível daqui por diante! – Comentou Vinicius, e ele mesmo permanecendo calmo, parecia não estar gostando nem um pouco da situação.

            - O que é isso Cavaleiro Renascido? Quem são estes? Um combate entre cavaleiros deveria ser de um contra um! – Pascal gritou interrogando o oponente de Thomas.

            - Estes foram meus Ícaros, são minhas armas, e tenho todo direito de usá-los, assim como o Templário está usando seus poderes! – Nosso inimigo gritou em resposta.

            Thomas se virou para Pascal e fez um gesto para que se acalma-se, o que só serviu para irritá-lo ainda mais.

            - Raphael, está luta deixou de ser um contra um, me tire daqui! – Pascal pediu com tom de ordem, que foi notada porei compreendida pelo arcanjo.

            - Também estou preocupado, mas ainda não é chegado o momento de intervir. – Explicou Vinicius. – Você viu o sinal de Baltazar.

            - O que? Como pode dizer isso Raphael? – Pascal perguntou surpreso.

            - Covarde! – Eu gritei para o oponente de Thomas.

            - Ei moleque. – Ele falou se referindo a mim, com evidente desprezo em suas palavras. – Estes que surgiram ao meu chamado há muito já deixaram de ser Ícaros, agora são meus instrumentos de batalha, sem consciência ou vontade própria, são minhas armas e por tanto, esta ainda é uma luta de cavaleiros de um contra um. Agora guarde minhas palavras! Eu sou Ademar, o enfrentarei quando terminar com o Templário, e quando a nossa luta acabar, eu serei o seu algoz.


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