— Já captou algo? — Shane perguntou.

— Se eu fosse uma antena parabólica, talvez — Lyra respondeu fazendo Derek rir. Shane revirou os olhos e voltou a prestar atenção ao redor.

— Vou pegar um refrigerante, vocês querem também? — Derek colocou as mãos nos bolsos da calça jeans.

— Sim, por favor — Lyra disse enquanto Shane murmurava um “você ainda tem dúvidas?”. Lyra e Shane sentaram no chão esperando o último trio aparecer.

Shane era um receptáculo que havia chegado no dia anterior. Ele possuía cabelos escuros com fios caindo pela testa e bonitos olhos verdes, os lábios eram levemente cheios e a pele era branca. Para deleite de Lyra, Shane soltava vários comentários irônicos e desnecessários.

— O que acontece para você saber que tem algum dos nossos por perto? — Shane perguntou.

— A temperatura do colar muda, fica como se o pingente estivesse sido mergulhado em água polar ou algo do gênero — Lyra deu de ombros.

A tarde estava abafada e Lyra não tinha dormido bem na noite passada, absorvendo cada nova informação sobre lutas que recebera de Allan, Aaron, Jesse e Pietro. O corpo inteiro estava dolorido pelos pequenos treinamentos que fazia no jardim dos fundos, as pernas estavam pesadas e as costas doíam pelos dois pontos que recebera ali, o local do corte era o que mais recebia golpes, a maioria deles sem querer e fruto do desastre da própria Lyra. Ela se perguntava como ainda conseguia se movimentar. Os dedos passaram suavemente por cima da barriga onde o tecido leve da blusa azul marinho escondia as manchas roxas do treinamento. Nunca mais concorde em treinar com Aaron usando cabo de vassouras.

Lyra voltou para a realidade no momento em que a temperatura do colar caiu. Antes que os dedos dela pudessem chegar até a joia, Shane tocou o objeto.

— Está aqui — ele disse.

— Estou atrapalhando? — Derek apareceu segurando três latas de refrigerante nos braços. Lyra arqueou a sobrancelha tentando entender a pergunta, até que viu os dedos de Shane envoltos no pingente do colar perto do decote em V da blusa.

— Tem outro receptáculo por aqui — Lyra respondeu começando a varrer a área procurando alguém incomodado com a última peça que faltava: um anel.

— Aonde? — Derek perguntou.

Lyra apontou com o queixo dois garotos mais ao fundo do lugar. Um deles encarava a mão onde um anel prateado dava a impressão de estar brilhando. Shane soltou o colar.

— Você é a anfitriã, vá falar com eles — ele disse.

— Muito legal da sua parte — Lyra revirou os olhos e respirou fundo antes de levantar. Ela caminhou até os dois com as pernas doloridas e tentou parecer simpática quando estava perto o suficiente. — Oi.

— Oi — um deles respondeu. Ele era alto e magro, com a pele levemente bronzeada, cabelos castanhos que iam até os ombros e olhos tão escuros e profundos que não podia se distinguir o que era íris e o que era pupila.

— Você é a Lyra? — o outro perguntou. Esse era basicamente da mesma altura do outro, tinha a pele mais clara, os olhos eram azuis e os cabelos loiros tinham o mesmo comprimento do primeiro garoto. Os dois também eram, provavelmente, os dois homens mais bonitos que Lyra já tinha visto.

— Sou. Vocês?

— Brandon Pollock — o loiro depositou um beijo nas costas da mão de Lyra.

— Drake Devonshire — o moreno disse lançando apenas um sorriso para a garota.

— Prazer — ela sorriu e pegou o celular para mandar a mensagem de texto informando Allan que o último receptáculo já havia chegado. — Onde está a entregadora de vocês?

— Está pegando as malas com meu pai — Drake respondeu colocando as mãos nos bolsos da calça.

— Muito cavalheirismo da parte de vocês deixarem uma garota cuidar das malas — Lyra disse fazendo os dois rirem.

— Acredite quando digo que Kerry é tão forte quanto nós — Brandon disse.

— Acredito — Lyra sorriu de canto enquanto apagava tudo o que tinha escrito na mensagem para Allan. — Então, qual de vocês é o receptáculo?

— Eu — Drake levantou a mão em que o anel estava como se fosse um aluno na sala de aula pronto para responder a pergunta do professor.

— E qual daqueles dois é o seu guardião? — Lyra levantou os olhos do celular para olhar na direção que Brandon apontava.

— Nenhum dos dois. Shane e Derek são receptáculos, só estão me acompanhando.

— Achei vocês! — uma garota apareceu.

Ruiva, olhos azuis e apenas pelos traços suaves e infantis no rosto Lyra já deduziu que aquela era Kerry, a entregadora deles, já que suavidade parecia ser uma característica própria desse grupo. Ou apenas uma feliz coincidência. Atrás dela vinha um homem, provavelmente na casa dos quarenta anos, que exceto pelos olhos claros, poderia ser uma cópia mais velha de Drake, aquele provavelmente era o Sr. Devonshire.

— Pai, Kerry esta é Lyra. Lyra, estes são Kerry e meu pai Johnny — Drake apresentou.

— É um prazer — Kerry abraçou Lyra, que respondeu com um tapinha nas costas da garota. Kerry era extremamente simpática, Lyra anotou mentalmente.

— Igualmente — Lyra forçou um sorriso, tentando usar parte da simpatia da garota. — Prazer Sr. Devonshire.

— Johnny. Sr. Devonshire é meu pai — ele estendeu a mão sorrindo, e, antes que Lyra respondesse, Allan entrou correndo.

— Tem certeza de que eu vou ter que pagar apenas uma multa por excesso de velocidade? — Lyra arqueou uma sobrancelha.

— Tenho, eu estava a poucos metros daqui — ele e olhou para os recém-chegados. — Prazer, Allan.

— Brandon, Drake, Kerry e Johnny — Brandon apresentou.

Enquanto Allan ia de carro com Johnny, Kerry e Brandon, Lyra ia de táxi com Drake, Derek e Shane, acabando com as idas e vindas ao aeroporto.

— Gostaram da viagem? — Lyra puxou assunto.

— É muito bonito por aqui — Drake disse.

— Você vem de onde? — Derek perguntou.

— Inglaterra. Londres precisamente.

— Eu sempre quis ir para Londres — Lyra deixou o comentário escapar. Viajar pelo mundo era um dos desejos que Lyra sempre teve. Ela iria viajar nestas férias, segundo o pacote turístico que Carfax tinha fechado, ela, Lyra e Allan iriam fazer um tour pela Itália, fazendo paradas especiais em algumas cidades como Roma, Livorno, Florença, Veneza, Viena, Turim e Verona. Lyra riu baixo lembrando que isso era para ser surpresa.

— É um lugar muito bonito, quem sabe depois que tudo isso acabar você consiga ir para lá — Drake sorriu otimista. Lyra sorriu também.

Quando finalmente chegaram a casa, Lyra deixou Shane e Derek irem à frente, pagou a corrida e caminhou junto de Drake.

— Seja bem-vindo ao Hotel California — ela disse sem tentar esconder a ironia. Drake apenas sorriu.

— É um lugar adorável, mas tenho dúvidas sobre o número de quartos.

Agora foi a vez de Lyra sorrir. Aparentemente não iria ser tão ruim como pensou.