Observo a menina por um tempo. Quando seus olhos me reconhecem, sua mão sobe à boca para conter a surpresa e seus olhos se arregalam a ponto de sobressaírem ao rosto.

-Madge Undersee? - pergunto mais uma vez com a voz entrecortada.

Ela me fita por alguns segundos e depois se vira para Johanna ainda incrédula. Seus olhos transbordam de lágrimas e reflito se seria a mesma Madge que eu conheci na escola quando pequena ou se seria uma impostora fanática que não acreditava que eu estava ali. Ela suspira atrás da mão que agora cobria o rosto e toma fôlego para dizer:

-Ah meu deus, Katniss você está viva! - ela corre até mim e me abraça com força.

Era ela.

Era a minha melhor amiga Madge.

-Madge! Eu estava morrendo de saudades! - digo contendo as lágrimas.

Permanecemos no abraço por mais alguns minutos apenas para matar a saudade que sentimos da presença uma da outra. Todo esse tempo eu jurava que ela fora morta no bombardeio ao Distrito 12 enquanto ela provavelmente achava que eu havia morrido na rebelião.

-Katniss, o que aconteceu com você? - ela pergunta.

-Muitas coisas, eu nem sei por onde começar!

-Entra, vamos lá para a sala!

Dirigimo-nos para a sala e nos sentamos no sofá uma ao lado da outra. Ficamos conversando sobre as peças que a vida pregou em nós e isso durou pouco mais de três horas. Eu contei a ela tudo sobre o massacre e sobre a rebelião, mas decidi deixar a gravidez e o casamento para o final...

-Então, agora quero saber de você! - digo. -O que aconteceu no dia do bombardeio?

-Bem... - ela suspira. -Eu não estava em casa na hora do bombardeio. Eu não aguentei assistir os jogos então fui atrás de Gale lá na campina. Ele não estava lá.

-Ele talvez estivesse embarcando em um aerodeslizador rebelde. Iam atrás de mim na arena. - indago.

-Tudo bem. Mas quando voltava para casa, eu consegui observar os aerodeslizadores chegando ao Distrito 12, mas recebi a motívia de que todos haviam corrido para a floresta. Havia um outro aerodeslizador onde várias pessoas entraram e uns pacificadores indicaram para que eu entrasse junto.

-Ele veio para a ilha Vitoria? - pergunto

-Veio. E desde então, eu moro aqui. Eu me candidatei para abrigar as suas amigas quando avisaram que os vitoriosos chegariam. Só não sabia que você viria também. Afinal de contas, onde você está morando?

-Com Peeta, minha mãe e minha amiga Annie.

-Peeta?

-É! Madge, você perdeu muita coisa que aconteceu. Eu e Peeta namoramos desde o fim da rebelião. E mês passado... Ele me pediu em casamento!

-Aaaaaaaaaaaaaaaah! - ela berra. -Eu não acredito! Parabéns Katniss!

-E não é tudo... Eu também estou grávida!

-Aaaaaaaaaaaaaaaah! Do Peeta?

-É claro Madge!

-Logo você que nunca quis casar nem ter filhos...

-Você é solteira?

-Digamos que a sorte não está ao meu favor. E então, o que acha de almoçarmos juntas segunda feira? Eu tenho que estudar para as provas esse final de semana junto com as meninas.

-Eu não posso. Na segunda eu serei instrutora daquele programa de sobrevivência de jovens adolescentes.

-Eu ouvi falar.

-Eu ainda não acredito que você está aqui Madge.

-Eu que não acredito! - ela retruca e me abraça.

-Eu queria ficar mais, mas eu tenho que voltar para casa. Peeta deve estar preocupado...

-Tudo bem. Nos vemos em breve?

-Nos vemos em breve.

-Vou sentir saudades!

-Não por tanto tempo. - adiciono. Eu me levanto e Madge abre a porta para que eu saia. As meninas da casa correm para me abraçar e se despedem de mim. "Céus! Já são sete da noite! Peeta deve estar elétrico..." - penso. O tempo passou tão rápido...

Johanna me deixa em casa e eu entro literalmente saltitante. Peeta estava na "varanda" do andar de cima e se apoiando no parapeito, ele disse:

-Pelo visto era a Madge verdadeira...

-Era Peeta. Era a Madge mesmo!

Ele desceu as escadas e me abraçou com muita força. Eu retribui com a mesma intensidade e antes que eu percebesse já estava chorando. Eu não queria chorar na frente da Madge, mas Peeta sempre cessa minhas lágrimas, tanto de tristeza quanto de felicidade.

-É impressionante como tudo está começando a dar certo. - ele sussurra em meu ouvido causando arrepios.

-É verdade Peeta. É uma vida totalmente diferente, só que para melhor.

-Vem, vamos lavar esse rosto e depois jantar.

Ele me leva para o banheiro e me senta no tampo do vaso sanitário. Com uma toalha molhada, ele se abaixa na minha frente e limpa meu rosto secando as lágrimas com delicadeza. E, como sempre, ele toca a ponta da toalha no meu nariz me fazendo sorrir.

Nos levantamos ainda abraçados e antes de saírmos, ele passa uma mão por trás do meu pescoço e choca nossos lábios. Era um beijo delicado, mas apaixonado. Descolamos nossos lábios a contragosto e abrimos os olhos (só não me lembro tê-los fechado) fitando um ao outro. O azul se misturando com o cinza formando a mais bela das cores. Tomara que os olhos do meu filho sejam assim...

Voltamos à realidade quando ouvimos a batida na porta.

-Meninos, seja lá o que estiverem fazendo, parem um pouco e venham jantar! - minha mãe comenta envergonhada atrás da porta. Peeta dá uma risada deliciada e abre a porta para que saiamos me deixando passar primeiro. Um verdadeiro cavalheiro.

-Antes as damas aos cavalheiros. - ele diz.

-Obrigada.

Sentamo-nos ma grande mesa redonda de madeira e comemos uma panela de frango com batatas e cenouras. Talvez eu tenha exagerado um pouco na quantidade que comi, mas eu sempre tenho a razão por estar grávida.

-Então Katniss, era a sua amiga mesmo ou só mais uma pessoa super parecida e tal? - Annie pergunta.

-Era ela mesmo.

-E os pais dela? - minha mãe pergunta. Lembro-me de que a mãe de Madge e ela já foram muito amigas e provavelmente essa amizade ainda exista.

-Estão vivendo na Alla Urbana há um tempo mas pretendem se mudar para a Alla Cordilheira.

-Que bom!

-Quem preparou o jantar? A comida está maravilhosa! - Peeta comenta com a mão em frente a boca cheia.

-Fui eu. Achei um livro de receitas em uma caixa de vocês. Espero que não se importem. - Annie diz timidamente.

-Esta tudo bem. A comida está ótima. - ele responde.

-O que farão amanhã? - minha mãe pergunta.

-Vou conhecer a creche com Felix. Também vou arranjar outro emprego, já que meu turno integral não garante nem parte dos impostos da casa. - Annie responde.

-Vou conhecer o CS e dar uma olhada no trabalho que da padaria. - Peeta responde.

-Vou me instalar no hospital. Ganhei uma sala com os casos de ferimentos leves. Ah, já marquei a consulta com aquela médica que acelera o ultrassom para ver o sexo do bebê. - minha mãe responde.

-Eu não sei bem o que farei amanhã, mas será muita coisa. Isso eu sei. - digo.

Depois de um pouco de papo, eu subi para me deitar. Dou uma olhada na minha programação para me atualizar. Amanhã será mesmo um longo dia: visitar a padaria com Peeta, preparar a aula de sobrevivência, conhecer o CS, conhecer nossos vizinhos e finalmente ir até a médica que descobriria o sexo do nosso bebê. Estou cansada até de listar...

Peeta entra no quarto mas já estou deitada. Ele só tira os sapatos e se deita ao meu lado nos cobrindo com um cobertor felpudo. Esqueci de mencionar que a nossa Alla é ao centro-sul da ilha, uma das mais próximas da linha do Equador e, por isso, os dias aqui são demasiadamente quentes e as noites excessivamente frias. Mas todo esse frio é ignorado por mim, já que tenho um corpo quentinho me cobrindo bem ao meu lado.