Meu Bônus Infernal escrita por Mandy-Jam


Capítulo 69
Escuro


Notas iniciais do capítulo

Segurem esse tiro!
Ah, e nas notas finais tem uma surpresa para vocês, seus lindos!

Divirtam-se.



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Alice olhou chocada para Heahter, mas foi Joe que falou primeiro.

— Você viu o que você fez? – Perguntou.

— Ah, me poupe. Ele vai sobreviver. – Respondeu.

— Eu nunca imaginei que você seria tão baixa. – Falou Alice – Como pode falar assim com ele? Ele é uma criança!

— Ele vai ficar bem. – Repetiu Heather sem paciência e sem um pingo de remorso. Alice negou com a cabeça, ainda incrédula com o que presenciara.

— Ele estava mal e chorando, e tudo o que você fez foi gritar com ele! Não tinha necessidade disso. – Reclamou Alice.

— O que você fez foi horrível, e você sabe. – Concordou Joe.

— Tanto faz. – Heather revirou os olhos. Dwayne levantou enquanto Alice e Joe continuavam discutindo com ela, e foi até a porta da frente conferir se estava tudo bem com Thomas. Eu me mantive sentado ao lado de Alice no sofá, mas incomodou meus ouvidos.

Foi uma mudança de som no instante em que a porta se fechou atrás de Dwayne. A mudança fora tão gradual que eu só me dei conta quando o jovem saíra.

Antes tinha o barulho de uma criança chorando. Agora não tinha mais.

— Alice. – Disse, mas ela ainda estava absorta na discussão.

Olhei para a porta e franzi o cenho.

Cutuquei o braço dela, mas Alice ainda assim não prestou atenção. Quando estava prestes a segurar seu pulso, Dwayne escancarou a porta para trás e todos viraram a cabeça em sua direção.

— Thomas não está aqui fora. – Declarou o que eu já constatara.

— O quê? – Perguntou Alice, absorvendo a informação.

— Não está no jardim, nem em lugar nenhum.

Por alguns segundos, a sala foi tomada pelo silêncio e a respiração de todos foi interrompida. Joe, por fim, socou o braço da cadeira onde estava e olhou para Heather.

— Você está feliz?! – Gritou.

— Eu?! Eu não fiz nada! – Defendeu-se.

— Se não tivesse gritado com ele, ele não teria fugido! – Exclamou para ela.

— Ele fugiu porque é um bebê chorão. – Queixou-se – Mas não deve ter ido longe. Deve estar no celeiro chupando dedo ou sei lá.

— Você vai saber, porque você vai procurar. – Decidiu ele. Embora Joe fosse um covarde que bate em gente mais fraca e mente para escapar de encrencas, o seu tom de voz naquele instante me lembrou o de Zeus. A determinação em sua voz era uma ordem a ser seguida por Heather, sem questionamentos.

— Eu...! Eu não quero ir atrás dele! – Reclamou – Deixa que ele acha o caminho de volta!

— Ele é uma criança e estava assustado! E se estiver perdido?! – Falou Alice.

— E se ele não voltar? – Questionou Joe a Heather – Quem vai ser culpado por ele ter desaparecido?

Aí estava. É claro que ele não estava preocupado com o primo como Alice estava. Ele só estava com medo de ter que levar a culpa pelo desaparecimento do menino. Minha fez exatamente o que eu sabia que ela faria.

Em um salto, Alice se colocou de pé movida a pura fúria.

— Você se preocupa mais em levar uma bronca do que na segurança do Thomas?! – Exclamou com raiva – Que tipo de ser humano lixo é você?!

— Eu não vou levar a culpa pela besteira que a Heather fez! – Exclamou para Alice, mas não teve coragem de se levantar para enfrenta-la – Se está tão preocupada, vai junto com ela!

Alice parecia estar prestes a afundar as unhas no pescoço de Joe e se banhar em seu sangue, mas tudo que fez foi marchar em passos largos para frente da Heather.

— Levanta. – Foi tudo que disse.

— Você só pode estar brinca-

— Vai ficar escuro daqui a pouco. Thomas vai morrer de medo sozinho lá fora. – Falou séria – Agora levanta daí e vamos logo atrás dele.

Heather deu-se por vencida e levantou revirando os olhos. Alice pegou duas lanternas que ficavam penduradas do lado da porta de entrada e virou-se para mim.

— Se Thomas voltar para cá, me avisa. – Falou e saiu quase empurrando Heather para fora de casa.

Dwayne sentou-se devagar no sofá, no lugar que Alice estava.

Percebi que não tive nem tempo de acenar com a cabeça para Alice, antes dela ter ido embora. Eu devia mesmo ficar ali esperando? Não tinha certeza se era o melhor a fazer.

— Vai com ela. – Falou Dwayne. A voz dele era sempre uma surpresa, já que o garoto quase nunca falava. Virei meu rosto para olhá-lo.

— Por quê? Acha que ela precisa de ajuda? – Perguntei. Queria perguntar também porque dela gostar tanto dele, e qual era a dessa amizade esquisita entre os dois, mas contive-me.

Tudo que Dwayne fez foi esboçar um semblante de preocupação e olhar para o relógio velho que pendia na parede em cima da lareira.

— Vai ficar escuro. – Foi tudo o que disse, mas aquelas palavras pareciam ter uma explicação escondida. Assenti devagar e levantei.

— Vigia o idiota ali. – Falei apontando para Joe, que abriu a boca. Não dei tempo dele falar – Uma palavra, e eu acabo com você. Vai ser um favor que eu farei pra Alice.

Ele sentiu a autoridade na minha voz divina, e engoliu em seco.

Eu não sou um caçador. Essa habilidade toda com animais e com seguir trilhas pertence a minha irmã e às amigas dela. Em festas eu costumo dizer que eu sou o gêmeo bonito e inteligente, enquanto ela é a amiga da natureza. Sempre ganho um pontapé em seguida, mas nunca perde a graça.

Saber para qual lado Alice e Heather seguiram foi mais difícil do que eu imaginei que seria. Só consegui acha-la quando escutei as duas discutindo à vários metros de distância.

— Eu estou falando que a gente devia ter checado o celeiro antes de entrar nessa mata horrorosa. – Reclamou Heather.

— Se ele está no celeiro, ele vai conseguir voltar para casa. – Rebateu Alice – É aqui que ele pode se perder.

— E você é escoteira por acaso? Sabe rastrear alguém no meio da selva? - Perguntou irônica.

— Isso não é uma selva, isso é só uma floresta pequena. – Retrucou Alice – E não estaríamos aqui tendo que rastrear ele, se você não tivesse gritado com uma criança.

— Ah, pobre Thomas! Não pode ouvir a verdade! – Zombou ela – Eu não estaria aqui se você e Joe não tivessem enchido a minha paciência.

— Heather...! – Alice se conteve – Argh! Quer saber? Eu desisto. Eu vou andar mais para frente. Você pode ir embora se quiser.

— O quê? – Havia preocupação na voz dela – Você não vai me deixar sozinha aqui.

— Se você está com medo, imagina o Thomas. – Falou sem se importar e acelerou o passo. Heather teve dificuldade de acompanhar.

— Espera! Não pode me deixar sozinha aqui! – Reclamou tensa.

— Eu não ligo! – Respondeu.

Estendi o braço e puxei-a de repente. Alice soltou um grito de susto, mas ao reconhecer o meu rosto, soltou um suspiro pesado. Bateu no meu ombro e eu ri.

— Não me assusta assim! – Reclamou.

— Não achei que fosse assustar tanto. – Falei rindo, feliz de tê-la encontrado.

— Está ficando escuro. – Reclamou revirando os olhos. Aquela frase repetiu na minha mente. Escuro.

— Eu disse para você me esperar...! – Heather se interrompeu ao ver nós dois próximos. Seus olhos correram de Alice para mim, e pude notar os ciúmes crescendo dentro dela. No entanto, fingiu não se importar e deu de ombros – Se vão ficar de agarração, poderiam pelo menos ter me deixado em paz em casa ao invés de me trazer para o meio do mato.

Ela virou de costas e tirou do bolso o celular. Ergueu para o céu, girou os calcanhares e grunhiu frustrada.

— Sem sinal. – Reclamou – Ótimo. Ter que andar com vocês dois, não ter sinal, isso é um ótimo filme de terror.

— Vamos continuar. – Alice gemeu, incomodada por ter que aturar os chiliques de Heather – Por que você veio?

— Para evitar que você matasse a sua prima. – Respondi quando Heather se afastou de nós, andando na frente. Ela desistira de gritar “Thomas”, e agora tudo que fazia era procurar sinal de celular.

— Eu ia enterrar o corpo dela ali. – Disse acendendo a lanterna e mirando a luz em um monte de folhas e lama – Seria o crime perfeito.

— Teria que pintar o cabelo e arrumar uma identidade falsa. – Comentei.

— Uma identidade falsa? – Riu ela – Nossa, eu nunca saberia como arranjar uma.

— Você falsificou uma identidade? – Perguntei levemente surpreso – Isso é ilegal.

Alice riu e isso me fez perceber o quanto eu tinha sido ingênuo com aquela frase.

— É. É um pouco ilegal sim. – Assentiu com a cabeça – Mas só se te descobrirem.

Eu olhei para ela, sorrindo. Agora estava começando a ficar realmente escuro. Alice prendeu o cabelo em um rabo de cavalo, e manteve os olhos fixos nas árvores na nossa frente.

— Ainda bem que você veio. – Murmurou ela.

— Por quê?

— Porque... – Ela hesitou um pouco e depois encolheu os ombros – Porque com mais gente é mais fácil de achar o Thomas.

— Claro. – Assenti, mas achei que aquilo não era tudo. Deixei que Alice continuasse a andar e fiquei só um pouco para trás, não o suficiente para que ela estranhasse. Estendi a mão e toquei o ombro dela.

Tinha alguma coisa que não estava fazendo sentido e eu queria uma explicação. Nunca pensei em fazer isso com ela, porque achava que seria o que os mortais chamam de “invasão de privacidade”. No entanto, queria saber o que estava acontecendo de verdade. O que ela estava escondendo?

E com aquele toque, eu enxerguei o passado.

Tive a visão de um quarto velho e escuro, decorado como um escritório. Havia algumas aves empalhadas decorando as prateleiras de madeira do lado oposto aonde uma grande escrivaninha ficava. Os quadros eram fotos preto e branco de pessoas da família de Will. Só uma luz pendia no teto do quarto, mas estava apagada. Ainda estava claro lá fora, e o brilho do Sol entrava pelos vidros sujos da janela.

A porta se abriu de repente, e uma garotinha de cerca de 5 anos foi empurrada para dentro de uma forma bruta. Ela chorava. Suas bochechas estavam molhadas de lágrimas e seu vestido estava sujo de terra.

— Não! Por favor! – Pediu em choro.

— O que eu falei para você? – Perguntou um homem segurando seu braço com mais força do que devia. Ela prendeu o choro ao sentir sua carne ser retorcida por debaixo daqueles dedos – Eu falei para você não bater no seu primo!

— Ele me bateu! – Ela declarou.

— Mentira! Pare de mentir, já disse que é feio! – Brigou. Ela só voltou a chorar. O homem negou com a cabeça – Você está de castigo. Vai ficar aqui até eu deixar que você saia, entendeu? Senta lá, agora.

Ainda soluçando, a garotinha sentou e abraçou os joelhos.

— Se você se mexer um centímetro...! – Ameaçou com a mão espalmada no ar, apontando para ela. Ela se encolheu e ele bateu a porta.

Ela continuou chorando por um tempo, até que por fim se cansou. O tempo da cena foi passando mais rápido. O Sol foi se pondo do lado de fora, e o homem não voltou para tirá-la de lá.

— Papai. – Chamou em um murmuro. Passaram-se mais horas, e nada. – Papai!

Ela se encolheu.

— Papai! – Chamou de novo, quando o quarto ficou completamente escuro. O interruptor ficava alto demais para ela alcançar, e não havia uma única luz ali. Só a escuridão. Ela se encolheu e voltou a chorar, abraçando as pernas e com o rosto escondido nos joelhos, com medo de que o som fosse alto demais e alguém ouvisse.

Mais uma hora passou até que a porta finalmente se abriu. Ela ergueu a cabeça com um susto e o homem a fitou no meio das sombras.

— Aprendeu a lição? – Perguntou. Ela prendeu o choro e assentiu com a cabeça – Pode sair.

Essa cena se repetiu várias vezes. Cada episódio, a menina usava uma roupa diferente. Ás vezes ela chorava, ás vezes gritava furiosa, mas sempre ficava sentada no chão daquele quarto até escurecer e se encolhia de medo.

Algumas vezes, um garoto entrava no quarto quando estava escuro e sentava-se do lado dela, em silêncio. Ela parava de chorar imediatamente.

A medida que foi envelhecendo, a cena começou a se repetir menos. E deu para ver claramente seu rosto mudando com o tempo. Da última vez que a porta se abrira, a garota tinha por volta de uns 14 anos e tinha um temperamento mais forte. Ela lutava para livrar o seu braço que estava preso pela mão do homem.

Will e Alice.

 - Me solta! – Exclamou puxando com força o braço para longe dele. Will deixou escapar e fuzilou ela com o olhar – Não vou ficar aqui!

— Você vai ficar onde eu mandar você ficar! – Exclamou de volta com raiva, mas controlando a sua voz para não ser ouvido por ninguém além dela – Você me fez passar a maior vergonha na frente de todo mundo!

— Eu não fiz nada de errado! – Exclamou para ele.

— Você xingou a sua prima na mesa do jantar! Eu não sei que drama você inventou na sua cabeça para odiar tanto a Heather, mas ela é parte da sua família e não merece ser tratada desse jeito! – Brigou.

— Ela é uma vaca! – Exclamou com raiva. A mão de Will atravessou o ar na hora e acertou o rosto de Alice com tamanha força que ela tombou para o lado e teve que se apoiar em uma mesinha para não cair.

O quarto ficou em silêncio. Alice ergueu-se trêmula e passou a mão sobre a bochecha ferida. Seus olhos lacrimejaram sem que ela conseguisse controlar, e Will permaneceu imóvel.

— Você vai me respeitar e respeitar a sua família. Entendeu? – Perguntou com uma voz dura e incisiva. Alice respirou fundo, tentando se recompor – Está de casti-

— Eu não vou – Sua voz passava um traço de choro que ela tentava esconder – ficar nesse quarto.

— Você vai sim.

— Não, eu não vou. – Falou e andou até ela – Saí da minha frente agora ou eu vou contar para a minha mãe o que você fez.

A ameaça gelou o sangue dele.

— É pelo seu bem.

— Saí da minha frente agora! – Gritou. Will respirou fundo e olhou para a bochecha vermelha de Alice.

— Vai para o seu quarto. – Falou recuando um passo e apontando para fora. Alice respirou fundo.

— Eu odeio você. – Falou e foi embora.

 - Apolo?

...

— Apolo?

— O quê? – Perguntei piscando os olhos. Alice estava parada na minha frente, franzindo o cenho para mim como se algo estivesse errado.

— Você me cutucou. Só que eu virei e você ficou com um olhar perdido. – Falou estranhando – O que houve?

— Eu... – Seu rosto estava normal. Não parecia ter 5 nem 14 anos. Era a mesma Alice de sempre, com as roupas sujas da guerra de comida e com o cabelo preso pelo rabo de cavalo recém feito já lutando para se soltar – Eu me distraí um pouco.

— Tá bom... – Ela virou-se de novo e voltou a andar – Vamos logo, já está escurecendo.

— Você tem medo do escuro. – Disse sem conseguir me conter. Alice parou de andar imediatamente.

— Como é? – Perguntou.

— Você... Tem medo do escuro, não tem? – Perguntei lembrando da garotinha chorando como um animal indefeso, encolhida na tentativa de ocupar o menor espaço possível.

— Eu... – Ela hesitou cogitando se poderia mentir, mas desistiu – Como você sabe disso?

— Eu sou um Deus. – Dei um meio sorriso – Sei de muita coisa.

— Claro. – Ela assentiu e apontou com o queixo – Vamos logo achar o Thomas. Estou começando a ficar preocupada com ele.

Nós continuamos andando em silêncio. Pensei nas cenas de novo, e senti um misto de emoções: raiva, indignação, pena, compaixão, tristeza. Por mais que eu tentasse, eu nunca conseguiria continuar andando em silêncio por muito tempo.

— Alice, a gente preciso conversar. – Falei enquanto caminhávamos. Ela gritou o nome de Thomas mais uma vez, e depois olhou para mim.

— Ah, não. Olha, eu agradeço o convite, mas eu já te disse que eu não quero me juntar a seu grupo de teatro, tá bom? – Falou tensa.

— Não é isso. – Neguei com a cabeça, embora também achasse um desperdício ela não se juntar ao meu grupo de teatro. Alice suspirou aliviada.

— Bom. – Assentiu – E sobre o que é?

— Sobre... – Eu fitei-a nos olhos – Sobre muitas coisas. O seu padrasto, por exemplo.


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Notas finais do capítulo

Agradeço a todos vocês que nunca desistem de esperar e ficam me mandando mensagens loucamente pedindo os novos capítulos! Justamente por causa de vocês, essa autora linda aqui tem umas novidades:

1) Os capítulos Bônus que eu vou postar no final dessa fic, vão ser histórias curtas passadas bem no futuro onde vocês vão ver pela primeira vez OS FILHOS DA ALICE.

2) Estou escrevendo uma fanfic inteira dedicada a linda da Jennifer Kelly, que vai contar a história de como ela e Hermes se conheceram (muita loucura, vocês não têm ideia).

3) Estou escrevendo um livro original sobre fantasia que incluí os meus lindos OC's: Alice Kelly, Scott Collins, Matt Harris, Kim Francis e Abigail.

Pronto. Mandem comentários dizendo o que vocês acharam! Achei melhor dar umas notícias boas para quebrar o clima de tristeza dos flashbacks desse capítulo.

Beijos e vejo vocês no próximo capítulo!



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