Adentrei a sala sorrindo friamente. Conhecia os outros Carreiristas de vista e, apesar de serem relativamente bons, eu saberia que eu era bem melhor, igual a Cato. Revirei os olhos internamente com esse pensamento, mas teria que me acostumar, pelos menos por hora, já que seriamos uma dupla...

- Estávamos apenas a esperando, Srta. Spalding – resmungou severamente Puck, pai de Cato. Vencedor da 51° edição dos Jogos Vorazes.

- Me desculpe, Sr. Stroke – retruquei mecanicamente – Tive alguns problemas com falsas informações – olhei de relance para Cato, sentado ao seu lado, que sorriu inocentemente.

- Claro, claro – o homem resmungou novamente, fazendo pouco caso.

Fui me sentar ao lado de Cato, já que, além de ser a minha dupla, era o único lugar disponível. O fuzilei com os olhos, relembrando o quanto o garoto era infantil, por dizer o local errado da reunião, apenas para que eu me atrasasse.

Fitei os outros carreiristas, que se sentavam a nossa frente. Dois garotos e duas garotas. O garoto de cabelos negros e olhos azuis poderia parecer intimidador, se não fosse o fato de que, perto de Cato, ele era quase uma criança. Sua parceira, uma garota alta e loira, olhava para o chão, parecia um pouco insegura, o que me fez sorrir. O outro garoto me olhava com raiva, possuía cabelos em um tom semelhante ao mel e seus olhos eram completamente escuros, sorri desafiadoramente para ele, que pareceu ainda mais irritado. Sua companheira, que apenas o analisava, colocou uma mão sobre seu braço, o acalmando quase que imediatamente. Possuía cabelos curtos e negros, os olhos arregalados e, ao mesmo tempo, determinados.

Todos pareciam ter 17 ou 18 anos, o que me tornava a mais nova, já que tinha 16.

Me voltei para os vitoriosos sentados em outro canto, reconhecia todos, já que eram constantemente homenageados em nosso distrito. Havia em média uns dez presentes. Era claro que não existiam apenas esses, alguns estavam velhos demais para participar da reunião, mas a maioria não fora convocado, já que o conselho era formado pelos melhores vitoriosos vivos, aqueles que possuíam mais experiência geralmente.

- Bom, vamos começar – um deles disse, se levantando de sua cadeira e ficando no meio da sala – Como vocês, carreiristas, já têm conhecimento, amanhã será realizado a competição, para vermos quem será nossos dois representantes na 74° edição dos games...

- Um pouco entediante, não? – Cato comentou divertidamente, apenas para que eu o ouvisse.

- Cale a boca – resmunguei, tentando voltar a prestar atenção no que o homem falava.

- Tenho certeza que você já escutou tudo o que eles têm para falar – ele murmurou, colocando um de seus braços em meu ombro.

- Tire. Agora – falei entredentes, enquanto o garoto se fingia de desentendido.

- ...As três duplas irão duelar uns com os outros – o homem continuava – Lembrem-se que vocês terão que trabalhar em conjunto – nessa hora Brutus e Enobária nos lançaram um olhar cortante, onde eu revirei os olhos e Cato sorriu cinicamente – A melhor dupla irá...

Minha atenção decaiu novamente para o garoto ao meu lado, que dedilhava em meu ombro, chegando perto de meu pescoço.

- Pare, Stroke – eu resmunguei, tentando não chamar a atenção e ignorar a sensação de seus dedos em minha pele nua.

- Você não parece muito certa disso, minha querida – ele retrucou, parecendo perceber que eu havia me arrepiado vergonhosamente.

- Quando estivermos na arena, farei questão de pessoalmente cortar essa mão – murmurei, o olhando de relance e sorrindo cinicamente.

- Então irei aproveitar enquanto ainda a tenho – respondeu sarcasticamente, sua mão agora em minha nuca exposta, visto que meu cabelo estava preso.

Bufei, irritada. Sabia que se fizesse algo, chamaria a atenção para nós dois e o que eu menos queria era ser repreendida por todos, principalmente depois que Brutus e Enobária viram horas atrás, na sala de treinamento.

Tentei voltar minha atenção para a conversa, agora era uma mulher que discursava, seu rosto era distorcido por uma cicatriz, que fazia com que seus lábios ficarem estranhamente repuxados, como uma bela lembrança de sua vitória nos 57° games.

- Sabia que você fica muito sexy quando está com raiva? – Cato continuou a me provocar e eu senti meu rosto esquentar em ódio – E melhora ainda mais quando está vermelha.

- Lembrarei de cortar sua língua, também – falei entredentes, contendo minha vontade de pegar a faca em minha bota e fazer naquele mesmo momento.

- Não acho que faria isso, minha querida – ele sorriu, sem se abalar – Se quiser, posso mostrar uma grande utilidade para ela, assim que sairmos daqui.

- Cale a boca, Stroke – eu resmunguei – Você me enoja.

- Engraçado, você não parecia com nojo horas atrás, na sala de treinamento – ele continuou a provocar e senti meu sangue pulsar, enquanto minhas mãos caminhavam automaticamente para minha bota – Eu não faria isso se fosse você, querida.

Suspirei frustrada, me virando para Enobária, que permanecia ignorante de nossa discussão, enquanto tomava o lugar da outra mulher e começava a falar sobre o orgulho de poder representar nosso distrito.

- Espere até sairmos daqui – falei para Cato, que riu silenciosamente.

- Oh, pode apostar que esperarei ansiosamente – murmurou enquanto fingia prestar atenção em nossa mentora.

O resto da reunião passou lentamente, ninguém parecia ter se dado conta de nosso dialogo, com exceção, talvez, da garota de cabelos curtos, que nos olhava a cada curtos intervalos de tempo.

- Amanhã, logo pela manhã, teremos a competição na arena – Brutus anunciou, olhando diretamente para mim – Não será tolerado atrasos ou desculpas, se quiserem participar dos games, deverão estar lá, junto com seu parceiro.

Revirei os olhos para ele, que me lançou um olhar cortante, como se me desaviasse a discordar.

- Estão liberados –ele finalizou, se voltando para os outros vitoriosos, falando sobre algo que eu realmente não importava.

Cato se levantou rapidamente, sorrindo de modo inocente, enquanto caminhava até a saída. Logo o segui, ignorando os outros carreiristas, que agora nos olhavam descaradamente.

Vi ele se virando por um corredor e sumindo de minha vista, apressei o passo tentando alcança-lo, quando senti que alguém me puxava para uma sala escura.

Soltei um grito surpreso, que fora abafado pela mão do garoto, que me olhava com divertimento.

- Me seguindo, Spalding? – ele perguntou cinicamente, tirando a mão de minha boca.

 - Acho que, perseguindo, seria um melhor termo – respondi, sorrindo friamente.

- Fico feliz que admita para si mesma, querida – ele falou, alargando o sorriso sarcástico.

Seus braços me prensavam contra a parede e seu rosto era fracamente iluminado pela lua, que entrava pela janela semiaberta da sala desconhecida.

- Se quiser lutar, o aconselho a me soltar, ou não haverá graça alguma – eu disse, tentando inutilmente sair de seus braços.

- Quem disse que eu quero lutar? – ele perguntou, se aproximando ainda mais – Pelo que me lembro, prometi que mostraria as utilidades de minha língua, e se algo que me orgulho, é minha capacidade para cumprir minhas promessas.

- Stroke, o que você...

Porém, não pude completar minha frase, já que o garoto acabou com a distância que nos separava, selando nossos lábios.