Céu escrita por Liminne


Capítulo 21
Capítulo 21 – Nuvens




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Estava aborrecida com a chuva. Odiava chuva. Tinha que ficar enclausurada naquele prédio velho e sem graça...
Pensou em ir atrás do seu amigo de infância, mas desistiu. Ele devia estar ocupado com os estudos. Não queria atrapalhar. Muito menos parecer uma boba desocupada. Afinal, ele estava até apaixonado por uma mulher mais velha, cheia de compromissos importantes, toda inteligente... Não ia querer nada com uma boba de doze anos, não prodígio e ainda sofrendo de uma paixão que ele considerava infantil e desnecessária...
Seus pensamentos rodopiavam enquanto estava ali, sentada na escada que dava para o terraço. Queria poder contar as novidades para alguém... Mas era inútil...

****

- Ai como eu odeeeio chuva! – Keigo reclamava em alto e bom som andando para a cozinha do apartamento. Deu de cara com seu colega de quarto de cotovelo apoiado na mesa, segurando o rosto com a mão e com o olhar perdido. E o mais estranho: sem sombra de livros. – Ué? – arqueou uma sobrancelha. – Hoje que está chovendo não vai estudar?
- Não. – ele respondeu sempre gelado.
- Huumm... – puxou uma cadeira e sentou-se ao lado do menino. – Está pensando na gatinha da porta ao lado... – sorriu malicioso.
- D-do que está falando?! – Toushiro corou.
- Ora... – ele continuava com aquela cara irritante. – Eu vi quando você deu umas escapadas para procurá-la ontem. – riu. – Pena que ela esteja fazendo coisas da idade dela ao contrário de você.
- O que você quis dizer com isso? – o garoto apertou os olhos azuis de um jeito meio ameaçador.
- Ué... Só estou dizendo que se ficar a vida toda enfiado em livros e coisas sérias, vai perder a garota que está logo ao lado. – balançou a cabeça com cara de quem sabe tudo.
- Hunf! – ele cruzou os braços. – Do que está falando? – encarou-o cético. – Você mesmo ficou enchendo a paciência dizendo que estava a fim da tal da Ruky, que, também mora na porta ao lado, e até hoje não fez nada! Quem você acha que é então para me dar conselhos?

- Aaaaah! – ao invés de se sentir atingido pelo comentário maldoso, o moreno começou a gritar em comemoração, apontando o dedo na cara do outro. – Então admite! – berrava. – Admite que tá a fim dela!
- P-Pára com isso, idiota! – ficou sem ação. – Eu não... Não...
- Haha! Vamos brindar, colega! – tirou da geladeira duas latas de cerveja. – Ao amor pelas nossas vizinhas gatas!
- Eu sou de menor. – ele continuava com aquela careta fria, agora para a lata de cerveja.
- Ah é! – guardou uma das latas e abriu a outra. – É isso aí, rapaz! Vamos tomar uma atitude ou não?
- Já disse que não sei do que está falando. – desviou o olhar e levantou-se. – Divirta-se com sua festa só pra um. – e saiu marchando para o quarto.
Ainda pôde ouvir os gritos cantados do garoto tão enérgico. Mas ignorou-os. Fechou a porta e deitou-se na cama com os braços cruzados atrás da cabeça.
Mesmo que fosse um sem noção, talvez ele estivesse certo... Era novo demais para já estar tão longe... Ia passá-la para trás...
Não. Sacudiu a cabeça. Não devia pensar assim. Ela mesma gostava era de um cara bem mais velho. Então por que devia agir como uma criança?
A teimosia acabou se combinando com o barulho da chuva e o embalaram num sono. Não tinha porque sair dali. Não tinha porque procurá-la de novo. Não queria ouvir nada daquilo de novo... Nem os seus pensamentos.

****

Estavam ainda meio constrangidos. Tinham acabado de entrar no carro de novo. E dessa vez sem toda aquela ginástica.
Nem se olhavam. A pequena de olhos azuis encarava a chuva pelo vidro do carro e pensava. O ruivo nem pensava. Na verdade sem sabia pra onde exatamente estava indo.
- Er... – ele começou quando caiu na real. – O que fazemos? Te deixo na república?
Ela olhou para ele de volta meio perdida. Ainda não acreditava no que tinha acontecido... Quer dizer... Que vergonha! Fez o maior escândalo à toa! Tinha que ser aquele Infernal-sama! O rosto começou a esquentar de novo. Odiava humilhação. Odiava ter sido tão grosseira e escandalosa à toa.

Mas mesmo assim... Mesmo assim... Nunca tinha sentido um aperto no coração por ter sido humilhada... O braço estava tão leve...
- Não sei... – respondeu. Ei! O que estava dizendo? No que estava pensando? Finalmente ia voltar a sua vida normal, sem olhares tortos e podendo se mexer à vontade à noite. Sem banhos compartilhados. Sem alguém esperando do lado de fora do banheiro. Ia voltar pras suas amigas, pros seus livros, pra sua paz! – É claro. – corrigiu-se. – Para a república.
Ichigo então se colocou a caminho. Ficou mais um tempo em silêncio antes de dizer:
- Não acredito que estamos livres ainda... – o coração disparou. Não sabia por que estava dizendo isso. Mas precisava falar para não perceber o vazio. – E que tudo vai voltar a ser como era... E que vamos ter um resto normal de Golden Week... – ela não disse nada. E ele se sentiu meio ridículo. – E... O que você vai dizer pras suas colegas de quarto?
Ela arregalou os olhos. Ele estava certo! O que ia dizer? Que já tinha voltado da casa dos pais?
- Ai meu Deus! – ela soltou. – O que vou dizer? – pôs a mão na testa perdida. Mas suspirou e relaxou. – Bem... Acho que eu consigo inventar uma desculpa.
Olhou para o ruivo que estava distraído com a estrada. E de repente não pôde segurar o riso. Caiu numa gargalhada.
- O-o que foi, maluca? – ele espantou-se e olhou para ela.
- Seu rosto... – ela tentava dizer engasgada com as risadas. – Ainda está rabiscado! – riu mais. – E ninguém reparou!
- Meu rosto! – ele olhou-se no retrovisor. – Droga! – começou a passar a mão com força para ver se saía.
- Imagina só... Deve ter todo mundo achado que você era o maior retardado! – continuava rindo sem dó.
- É... – ele azedou o rosto. – Isso porque não sabem quem foi o verdadeiro retardado que fez isso!
Ela sentiu a alfinetada e o riso parou na hora.
- Há. Engraçadinho. – revirou os olhos e mudou a direção do olhar.
Mas passou pouco tempo emburrada. Logo já estava sorrindo de novo.
É. Finalmente admitia para si mesma... Ia sentir falta.

Não falaram mais nada depois disso. Até que chegassem naquela rua tão familiar.
- Estamos chegando. – os dois já viam o prédio.
Ela suspirou.
- Obrigada. De novo. – disse baixinho.
Ele se espantou de primeira. Mas logo relaxou o rosto num quase sorriso.
Parou o carro.
- É aqui que a gente se separa então. – ela disse.
- Não. – ele discordou. – A gente não vai se separar assim tão fácil.
Ela sorriu.
- É. – balançou a cabeça. – Ainda tem o Infernal-sama para nos unir de novo...
- E a faculdade... – ele continuou.
- E a Lua cheia. – ela concluiu com um brilho diferente nos olhos.
O coração do canceriano quase explodiu instantaneamente. Sintoma disso eram seus olhos arregalados e os joelhos levemente trêmulos. Teve que se esforçar para não deixar escapar um grande sorriso.
Ao invés disso, porém, cerrou um punho e começou a se aproximar mais dela. Muito devagar e hesitante. Quase imperceptivelmente. Como que por instinto. Não sabia o que estava fazendo. Mas ela estava... E dizendo... Com os olhos tão doces... E os lábios tão encantadores...
- Até mais então, Ichigo! – ela abriu a porta do carro sem parecer ter se tocado da aproximação. – A gente se vê.
Acordou do transe. Ela já estava saindo do carro. Ficou ainda mais trêmulo e agora vermelho.
- Ah. É. – coçou a nuca. - Até mais, Rukia. – acenou meio sem jeito e esperou que ela batesse a porta. Segurou o último sorriso dela até ela se virar e sair correndo por causa da chuva. Caiu de cabeça no volante. – O que eu estava fazendo? Idiota! – sussurrou para si mesmo e bateu a cabeça. Mas o sentimento amargo não durou muito. – Celeste-sama... – riu. – Você é mesmo uma praga. – mas desta vez, ele estava elogiando de verdade o guru estrelado.

****

Ainda estava sentada nos degraus esperando o barulhinho chato da chuva acabar. Quando a viu sair do elevador. Seus olhos castanhos quase pularam das órbitas. Um sorriso incrédulo e muito feliz tomou conta de seu rosto rapidamente.
- Rukia-chaaan! – foi correndo até a pequena de olhos azuis.

- Momo! – ela recebeu a menina nos braços também sorridente. Sentiu falta do cheirinho de pêssego dela.
- Que saudade! – riu feliz. Parecia ter esquecido o tédio. – Mas... – separou-se do abraço com o pensamento que lhe ocorreu. – O que está fazendo aqui? Hoje ainda é... Quinta.
- Ah... – ficou agitada
em pensamentos. Não tinha pensado numa desculpa afinal. – Eu só... Bem, tinha alguns trabalhos pra terminar, recebi umas ligações do pessoal da faculdade e tive que voltar mais cedo. – sorriu amarelo. Odiava ter que mentir. – Mas deu pra curtir bastante.
- Que bom! – ela nem reparou na desculpa esfarrapada. – Fico feliz que tenha voltado! Não agüentava mais cozinh... Oops! – tapou a boca arrependida.
- O que? – a capricorniana diminuiu os olhos. – Ia dizer cozinhar?
- Hehehe... – a geminiana riu sem jeito.
- Ai ai... – Rukia meneou a cabeça. – Eu mal chego e já tenho que dar bronca em certas pessoas? – falava assim, mas sorria. – Vamos entrar. – foi andando até a porta. – O que é que você estava fazendo aqui fora, menina?
- Eu tava entediada...
Entraram no apartamento e deram de cara com a loira peituda devorando um pote de sorvete. Seus olhos azuis cresceram vertiginosamente ao ver quem entrava junto com a prima.
- Chegamos! – Rukia foi dizendo fingindo casualidade.
- Rukia-chan... – por uns segundos, Rangiku ficou tão congelada quanto o doce que enfiava na boca. – Rukia-chan! – mas logo derreteu como o mesmo e levantou-se para abraçar a amiga. – Você já voltou! – apertou-a com mais força que a baixinha previra. – Senti tanto a sua falta...
Rukia sorriu meio assustada e deixou as malas despencarem no chão. Retribuiu o abraço carente da amiga. Ela parecia de verdade estar precisando daquilo.
- Eu também senti. – ela disse baixinho. – Mas eu sei, tá, suas interesseiras. Sentiram mais falta da minha comida do que de mim!
- Mentira! – a loira separou-se do abraço tentando disfarçar as lágrimas que começaram a inundar os olhos. – Sentimos falta de você sim!

- Sei, sei... – ela fez cara de falsa credulidade. – Já estou sabendo quem teve que comandar o fogão na minha ausência.
- Momo! – a libriana ralhou com a priminha.
- Ahh, foi mal prima! – coçou a bochecha sem graça.
- Desculpa Rukia-chan... É que é complicado demais pra mim... – admitiu derrotada.
- Hun... – a baixinha de cabelos negros não deixou por menos e lançou um olhar sério e reprovador sobre a loira. – Separei as receitas mais fáceis... Que absurdo!
- Rukia-chan desculpaaa! – ela choramingava batendo o pé no chão, quase uma pirraça.
Momo se acabava de rir da cena.
- Não sei, não sei. – Rukia fazia jogo duro de braços cruzados. – Assim fico sabendo que não posso contar com você quando saio...
- Mas pode contar com a Momo! – puxou a prima pelos ombros e mostrou-a para Rukia. – Ela é cem por cento responsável! – piscou.
Não agüentou. Teve que rir.
- Você é muito cara-de-pau, mulher... – mesmo com as mãos nos quadris, não conseguia mais ficar séria.
Algumas coisas nunca mudavam. Mesmo com todas as fases da Lua. Mesmo com qualquer circunstância. E era bom assim.
- Vamos comemorar a volta da Rukia-chan! – a loira berrou animada.
- Ei, ei! – Momo já se colocou na defensiva. – Nem pensar! Já vai arrumar motivo pra encher a cara?!
- Não! – ela fez beicinho sentida. – Vamos comemorar com refrigerante mesmo. Já que só tem criancinha aqui, né? – suspirou desanimada.
- Quem é criancinha? – Rukia fingiu-se de brava.
E logo as três já completavam a alergia daquele, em tão pouco tempo, lar. Onde a essência de cada uma era importante.
Comemoraram até bem tarde da noite, com refrigerante. Conversaram, riram, brincaram e implicaram umas com as outras. Mas continuaram mantendo seus segredos. Cada uma das três. Quem é que não tem um segredo que não quer contar pra ninguém?

****

O fim de semana passou. Na república, estavam todos bem comportados. Apesar de Rangiku ficar grudada com o celular, Rukia obrigou-a a ajudá-la a arrumar a casa e até a fazer comida. Acabou aprendendo algumas coisas.

Também estudaram bastante. E Momo as acompanhou. Ficou meio chateada de não poder mais visitar seu professor. Mas as três acabaram se divertindo juntas também. Sem intervenções. Nem Gin, nem o professor Aizen, nem Celeste-sama.
No início, Rangiku estava desesperada para desabafar com Rukia. Mas acabou se distraindo com tantos afazeres e deixando a covardia tomar conta de sua mente. Pelo menos passou a esquecer um pouco o celular na mesa da cozinha de vez enquando.
Momo continuou sonhando acordada, mas estava mais acordada do que sonhando na maioria das vezes. Rukia não deixou que ninguém ficasse parada!
E Rukia... Bem. Pensamentos ferviam em sua mente. Vai ver era esse o motivo de tanta ação em três dias de fim de semana.
Guardou as pétalas das flores num bonito recipiente redondo de vidro que comprou quando foi fazer as compras para o almoço da sexta-feira. Colocou-as em sua mesinha de cabeceira. A pétala azul em destaque no centro de todas as outras. Voltou às atividades normais.
A Lua já minguava no céu...

****

Era muito cedo, mas tinha que se acostumar de novo. Sempre chegava bem cedo para as aulas. Tinha acabado os dias de feriado e de acordar tarde.
Foi caminhando para a sala de aula com sua cara azeda, mais azeda ainda pela manhã. Esbarrou num grupinho de garotas e seguiu em frente sem nem olhar pra trás, mesmo com os resmungos delas. Murmurou um “Foi mal”, mas parecia que elas não tinham ouvido... Ou...
Espantou-se um pouco quando elas foram atrás dele histéricas.
- E-er... Foi mal aí... Eu tava meio com pressa... – desculpou-se meio sem jeito.
- É ele, não é? – uma garota de cabelos ondulados cochichou com a amiga de olhos muito verdes.
- Sem dúvidas que é. – ela respondeu à amiga com um risinho. – Não se lembra?
- Ela não estava no dia! – a mais alta das três interveio com um revirar de olhos.
- Er... Isso é comigo? – Ichigo coçou a nuca. – Por que se não for, estou me mandando. Fui!
- Não, não, não! – as três gritaram e quase o puxaram pela camisa. – Isso é com você!

O ruivo estava no mínimo assustado.
- A gente ficou sabendo que você tá namorando aquela menina nova de medicina. – uma delas falou.
- Aquela do interior. – a outra sorriu. A CDF da turma. – fez uma pausa pensativa. – É Rukia o nome dela, não é?
- E-eu? Namorando... – ficava cada segundo mais vermelho. – Do que vocês estão falando?!
- Disso aqui! – a mais alta mostrou uma foto dos dois patinando no gelo presos pela corrente. – Por que raios vocês estavam a-cor-ren-ta-dos? – deu bastante ênfase na palavra. E as outras começaram a rir. Era a pergunta que não queria calar.
Foi nesse instante que o chão sumiu dos pés do canceriano. O coração gritava mais que aquelas vozinhas finas e fofoqueiras. Como aquilo... Por que... Impossível!
- Qual é a fofoca? – uma voz familiar surgiu. E logo o espetadinho pôde identificar. As mãos tomaram-lhe a foto e ela deu um risinho. – Ah, é aquela foto que tava no blog dos estudantes da faculdade. – os olhos embaixo da franjinha rosa fitaram Ichigo maliciosos. – Vem ver, Mai-chan!
Abriram espaço para a loira. Os scarpins cor de vinho vieram estalando pelo piso. Os cabelos parcialmente presos por minúsculas borboletinhas combinando com os sapatos se moviam graciosos. O vestido vinho de meias mangas fofinhas e decote redondo tanto no busto quanto nas costas balançando levemente nas pernas. O perfume floral inconfundível destacava-se no ambiente e logo aqueles olhos tão escuros e misteriosos o encararam. Ele estremeceu. Paralisou. Fazia quanto tempo que não olhava naquelas pequenas bolas negras e profundas? Ela estava tão bonita... Radiante. Elegante e simples e ao mesmo tempo exuberante por causa das cores do vestido e dos cabelos que pareciam estar ainda mais solares naquela manhã. E o olhar escuro tão forte quanto a sua presença...
- Ah... – ela agora estava com a foto nas mãos. Sorriu indecifravelmente. – Então a danadinha da Rukia nos enganou, né? Disse que ia para Kofu!
Fuu riu. Ichigo permanecia parado.

- Então é verdade, Kurosaki? – ela deu um passo na direção dele. Àquela altura, seduzidos pelo magnetismo da escorpiana, já havia mais gente ao redor deles.
Como naquela vez...
- O-o que é verdade? – ele nem conseguia recuar. O coração marchava como se quisesse carregá-lo junto para longe. Mas era pesado demais.
- Você e a Rukia estão... Juntos? – não desgrudava o olhar dele. Tinha a vantagem de ter aquele isolante. Conseguia ver tudo através daquele negro. Mas não permitia ninguém que se atrevesse a desvendá-la. Não era possível.
O caranguejo então, diante daquele olhar e daquela pergunta, sentiu-se tremer de leve. Era novamente aquela situação. Aquele monte de pessoas. Fofoqueiros inúteis. Cheios de expectativas pela sua resposta. E aqueles olhos perversos querendo derrubá-lo de novo. Colocando-o em outra armadilha.
Mas olhando bem para aquele rosto maquiado, podia ver um minúsculo sorrisinho... Não! Estava viajando! Fazia parte do pacote para manipulá-lo e ser de novo a piada de todos. Como se já não fosse fácil ser destacado pelos cabelos laranjas esquisitos. Era isso. Ela queria incentivá-lo a uma resposta.
Mas qual era o objetivo dela em lhe fazer de palhaço?
Com as sobrancelhas apertadas e aquela sua careta ameaçadora, estava mole por dentro. E muito pensativo. Não agiria por impulso daquela vez. Não. Ia dar uma resposta que podia vingar aquela sua vergonha que, pelo visto, não fora esquecida.
Já que ela queria tanto saber, ia saber. Ele estava bem e não era mais o seu otário. Não era mais.
- Estamos. – disse antes que pudesse ponderar mais e desistir. Começou uma série de burburinhos sorridentes e perplexos. – E o que vocês têm a ver com isso? – seu tom de voz era totalmente o oposto da confusão em sua cabeça.
Mai segurou com todas as suas forças aquele enorme sorriso que se espalharia por todo o rosto. Ao invés de relaxar, prendeu-o e transformou-o numa boca semi-aberta de espanto.

- Uau! – seu coração pulsava tão contente que era capaz de gritar por horas. – Quem diria hein? Parece que se deu bem. – deixou-se sorrir um pouco, mas com o cuidado de deixar transparecer apenas um pouco de sua culpa evaporando. – Vocês formam um lindo casal. – tocou de leve o ombro do ruivo e saiu andando alegre.
Os comentários continuavam. Alguns concordavam com as palavras de Mai e outros berravam em discordância.
Mas aquilo agora era o de menos. Pelo menos para ele.
Olhava para a loira se afastar com seus estalos no chão e os cabelos tão loiros se movendo e preenchendo o decote das costas do vestido. Ouvia sua voz rindo e conversando com Fuu. E pensava se tinha feito a coisa certa. E condenava-se mais uma vez por ter sido tão precipitado. Porque para uma vingança, sua resposta não teve efeito sobre ela. Mas para um restaurador de orgulho, até que tinha funcionado bem demais.
Será que era isso... Que ela queria?
Cerrou um punho e os lábios. Andou para a sala fingindo não ouvir seu nome nas fofocas. Estava tão pasmo e obcecado que se esqueceu de certo nome que tinha dona. E uma dona que, apesar do pouco tamanho, não era fácil de dobrar.

****

Após um começo de segunda-feira totalmente típico, com a alegria de Momo e os resmungos de Rangiku no café da manhã, caminhava finalmente de volta à universidade.
Estava de bom humor. Estava até usando sua saia de coelhinhos preferida com um casaquinho branco e leve por causa da brisa da manhã.
Voltar para a rotina significava voltar a estudar, a ver os professores e os colegas. Fazia tempo que não via Ashido, Mai e as outras meninas... Também significava que ia voltar a trabalhar, o que a deixava mais animada. Já sentia falta.
E também... Bem... Depois de tanto tempo grudada àquele ruivo e logo em seguida dias sem ele, ia vê-lo de novo... E... No que estava pensando?!
Mudou a confusão para um sorriso quando atravessou os portões da faculdade. Estava feliz por estar de volta.

Os olhos azuis bateram no grande relógio do local e arregalaram-se. Estava muito atrasada! Devia mesmo ter perdido tempo demais tentando animar Rangiku!
Saiu correndo pelos corredores e subiu as escadas sem nem olhar para os lados. Era incrível como nunca conseguia chegar antes de hora. Incrível!

****

Hora do intervalo. Finalmente poderia ver melhor os colegas e conversar um pouco, relaxar. Era o que Rukia pensava levantando-se na sala. Chegara tão tarde que nem tivera como sentar perto de Mai como sempre. E ficou muito atarefada com a matéria.
Agora descia as escadas mais tranqüila. A loira e a jovem de cabelos rosas apareceram.
- Oi atrasadinha! – Mai sorriu. – Tudo bem?
- Mai! – ela sorriu de volta. – Tudo sim e você? Eu sempre acabo chegando atrasada... Desculpe não ter falado com vocês ainda.
- Oh, tudo bem. – ela balançou as mãos.
- Na verdade, a gente tem taaanta coisa pra falar que ia ser meio complicado mesmo na aula. – Fuu estava claramente animada. Os olhos brilhavam e o sorrisinho não abandonava os lábios.
- Que bom! – a pequena de cabelos negros era inocente. – Então o feriado foi mesmo bom. – sorria. – Você está muito bonita Mai. Parece ainda mais bonita. O que andou fazendo?
- Se-gre-do! – pôs o dedo indicador na frente dos lábios e piscou um olho.
- Ah, puxa! Que injusto! – fez um muxoxo de brincadeira.
Estavam tão entretidas na conversa que a baixinha nem viu o ruivo passar como uma bala, de cabeça baixa. Fugindo? É o que parecia estar fazendo.
Chegaram à mesa e encontram Chiharu como sempre. Sentaram-se e a morena dos cabelos compridos já foi falando.
- Menina, seu nome está ecoando por todos os cantos! – cutucou Rukia por cima da mesa antes de sentar-se.
- Meu nome? – Rukia franziu as sobrancelhas estranhando. – Por quê? – riu pequenamente incrédula.
A pisciana trocou olhares com as outras duas cúmplices.
- É que você mentiu pra gente! – Mai resolveu dizer, fingindo-se de chateada, mas com um sorrisinho malicioso escapando pelo bico.

- M-menti? – ela ficou nervosa. Claro. Tinha mesmo mentido.
- É isso mesmo. – Chiharu assentiu. – Você disse que ia pra Tofu e...
- É Kofu! – Fuu e Mai corrigiram revirando os olhos.
- É. E o que eu falei? – pareceu aborrecida por ter sido interrompida. – Enfim... Você disse que ia para sua cidade natal, mas acontece que... Acontece que descobriram a verdade. – fez sinal para Fuu.
- V-verdade? – sentia a cabeça quente e os joelhos fracos. – Que verdade?
Fuu então mostrou a foto.
- Essa verdade. – Mai disse. – Você e o Kurosaki...
As outras abafaram risinhos.
O rosto alvo de Rukia foi ficando cor de fogo.
- Estava no blog dos estudantes da universidade. – a garota de cabelos rosas explicou.
- E então... – Mai debruçou-se na mesa e lançou seu olhar inquiridor. – Vocês estão namorando, é?
Olhou para os lados disfarçadamente. Nada daquele ruivo. Como conseguiram ser tão descuidados!? Por que tinham que ter saído? Quem diabos tinha tirado aquela foto? Será que era tudo armação do Celeste-sama? E aquela pergunta? Estavam namorando? Namorando ? Não. Não estavam... Estavam... Não! Claro que não! Mas que coisa...
- Não! – deixou escapar de seus pensamentos pela sua boca, totalmente em pânico. – C-claro que não! Isso deve ser uma montagem! – Claro! Sempre tinham as montagens para culpar! Agora era só fazer sua cara mais chocada possível e parar de tremer... E voltar à cor normal!!!
Para sua surpresa, a reação das três foi deixar o queixo cair sobre a mesa.
- Como... C-como assim? – Mai não conseguiu se conter dessa vez. – Vocês não estão juntos?
- Não! – tentou simular a expressão mais indignada possível.
- Mas o Kurosaki... – Chiharu interveio. – Ele disse que estavam.
- Fofoca! – tentava não olhar diretamente para elas. Tentava falar com descaso.
- Não! – agora era Fuu teimando. – Ele mesmo disse pra gente algumas horas antes. Ele disse que estavam namorando!
Ai Deus. Era só o que faltava.

Não conseguiu emitir nenhum som. Sua mente era um emaranhado louco. Daqui a pouco ele a impediria até mesmo de respirar.
- Então ele mentiu de novo. – Fuu riu venenosa. – Igual ele fez com a Mai daquela vez, se lembram?
Droga! O emaranhado ficava pior. E agora estava se sentindo mal... Enjoada. O que estava fazendo?
- Ah... É. – Mai estava completamente sem graça. Não queria voltar nessa história. Sua intenção não foi deixar Ichigo na pior de novo! De jeito nenhum!
- Ele disse que ia sair com a Mai e arrumou o maior barraco com o Ashido, acredita? – a geminiana continuava, alheia ao desespero das outras três, se divertindo com o veneno. – Ficou conhecido como o maior lunático desde o ano passado! A Rukia-chan não pode sair com um cara desses!
- “Você viu os dois, sua idiota!” – Mai pensava rangendo os dentes. – “Por que está envenenando desse jeito, então?”.
Chiharu forçou um risinho para que o silêncio não ficasse incômodo naquela mesa. Sabia que Mai devia estar explodindo por dentro e ocupada demais se segurando.
Só esperava que a fofoca funcionasse com Ashido. Por que estava tudo a maior loucura!
E afinal... Os dois estavam namorando ou não? Fuu os tinha visto juntos de verdade. A foto não era montagem. Então porque Rukia negara com tanta convicção?
- Bem... – a pequena resolveu falar alguma coisa. Suava. De raiva, de frustração, de enjôo, de confusão. – Isso deve ser um grande mal entendido, não é? – tomou um gole de suco. – A foto é uma montagem e ele deve ter dito isso só para não encherem a paciência dele... Não sei. – resolveu ficar quieta. Parecia estar piorando as coisas. Não queria piorar o lado dele. Mas... Por que raios ele foi dizer que estavam namorando?! Quem tinha dito isso pra ele?! O que ele tinha na cabeça?!
Foi então que Ashido apareceu. Olhava para a mesa delas.
O coração de Mai logo se fez presente. Quase saltou do seu peito. Tinha certeza que todos ali podiam ouvi-lo. Tentou não encará-lo. Ele ia notá-la. Ia falar com ela.

Ver como ela estava diferente e confiante. E linda. Ia lembrar o quanto a amava. E que enfim aquela baixinha pertencia a outro e não tinha nada a ver. Não importava. Queria que ele a notasse. Queria que ele fosse atrás dela de novo... Não agüentava mais a falta que ele fazia... Queria só que ele...
- Rukia. – a voz cortou em mil pedaços toda a esperança que ela juntara. – Tem um minutinho pra falar comigo? – sorriu pequenamente para ela.
A respiração parecia ter voltado com força para a capricorniana. Ao levantar daquela mesa, sentia novamente o ar fresco voltando-lhe. Ele sempre a salvava.
- Ashido! Claro! – foi praticamente correndo até ele. Estava desesperada para sair daquele sufoco.
Chiharu então começou a rezar mentalmente.
E Mai segurava-se com todas as forças tentando convencer a si mesma de que aquilo não era nada demais... E se fosse... Não passaria de um pesadelo do qual acordaria logo. O tiro não podia sair pela culatra... Não podia!
O céu de primavera tão límpido e azul tinha sido invadido por um exército de nuvens. Bloqueavam o tão brilhante Sol e qualquer um de seus raios. Ofuscavam a beleza celeste. Fechavam o tempo. Confundiam a estação das flores com uma estação triste e de chuvas imprevisíveis. Atrapalhando todos os planos...


Continua...

 


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