Capítulo V

Sam Evans

Eu concordara em ficar de olho na Ice Queen, quero dizer, Quinn Fabray –– mas a verdade é que eu não tinha a mínima ideia de como eu deveria fazer isso. Será que eu tinha que segui-la pelos corredores, esperando algum contato dela com a treinadora Sylvester? Não, aquilo era ridículo. Além do mais, a Fabray nem fazia parte das líderes de torcida, então havia uma grande possibilidade da ideia do Kurt ser furada. Quero dizer, o que eu realmente vi? Duas garotas caídas no chão, uma por cima da outra. Mas isso não significava nada demais, ou significava? Podia ser só um acidente. E talvez eu só tenha me confundido sobre o “olhar de namoradas”. Vai ver elas só estavam se fuzilando com os olhos por terem caído no chão.

–– Evans, você está aí? – indagou Puck, acenando as mãos em frente ao meu rosto.

–– O que? – perguntei, franzindo o cenho. – O que eu perdi?

–– Qual é cara, você não ouviu nada do que eu disse? – perguntou Finn indignado.

–– Não, não ouvi. Desculpem – acrescentei, dando de ombros.

–– Tudo bem, eu repito – disse Finn, parecendo empolgado com a própria história. – Então, lembra que eu te chamei para ir comigo e o Puck encher a cara no ginásio?

–– Sei – concordei com a cabeça. – O que tem isso?

–– Então, eu jurava ter visto duas garotas entrando no vestiário feminino, e arrastei Puck atrás de mim para checarmos o que estava acontecendo...

–– Finn achava que elas estavam se pegando – disse Puck, revirando os olhos.

–– Não interrompe Puck. Mas seja como for, sabe quem estava lá?

–– Uma garota? – disse rindo. Finn revirou os olhos.

–– Não cara, era a Ice Queen!

E de repente, eu comecei a prestar mais atenção na história do Hudson.

–– E ela estava sozinha?

–– Não vi nenhuma outra garota – disse Finn dando de ombros.

Estranho, porque as duas estavam juntas quando eu as encontrei no corredor, e a Fabray definitivamente puxou a Berry para ir com ela. Mas se eles não viram duas garotas juntas...

–– E o que a Fabray estava fazendo? – perguntei desconfiado.

–– Aparentemente nada – disse Finn, dando de ombros. – Só estava lá, parada, encostada em um armário.

–– Foi estranho – comentou Puck sombriamente. – Era como se ela soubesse que íamos aparecer.

Talvez ela tenha dito para a Rachel se esconder –– pensei.

–– E você nem imagina o que o Puck fez – disse Finn, tentando não cair na gargalhada.

–– Muito engraçado, Hudson – resmungou Puck.

–– O que você fez? – perguntei interessado.

–– Ele a beijou! – disse Finn, rindo descontroladamente. – A cara de nojo dela... Cara foi impagável! Ela deu o maior empurrão nele. E foi aí que a Sylvester apareceu.

–– Sue Sylvester?

–– É cara. Deu o maior sermão na gente, e a Fabray veio com uma história de estupro.

–– Ela acusou vocês de estupro?! – gritei espantado.

–– Claro que não, cara! Pirou? Ela só queria botar pilha. Parecia até que queria que a gente saísse dali o mais rápido possível.

–– De qualquer forma, a Sue nos mandou para a diretoria. Mas eu estava cismado, cara. Eu tinha visto duas garotas entrando ali. Então pedi para Puck esperar um pouco.

–– E nós vimos duas garotas saindo juntas do vestiário – contou Puck, com um sorriso malicioso no rosto. – Uma delas era muito baixinha.

–– E vocês viram quem era? – perguntei, mesmo sabendo exatamente de quem se tratava.

–– Não vimos o rosto – comentou Finn, dando de ombros. – Mas isso é definitivamente algo a ser lembrado.

–– E por quê?

–– Porque Quinn Fabray tem uma namorada.

–– Ice Queen faz muito mais sentido agora – disse Puck rindo.

Finn comentou alguma coisa estúpida, fazendo Puck rir ainda mais. Franzi o cenho. Cara, isso não é nada bom.

Mercedes Jones

–– E era a Rachel? – perguntei, franzindo o cenho. – Então elas realmente se conhecem.

–– Eu estava certo – comentou Kurt.

–– Talvez não – disse Sam. – Olha gente, isso tudo pode ser só um grande mal entendido. Vai ver elas só não queriam ser pegas, e sejamos francos, não há lugar melhor para se esconder que o vestiário.

–– Isso faz sentido – concordei. – Mas acho melhor abrirmos mais nossos olhos. Não podemos deixar passar nada.

–– É, mas também devemos ser os únicos a sabermos disso. Se Noah Puckermann e Finn Hudson descobrirem que era a Rachel... Não quero nem pensar no que vai acontecer – disse Kurt.

–– Eles não viram quem era – garantiu Sam.

–– E Finn é a criatura mais burra da face da Terra – comentei. – Ele não reconheceria Rachel Berry nem se ela dançasse nua na sua frente.

–– Talvez ele até reconhecesse... Mas não acho que Rachel faria uma coisa dessas. Afinal, ela não vai querer deixa a Ice Queen com ciúmes – comentou Kurt maliciosamente, rindo da sua própria piada.

Não pude deixar de rir junto. Até mesmo Sam, que é um verdadeiro santo, deu um sorrisinho.

–– E vocês já falaram com ela hoje? – perguntei, olhando ao redor.

–– Não – disse Kurt. – Mas é melhor irmos logo. Estamos atrasados para a próxima aula. Depois é o almoço, nós conversamos melhor lá.

–– E a gente encontra a Rachel e pergunta se ela vai mesmo entrar – acrescentei.

–– Ó Céus – murmurou Sam, parecendo preocupado. – Só espero que isso não dê em nenhuma merda.

E ele definitivamente não era o único.

Rachel Berry

–– Estou dentro – disse. – Eu vou para a reunião do clube do coral.

Kurt sorriu para mim e me abraçou.

–– É ótimo termos mais um membro.

–– Na verdade, são mais dois – comentou uma voz suave logo atrás de mim.

Kurt pareceu ter congelado no lugar. Nem sequer precisei me virar para saber de quem se tratava. Tentei não sorrir, mas não me segurei.

–– Espero que não se importe, Kurt – disse, acenando na direção de Quinn. – Estávamos conversando ontem, e eu comentei que o clube do coral precisava de novos membros, e ela pareceu interessada.

–– E vocês se conhecem? – perguntou Kurt, arqueando a sobrancelha.

–– Agora nos conhecemos – disse Quinn, sorrindo em minha direção.

–– Eu me atrasei para a aula ontem, e a Quinn me ajudou a não ser pega vagando pelos corredores – esclareci. – Conversamos um pouco, e ela me parece ser bem legal – disse com sinceridade.

–– Até porque você não ia falar mal dela com a garota presente, não é?

Virei-me e vi Santana Lopez parada bem perto de mim. Ela me olhava de cima a baixo com uma expressão de desprezo no rosto. Encolhi-me.

–– Então você é a Berry?

–– Algum problema com isso? – perguntou Quinn, desviando a atenção de Santana.

–– Problema nenhum – comentou Santana com um sorriso falso no rosto. – Sempre quis conhecer um hobbit.

Quinn estava prestes a abrir a boca para argumentar, mas segurei o braço dela e disse baixinho.

–– Deixa para lá.

Mas a minha atitude não passou despercebida por Santana. Seu sorriso só fez aumentar, e de falso, tornou-se malicioso.

–– Ora, ora, ora. Então a Ice Queen tem uma namorada! Tudo faz mais sentido agora – comentou, soltando uma risada.

Olhei para Quinn com medo que ela perdesse a cabeça ou algo assim. Eu não a conhecia direito, e realmente não me importava com insinuações –– afinal de contas, eu realmente gostava de garotas. E embora meu recém-descoberto gaydar apitasse perto dela, eu não tinha muita certeza de que ela era assumida. Mas para a minha surpresa, Quinn também riu.

–– Ora Lopez, então eu não seria muito diferente de você, não é? Ou você acha que ninguém sabe o que acontece entre você e a Brittany?

E pela primeira vez na vida, eu vi Santana Lopez com um olhar assassino no rosto. E eu quase agradeci por aquele olhar não ser direcionado a mim. Mas a raiva da latina parecia divertir Quinn ainda mais.

–– Acho que nós duas aprendemos uma lição hoje, não foi? – perguntou Quinn, parando de rir. – Não se meta na vida dos outros, se não quer que eles não se metam na sua.

E sem dizer mais nada, Quinn saiu andando, deixando uma Santana espumando de raiva, e um Kurt paralisado. Foi aí que eu soube que o clube do coral ia se tornar um verdadeiro inferno.

Santana Lopez

Aquilo não era possível. Como Ice Queen sabia sobre Britt e eu? Nós nunca contamos para ninguém, nós nunca demos bandeira. Não, ela não podia saber. Ela estava inventando, era isso, e eu estava sendo uma tremenda idiota por cair naquele truque fajuto dela. Mas se Ice Queen pensava que ia me intimidar, ela estava muito enganada.

Kurt Hummel

Eu nem sabia ao certo como respirar. Santana saiu bufando de raiva, empurrando todos que estavam a sua frente. Será que o que Ice Queen dissera era verdade? Será que ela tinha um caso com a Brittany? Cara, aquele era o babado do século! Santana Lopez gay? Nem mesmo meu gaydar tinha apitado perto dela. Ou talvez ele só se sentisse intimidado –– até porque Santana Lopez pode ser bem assustadora sempre que quer. E ela sempre quer. Encarei Rachel, e ela parecia tão embasbacada quanto eu. Mas antes que eu pudesse soltar um “ai” sequer, o sinal bateu, indicando o fim do almoço.

–– Vejo você no clube do coral? – perguntei receoso.

–– Pode ter certeza que sim – respondeu-me.

Não pude deixar de sorrir. Essa é das minhas –– pensei, antes de sair andando para o meu armário e enfrentar mais duas aulas chatas.

Brittany Pierce

–– Fica calma, Santana, ninguém sabe sobre nós – disse, revirando os olhos. – Quero dizer, talvez o Lord Tubbington saiba, mas pode ficar tranquila, ele não vai contar para ninguém.

Santana me encarou, parando de andar de um lado para o outro. Não pude deixar de sorrir. Ela ficava tão bonitinha irritada. Acho que era uma coisa boa ela sempre estar irritada, porque ela era sempre bonitinha. Eu realmente não gostava quando ela intimidava as pessoas, ou jogava slushie na cara delas, mas ultimamente ela estava sendo muito legal.

–– Você tem certeza, Britt?

–– Absoluta Sant. Eu não contei para ninguém, eu juro – disse, levantando o dedo mindinho.

A verdade é que eu não entendia porque a Sant fazia tanta tempestade em um copo d’água. Parecia até o Lord Tubbington! Os dois ficavam resmungões, zangados e andavam de um lado para o outro. Mas pelo menos Santana não roubava meu dever de casa para usar para fumar maconha.

–– Vamos Santana, o sinal já bateu. Eu não quero me atrasar para o Glee Club.

–– Não sei por que você gosta tanto desse clube – resmungou Sant.

–– Como se você também não gostasse – retruquei, revirando os olhos. – Vamos logo. Se você estiver certa, finalmente teremos nossos doze membros completos.

Não esperei uma resposta da Sant –– segurei-a pela mão e saí andando pelo corredor. Ela corou.

Rachel Berry

Meu coração bateu apertado quando o último sinal bateu. Eu estava muito nervosa, principalmente depois do que tinha acontecido. Respirei fundo algumas vezes, tentando buscar alguma coragem.

–– Vai ficar tudo bem – disse alguém, colocando a mão sobre meu ombro.

–– Eu não teria tanta certeza – disse, virando-me para a garota atrás de mim. – Como você pode estar tão calma depois de provocar Santana Lopez?

Quinn Fabray sorriu. Sua mão apertou meu ombro com um pouco mais de força e ela balançou a cabeça.

–– Cão que ladra não morde – garantiu-me Quinn. – Agora vamos, é melhor não nos atrasarmos para a nossa primeira reunião.

Concordei com a cabeça. Quinn não soltou a mão do meu ombro durante todo o caminho. Quando entramos na sala do Glee, Santana já estava sentada ao lado da Brittany –– e não lançava um olhar nada amigável na nossa direção. Quinn soltou uma risadinha baixa antes de me soltar.

–– Senhor Schuester? – chamou Kurt. – Nós encontramos os dois últimos integrantes para o Glee Club.

Só então o Sr. Schue pareceu nos perceber. Ele abriu o maior sorriso e se aproximou.

–– Olá! Bem vindas!

–– Olá – dissemos eu e Quinn ao mesmo tempo.

–– Você é a novata? – perguntou-me. Concordei com a cabeça. – E eu acho que não te conheço – acrescentou ele, lançando um olhar confuso à Quinn.

–– Provavelmente não – disse Quinn, dando de ombros.

–– Você também é novata? Eu nunca a vi nas aulas de Espanhol.

–– Porque eu nunca fui a nenhuma aula de Espanhol – comentou Quinn desinteressada.

O Sr. Shue arqueou a sobrancelha.

–– Hum, podemos entrar? – perguntei.

–– Deixem-me ser bem claro: todos os membros do Glee devem participar de todas as aulas. Ninguém aqui pode ter uma nota abaixo na média, e não quero ninguém sendo reprovado por falta. Estamos entendidos?

–– Não se preocupe Sr. Schue – disse Quinn sorrindo. – Eu vou me esforçar mais daqui pra frente.

Ele concordou com a cabeça.

–– Muito bem. E o que vocês vão cantar?

–– I say a little pray for you – disse Quinn.

Sentei em uma cadeira ao lado de Kurt, e Quinn começou a cantar.

The moment I wake up

Before I put on my makeup

I say a little prayer for you

While combing my hair, now,

And wondering what dress to wear, now,

I say a little prayer for you

Quinn sorriu, e foi um dos sorrisos mais lindos que a vi dar. Ela parecia se envolver com a música, como se ela de fato tivesse vivido tudo aquilo.

Forever, forever, you'll stay in my heart

and I will love you

Forever, and ever, we never will part

Oh, how I love you

Together, together, that's how it must be

To live without you

Would only mean heartbreak for me

Então me ocorreu: e se Quinn já tivesse sido uma pessoa diferente? Fazia sentido. Porque ela provavelmente tinha motivos para agir do jeito que agia, para afastar as pessoas dela, como ela mesma admitia fazer.

I run for the bus, dear

While riding I think of us, dear,

I say a little prayer for you.

At work I just take time

And all through my coffeebreak-time,

I say a little prayer for you.

Peguei-me pensando se eu gostaria de conhecer essa “antiga” Quinn, se ela de fato existiu. Essa que eu conhecia parecia tão interessante, tão misteriosa. Era como se ela escondesse um segredo, e como se ela quisesse que seu segredo fosse desvendado.

Forever, forever, you'll stay in my heart

and I will love you

Forever, and ever we never will part

Oh, how I love you

Together, together, that's how it must be

To live without you

Would only mean heartbreak for me

E quando Quinn terminou de cantar, eu me prometi uma coisa: eu iria desvendá-la, custasse o que custasse. Todos, com exceção de Santana, aplaudiram Quinn de pé. Kurt estava de boca aberta, como se ele nunca esperasse uma voz tão doce de alguém tão misteriosa.

–– Você é muito boa – elogiou o senhor Schuester.

Quinn deu de ombros e veio se sentar ao meu lado.

–– É a sua vez, Rachel – disse Kurt.

Quinn sorriu para mim e sussurrou “você vai se dar bem”. E quando eu fiquei na frente de todos, pronta para começar a cantar, eu sabia que ela estava certa. Tudo ia ficar mesmo bem.