Capítulo XXVIII

Quinn Fabray

"Você está bem?" perguntei pelo que me pareceu ser a milésima vez naquele dia.

"Sim" disse Rachel, embora seu tom de voz não soasse firme.

Encarei-a preocupada. Desde sexta-feira que Rachel estava estranha, e eu não tinha a mínima ideia do motivo. Será que eu havia feito alguma coisa de errado? Provavelmente não, porque Rachel não estaria andando de mãos dadas comigo pelos corredores se eu fosse o problema. Quem seria, então? Blair? Não. Blair passara o final de semana inteiro comigo, e seus pensamentos estavam focados em um certo loirinho. Será que os pais de Rachel brigaram com ela, ou coisa do tipo? Não, também não. Eles são do tipo de pessoa que preferem evitar conflitos. Mas o que seria? Bufei. Era nessas horas que eu me sentia extremamente frustrada por não conseguir ler a mente da minha namorada.

"Vou pegar meus livros" disse Rachel, soltando-se da minha mão e caminhando até seu armário. Parei em frente ao meu e a observei por alguns segundos. Poderia não ser nada, afinal. Talvez ela só estivesse cansada por causa de uma noite mal dormida, ou preocupada com a prova de Matemática que teríamos ainda nessa semana. Suspirei e abri a porta do meu armário. Um bilhete caiu. Franzi o cenho e o peguei no chão.

E aí, Q., tudo beleza?

Você sabe quem eu sou. Você já me viu pelos corredores, e você sabe o meu nome. Você passa por mim todos os dias, mas na maior parte do tempo você ignora a minha presença. Ridículo, eu sei. Como alguém poderia ignorar a minha presença? Bem, você faz isso. Provavelmente porque seus olhos sempre se desviam para uma certa baixinha.

Enfim, você sabe o que fazer. Tente me encontrar, Q. Tente me encontrar, porque eu vou tentar me esconder.

S.

Bufei. Como se eu não tivesse coisa demais com o que lidar! Wonder estava perdendo a cabeça se achava que eu ia cair naquele joguinho de esconde-esconde. Se a tal S. quisesse, ela que viesse atrás de mim. Eu que não ia perder meu tempo correndo atrás de uma perdedora e deixar de dar atenção a única garota que realmente me importa. Virei a cabeça, mas Rachel já não estava mais no corredor. Franzi o cenho e fechei a porta do armário com força.

"Vai quebrar, Q.?" perguntou Santana, abrindo um sorriso maldoso.

Eu nem sequer notara que Santana Lopez estava parada ao meu lado. Seus olhos desviaram para uma loirinha conversando com uma outra garota perto de um armário, e Santana soltou um longo suspiro.

"Cuidado com a baba" zombei.

"Vá se foder, Fabray" resmungou Santana. "E aquela Adoçante não saí de perto dela"

"Adoçante?" perguntei, arqueando a sobrancelha. "Você quis dizer Sugar?"

"Tanto faz" resmungou Santana.

"Ela é uma líder agora, não é?" perguntei, escorando-me em meu armário e observando a garota.

Olha só, a Santy está olhando para mim. E a Quinn também. Elas andam tão juntas ultimamente. Isso não é normal, é? A Q. não namora a baixinha? Qual é mesmo o nome dela? Droga, sempre esqueço! Esquecer devia ser bullying, assim eu podia reclamar com o diretor Figgins que a minha memória está sempre bulinando comigo. Mas bullying maior ainda é amar tanto uma pessoa e não ter ela ao seu lado.

Mordi o lábio inferior e tentei não sorrir. Ah, se a Santana soubesse como a Brittany se sentia a ela! Mas os pensamentos de Brittany foram deixados de lado assim que a voz anasalada de Sugar invadiu minha mente e me fez querer arrancar meus próprios ouvidos.

Essa loirinha é tão burra. Sério, como ela pode ser líder de torcida? Vai ver ela só quer se pegar com a latina. Haha! Você é hilária, Sugar! Mas... Bem, não deixa de ser verdade, acho. Aquela latina parece homem, às vezes. Eu não me surpreenderia se Brittany quisesse mesmo se pegar com ela. A garota é tão burra que pode chegar a confundí-la com um garoto. Hahaha! E... Espere aí, a Fabray está olhando para cá? Então olhe, Ice Queen, porque olhar não tira pedaço. Mas quero só ver se a Ru Paul, vulgo Gaychel Berry, vai se sentir com relação a isso. Oh-oh! Q. teria graaaaaaaandes problemas!

Encarei Sugar irritada. Quem aquela vadiazinha achava que era para pensar aquelas coisas de Brittany, Santana e Rachel? Fechei minha mão esquerda em forma de punho, e prometi a mim mesma que na primeira oportunidade, derrubaria a garota da pirâmide.

"Você vai se declarar?" perguntei, encarando Santana e tentando tirar a Adoçante da minha mente.

"Sim" concordou Santana, soltando um pequeno suspiro. "E a aposta, Fabray?"

"Digamos que amanhã o diretor Figgins terá uma surpresinha em seu escritório" disse, abrindo um largo sorriso.

Porque eu passara o final de semana inteiro imaginando o que eu poderia fazer. O objetivo era distrair o diretor por tempo o suficiente para que Santana pudesse pegar a prova e colocá-la na mochila. E se tinha alguma coisa que o diretor Figgins detestava, essa coisa era vampiros. Então digamos que não seria nada agradável encontrar uma mensagem com "sangue" na parede do seu escritório dizendo que ele seria o próximo a ter todo o sangue drenado de seu corpo. E, claro, para completar, teria um esqueleto pendurado no teto. Sim, eu sou um gênio.

"Que tipo de surpresinha?" perguntou Santana.

"O suficiente para fazê-lo sair correndo chamando pela mamãe feito um bebezinho" disse maliciosamente. "Você terá no máximo dez minutos. Duvido que a treinadora Sylvester fique assustada com uma pegadinha. O Figgins é um idiota"

"Isso é verdade" concordou Santana. "Que horas?"

"Amanhã é terça" disse. "O Figgins sempre chega atrasado às terças"

"Como você sabe disso?" perguntou Santana.

"Observando, Lopez. Aprenda comigo"

Mas aquilo não era verdade. Eu sabia que o Figgins chegava tarde às terças porque aparentemente segunda-feira era o único dia da semana que sua esposa estava bêbada o suficiente para aceitar ter uma noite longa de sexo com ele. Ele passa o dia todo se vangloriando –– embora ninguém o escute, já que ele faz isso em sua própria mente –– sobre como sua noite foi incrivelmente maravilhosa. Patético. Às vezes eu me surpreendo por ele ainda ter uma mulher.

"Sei..." disse Santana, estreitando os olhos em minha direção. "Então que horas ele chega?"

"Umas dez" disse. "Vinte para as dez você pede um passe e se esconde naquele banheiro feminino, e assim que ele sair correndo, eu te mando uma mensagem"

"E a secretária dele?"

"Eu a distraio" disse.

"Parece que temos um plano" disse Santana maliciosamente.

"Ah, sim" concordei sorrindo. "Nós temos mesmo"

"Então nos vemos no clube do coral" disse Santana, soltando um pequeno suspiro e lançando um último olhar na direção de Brittany.

"Vai ficar tudo bem" garanti-lhe.

Porque eu tinha absoluta certeza de que hoje seria o dia em que Santana Lopez e Brittany Pierce começariam a namorar.

Santana Lopez

Eu estava nervosa. O almoço tinha acabado, e a conversa com a Fabray me deixara relativamente mais calma, mas ainda assim não era o suficiente. E se Brittany me desse o fora na frente de todo o clube do coral? E se todos rissem de mim? E se o colégio todo descobrisse que eu sou gay? Não que essa seja minha maior preocupação. Afinal de contas, eu quero ter Brittany como minha namorada, mas se ela me rejeitar, então eu não vejo motivos para não continuar no armário.

"Oi Santy" disse Britt, abraçando-me por trás.

"Oi Britt-Britt" disse, abrindo um pequeno sorriso e me virando de frente para ela. "Já almoçou?"

"Já" concordou Brittany. "Senti sua falta no almoço"

"Hum... Desculpe-me. Eu só estava pensando"

"Em que?" perguntou Britt.

"Hum... Na prova que teremos. Preparada?"

"Você sabe que não" resmungou Britt. "Vou tirar zero de novo"

"Não vai não, mi guapa" disse, tocando a ponta do seu nariz e fazendo-a sorrir. "Eu vou te ajudar, lembra? Amanhã podemos estudar juntas"

"Vai ser um prazer ter você como professora" disse Britt, abrindo um sorriso malicioso.

Díos mio!

Ela um dia nos mata, Santana.

Nem me fale. Como ela consegue ser tão linda?

Não sei. Perfeita, simplesmente perfeita.

Eu não me arrependo da decisão que tomei.

Nem um pouco.

Foda-se as consequências.

Foda-se tudo. Hoje Brittany Pierce será nossa.

Só nossa.

E de mais ninguém.

Abri um grande sorriso e abracei com força minha loirinha. Nós ainda tínhamos duas aulas antes do clube do coral, mas eu já estava completamente preparada. Porque eu amava Brittany, e era só isso o que me importava.

Shelby Corcoran

"Belo escritório" comentei.

"Obrigada" disse Alexia, embora não parecesse nem um pouco feliz com o elogio. "O que você quer, Corcoran?"

"Que nome é esse que você adotou?" perguntei curiosa. "Wonder? Interessante"

"Será que podemos cortar o papo furado?"

"Ah... Sim, claro. Como você quiser"

"O que você quer?"

"Quem você estiver escondendo"

"O que?" perguntou Alexia surpresa.

"Eu sei, 'Wonder'. Eu sei que você não é a única em Lima. Eu sei que você está encobrindo alguém aqui na cidade e, pior, o Governo também sabe disso. Então se você for sábia, vai nos dizer que é e acabar logo com isso"

"Você não pode estar falando sério" disse Wonder incrédula. "Eles sabem da sua filha, Concoran?"

"Minha filha?" perguntei. Ela não podia saber sobre Rachel... Ou podia?

"Ah, sim. Eu sei que ela é sua filha. Eu soube desde a primeira vez que a vi"

"Você a conhece?" perguntei irritada. "Fique longe da Rachel"

"Não se preocupe. Ela ainda não é uma Reader, mas acho que é só uma questão de tempo"

"Ela não vai se tornar uma!" gritei. "Entregue logo quem quer que seja que você esteja escondendo, Reynolds"

"Alexia Reynolds... Há muito tempo que ninguém me chama assim... Prefiro Wonder, se não se importa" disse Alexia. "E eu acho que você não vai querer machucar sua própria filha. Pelo menos não mais do que você a machucou"

"Do que você está falando?" perguntei confusa. "Rachel não tem nada a ver com isso"

"Engano seu, Shelby. Rachel tem tudo a ver com isso"

"E como poderia?"

"Porque a Reader que eu estou encobertando é a namorada dela"

"Você está mentindo" disse, arqueando uma sobrancelha. "Quinn Fabray não é uma Reader"

"Ah, então você a conhece?" perguntou Alexia surpresa. "E não leu a mente da garota? Impressionante, porque ela grita para quem puder ouvir o que ela é. Ainda não tive tempo de ensiná-la a se fechar"

"Eu a vi na mente de Rachel" disse. "E a garota é normal. Você está inventando tudo isso"

"Não estou" negou Alexia. "Mas se você não acredita em mim, então verifique por si mesma. Ela também faz parte do clube do coral, assim como sua filha"

"Eu sei disso" retruquei irritada. "Fique longe da Rachel"

"Mantenha eles longe de mim e das minhas meninas" retrucou Alexia.

"Então há mais de uma?" perguntei. "Bom saber, Alexia"

Alexia ficou pálida, e eu sorri triunfante. Sim, eu iria até o clube do coral e descobriria se a namorada da minha filha era ou não uma de nós. E quando eu soubesse... Bem, eu teria que tomar uma decisão. Mas seja ela qual for, eu não preciso sair de Lima com as mãos vazias. Porque ao que parece, Quinn Fabray não é a única.

"Nem pense em avisá-la" disse, levantando-me e caminhando até a porta. "Seus telefones estão grampeados. Até mais, Alexia Reynolds. E cuidado. Nós ainda estamos de olho em você"

E sem dizer mais nada, eu fui embora. Eu ainda tinha muito trabalho a fazer.

S.

"Você tem certeza?"

"Sim, eu tenho. Esqueça os bilhetes. Revele-se para a Fabray. Diga quem você realmente é, e mande ela ter cuidado com a Corcoran. Essa mulher é perigosa"

"O que você quis dizer com 'Ela trabalha para o Governo?', Wonder?" perguntei confusa.

"Quer dizer que o Governo sabe da nossa existência, S. Eu fugi deles uma vez, mas paguei um preço muito caro. Desde então, tenho vivido escondida, rezando para que eles não me encontrem. Mas eles sempre souberam onde eu estava"

"Isso... Isso quer dizer que vão vir atrás de mim?" perguntei assustada.

"Você consegue se bloquear"

"Então talvez eu não devesse me revelar para a Quinn. Se ela souber quem eu sou, a Shelby também vai saber"

"Eu sei, mas acredite, é melhor assim. Ela vai ver que você é só uma criança, assim como a Quinn, assim como a Rachel. Não acho que ela vá entregar vocês"

"Mas ela sabe que tem algum Reader em Lima"

"Eu sou uma Reader" disse Wonder. "O Governo sabe que eu estou aqui. Eu posso fingir que sou a única, mas vou precisar da ajuda da Shelby para isso. E ela só vai me ajudar se perceber que vocês são inofensivas"

"Você mencionou a Rachel... A Rachel não é uma de nós. O que ela tem a ver com isso?"

"Shelby é a mãe da Rachel, S."

"Oh..."

"Sua amiga escolheu uma péssima namorada"

"Eu... Eu tenho um plano. A Fabray estava planejando pregar uma peça no diretor. Eu posso transformar isso em algo maior e interditar a escola"

"Isso seria ótimo, S.! Então poderíamos conversar"

"Sim" concordei. "Então amanhã nos vemos, Wonder"

"Até amanhã, S. E cuidado"

"Você também" disse, soltando um pequeno suspiro.

Desliguei o celular e passei a mão pelo rosto. Maldição! Tudo estava indo tão bem na minha vida, tudo estava tão maravilhoso! Eu deveria saber que nada daquilo ia durar muito. Nunca dura para alguém como eu. Como Quinn. Como Wonder. Deve ser algum tipo de maldição que carregamos, acho. Suspirei.

"Estamos fodidas"

Abracei meu caderno com força contra o peito. E pelo visto, a pior parte ainda estava por vir.