A Grande Busca escrita por Rebeca Bembem


Capítulo 7
Hugo vira herói com sua luz cinza.


Notas iniciais do capítulo

OOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOI. Sei que demorei MUITO pra escrever este capítulo, mas estava sem ideias, sem tempo, e sem inspiração. Espero que me perdoem por este atraso mais que longo e que este capítulo compense. >.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/207260/chapter/7

Abri a porta da geladeira me perguntando por que aquilo sempre acontecia comigo, e se poderia algum dia, parar. Primeiro, meus pais. Depois, meus avós. Depois, minha irmã, e agora meu amigo de infância. Até meu colar já haviam tirado de mim. A única coisa material com a qual realmente me importava. Sentia um vazio dentro de mim onde algum tempo antes havia certa esperança e determinação. Disse a mim mesma que era apenas a fome e tentei me convencer disso, sem muito sucesso.

Meu estômago roncava por ter passado quase três dias sem receber comida. A geladeira ainda estava cheia. Meu avô fizera a compra do mês antes de morrer. Quase não suportei a saudade que tomou conta de mim. Quase. Mas havia um doce na geladeira, e eles sempre me ajudavam. Peguei a barra de chocolate branco, um pote de requeijão, um pedaço de queijo e uma garrafa de coca e abri o armário pra pegar um pão, um copo e uma faca.

Sentei-me à mesa sozinha. Hugo não se mexera desde que lhe virara as costas. Estava com tanta fome que o pão com requeijão se foi rapidinho e a garrafa de coca também. Comi metade do chocolate e resolvi guardar a outra metade para afogar as próximas mágoas que com certeza viriam.Em dias tão bons como esses é bem provável que fique obesa, de tanto afogar mágoas e mais mágoas em chocolate, pensei.

Finalmente, quando eu já me preparava para ir para a sala e escutar, em fim, a história que Raquel e Pedro me contariam, Hugo dá uma tosse fingida, bem baixa, mas suficientemente alta para que eu me virasse, hesitante para encará-lo. Ele tinha os olhos tristes. Muito tristes e desolados. Não me lembrava de jamais ter visto aqueles brilhantes olhos cinza tão sem cor e desamparados. Não tive reação por um momento. Depois, simplesmente dei e ombros e murmurei:

– Tudo bem. Eu entendo você. Não precisa fingir que quer me ajudar a encontrar minha irmã. Não mais do que já fingiu. Sei que vou ter que fazer isso sozinha, porque não é esse seu objetivo. Tudo bem. Se eu pudesse, também faria tudo pra trazer minha mãe de volta - então, olhei para o chão e tentei fazer parecer que estava encarando 'meus' chinelos e pensando como eram lindos. Mas isso só piorou a situação, porque os chinelos eram, afinal, de Elisa, mãe de Hugo.

E quando resolvi, finalmente erguer a cabeça e ir para a sala, vi um pontinho branco no chão. Ouço que Hugo está começando a falar, mas nem presto atenção e as palavras dele trespassam meus ouvidos, fazendo tanto efeito em mim como o vento. Pois agora tinha algo muito mais interessante com o que me importar. Aquele papelzinho dobrado, que eu me agacho para tirar do chão. Aquele que eu tirara da caixinha onde estava meu colar.

Meu coração começa a bater muito rápido, e uma tênue chama de esperança começa a queimar em mim. Em minha cabeça vozes sussurram:''É uma pista. '', ''Finalmente eu tenho por onde começar a busca'', ''UMA PISTA!''. Eu desdobro o papel, e meus olhos passam por ele tão depressa que nada entendem da caligrafia bonita, grande e feminina do pequeno bilhete. Tenho que voltar e ler tudo de novo, mas estou tão apressada em saber quem escreveu que meus olhos param, inevitavelmente no nome escrito no canto direito do final do bilhete:Bianca.

Esqueci, por um momento, que não estava mais dividindo aquela missão de busca com Hugo, e lhe perguntei, provavelmente interrompendo seu maravilhoso discurso - ainda ouvia ecos da sua voz:

– Quem é Bianca?

Hugo engasgou no meio da fala e começou a tossir, violentamente. Seus olhos ficaram esbugalhados e, quando parou de tossir, não falou mais nada.Será que ele falou tanto tempo sozinho que o deixei sem saliva? Eu me perguntei.

– Você conhece alguma Bianca? Vamos, responde logo seu idiota mudo! - estava ficando impacientemente muito agitada e apressada. Nem havia lido direito o conteúdo do bilhete. Sentia que precisava conhecer minha mais nova amiga ou inimiga, primeiro.

– Não sou mudo, estava falando com você até agora, mas você não estava ouvindo. O quê é isso aí na sua mão? Um bilhete? - ele veio pra cima de mim, querendo ler o bilhete, mas meu instinto me disse pra escondê-lo.

– Respondo sua pergunta se responder à minha. Por que ficou tão apavorado quando te perguntei quem era Bianca? Hein?

Hugo franziu as sobrancelhas e pesou suas palavras por uns segundos.

– Promete me escutar se te responder e promete me ouvir até euterminar de falar?

– Hm, eu te escuto - eu sabia que não tinha escolha, e que precisava daquela resposta.

– Muito bom. Bem, sim, eu conheço uma Bianca. Ela faz meio que o mesmo papel que eu, você, sua irmã, esse tal de Pedro - o tom de desprezo em sua voz quando disse 'esse tal de Pedro', mesmo que disfarçado, foi bem perceptível pra mim - e mais umas pessoas nessa história toda. E não me venha com perguntas sobre que papel é esse, isso é pra depois, fecha essa boca aí -prometi ouvir até o final, agora vou ouvir–. Nos conhecemos à... Muito tempo, digamos assim. E, bem, sua mãe é... Cersei. A mulher que, aparentemente, mandou homens atrás dos seus colares. Aquela que tem um plano pra... Bem simplesmente dizendo, trazer minha mãe de volta - vi um rubor subir pela face de Hugo e sua pele morena ficou vermelha.

Como ele nada mais disse, resolvi mudar o rumo que o assunto estava seguindo, e focar no bilhete.

– Cersei é a mulher que tem minha irmã?

– Aparentemente. E Bianca é sua filha.

No silêncio que se seguiu, eu podia ter lido, enfim, o bilhete, mas uma ideia, uma sugestão crescia em minha mente.A mulher que tem minha irmã... ''E Bianca é sua filha''. ''Ela faz meio que o mesmo papel que eu, você, sua irmã, esse tal de Pedro e mais umas pessoas nessa história toda''.Ela tem algo em comum conosco...

– ELA TEM UM COLAR?! - deu um grito súbito de compreensão, tão alto que Hugo quase caiu no chão.

– Tem, tem, meu Deus como você grita alto. Acho que até a ruivinha e o seu amado Pedrinho ouviram lá da sala, ai meus ouvidos Alice...

– Raquel. Pedro - eu murmurei, assustada. Como me esquecera deles?Vai ver foi porque fizeram um silêncio enorme e nem vieram ver por que estávamos demorando tanto pra ir pra sala... Exatamente. O silêncio. Na situação que me encontrava, estava praticamente desconfiando de tudo. Com o medo crescendo dentro de mim, como das duas últimas vezes que corri por esta casa, corri até a sala, apertando bem firme o pedacinho tão precioso de papel em minha mão esquerda e puxando Hugo pelo braço com a mão direita.

– O quê foi? Está brava comigo porque não lembrei o nome da ruivinha com blusa de panda? Não precisa parecer tão assustada Alice. O quê você tem? - ele me perguntava, com tom de voz preocupada enquanto corríamos até a sala e a encontrávamos... Vazia.

Nem nos sofás, nem embaixo deles, nem no chão, nem no teto, nem nas paredes havia sinal dos cabelos ruivos de Raquel e dos rebeldes cabelos loiros de Pedro. Mas havia uma pequena dica de onde poderiam ter ido... A porta da frente estava aberta. Quando parei um segundo para encarar a sala vazia Hugo pareceufinalmente (!) entender porque eu estava tão assustada e não precisei mais puxá-lo para que corresse, pois ele passou à minha frente e correu para a porta antes de mim.

Olhei para todos os lados enquanto descia os degraus da frente, mas não achei nada. As nuvens carregadas que despejaram água do céu enquanto eu fiquei na casa de Hugo haviam parado de pingar. Mas, mesmo assim, e mais uma vez, o céu estava nublado, como não era típico do fim de ano, e como estava desde que meu avô morrera. Nos jardins, pra qualquer lado que olhava, não via nada. Olhei para a direita e vi Hugo dentro da garagem, procurando de um lado pro outro, mas sem sucesso também. Tomei fôlego e gritei:

– RAQUEL! RAQUEEEEEEEEEEEL!

E quando já me preparava para gritar o nome de Pedro a resposta veio. Poderia ter ficado feliz, mas o tom dela só me deixou ainda mais preocupada. Era um grito desesperado, assustado e pontuado por soluços, que encheu meu coração de angústia e quase me fez ficar parada no lugar ao invés de correr pra ajudar.

– AQUI! ALICE! - soluço - ALICE! AQUI! ATRÁS DOS ARBUSTOS E DA MACIEIRA! - soluço - AQUI! POR FAVOR! VENHA AQUI! - soluço - RÁPIDO, POR FAVOR! HUGO, POR FAVOR! ALGUÉM!

Nem olhei para Hugo pra saber se ele me seguia. Desatei a correr para os arbustos, alguns metros à minha frente, sentindo que cada passo demorava uma eternidade, mesmo que meus pés mal tocassem o chão.Pedro não,eu pensava.Por favor, ele não. Raquel não, não, por favor...

Cheguei até os arbustos e dei a volta. Assustei-me muito com o que vi. Pedro estava deitado no chão, estatelado na grama, com um corte muito grande que ia do queixo até o fim do pescoço. O corte cruzava o pescoço como uma rubra e longa linha vermelha, e o sangue pingava e ensopava sua camisa de um vermelho tão vivo que embasava minha vista. Meu terror foi total. Raquel estava debruçada sobre ele, murmurando em seu ouvido: ''Tudo vai ficar bem, vou te levar pra um médico, fique tranquilo, meu amor, doce amor, não vou deixar você, não te deixo, não deixo te machucarem, cuido de ti, meu amor, cuido, cuido, tudo vai ficar bem querido...''

Agachei-me na grama, tremendo e suando frio da cabeça aos pés e encarei os olhos azuis de Pedro. Não deixaria que o brilho deles se apagasse. Não, mais um não. Ele estava vivo, sentia isso. Coloquei minha mão sobre seu peito, e senti seu coração batendo, fraco, mas batendo. Pensei desesperada, aterrorizada, no que fazer, até que Hugo me empurrou para o lado e tirou uma corrente de prata do pescoço. Raquel levantou a cabeça, e seu rosto estava ensopado de lágrimas. Ela olhou pra Hugo, suplicante, e depois para a grande pedra cinza que Hugo trazia em seu colar e mexeu os lábios formando a palavra 'Por favor'.

Tudo que se passou à seguir foi muito rápido e eu, de tão assustada que estava, me lembro de tudo como se fosse um borrão. Lembro-me de ter visto Hugo, suando frio e tremendo, encostar a pedra cinza no pescoço de Pedro e murmurar umas palavras estranhas. Lembro-me de uma luz cinza ter saído da pedra e tomado o lugar do vermelho na minha visão. Lembro-me de ter olhado para os olhos azuis de Pedro e ver o brilho voltando à eles. Lembro-me ainda, e mais nitidamente, de ter sentido o coração dele batendo mais forte quando encostei minha mão em seu peito.

O alívio, a surpresa, a dúvida e o medo tomavam conta de mim ao mesmo tempo, mas eu só me deixei sucumbir pelo alívio. Pedro estava vivo! Eu ainda tremia e suava quando ele se sentou, ao som da respiração ofegante de Hugo, e do grito de alívio de Raquel. E, depois de esperar Raquel dar um beijo prolongado nele, me joguei em seus braços, sentindo com uma felicidade imensa que ele tinha voltado pra mim. Não sabia como, não entendia o que tinha acontecido, mas sabia que naquele momento, nada mais importava.

Nem mesmo o bilhete que eu largara aos meus pés sem ter lido.



Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Então? Gostaram? reviews??????????????????????????????????????????????????????????????????????????????????????????????



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Grande Busca" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.