Leis da Noite - Mente sobre Materia escrita por Ryuuzaki


Capítulo 5
O Colecionador - Parte 4




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                                   ...

 


Claudius sentou-se em uma das cadeiras do mesmo modo e com a mesma classe de um rei, parecia ter vivido em meio à Inglaterra absolutista. Seu rosto possuía traços finos, típicos da aristocracia européia, parecia mais jovem do que os quarenta anos que dizia ter e sua feição era decididamente simpática, embora muito agradável para que fosse verdadeira. Seu cabelo, preto, muito escuro, estava penteado para trás e preso em um rabo de cavalo, estava completamente alinhado, como que, por medo, nenhum fio ousasse sair de seu lugar. Sua barba em cavanhaque estava perfeitamente modelada, fio nenhum pelo parecia ter escapado da jeitosa barbeação que o nobre, provavelmente, requisitara um babeiro com preço inacessível para a maioria dos moradores de Santa Felícia.

 

Sua pele era alva. Pálida para ser justo, mas não de uma brancura totalmente feia ou mórbida, mas sim algo que reservava certa beleza e combinava tão bem naquele rosto e modos de aristocrata, combinação que poderia levar alguns pintores a terem uma verdadeira inspiração para um quadro, o que, porém, não era o caso de Michael. Mas nada disso era o que mais impressionava em sua aparência.

 

Seus olhos eram o foco, para aonde todas as atenções se voltavam. A cor  era de um simples castanho claro, com o semblante imponente de um nobre arrogante, embora não parecesse se importar com a óbvia diferença de status entre ele mesmo e o pintor, coisa bem evidenciada nas vestimentas. O barão tinha classe o suficiente para nem notar o quão desmazelado Torem estava na ocasião, os guardas e o mordomo? Estes sim fizeram vista grossa, embora não tivessem o direito de reclamar...

 

Mas Claudius repararia? Não... Não ele. O Colecionador sequer repararia nas roupas de um convidado, sabia que era melhor do que isso... Mas, cor, aspecto, emoções e sentimentos... Nada disso era o que realmente importava em seus olhos.

 

O fato era que seu olhar parecia atravessar as coisas, objetos, pessoas, almas... Olhava como se tudo e todos compreendesse e, ao mesmo tempo, como um predador se divertindo ao ver sua presa a se debater inutilmente. E era justamente esse aspecto de caçador que, sem este saber, hipnotizava Michael, não como algo perigoso, no momento, mas simplesmente como uma coisa superior, incompreensível.

 

                          - Creio que conheça a minha pessoa, senhor Toren.

 

                  As palavras do barão despertaram Michael de seu transe hipnótico e este, por um segundo, pareceu não recordar nem mesmo aonde se encontrava. Porém, logo lembrou-se de tudo e seu cérebro foi capaz de processar a pergunta feita pelo seu anfitrião

 

                  - Hã?! – Ainda estava um pouco aéreo – Ah... Claro, claro que sei quem você é. Claudius Du Coudray, notório colecionador de obras de arte, dizem que possuí mais obras que o Santa Felícia Museum of Art, também é conhecido por ser responsável pela fama de muitos artistas contemporâneos. – proferiu sua última frase com uma discreta ênfase, certamente querendo sugerir algo e tomar as rédeas da conversa. Não queria perder tempo, levaria o nobre a um assunto de seu próprio interesse.

 

                    O colecionador distendeu os lábios em um pequeno e tímido sorriso; parecia não querer que o gesto fosse notado, mas ficara feliz com algum motivo que não os elogios interesseiros. Aparentemente tudo corria conforme ele planejava. Mas o que tramava ainda era algo obscuro, fora de especulações e, naquela sala, pedidos de socorro poderiam não ser ouvidos ou atendidos.

 

                      - Sim – começou a dizer – modéstia à parte, mas, hoje em dia, sou alguém de certo destaque, para não dizer importante, no meio artístico. Principalmente aqui, no estado da Califórnia. – fez uma pausa na qual ficou a encarar Michael, apoiava os cotovelos na mesa e o rosto estava em meio às suas mãos. Escondia um sorriso. – Bem, sou realmente uma pessoa bastante influente. Poderia facilmente, por exemplo, tirar alguém do anonimato total e elevá-lo a um artista amplamente conhecido... E admirado.

 

               - Sua influencia no mundo das artes está mais que comprovada. Entretanto, se me permite uma breve fuga no assunto, senhor. – fez uma pausa na qual procurou medir as melhores palavras para seu intento – Não está claro para mim o motivo pelo qual fui convidado. Creio que não são todos que tem o prazer de uma visita à sua casa. – Tentava falar da mesma maneira que o ricaço, não pretendia deixar se levar pela fala coloquial. – Mas, realmente acho que nada que eu fiz justifica a minha estada nesse majestoso local – Preferiu fazer-se de desentendido, achava que só poderia ter sido chamado pela sua habilidade com quadros, ele queria agora ter uma satisfação a mais, sendo bajulado pelo Colecionador.


                         - Ora ora! – Respondeu Claudius sorrindo e indo em direção ao frigobar – Não sejamos tão apressados! Veja só, eu nem mesmo ofereci-lhe uma bebida, talvez tenha esquecido meus modos em algum canto de minha residência... Quão rude de minha parte!

 

                       Em instantes uma garrafa de Château Petrus, safra de 1982, pousava levemente na mesa, juntamente com duas taças de cristal. Claudius prontamente as encheu com o líquido rubro que valera dez mil dólares, depositou uma delas à frente de Michael e, com uma mesura, fez sinal para que bebesse. A classe daquele homem, simplesmente ao encher copos, faria qualquer um se sentir bruto e descivilizado à sua presença.

 

                    O pintor pegara a taça e fizera menção de beber, ficara, todavia, um tanto quanto receoso, afinal, mesmo em forma de vinho, era muito o dinheiro que era contido naquele cálice cristalino, dinheiro, este, que só conseguiria apenas em muitos anos de trabalho. Por fim, bebericou um pouco do conteúdo, enquanto era observado pelo Colecionador, que não bebia em seu próprio copo, apenas olhava o convidado com certo interesse.


                       - Sabe o que eu mais gosto em vinhos, Senhor Toren? – A pergunta era retórica, não esperou por resposta alguma - A cor. Acho esse vermelho sangue majestoso, de encher os olhos... Sabe Deus o porquê – Deu um sorriso sinistro. Havia sido literal.


...


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