Leis da Noite - Mente sobre Materia escrita por Ryuuzaki


Capítulo 4
O Colecionador - Parte 3




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... O artista se viu só. Estava em uma sala, perfeitamente quadrada, não muito grande, parecia ser usada, comumente, em reuniões de negócios, conversas reservadas ou pequenas confraternizações, não apresentava janelas e as paredes pareciam ser forradas e reforçadas, tornando assim um lugar ótimo para negócios escusos. O local estava um tanto quanto que apertado, não exibia nem um décimo das dimensões de sua antecessora e, embora passasse ao convidado uma sensação estranha, ruim, ostentava o mesmo nível de riqueza: Um frigobar com porta transparente mostrava, como em uma vitrine de loja, vinhos portugueses da mais cara safra. Estátuas gregas autênticas, faziam vez de guardiãs, defendendo o encontro das paredes, uma belíssima, e deveras cara, tapeçaria persa descansava sobre o centro do recinto e apoiava a mesinha de carvalho envernizado e as cadeiras de estofado francês, quadros dos mais variados tipos enfeitavam as paredes e, para completar a majestade do lugar, na parede à esquerda a qual Michael entrara, uma porta adornada com entalhes em sua extensão e pintada à ouro, ou, quem sabe, até mesmo feita de ouro maciço. Decerto não sairia tão caro à alguém com uma conta bancaria do tamanho da de Claudius e provavelmente seria o lugar por onde ele entraria, mas Michael não se ateu para essa hipótese, não lembrava nem mesmo do desconforto que a sala lhe passava, bem como o frio que sentira dentro da casa. Ele estava inebriado com tamanho luxo, chegando até mesmo a se arrepender de seu estilo de vida, de sua renda, e, principalmente, das roupas que usava no momento e sua aparência. O Jeans rasgado e sujo de tinta em vários pontos, a camisa preta, sem estampa, desbotada que usava e o Allstar semi-destruído. Certamente aquela não era a combinação mais apropriada para aquela situação, bem como o cabelo loiro mal cortado e despenteado, que escorria por sobre suas orelhas. Porém, ele era fiel ao caminho o qual escolhera e o tal arrependimento logo passou ao lembrar-se de que um gênio da arte, a imagem que tinha de si mesmo, não deveria se deixar seduzir com coisas supérfluas como dinheiro. Seria o mesmo que vender a própria alma e não obter retorno. Como seu anfitrião demorava a adentrar no recinto, o rapaz ficou à esperar. Aos poucos percebeu que, apesar de toda aquela opulência e luxo, aquela sala era sombria, passava uma impressão ruim, desconfortável, mas, ele não podia ir embora. Havia muito em jogo. Estava agoniado, certamente aquele lugar não era bom, então, para não ficar somente à esperar, ficou tempo, livre e sozinho, a analisar as peças artísticas que decoravam a sala, tanto por curiosidade quanto para tentar diminuir o desconforto que sentia, em especial os quadros que ali se encontravam. Apurou os ouvidos para que, caso alguém chegasse, não fosse pego olhando os objetos ao seu redor e ser tido como bisbilhoteiro, o que, certamente, causaria uma má impressão, portanto, caso ouvisse passos advindos do corredor, estaria pronto para sentar em uma das cadeiras desejando passar a impressão que estivera lá por todo o tempo. Começou olhando uma réplica perfeita de O Grito, perfeita num sentido totalmente literal, simplesmente não havia imperfeições em relações ao original, passou por obras originais de alguns artistas pouco conhecidos, que foram praticamente ignoradas pelo pretensioso auto-proclamado gênio, até que chegou à Mona Lisa, que se encontrava logo ao lado da porta dourada, o que tirava um pouco da atenção que aquele quadro famoso sempre possuía, e começou a observar a obra. Olhava desinteressadamente, pensava no porque de tantas pessoas aclamarem uma obra simplória como aquela, decerto por que não haviam visto seus quadros, deixou esses pensamentos num canto escuro de sua mente, afinal, tinha a convicção de que, no futuro, seria idolatrado e então aquela mulherzinha andrógena de sorriso besta logo sumiria da mente das pessoas. Aquela era a mais perfeita réplica que havia visto. Não que gostasse da obra, mas, estava idêntica a original. Toda a composição, a mistura da tinta, das cores, que só o verdadeiro autor poderia reproduzir. Ele ficou um pouco preocupado, se alguém conseguia imitar com tamanha elegância e precisão, poderia ser considerado com técnica superior à dele, e esse pensamento definitivamente não o agradou. Porém, dada a perfeição era espantoso acreditar que se tratava de uma cópia, se sentiu um tanto quanto ridículo por pensar isso, mas, aos poucos uma idéia se consolidou em sua cabeça: Só pode ser a or... - Sim. É a autêntica Mona Lisa, original. Michael, assustado, girou sobre os calcanhares em direção à voz, tão semelhante a uma melodia bem composta, e deu de cara com um homem, provavelmente o dono daquelas riquezas, que estava bem ao seu lado, como se sempre estivesse ali. O pintor estava sobressaltado, não havia ouvido nenhum ruído, nem um único estalar do assoalho que intensificava o som dos passos e denunciaria o andar de qualquer um. Mas não, ali estava ele, chegara feito um fantasma e ainda por cima afirmava ser aquela a invenção feita pelo próprio Da Vinci. Estava aturdido tanto pela aparição repentina quanto pela revelação espantosa. Então o que estaria no Louvre? - Você realmente acredita que em 1913 o zelador chamado Vicenzo Peruggia devolveu o quadro verdadeiro? Não, ele cumpriu o que desejava e conseguiu retirar a Mona Lisa do território Francês. Como veio parar em minhas mãos é outra historia, mas decerto não menos mirabolante... - Acho que, agora, já esta imaginando que “O Grito” também é o verdadeiro. Quem sabe aqueles ladrões fortemente armados que o roubaram em 2004 não estavam sob minhas ordens? – Piscou de um jeito travesso, mas Michael teve absoluta certeza de que este falava a verdade – De qualquer modo, senhor Toren, gostaria de sentar-se? – pausa – Creio que temos muito o que parlamentar, mas, obrigado por apreciar, mesmo não gostando do quadro, estas humildes peças de minha coleção. O artista, meio hipnotizado pela aquela situação surreal, foi em direção à mesa e se acomodou, não conseguia dizer uma palavra sequer e nem sabia o porquê de estar praticamente aterrorizado, como que algo perigoso estivesse por perto. Como que aquela voz melodiosa do anfitrião fosse algo belo apenas para atrair as presas, como a planta carnívora que exala um bom odor. Mesmo alarmado afastou aqueles pensamentos infantis, havia sido surpreendido, só isso, tentava se convencer, mas, realmente, tanto o lugar quanto o anfitrião, tinham algo podre, apenas não sabia o que, mas que tinham, tinham. Precisava, no entanto, estar concentrado e lúcido. Afinal, era a chance da sua vida. Estava à mesa com Claudius Du Coudray, o colecionador. ...

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