Nameless escrita por Guardian


Capítulo 14
Eu não quero sentir


Notas iniciais do capítulo

Lá lá lá, menos de uma semana ~



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Foram apenas durante alguns instantes que aquela situação se manteve, poucos instantes até que um deles finalmente tomasse consciência do que tinha acabado de acontecer ali. Do que ainda estava acontecendo, na verdade.

 Não houve certeza de quem "despertou" primeiro, apenas que quando o fizeram, ambos estavam tão surpresos, chocados, perplexos, confusos, e quantos mais outros adjetivos dessa classe de palavras existam por aí, que nenhuma palavra foi dita.

 Depois de piscar várias vezes, como se para acordar de fato, Mail caminhou vagarosamente para o sofá e ali sentou pegando algum livro qualquer que sua mão conseguiu alcançar e o abrindo para fingir que lia. Estava de ponta cabeça. 

 Mello lançou um olhar ainda confuso ao redor, como se certificando se continuava no mesmo lugar de minutos antes, e começou a tatear os bolsos com as mãos teimosamente trêmulas até encontrar suas chaves, saindo do apartamento sem sequer lembrar de bater a porta no processo.

 Aquilo era inédito. Estranho. Confuso. Intrigante. Bizarramente... Magnético.

 E eles não tinham ideia de como agir.

                                  **************

 Quando Mello voltou ao apartamento, várias horas depois do ocorrido, não conseguiu evitar um baixíssimo suspiro de alívio de deixar seus lábios ao avistar a cabeleira ruiva bagunçada nas almofadas do sofá. Ótimo, Mail estava dormindo. Isso pouparia o estágio "enfrentar" por mais algumas horas.

 Contrariando todo o seu modo de ser de quando não se vê envolvido em algum trabalho, Mello andou silenciosamente até seu quarto e chegando lá, jogou-se na cama de qualquer jeito já de olhos fechados. Mas infelizmente, podia fechar os olhos para o mundo ao seu redor, mas não para sua própria mente e pensamentos. E todos eles acabavam o levando de volta para aqueles poucos instantes em que...

 O que deveria fazer? Refletir a respeito e encarar de vez todas as sensações e pensamentos irreconhecíveis para ele? Conversar? Livrar-se do "outro elemento"? Ignorar como se nada tivesse acontecido?

 Mello era o tipo de pessoa que tinha como filosofia de vida encarar o que quer que aparecesse à frente, sem medo ou receio, mas também era do tipo que não tinha o costume de olhar para dentro de si mesmo e que não fazia nenhum esforço para mudar isso.

 Conversar francamente também não era um dos seus maiores costumes ou habilidades. E ele não tinha deixado aquele ruivo em seu apartamento, correndo um risco que ele sequer sabia o porquê corria, durante semanas, para agora se livrar de um corpo. Não, aliás, essa era a alternativa que menos o atraía.

 Ignorar então? Era a única opção restante, não deveria ser difícil, certo? Agir como se a última ação digna de ser lembrada durante a madrugada tivesse sido bater a porta da casa de Klaus ao sair e...

 Klaus...

 Depois do que aconteceu acabou até mesmo se esquecendo das perguntas sem respostas que o haviam levado a tudo aquilo! Como pôde esquecer?! Tinha que descobrir quem aquela mulher era, o por quê dela saber seu sobrenome, tinha que...

 ...

 Céus, estava exausto... Há quantas horas não dormia...? Provavelmente desde a manhã do dia baile de máscaras, onde já não havia dormido muito na noite anterior por causa daquela maldita prova. Talvez devesse imitar Mail e...

 E antes que pudesse completar o pensamento sobre "deveria dormir um pouco", ele já havia adormecido do jeito que estava, esparramado na cama sem ao menos tirar as botas.

 Acontece que na verdade, embora não soubesse, o loiro era o único naquele apartamento entregue aos braços de Morfeu*. Tão logo concluiu que estava tudo silencioso demais e, portanto, zona segura, Mail abriu os próprios olhos e ergueu-se devagar do sofá. Fingir que dormia foi a melhor ideia que teve quando ouviu as chaves de Mello na porta.

 - Mas que merda... - soltou baixo e começou a esfregar o peito com os dedos, como se assim tentasse aplacar alguma dor ali presente. E era exatamente o que sentia no momento. Dor. Uma sensação sufocante que achava que já houvesse enterrado anos antes, junto com... 

 "Como você é idiota! Se for para fugir, você não pode deixar ninguém olhar para você por muito tempo, nem mesmo as pessoas nas ruas, senão elas podem lembrar do seu rosto e contar pra quem não deviam" o garoto disse com a voz rouca e aproximou-se do ruivo saindo das sombras do quarto, e com um sorriso de zombaria completou "Além do mais, esses seus cabelos chamam muita atenção"

 Mail levou instintivamente uma das mãos aos fios ruivos, ao ter aquelas palavras, pela primeira vez em muito tempo voltando a ecoar em sua mente. E não conseguindo mais ficar parado naquele ambiente completamente fechado, andou vagarosamente até a pequena varanda para a qual a sala dava acesso, agradecendo mentalmente pela porta de correr não fazer nenhum barulho ao ser puxada. A manhã estava nublada, e pelo vento que batia agora bem-vindo em seu rosto, provavelmente haveria chuva mais tarde.

 Voltou a esfregar o peito, com menos força desta vez.

 Havia uma cicatriz ali. Uma cicatriz antiga e a qual ele sempre evitava olhar, para evitar exatamente o que estava acontecendo agora. As lembranças machucavam e faziam aquela região doer a despeito de aquela ser apenas a marca da ferida que ganhou quando... Estava curado há muito tempo, mas lembrar dos eventos que o levaram a ganhar tal marca fazia parecer como se ela tivesse acabado de ter sido feita.

 Por quê? Tanto esforço, durante tanto tempo, até finalmente conseguir a indiferença para encarar qualquer coisa, até conseguir parar de sentir, por que Mello tinha que pôr todo esse trabalho a perder agora? Como ele tinha conseguido fazer isso em apenas alguns instantes? Por que Mail agora não conseguia abafar tudo dentro de si, por que parecia agora tão difícil, como se fosse a primeira vez que tentava?

"Eu sinto muito, Mail. Mas eu... Eu quero ser livre, e... E eles me prometeram. Eu sinto muito"  foram as únicas palavras que ouviu antes do outro lhe virar as costas, como se o ruivo não fosse digno sequer de receber um último olhar. Talvez não fosse mesmo.

 - Einarr...

 Mail voltou surpreso à realidade ao seu redor, ao perceber-se dizendo aquele nome. Aquele nome... O que Mello havia feito com ele para agora ser assombrado pelas cenas do seu passado? O que ele havia feito para ter que se lembrar delas? Havia se fechado, não havia? Não só para qualquer um que se aproximasse, mas também para si mesmo; não era o que bastava? Não deveria ser o suficiente? Não estava preocupado exatamente com o beijo que por algum motivo o loiro acabou iniciando. Estava apreensivo com o que Mello faria quando se desse conta do erro absurdo que cometera. Talvez ele... Ele também...

 Duas batidas fortes na porta fizeram o ruivo estacar no lugar. O apartamento não possuía campainha porque Mello achava o som irritante demais, e não eram nem oito horas da manhã de um domingo, um pouco cedo demais para uma visita social. "Talvez uma visita de 'trabalho'" Mail pensou, fechando cuidadosamente a porta da varanda atrás de si. 

 Mais batidas.

 Sabia que tinha de se esconder, fosse quem fosse ali, mas antes que tivesse a chance de alcançar a lavanderia - único "esconderijo" possível além do quarto do próprio Mello - e se trancar lá, ouviu um suspiro vindo detrás da porta de entrada, seguido por um aviso que não parecia ser de brincadeira.

 "Se você não abrir, eu posso muito bem arrombar. Você quem sabe".


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Notas finais do capítulo

*Morfeu na verdade é relacionado aos sonhos, mas como é mais conhecido do que Hipnos (Deus do Sono), dá uma impressão maior ~
*Comentário random on:* AH, COMO EU ODEIO QUANDO UMA SÉRIE É BOA! >////< Episódio duplo mais tenso até agora, acontece um monte de coisas que te fazem xingar de tão presa nelas que você fica, depois da cena mais fofa de pedido de casamento com o casal mais fofo, o cara morre algumas horas depois do seu transplante de coração! E ainda colocam a morte de um cachorro pra completar! *Comentário random off*