Meio-sangue escrita por gsiqc


Capítulo 6
A canção do meio-dia


Notas iniciais do capítulo

Bastante ação, porque não vai ser moleza chegar ao acampamento, não kkkkkkk



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Summer dormiu. As coisas iam bem, e finalmente conseguiu deixar a mente vagar enquanto encostava a cabeça no ombro de Elliot, o Sátiro Nível 2. E finalmente um sono neutro, sem nenhum sonho estranho para pertubá-la.

Enquanto isso o garoto mastigava distraidamente um pedaço solto de sua pulseira de latão. A paisagem estava ótima, inebriante em seus tons de verde selvagem e vultos escuros por entre as árvores. Mas enquanto sentia suas pálpebras caírem no silêncio do carro, um ruído estranho chamou sua atenção. Não era um ruído qualquer, era como o som de um pássaro híbrido rasgando o ar. Um piado incessante, contínuo. E as árvores se agitavam lá fora, as folhas indo de um lado para o outro como se curvassem para algo.

Antes que pudesse dar-se conta do que estava acontecendo, o som foi ficando mais alto, ensurdecedor. Elliot então despertou para o piado agudo e cortante de uma águia, as pernas tremendo. Summer, tonta de sono, acordou após um breve chute desnecessário e apavorado do garoto, tornando a não entender nada do que acontecia. De repente, duas enormes e afiadas garras rasgaram o teto do táxi como se fossem seda e o arrancaram em pleno movimento.
– AAAAAAAAAAAAAH!
– Por Pã! O que é isso?! - Gritou Elliot, assustado. Mais a frente, um homem velho e de olhos apertados entrou em pânico, gritando sem parar com os dedos cravados no volante.

O enorme bicho então piou mais uma vez, os olhos negros como carvão fixos nos dois adolescentes no banco de trás. O motorista percebendo não haver mais nenhum carro na pista, girou o volante com rispidez e parou o táxi no meio da estrada, largando o carro à sorte. Depois correu floresta a dentro, gritando psicoticamente e enlouquecido.

Elliot arrastou a garota para fora do carro o mais rápido que conseguiu, mas o animal barrou sua passagem, parando frente a frente com eles.
Summer olhou para cima, contendo um grande pavor dentro de si. O animal havia baixado as asas e suas patas traseiras se dobraram, indicando que ninguém iria sair dali.

O bicho possuía uma enorme cabeça de águia, patas munidas de afiadíssimas garras e asas cobertas de penas. O resto do corpo tinha a forma de um leão, e se estendia em pêlos curtos e brilhantes.
– Eu vou desmaiar, isso é demais para mim. - Resmungou Summer, a voz quase um fiapo. O garoto olhou-a como se dissesse: "Não ouse me deixar sozinho".
Com um movimento da pata dianteira, o animal jogou os destroços do capô do carro longe. Depois sentou-se no asfalto, observando-os.
– I-isso... é um Grifo. - respondeu o garoto, mais branco do que nunca. - Estamos mortos.

O Grifo, ao vê-lo paralisado, deu um enorme piado. Tão alto e agudo que mais parecia um rugido. E então atacou, pulando em cima do carro, amaçando-o, e dando um golpe com a pata no resto do táxi e o fazendo rolar pela estrada para mostrar do que era capaz. Summer e Elliot não precisaram esperar para ver o que iria acontecer, saíram correndo pela trilha da floresta, adentrando a mata o mais rápido que puderam, aproveitando-se da brecha.

Mas o Grifo brandiu suas asas enormes e sobrevoou a floresta, alcançando-os com incrível facilidade. Abriu uma clareia entre as árvores, fazendo-os parar a corrida e derrubando troncos e folhas para todo lado. O animal avançou em direção a eles, os olhos faiscando num brilho intenso. Piou mais uma vez, mostrando quem é que mandava de modo majestoso.
– Faça alguma coisa! - Gritou Elliot, despedaçando sua pulseira "Sátiro Nível 2" com os dentes, as pernas mal sustentando-o em pé.
– Faça você, seu estúpido! - retrucou ela de repente, indignada. - Você que me trouxe, devia me proteger!
O Grifo então ficou confuso. Seus olhos percorreram Summer e depois Elliot. Estava carregado de extrema excitação, e ao ver o garoto soltar um balido grotesco de animal e tremer convulsivamente, saltou sobre ele. As patas bateram no chão, levantando terra e folhas para todo lado, e seus olhos ficaram a centímetros do de Elliot.
– Bééé! - Gemeu o garoto embaixo do Grifo, coberto de terra e folhas.

Summer ficou paralisada. Aquele havia sido um balido de bode ou era impressão sua? Lembrou-se então de seu sonho, e do bode montanhês sob os campos de morango. Lembrou-se da noite anterior, quando havia levado um puxão de cabelo e uns tapas de Driel por ter interrompido seu sono. E então para fazê-la ficar quieta começou a cantar. Não sabia muito bem porque mais quando cantava aquela música, as pessoas inevitavelmente dormiam. Ou sua voz era muito ruim, ou havia alguma coisa naquelas palavras. Era loucura, mas precisava salvar Elliot. - Soocoooorro! Pelos Deuses, Summer, me ajude!

Summer sentiu a cabeça doer, e lembrou-se da mulher-cobra também. Sua cabeça estava a mil, um misto de sensações e lembranças tomando sua consciência por completo. Apertou o braço dolorido, vendo o Grifo acertar o rosto de Elliot com a pata outra vez. Estava cansada, ferida e cheia de perguntas para fazer. Começou a cantar, o mais alto que pôde, o corpo tremendo em pânico.


"No céu azul, flores nascentes
Sob o ardor de nosso sol quente
Flutuam no ar da poesia
Morrem sozinhas, mas sem agonia
Montes e lagos numa canção
Verdade e passado em seu coração
Apertado
Novo e febril.

Vindo da terra todo o vapor
Do cristal transparente um novo amor
Divina essência em futuro nos dá
A ponte para outro jardim adorar."


Summer abriu os olhos com cautela, temendo o que iria ver a seguir e sentindo o silêncio preenchê-la. Elliot estava no chão, o rosto sangrando e o peito arfando de medo. Ao seu lado, o animal mantinha os olhos observadores na garota, esquecendo-se momentaneamente de Elliot. Mas não havia dormido, nem sequer piscava as pálpebras. Não havia dado certo. Summer devia ter imaginado.
– Elliot... - Disse, limpando o suor da testa coberta de terra. Olhou suplicante para ele e depois para o Grifo, que ainda a observava com os olhos ameaçadores. - Me desculpe.

Mas de repente, aconteceu uma coisa absurdamente estranha. O Grifo em vez de atacá-la, pos-se de pé e curvou a enorme cabeça de águia na direção de Summer. Olhou para ela e um ruído baixo saiu de sua boca, mas dessa vez não era ameaçador e cruel, era como se estivesse convidando-a a se aproximar.

No interminável instante em que ela ficou olhando para sua penugem, ocorreu-lhe que não sabia onde havia aprendido aquela música. E ali, diante do fantástico animal, percebeu que ele reconhecia-a. Ajoelhou-se então, e começou a chorar. Chorou como criança, e resolveu não se importar com o fato de que Elliot estivesse vendo. Havia aguentado tempo demais. E aquilo significava alguma coisa, ele reconhecia sua canção. De repente Summer não se sentia mais tão sozinha.

O Grifo se aproximou, sentou ao seu lado na grama e piou baixinho, descansando a enorme cabeça sobre as patas. Summer olhou para ele e encostou-se em seu ombro, abraçando-se debilmente no animal.

Elliot pensou em correr, mas ao ver tal cena achou melhor ficar ali mesmo, quieto. Sentou-se apoiado numa árvore e observou os dois em silêncio. Talvez fosse mesmo um péssimo sátiro, mas pelo menos sabia que agora estava tudo bem.


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