Cheguei um pouco para trás e estendi a mão, fazendo sinal para que Zeus pudesse entrar. Ele entrou de cara fechada, olhou para o teto e para os móveis, como se estivesse avaliando a casa. Fiquei meio nervoso, primeiro porque eu não o via fazia anos, e também não sabia como ele me reconhecia. Bom, eu só o reconheci porque ele estava à mesma cara, só que com algumas rugas à mais de preocupação ou nervosismo.

- Então… faz muito tempo que eu não vejo você, tio - falei, tentando puxar conversa.

- Tempo… - ele murmurou - Faz muito tempo que não vejo você, nem os seus outros tios, primos e seu pai. Por falar em Poseidon - ele se virou para mim -, ele não está aqui, está?

- Sinto muito, mas não. - falei. Ele pareceu decepcionado, mas não impressionado - Se quiser se sentar…

- Não tem problema, eu falo com você mesmo… - ele falou, se sentando - Bom, Percy, eu sempre soube que de alguma forma ou outra eu iria falar com você sobre algo que realmente é importante…

Eita.

- O que isso significa? - perguntei, franzindo meu cenho.

- Bom… acho que você sempre soube que eu e meus irmãos brigaríamos pelos negócios de família… E seu avô, Cronos, repartiu a herança. E nos fez prometer que iríamos passar de geração em geração, ou seja, de seu pai para você, de mim para meus filhos… - ele disse, coçando a barba - A questão é, as coisas saíram do controle nesses últimos meses, estamos ultrapassando os nossos limites combinados. Eu me certifiquei de… pagar as contas de água. Mas acontece que o dinheiro não foi depositado, e eu também não fui o culpado por aquela explosão na loja de seu pai, e os serviços de Hades também estão sendo interferidos. Alguém está por trás disso, e creio que seja você, ou os filhos do seu tio Hades, por ordem dos próprios pais… Ou até mesmo os meus.

E lá estava eu de queixo caído e totalmente pasmo. Como essa ideia maluca podia ter brotado na cabeça do meu tio?

- Espera… - Eu pedi voltando a raciocinar aos poucos - Você acha que somos nós? Porque, diabos, faríamos isso? E só tem uma semana que eu cheguei nessa cidade!

- É isso que estou tentando descobrir. Não só uns contra os outros, mas também, contra boa parte da cidade e de outras empresas. É como se alguém quisesse mais poder que os outros, entende? E não somos só nós, são outras empresas também, como as de Hefesto, filho da minha mulher, Hera. Às vezes penso que vocês querem apenas fugir de mais uma briga… Ou se vingarem pela separação da família nem tão feliz assim. E seu pai não falou nada disso com você? - ele perguntou por fim. Fiz que não com a cabeça, confuso - Pra variar…

- Olha, tio Zeus, eu realmente entendo a preocupação de vocês e tudo mais, mas acontece que eu cheguei recentemente e…

- Escute, Perseu - ele disse, se levantando e eu me levantei também - Eu não estou de acusando de nada… ainda. Mas, se eu descobrir quem foi, eu juro que as consequências serão ruins, e os primeiros suspeitos são você e seus primos… É como uma lei de família que tem de ser cumprida. Bom, eu tenho que ir agora. Diga ao seu pai que eu passei por aqui.

- Claro - falei, e me dirigi até a porta, querendo que ele fosse embora logo - Até mais.

- Ah, e só mais uma coisa… Se eu souber que você vem atropelando Thalia ou coisa do tipo, você vai morrer - ele falou, e saiu. Fechei a porta e fiquei ali, parado, pensando em quem poderia fazer isso. Sinceramente, eu não via motivos pra alguém fazer isso, ainda mais alguém da família.

- Ahn, Percy, é impressão minha ou tinha alguém aqui? - perguntou Luke, descendo as escadas.

- É impressão sua - respondi - Não tinha ninguém.

(…)

Desde aquela conversa com meu tio Zeus, eu havia ficado meio tenso. Eu ficava quieto demais, não falava tanto com o meu pai - já que ele não havia me falado sobre isso. Cara, eu podia dar uma força, não? Bom, de qualquer forma, eu estava atrasado para meu… hm… Encontro com Annabeth. Já eram quase oito horas, e a viagem até o shopping levava uns dez ou vinte minutos. 

Fiquei de me encontrar com Annabeth (que pegaria carona com Thalia, que queria ir não sei aonde) na porta do shopping, então tinha que ser rápido. Calcei meu all star e tentei correr, antes que Luke zombasse de mim ou reclamasse da vida dele, o que não foi fácil. Enfim, peguei as chaves do carro e saí. Não peguei muito trânsito para uma noite de sábado, mas ainda sim demorei um pouco.

Depois de estacionar, subi as escadas e fui até o boliche. Confesso que fiquei meio perdido, fazia anos que eu não ia pra lá. Fiquei ali na porta dando bobeira até ouvir a voz de Annabeth.

- Caramba, me desculpe por ter atrasado - ela disse, se aproximando - Thalia ficou enrolando por horas e depois ficou enchendo minha cabeça… - e continuou falando, só que eu não prestei atenção em nenhuma palavra que ela dizia. Ah claro, o porquê disso é que Annabeth não era Annabeth. Ela era um… anjo.

- Você está linda - soltei de repente a interrompendo. Ela se calou e me olhou. Suas bochechas coraram levemente e Annabeth sorriu. Ela estava usando um jeans claro com regata branca com estampas de textura e um all star branco. Seu cabelo estava trançado de lado e tinha alguns fios soltos. Maquiagem? Bem, você há de concordar que anjos são naturalmente perfeitos, não precisam de maquiagem.

- Bom, acho melhor a gente entrar antes que as pistas lotem - ela falou, e eu concordei. Quando entrei lá, fiquei meio confuso. O lugar tinha mudado muito. Havia luzes com cores fortes em todo canto, vários painéis com fotos e paredes com assinaturas de quem havia passado ali, cadeiras e mesas coloridas, além da música eletrônica que agitava o lugar. As pessoas comemoravam quando venciam e faziam suas apostas. Troquei um olhar curioso com Annabeth, que deu uma espiada no local. Não demorou muito até que dois garotos, quase que idênticos apareceram na nossa frente.

- Yo! - disse um deles.

- Yo yo! Eu disse isso duas vezes, algum problema nisso? - disse o outro. Eu os conhecia de algum lugar, de onde eu não sei.

- Você é um idiota, Connor.

- Eu tinha que ser seu irmão mesmo, Travis - respondeu, o que parecia ser Connor. Annabeth me olhou nervosa, rindo um pouco.

- Bom, eu sou Travis Stoll e esse é meu estúpido irmão, Connor - disse ele - Nós somos os novos proprietários desse lugar… Já vieram aqui antes?

- Hmm, faz um bom tempo que eu já não venho aqui - falei.

- Ah, então com certeza reparou que algumas coisas mudaram. - Disse Connor.

- Algumas? - Bom, acho que não vão precisar de tênis especiais essa noite. Vamos encontrar uma pista pra vocês.

E então, ele saiu na nossa frente enquanto Travis falava no sistema de pagamento, que era pago por hora e tudo mais. Conseguimos uma pista no fundo do lugar, uma das últimas. Os dois desejaram boa sorte e disseram que Annabeth venceria, e ela pareceu gostar daquilo.

- Eu vou primeiro, afinal, tenho que te ensinar a jogar - falei, e ela cruzou os braços na frente do corpo, rindo. Peguei uma bola, posicionei-me e arremessei na pista. Strike! Virei-me e olhei pra Annabeth, que olhava para o teto rindo.

- Ok, entendi. Minha vez, Cabeça de Alga - ela disse. 

- Boa sorte - falei, 

- Acho que perdi o jeito - Annabeth disse, equilibrando a bola com as duas mãos.

- Tente jogar - falei, me encostando na parede. Ela deu um impulso e lançou a bola, que foi parar no canto sem acertar nenhum pino e eu ri. Tinha que admitir, eu era ótimo no jogo, e eu me sentia o máximo.

- É, acho que eu não sei jogar mais isso - disse Annabeth, me olhando.

- Sem problemas, eu te ajudo - falei, chegando mais perto.

- Ótimo - murmurou ela.

- Você tem que relaxar - falei, pegando uma bola e colocando os dedos dela no lugar - E então, só jogue a força na hora de lançá-la.

E dizendo isso, eu coloquei a minha mão atrás da bola. Eu e Annabeth estávamos praticamente colados, mas nenhum de nós recuou ou coisa assim. Não que eu ou ela estivesse concentrado nisso. Pelo menos não totalmente. Contei até três, e demos um impulso juntos. A bola rolou pela pista, acertando em cheio os pinos. Annabeth se virou rindo, e me deu um abraço.

- Consegui! - ela disse, se afastando e eu a encarei - Ok, nós conseguimos.

- Melhor assim - eu disse, sorrindo. Ainda tínhamos uma longa noite pela frente.