Tormenta De Máquinas escrita por davifmayer
“Espera mil anos e verás que será precioso até o lixo deixado por uma civilização extinta.” Isaac Asimov
Melissandra, Antônio e Eddard contemplavam o hangar da cidadela de Éden. Era um espaço amplo revestido de concreto, onde lâmpadas florescentes pendiam do teto e iluminavam as máquinas de guerra alocadas ali dentro. Três fileiras de dez caças de guerra estavam estacionadas. A marca das aeronaves foi riscada, bem como a bandeira as quais pertenciam. Não importava mais a nacionalidade. Todos os sobreviventes estavam dispostos nessa guerra sobre uma mesma bandeira: a esperança, a paz e a sobrevivência.
Abraão ficou de frente aos três, pôs as mãos na cintura e rugiu como um soldado.
- Bem vindo à cidadela de Éden senhores. Uma das últimas cidades fortificadas para impedir o avanço do Usurpador. Estas naves estão aqui esperando o dia D. O dia em que nós romperemos a primeira linha de defesa do inimigo.
- Você fez um ótimo trabalho, Abraão. – falou Eddard alisando a carcaça de uma das aeronaves.
- O trabalho não foi apenas meu. Meus engenheiros ajudaram também. Os seus alunos, para ser mais exato.
O Solitário da Montanha rugiu em aprovação.
- Venham. Explicações depois. Devem estar famintos.
Desceram por um elevador manual de carga e chegaram num refeitório amplo, onde grupos de soldados comiam em longas mesas retangulares. Diversas etnias e culturas se misturavam e falavam em vozes altas. Mulheres e homens compartilhavam a mesma sorte e o mesmo teto. Quando o regente do conselho rebelde adentrou, todos ficaram em silêncio e curiosos com a chegada de visitantes. Era raro pessoas estranhas na cidadela.
Melissandra sentiu os olhos dos homens sobre si, e sentiu-se constrangida. Como deveria estar? Suja, com olheiras e magra até os ossos.
Um grupo de alta patente se levantou de imediato e foi até eles.
- Primeiro regente Abraão. – falou um deles. – recebemos noticias de seu filho. Ele chegará dentro de um dia. A missão foi um sucesso.
Uma ligeira tensão se abrandou nos ombros largos do regente.
- Ótimo.
- Seu filho continua na elite da aeronáutica, apesar de tão pouca idade? – disse um surpreso Eddard. – sabia que tinha talento e coragem... Mas não sabia que iria tão longe.
- Ele já participou de sete missões e nunca foi abatido pelas vespas. Já viu companheiros morrerem, outros tomarem seus lugares... Aquele garoto tem garra!
- Sim. Ele tem.
- O único que durou tanto tempo como membro dos Caçadores Noturnos foi a sua mãe, Ruth. - o riso do homem de pele escura perdeu um pouco o brilho. – mas não é hora de falar de tristezas. Vamos, sentem-se. Tragam outros pratos! – ordenou com um brado.
Pratos foram servidos de sopa. Os três viajantes comeram rapidamente e pediram por mais. Enquanto comiam, Eddard falou:
- Como estão os preparativos para o dia D?
- A cidadela do Urso já sabe do nosso plano. Um ano a mais de preparação e atacaremos. Nós pelo oceano pacífico e eles pelo Atlântico. Suas informações foram de grande valia, Eddard. Enquanto não destruirmos o sistema de radar do Usurpador será suicídio entrar com nossas aeronaves em seu território. Até mesmo com a Ghost-Hunter.
- Vocês conseguiram colocar aquela lata velha no ar?
- Lata velha? Deveria ver o que seus alunos foram capazes de fazer. 3.700 km por hora, mísseis de explosão, radar e de fuga. Visão noturna e piloto automático. Ele pode ficar no ar por dois meses e ainda continuar pronto para a batalha, senhor. Isso eu nunca vi igual. E ainda não disse tudo que ele é capaz de fazer. E graças a você velho solitário. Deveria ter ficado conosco.
- Não... – suspirou o velho cibernético. – não podia.
- Enfim. Lamento que não pôde ficar tanto tempo entre nós. E continua o mesmo, hein? Cheio de segredos. Então, que bons ventos o trazem aqui?
Eddard falou do ataque a cidade de Atlântika. Da morte do pai de Melissandra e dos mineradores, bem como a única alternativa deles de irem até a cidadela de Éden em busca de segurança e refúgio.
- Entendo. Mais uma cidade caída na mão dos monstros de metal. E em que posso aproveitar esses dois jovens? – apontou com a cabeça os dois que se fartavam em comer, mas continuavam com os ouvidos atentos a conversa.
- Quero Tony comigo na forjaria e Melissandra daria um ótimo soldado.
Melissandra engasgou com a sopa. Enxugou os lábios.
- O que... ? – ela parecia não acreditar.
- Hmmm... Vejamos do que ela será capaz. Um dos três membros dos Caçadores Noturnos morreu em combate, e precisa ser substituído urgentemente.
- Você não acha que é um pouco demais? – argumentou Eddard. – seria praticamente a sentença de morte para ela.
- Meu filho tem pouco mais que vinte anos... E outros já se entregaram de corpo e alma a esse grupo de elite. Não consigo ver diferença entre morrer nos céus agora e morrer nos céus depois. Morrerá fazendo aquilo em que ela acredita.
- Não concordo... – falou Eddard mexendo a colher na sopa.
- O que é o grupo Caçador Noturno? – perguntou Melissandra curiosa e com o sangue fervilhando de emoção.
Abraão sorriu.
- É a elite dos guerreiros do ar. Aqueles caças de guerra que você viu lá em cima não são nada comparados com as naves que os Caçadores Noturnos utilizam. Os Ghost-Hunter’s. Verdadeiros caçadores de vespas, a cortar os céus num piscar de olhos. Tão custoso e tão mortal o seu uso, que limitamos em apenas três naves. E três pilotos. A seleção do mais novo membro se dará em breve.
- Eu quero participar! – ela falou, segurando firmemente a colher entre os dedos.
- Sabe que não será uma vida fácil, não é Melissandra? – comentou Eddard.
- Não espero uma vida fácil enquanto houver um tirano sentado na cadeira de máquina.
- Gostei de ver garota. Os ases, como são chamados, tem vento nas veias. Se fortaleça e se prepare. Não será uma jornada curta. – aclamou o regente.
Melissandra o encarou com firmeza.
- Não espero isso senhor.
Acomodaram-se em quartos separados. Melissandra demorou para dormir, as novidades fervilhavam em sua mente. E quando as pálpebras ficaram pesadas, alguém bateu na sua porta. Ela praguejou baixinho e se sentou na cama a contra gosto.
- Quem é?
- Antônio.
Ela suspirou com os olhos enevoados de sono.
- Pode entrar.
Ele entrou. Cabelos em desalinho e roupa de dormir. Fechou a porta atrás de si e deixou a vela que trouxera em cima de uma mesa ao lado da cama dela. Sentou ao lado da garota e segurou em suas mãos. Antônio a encarou nos olhos.
- O que pensa em fazer ao se juntar a esse grupo? É suicídio. Ninguém dura nessa equipe. O lema deles é “Destruir as vespas ou morrer.” Se a missão não for concluída, não poderão voltar para a base para não mostrar ao inimigo nossa localização.
- Entendo sua preocupação, mas cansei de me esconder enquanto outros morrem por mim, pela liberdade...
- Esqueça isso. Existem outras formas de você ajudar os rebeldes e destruir o Usurpador.
- Não quero mais ficar longe da ação. Cansei de me esconder.
- Não diga isso. Você pode ficar comigo...
- Estamos no meio de uma guerra e você pensa em quê? – esbravejou ela empurrando-o da cama. – acha que é em romance que penso? Acha que é em filhos? Constituir uma família e viver felizes para sempre?
Ela o jogou contra a parede. Mudo de surpresa, Antônio apenas a encarava sem acreditar na mudança de temperamento na garota pela qual se apaixonara.
- Não estamos mais em Atlantika! Não estamos mais em proteção! Precisamos lutar até o último homem... Ou até a última mulher!
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