Tormenta De Máquinas escrita por davifmayer


Capítulo 3
Capítulo 3 - A Cidadela de Éden




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“Nunca deixe seu sentido moral impedi-lo de fazer o que está certo”. Isaac Asimov.

Três viajantes cavalgavam a meio galope sobre um planalto de terra cinza escura. Nada se via a quilômetros. Um vento úmido e salgado fazia suas capas esvoaçarem e o sol do meio dia castigava suas costas.

            Melissandra estava em silêncio, observando o chão passar por entre as patas da sua égua branca.

            Há dias percorriam o planalto, parando à noite para se alimentarem e dormir, e voltavam a cavalgar no dia seguinte. Os dois jovens estavam apáticos, observando o deserto se estender mais e mais. E quando subiam um aclive, se deparavam com mais um horizonte limpo de qualquer montanha ou vegetação.

            Antônio não estava feliz. Bronzeado pelo forte sol, ele encarava impaciente o velho a cavalgar a frente deles.

            Eddard vez ou outra olhava adiante, em seguida baixava a cabeça e entrava numa profunda meditação.

            Cavalgaram longamente naquele dia.

            Os dois jovens desceram dos cavalos ao por do sol, exaustos e com a parte interna da coxa dolorida. O vento uivava quando armaram uma tenda na direção do vento. Com muita dificuldade ascenderam uma fogueira trêmula.

            O Solitário da montanha deu uma longa cavalgada em derredor, procurando alguma ameaça. Nada encontrou e assim voltou, desmontando rapidamente do seu alazão escuro.

            Comeram sopa de algas em silêncio, enquanto se fechavam em seus pensamentos.

            - Que lugar é esse? – perguntou Antônio.

            - A cidadela de Éden... ?– fungou Eddard. – já falei sobre ela a você. É uma espécie de forte militar, onde rebeldes são treinados na arte da guerra do ar e da terra. Visam destruir pontos estratégicos do Usurpador.

            - E ele nunca descobriu onde está a fortaleza?

            - Ainda não. São muito cuidadosos quanto a isso.

            - Também acreditávamos nisso na Atlantika. – retrucou Melissandra um pouco ríspida. – e não sobrou ninguém. Nenhuma alma viva.

            Através da manta oculta pelas sombras da noite, o Solitário da Montanha a encarou.

            - Enquanto houver um tirano sentado no trono de máquina, nenhum ser humano estará livre e seguro.

            - Então por que a cidadela não ataca o Usurpador de uma vez? Você mesmo disse que cidades refúgio estão caindo nas garras dos robôs. Por que não fazem nada? Por que você não faz nada? – ela vociferou.

            - Não é tão simples como...

            - Todos vocês são uns covardes! Se possuem o poder para liderar uma força de guerra, por que não fazem? Preferem se esconder atrás de seus muros ou enterrados como formigas sem fazer nada. Contemplando uma vida de sofrimento e angustia, com receio de a primeira vespa mecânica aparecer a qualquer momento.

            - Calma Melissandra... – Antônio tentou aplacar seu ímpeto.

            - Não preciso de calma. E não preciso dessa paz fajuta que vocês e os rebeldes me oferecem. Prefiro morrer lutando em honra a meu pai, ao meu irmão... – as lembranças das crianças sendo queimadas a fez chorar. – e a Atlantika.

            Levantou-se bruscamente e foi se deitar, enrolando-se na sua manta preta.

            - Velho... Desculpe por ela... Está perturbada ainda pela morte dos pais e pela destruição de Atlantika.

            O velho riu e engoliu mais uma colher de sopa.

            - Ela será útil na cidadela.

            Nos primeiros raios do sol levantaram acampamento. Melissandra, emburrada, ficou o mais distante possível dos dois. Antônio a olhou magoado, mas deixou-a sozinha. Precisava um pouco da solidão, de se fortalecer e esquecer sua tragédia. Ele próprio também precisava.

            Viram o primeiro sinal diferente em semanas de viagem. Uma espécie de cemitério de baleias se erguia até onde a vista podia alcançar. O deserto criava pequenos montes de areias subindo e descendo, como ondas num mar, e os esqueletos dos enormes animais se expunham ao vento e ao sol.

            Admirados, cavalgavam entre as costelas, as vértebras e os crânios das baleias que um dia povoaram o oceano pacifico. Os jovens contemplavam com olhares brilhantes de emoção. Não acreditavam que uma criatura como essa um dia já possuíra vida e nadava com desenvoltura.

            Melissandra sentiu-se pequena diante dos enormes ossos brancos e cinzas. Os cavalos cavalgaram por uma lama barrenta. Para seu espanto visualizou uma cobra d’água a serpentear entre os ossos e esgueirar-se para longe de sua visão, assustada pela repentina movimentação dos eqüinos.

            Subiram mais um aclive, e já estavam fora do cemitério de baleias. Melissandra puxou o cavalo para dar uma última olhada para aqueles grandes e estranhos ossos. Antônio ficou ao seu lado.

            - Deveriam ter sido criaturas magníficas. – disse ele.

            - Sim... – ela respondeu encarando os ossos a se espalhar por quase todo o horizonte. Deixou seus cabelos castanhos serem lambidos pelo vento morno e salgado. O sol já se encontrava na linha do horizonte e uma tênue escuridão cobria grande parte do deserto.

            Ela o encarou. A inocência que ele outrora vira em seus olhos castanhos não existia mais. Uma determinação profunda emanava do olhar dela, uma maturidade forçada a desenvolver com as perdas recentes. Gostou de ver que ela estava superando, e criando forças para lutar contra esse mal.

            Ficaram em silêncio por um momento, se encarando. Ela virou o rosto para frente. O Solitário da Montanha já tinha percorrido cem metros e não olhava para trás.

            - Tony... – ela murmurou. O rapaz teve que se inclinar no cavalo para poder escutar a voz dela ante o som forte do vento. – precisamos acabar com essa guerra.

            E dito isto ela fez seu cavalo galopar seguindo os passos de Eddard.

            - O velho estava certo. – sorriu Antônio pensando em voz alta. – ela será um ótimo soldado.

            Um mês se passou. Estavam famintos, magros e abatidos. O vento, o sol e a fome eram visíveis nas fisionomias dos três viajantes. Não resmungavam, não conversavam. Poupavam os esforços dia-a-dia, se preparando para mais um dia seguinte de labuta.

            Subiram um aclive de terra negra e dura. Ao longe, depararam com um paredão de rocha cinza se estendendo por quase todo o horizonte. Devia ter uns duzentos metros de altura, calculou Melissandra. Os cavalos relincharam. Eddard passou a mão metálica sobre o pescoço grosso da sua montaria.

            - Chegamos. – suspirou Eddard. – a cidadela de Éden.

            A princípio eles não enxergaram nenhuma cidade fortificada, até que o Solitário da Montanha apontou para um ponto do paredão. Incrustado na rocha, uma parede solida de concreto se pronunciava como uma gaveta para fora do paredão. Imensa, viram um compartimento em forma de retângulo se deslocar para o interior. Um barulho de hélice em rotação chegou aos ouvidos deles.

            Viram apenas um ponto verde distante, se afastando do monte e indo em direção deles. Logo, o helicóptero verde tornou-se visível e se aproximava com rapidez. Era grande, e em suas laterais mísseis com pontas vermelhas estavam acopladas. Dois pilotos acenaram para eles. O vento provocado pelas hélices espalhou poeira, e os cavalos ficaram inquietos. Logo, o helicóptero pousava lentamente.

            Um homem alto, de ombros largos e pele escura desceu do helicóptero. Andava com firmeza em direção a eles.

            - Enfim o vejo, Eddard. Quanto tempo faz? – riu o soldado.

            - Não sei. Diga-me você Abraão.

            - Muito tempo. Muito tempo. Vamos! Tragam seus cavalos e se alojem no helicóptero. Haverá comemoração hoje na cidadela.


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