- VAMOS CRIANÇAS, SE ARRUMEM! – gritou a professora de teatro pra bagunça que estava aquele salão.

                Todas as crianças correram pegar suas roupas, menos eu. Eu ainda não tinha uma roupa para a peça que íamos fazer. Fiquei sentada num sofá do cenário esperando as outras crianças vestir suas roupas bonitas.

- A sua roupa só vai ficar pronta dois dias antes da apresentação, sinto muito. – disse a professora quando perguntei da minha roupa para ela.

                Todos iam zombar de mim sempre quando tiver apresentação, todos têm roupa, menos eu.

                Amanda saiu da salinha do vestiário com um vestidinho parecido com o de um bebê e uma frauda e sapatinhos de pano. Susana saiu de lá com um vestido lindo que parecia muito com os que as mulheres grandes usam. Outro menino saiu de lá com um terno, estava lindo! Depois duas meninas com roupas combinando saíram e por ultimo... O Bê. Ele estava com calça e camisa social, mas sem paletó. Usava um chapéu um pouco de lado e sapatos pretos. Levantei da onde estava para olhar melhor para ele. Quando ele me viu, sorriu para mim e retribuí.

- Vamos lá. Todos estão prontos? – as crianças fizeram um “sim” em coral. – Então todos em seus lugares! – a professora riu.

                Susana, - ou melhor, Renata, como se chamava sua personagem – entrou na casa e sentou-se no sofá. Logo Amanda – sua personagem se chama Carol – chegou na sala chamando por sua mãe.

- Mãe! – Amanda disse alegre chegando perto de Susana.

                Eu estava parada perto da porta esperando minha vez.

- Está nervosa? – perguntou Bernardo atrás de mim.

- Nervosa pra quê? – perguntei.

- Para a apresentação. Eu nunca apresentei nada na frente de tantas pessoas. – ele disse.

- Não estou nervosa. Ano passado também participei do teatro. – eu disse.

                Ele continuou a observar a cena que Susana e Amanda treinavam no cenário. Fiz o mesmo.

- Você é a Mari? – perguntou um menino entrando na minha frente.

- Sou. Quem é você? – perguntei.

- Meu nome é Kevin. – ele disse e ajeitou os óculos.

                Ele era o menino de terno. Tinha cabelos bem claros, mais claros que os meus, e era do meu tamanho. Olhos castanhos e parecia muito tímido.

- Pode tirar o chicle do meu cabelo? Grudaram aí atrás e eu não consigo tirar. – ele disse meio triste.

- Quem fez isso? – perguntei mexendo no chicle.

- Não importa. Tira?

- Tá bom.

                Depois de muito tentar, consegui tirar completamente a coisinha grudenta do cabelo do menino. Então ele sorriu para mim e saiu apurado. Era a vez dele na cena.

                Eu esperei Amanda se trocar sentada no chão do lado de fora da porta da salinha que ficava as fantasias.

- Você ainda não treinou sua cena? – ela perguntou saindo de lá.

- Não. – eu disse desanimada.

                Ela olhou para trás de mim e eu me virei. A professora de teatro estava parada atrás de mim.

- Posso falar com você um minutinho querida? – ela perguntou para mim.

- Tá. – respondi.

                Ela me puxou para um canto isolado das outras crianças e se abaixou para ficar do meu tamanho.

- Fiquei sabendo pela sua professora que você queria fazer o papel que Susana está fazendo, é verdade? – ela perguntou.

- Sim. – respondi baixinho depois de alguns segundos pensando se devia falar a verdade ou não.

                Ela fez carinho nos meus braços e suspirou.

- Eu queria te pedir uma coisa, estude seu papel em casa, treine lá. Ensaie bastante e eu vou te fazer uma surpresa no dia da apresentação, ok? – ela disse sorrindo.

                Eu sorri e fiquei alegre, adorava surpresas. E parecia ser boa do jeito que ela falou.

- Agora acho que é melhor você ir embora, sua mãe está te esperando. – apontou para a porta.

                Olhei minha mãe e Amanda que estavam me olhando e esperando a professora terminar de falar. Corri até elas e fomos embora. Amanda ia passar um tempo comigo depois mamãe ia levar ela para casa, talvez ela pudesse me ajudar com o ensaio.

                - Vamos lá, começa de novo. – ela disse para mim.

Entrei no quarto e fiz tudo como estava dito no papel.

- Agora a fala. – ela disse.

- Senhora? – eu disse, interpretando o papel.

Amanda continuou a fala, e eu fui a acompanhando.

- Vamos lá Mari! Tem que estar mais convincente. – ela disse.

- Você exige demais de mim! – eu disse.

- Você não quer impressionar o Bê? Pensa nele e você consegue! – ela disse e voltou a sentar na cama onde estava observando tudo o que eu fazia.

Suspirei e tentei de novo, e dessa vez Amanda sorriu para mim.

- Agora sim tá muito bom! – ela disse sorrindo.

Sorri para ela. Esperei muito tempo para pode impressionar o Bê, e agora eu ia conseguir. Eu ia ser melhor que a Susana e ele ia me preferir. Faltavam duas semanas para a apresentação e eu estava quase pronta. Duas semanas para a apresentação e duas semanas para Bê ir embora. Me deu um aperto no peito só de pensar nisso, ele não devia ir embora, ele devia ficar comigo. Ou eu poderia ir embora junto com ele, se minha mãe deixasse. Eu a convenceria a se mudar pra pertinho da nova casa dele, e íamos ser amigos e até algo mais quando crescermos. Seria maravilhoso.

- Você acha que ele vai se mudar mesmo? – perguntou Amanda.

- Ele quem? – perguntei distraída.

- O Bernardo né. – ela disse.

- Ah, eu não sei, acho que sim.

- Ele não ficaria por você?

Pensei um pouco. Ela estava colocando esperança no meu coração.

- Não sei. Você acha que ele ficaria por mim? – perguntei esperançosa.

- Acho. Ele parece gostar de você.

Eu sorri meio escondido. Ela sabia como me alegrar, mas não sabia que sabia disso. Fazia espontaneamente e isso que era bom nela, isso que fazia nossa amizade ficar forte e cada vez maior. Ela pegou a minha mão e me puxou para fora de casa, no quintal de trás, e começou a dançar ciranda comigo.

- Vamos botar um sorriso no seu rosto. – ela disse.

E eu sorri. Ela era perfeita.