Richard desceu do trem, saindo rapidamente da estação, observando a fria paisagem de Londres coberta de neve. Sorriu, um sentimento nostálgico invadia seu coração. Faziam apenas quatro meses que não visitava a cidade, mas sentia como se fosse muito mais tempo. O suficiente para que se esquecesse de como era viver ali. Parecia toda uma vida...

Suspirando, pegou sua valise de viagem e subiu em uma das carruagens de aluguel que ficavam ali em frente a estação esperando clientes. Apesar de sentir saudades da capital, não conseguia mais pensar na cidade como seu lar. Poucos meses e muita coisa mudara dentro de si.

O percurso até sua casa fora um pouco mais longo que o normal, efeito da neve que caira cedo demais nesse ano. Mas que, felizmente, ainda não se acumulara o suficiente para bloquear as linhas do trem e impedir a viagem.

O professor sabia que teria de tomar uma atitude quanto a Nicholas. O amor que sentia era correspondido, e isso o fazia desejar esquecer a diferença de idade e o fato de serem do mesmo sexo. Mas qualquer decisão em relação ao garoto teria de ser tomada depois de resolver sua situação com sua noiva Vitoria. Pois do jeito que estavam as coisas, não era justo com nenhum dos dois.

Ele pensara muito nesses últimos dias e compreendera varias coisas sobre si mesmo. Nunca havia parado, na verdade, para pensar no seu relacionamento com ela. Haviam se conhecido ainda crianças, quando a jovem se mudara com os pais para o mesmo bairro. Fora sua primeira e única namorada, estavam juntos desde a adolescência. Para Richard, sempre parecera obvio que iriam se casar um dia. E isso lhe era tão certo, que nunca notara que já fazia um bom tempo que não a amava mais, Sentia um carinho imenso por ela, era uma pessoa importante em sua vida, mas não sentia mais paixão por Vitoria.

Bastara conhecer e se encantar completamente por Nick para entender. E agora, sabia que não poderia levar adiante um noivado que já estava fadado ao fracasso.

-Richard!!!!!- mal entrara em casa e já fora abraçado por sua irmã Alice.  A jovem, com seus 17 anos, trazia no belo rosto os mesmo traços orientais, olhos cor de mel e pele clara.

Ao contrario do que acontecera com o irmão, desprezada por ser um bastardo, a família de seu pai tentara levá-la . Henry tivera apenas três meninos com a esposa legitima, e, na época, precisavam de uma garota para selar um importante acordo com um casamento. É claro que Richard e Naoko não deixaram.

-Demorou  a nos visitar.- reclamou a adolescente.- sei que foi trabalhar lá no fim do mundo, mas podia visitar a família as vezes.  Fiquei com saudades!

-Desculpa, Alice.- sorriu.- Estive muito ocupado nesses quatro meses. Onde está a mãe?

-Foi ao teatro. Sabe como ela gosta de peças e musicais...

-É, realmente. Fça um favor: leve minha mala lá para cima, no meu antigo quarto. Eu tenho algumas coisas para resolver, mas volto na hora do jantar.

-Ficará quanto tempo?

-Até domingo. Segunda tenho que trabalhar.

Alice sorriu, animada, sentira muita falta do irmão mais velho. Richard também estava feliz em ver a família, mas estava reunindo coragem  para a conversa que teria com sua noiva.

XXX

Vitoria era uma bela mulher de 22 anos. Os cabelos loiros eram lisos e cortados na altura dos ombros, a pele clara mas bronzeada e olhos verde- água. Trabalhava como professora do primário em uma escola só para meninas. Era uma jovem independente e de opinião forte, que não admitia ser rebaixada por ninguém.

Naquele dia, estava chateada pelo fato das aulas não terem sido suspensas apesar da neve que caira no dia anterior. Não gostava de sair e andar quanto estava tão frio assim. E ao chegar em casa, levou um verdadeiro susto ao perceber que tinha alguém lhe esperando na varanda, a mais ainda ao ver que era seu noivo, que não dava sinal de vida há quarto meses.

-Richard!.- sorriu.- por que não me avisou que vinha me visitar?

-Oi, Vitoria. Eu vim porque precisamos conversar. É algo realmente importante.

O sorriso morreu nos lábios de Vitoria, cuidadosamente delineados por um leve batom vermelho. Assentindo, ela abriu a porta e o convidou para entrar. Rapidamente, livrou-se do pesado casaco e das luvas que vestia.

-Eu irei preparar um chá, então conversaremos.-falou, seguindo para a cozinha e ligando o aquecimento da casa.  Um calor gostoso tomou o lugar, fazendo seu animo melhorar consideravelmente.

Richard suspirou fundo ao vê-la voltar com uma badeja com chá, biscoitos e bolos, criando coragem para as palavras que iria dizer. Uma parte de si estava com medo de estar trocando o certo e definido por algo duvidoso, mas faria o que sempre fazia: seguiria seu coração. E seu coração desejava estar com Nicholas.

-Diga.- a mulher comandou, tomando um gole de chá e comendo um pedaço de um bolo. – o que o traz aqui? E por que não veio me visitar nenhuma vez nesses meses e quase não respondia minhas cartas?

-Vitoria...eu quero que saiba que eu gosto muito de você. É uma mulher decidida, inteligente e passamos n=bons momentos juntos...

-Não precisa desses rodeios. Diga logo o que deseja.- ela o interrompeu ríspida, já tinha uma ideia do que seria tema daquela conversa.

-Eu não posso me casar com você. Não iria dar certo...eu...eu me apaixonei por outra pessoa. Sinto muito, mas acho melhor terminamos nosso noivado.

-Então.- Vitoria, como boa inglesa, se esforçava para se manter calma e impassível, mas suas mãos que seguravam a xícara de chá tremiam.- É isso? Está jogando fora todos os anos que estamos juntos.

-Não é isso. Mas eu não poderia me casar contigo amando outra pessoa.

-É BEM FACIL PARA VOCÊ FALAR!!!!!!! Chegar aqui na minha casa e dizer que, após cinco anos juntos e dois de noivado, simplesmente encontrou alguém melhor que eu? Sabe como isso machuca? E o que acontece com todos esses anos que me dei para você w E os planos e esperanças que eu tinha? Meu amor nunca valeu nada, não é?

-Vitoria, eu...

-Não quero ouvir suas desculpas! SAI DAQUI, E NUNCA MAIS APAREÇA NA MINHA FRENTE!!!!!!!!!

Richard suspirou, pegando seu casaco e saindo. Não podia culpar, sua ex-noiva pela reação que tivera. Bem, em todo caso, um problema a menos. Agora faltava comunicar a família que desistira do noivado e decidir o que fazer em relação a Nicholas...

XXX

-Você o que? – Alice gritou, surpresa. Estavam jantando juntos com uma família completa pela primeira vez que desde que o professor se mudara para trabalhar na mansão da família Heagraves.- mas por que?

-Eu não amo mais a Vitoria, não teria porque continuar com ela.

-Mas...

-Alice!- Naoko repreendeu a filha.- essa é uma decisão que diz respeito apenas ao seu irmão. Além que concordo com ele, sem amor um relacionamento não vai para frente. Não quero meu filho preso a um casamento de fachada e infeliz.- ela sabia do que falava, afinal, vivera um romance proibido com um homem casado E não se arrependia de nenhuma de suas ações.

Richard aproveitou bem aquelas dias com a mãe e a irmã. Não percebera o quanto sentira saudades das duas. Mas, ao mesmo tempo em que se divertia, ansiava por voltar para a mansão e rever Nicholas...se pegava pensando nele toda hora ...se já teria jantado...se estava bem...estaria tendo pesadelos a noite de novo?

Felizmente para si, o domingo chegou, e com ele mais 4 horas e meia de viagem até a mansão, duas horas de trem e mais duas na carruagem, duas horas de trem e mais duas na carruagem e meia hora para encontrar um condutor que o levasse.

Quando chegou, a noite estava nascendo e a neve recomeçara a cair. Queria ir logo ao encontro de Nick, mas assim que pusera os pés no primeiro degrau da escada, Edward aparecera e lhe pedira para segui-lo até o escritório, pois gostaria de conversar.

O Duque havia descoberto o envolvimento nada fraternal de seu filho com o jovem professor.  E, ao contrario da atitude que muitas pessoas tomariam, ele não via esse possível romance com maus olhos. Afinal, ele próprio vivera a experiência de um amor proibido, pela mãe de Nick, e por isso mesmo, se Richard amasse realmente o garoto, não se oporia.  Aliais, isso talvez até mesmo pudesse ajudar, já que logo ele não seria capaz de cuidar do menino. Se fosse como antes, se ainda estivesse solteiro, não hesitaria em largar tudo para proteger o filho, mas agora tinha Ângela e as gêmeas...então talvez o professor pudesse tomar o seu lugar e proteger o pequeno.

Foi direto ao assunto, como era de sua natureza, e contou que sabia do envolvimento de Richard com Nicholas, deixando o moreno absolutamente apavorado. E depois, surpreendido ao ouvir do mais velho que ele não pretendia impedir o romance.

-Eu só preciso saber se você não está brincando com meu filho.

-Eu amo Nick.- o professor falou, determinado, e Edward sentia que ele estava sendo sincero.

-Eu vou lhe contar a verdade sobre ele, e , se depois disso, ainda o querer, eu não me oporei a relação de vocês.- respirou fundo, era a primeira vez que iria contar isso a alguém, e era difícil achar as palavras certas.-Nicholas...ele não é humano...pelo menos não totalmente...