Código Zero escrita por Rhyca Corporation


Capítulo 25
Capítulo 24 - Poço do Desespero




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   Entrei em pânico, sem saber o que fazer. Era muito azar encontrar o príncipe reinante logo de cara. Eu tinha acabado de confirmar que era a pessoa mais sem sorte do mundo. Rapidamente nós tomamos posição de batalha, embora Mammon não parecesse interessada em lutar. Ela andou até perto da gente e começou a falar, sem tirar o sorriso do rosto:

 - Visitas! É tão raro aparecer alguém por aqui! Por um acaso a Rhyca também veio?

   Nós não respondemos, e ela espiou um pouco por trás dos nossos ombros, ficando na ponta dos pés. Ela parecia bizarramente inocente.

 - Aaah, parece que ela não está aqui. Que pena não é mesmo?

 - Pare com esse teatro Mammon. Vai nos enfrentar ou vai ficar aí bancando a boa garotinha? - Shishou falou, parecendo muito sério.

   A expressão do príncipe mudou, se tornando terrivelmente cruel.

 - Não Schiffer, não sou paga pra lutar com vocês. Mas, já que vocês se deram ao trabalho de vir até aqui, eu vou deixar que façam um passeio. Espero que se divirtam.

   Não sei explicar o que aconteceu depois desse breve diálogo. Sei apenas que Mammon levantou os braços e todos nós fomos arremessados para longe dalí, cada um em uma direção diferente.

   Hoshitake (e Kazumi, por tabela) foi arremessado para uma espécie de abismo, localizado no extremo sul do salão. O lugar era todo feito de pedra, e também estava em ruínas, sendo fracamente iluminado, apenas uma penumbra. Hoshitake ficou atento, se preparando para lutar a qualquer momento, mas a sua companhia estava agitada, e nada focada:

 - Você viu o que aconteceu? Minha nossa, eu achei que fosse morrer. E pelo fogo do inferno, onde é que a gente tá?

 - Fique quieto, é isso que estou tentando descobrir.

   Um ruído suave foi ouvido, perto de onde eles estavam.

 - Oh meu Deus, o que foi isso? - Kazumi perguntou, parecendo assustado. - Por favor cara, me diz que foi você, por favor!

 - Cala a boca! Como posso me concentrar se você fica aí berrando no meu ouvido?

    Uma voz interrompeu a discussão dos dois, vinda de algum lugar na escuridão. A única coisa visível da criatura eram os olhos, brilhando como faróis:

 - Bem vindo ao Poço do Desespero, senhor assistente da área sete.

 - Quem está ai? – Perguntou o espião.

 - Sou Havenna, comandante deste lugar. – Ela respondeu com uma voz que vinha de todos os cantos e ao mesmo tempo, de nenhum, semelhante a voz que Shion e Yan escutaram na área 5. Desta vez era uma voz claramente feminina.

 - Sua voz... Está dentro da minha cabeça... O que é você? Um BARON?

   Havenna riu histericamente. Sua risada era parecida com o canto de alguma ave, mas nada podia ser visto da inimiga.

 - Sou muito melhor do que esses insetos que vocês veem enfrentando. – Disse a mulher de modo esnobe. – Aposto que você nunca enfrentou nada parecido comigo até hoje. Modéstias a parte, mas sou melhor até do que certos principezinhos por ai...

 - Está blefando! – Falou o espião olhando para todos os lados. – Se você fosse mais forte do que um príncipe, não estaria sendo uma vassoura para limpar a sujeira que sua mestra faz.

 - Cale-se, seu humano imundo! Como ousa proferir essas falsas verdades ao meu respeito?! Ah, eu já havia esquecido. O cérebro de vocês não consegue acompanhar minha capacidade intelectual, por isso preferem não acreditar ao ouvirem algo que para mim já é natural. Humanos são mesmo insetozinhos insignificantes!

   Hoshitake abriu uma de suas mãos e segurou a foice que havia surgido. Sem hesitar, ele aplicou um golpe vertical naquele imenso par de olhos amarelos que estavam a sua frente. Os olhos desmancharam-se como uma fumaça submetida à um forte vento, sumindo em pleno ar. A sensação sentida pelo espião foi de que não tinha acertado coisa alguma, e isso o preocupava ainda mais, embora parecesse calmo.

   Logo após essa tentativa de ataque, Kazumi voltou a judiar da pouca paciência do assistente do sete:

 - O que foi isso cara? Por que tá falando sozinho? Não vai me dizer que tá ouvindo vozes?

 - É, estou ouvindo vozes... A SUA voz irritante no meu juízo! Quer fazer o favor de ficar calado? – Falou o assistente.

 - Mas cara, tá me assustando! Do nada fica falando sozinho. Cheguei a pensar que tava ficando louco!

 - “Cê, cê, cê”. Será que um ex-menbro de Gehenna só sabe falar isso e fazer perguntas enquanto se borra todinho? – Hoshitake falou perdendo a paciência. – Só pra sua informação, eu tenho um nome, mas não lhe diz respeito. Por isso me chame de qualquer coisa, menos de “Cê”. A não ser que queira morrer!

   A mulher voltou a falar:

 - Você tem algum problema mental, assistente? Por que raios está falando sozinho? Parece que enlouqueceu...

   Hoshitake tentou realizar outro ataque, mas sua mão não respondia ao comando e simplesmente ficou parada, como se algo a segurasse. O espião olhou rapidamente para o braço e não encontrou nada que prendesse seu movimento.

   O lugar continuava muito mal iluminado e impedia uma visão mais nítida dos arredores ou da oponente.

 - O que houve com sua mão, assistente? – Disse Havenna tentando provocá-lo. – Pensei que você fosse fazer algo com ela, mas acho que me enganei.

   Ao tentar mexer o outro braço, o espião percebeu que ele também estava preso de alguma forma e que não eram somente ambos os braços, mas todo o corpo estava completamente paralisado.

 - O que foi dessa vez Falx (Foice em Inglês)? – Kazumi perguntou mais uma vez. – Porque você não se mexe?

 - Estou tentando, mas acho que caí na técnica da inimiga. – Hoshitake respondeu sem esforços para falar. – Pelo menos minha boca está livre. Acho que posso fazer algo. Kazumi, precisarei da sua ajuda.

 - O-o que eu posso fazer sem meu corpo?

 - Preciso que apenas me diga em que direção a desgraçada está.

 - Mão não tem ninguém aqui...

 - Mas é claro que tem! – Hoshitake falou um pouco exaltado. – Ela está falando apenas em minha mente. Saiba que se eu morrer aqui, você morre junto.

 - T-tudo bem, mas acho que já disse que não consigo vê-la...

 - Você vai enxerga-la em breve. Fique atento!

 - O quê você está cochichando ai? – Disse Havenna. – Somos os únicos neste poço, então pare de bancar o louco e morra com dignidade! – A oponente gritou avançando sobre o espião.

   O assistente recitou um feitiço o mais alto que conseguia, assustando a oponente:

 - Feitiço ofensivo: Estrela-cadente!

   Uma pequena esfera surgiu na parte mais alta daquele local e começou a despencar com grande velocidade ardendo em chamas douradas, semelhante à habilidade da Hidelgarde-sama. O impacto da estrela ao cair causou um forte estrondo juntamente com uma luz ofuscante que clareou todo o poço.

 - Agora Kazumi!! – Gritou Hoshitake com os olhos fechados.

   O manipulador de bombas olhou para os lados rapidamente, enquanto evitava olhar diretamente para aquela explosão de luz até que conseguiu ver um ponto ao longe que, aparentemente, estava se protegendo do clarão.

 - Ela está à cinco horas, uns dez metros de você! – Gritou o fugitivo, cobrindo os olhos em seguida.

   Hoshitake teve seus movimentos de volta por causa da inimiga que estava se protegendo da claridade. Ela havia se desconcentrado na utilização da sua técnica e por isso o espião pode recuperar o controle do corpo.

   Ainda de olhos fechados, o assistente avançou até onde Havenna estava, enquanto a luz da estrela-cadente estava se esgotando. Três passos antes de aplicar o golpe, ele abriu os olhos e atacou horizontalmente com sua foice.

   Havenna pode ser vista pouco antes da foice causar-lhe um corte superficial no quadril. Tratava-se de uma mulher com os braços cobertos de penas de cor marrom. Sua face tinha características de uma coruja, embora não apresentasse um bico. Seus grandes olhos amarelos estavam fechados e sangrando, provavelmente por causa do grande quantidade de luz captada por eles, afinal, ela era uma criatura noturna e seus olhos não suportariam tanta claridade.

   A luz foi extinta, deixando o poço mal iluminado como de costume.

 - Não irá me derrotar somente com isso! – Falou a coruja ofegantemente, enquanto mergulhava nas sombras.

 - Como você conseguiu desviar do golpe que dei? – O espião perguntou voltando para a parte mal-iluminada do poço.

 - Sou a rainha das criaturas noturnas! Não dependo somente dos meus olhos para enxergar.

 - Agora posso ouvi-la também, Falx! – Disse o encantador de bombas. – Porque só agora posso escutar o que ela diz?

 - Acredito que essa habilidade estivesse ligada aos olhos dela. Quando eles foram feridos, o poder foi anulado junto com as correntes invisíveis que me prenderam.

   A mulher voltou a falar, dessa vez sua voz parecia vir de cima:

 - Já disse que isso não é o bastante para me vencer! Vou ter o maior prazer em te despedaçar todinho por ter feito isso aos meus olhos!

 - Como? Até onde eu sei, almas não conseguem ferir ninguém fisicamente... Ah! Esqueci de te avisar, mas você vai virar uma logo depois que eu te derrotar. SE sobrar muito de você. Minha foice está sedenta de sangue!

 - Vai lá Falx! Acaba com ela. Aproveita e depena logo pra gente jantar. – Kazumi falou sorridente.

 - Pode deixar comigo! – Hoshitake concordou estranhamente empolgado.

   O assistente da área 7 fez menção de adentrar em meio as sombras, mas antes que ele pudesse fazer isso, penas voaram em sua direção como flechas extremamente afiadas e perigosas.

   O espião girou sua foice para bloquear os projeteis e mergulhou em meio ao grande mar da escuridão.

   Os dois pareciam estar brincando de pega-pega no escuro de modo que, nenhum ataque realizado por ambas as partes foram bem-sucedidos. Ora Havenna lançava penas que eram bloqueadas pela arma do assistente, ora Hoshitake investia vorazmente com sua foice na mulher-coruja e ela desviava com facilidade. Kazumi gritava como uma garotinha toda vez que algum dos golpes passava perto dele.

 - Pare de gritar, criatura! – O espião berrou sem paciência. – Nenhum desses ataques irá te afetar!

 - Tsc. Ainda não me acostumei com isso. – Respondeu o fugitivo. – E ainda por cima, não posso esquivar porque estou preso a você. Garanto que não é uma situação nada agradável...

 - Quem mandou fugir da prisão? – Revidou o assistente enquanto se defendia de uma rajada de penas. – Você deveria ter ficado quietinho lá e nada disso teria acontecido.

 - Eu precisava fugir... Não posso encontrar aquela mulher novamente. Ela é um monstro!

 - Mulher? Que mulher? – Hoshitake falou enquanto olhava rapidamente para Kazumi.

   Uma pena acabou escapando dos golpes que o espião aplicava e o acertou diretamente na barriga.

   Longe daquele lugar, mais precisamente na área 3 da ordem zero,  Pandora entrou na sala da Rainha Serpente com uma expressão preocupada. Mal esperou que a porta fosse aberta e foi falando:

 - Hidelgarde-sama, algo terrível aconteceu! O prisioneiro particular da senhorita não se encontra em sua cela. Nakashima Kazumi simplesmente desapareceu!

   No entanto, a general pareceu bem tranquila. Parecia que ela já esperava por isso.

 - Hum... Quer dizer que aquele ratinho de laboratório não sabe como convidar uma dama para sair. Diga-me Pandora, quantas vezes alguém já conseguiu fugir com vida daqui?

 - Nenhuma, Hidelgarde-sama.

 - Interessante... – Hilda fez uma expressão pensativa. – Parece que aquele ratinho já está com saudades de mim... Bem, serei obrigada a matar a saudade dele.

   De volta ao poço, Hoshitake parecia estar levando a pior naquele combate. Seus movimentos estavam mais lentos e ele mal conseguia se sustentar de pé. Sua vista estava embaçando e depois de algum tempo, o espião começou a ver imagens triplicando até que, não aguentando mais, o assistente caiu desacordado.

   Havenna surgiu sorridente em meio às sombras e pôs-se a falar:

 - Ninguém é páreo a mim e muito menos ao meu veneno. Mas não se preocupe, você não morrerá ainda. Não passou pela sua cabeça o motivo desse lugar se chamar Poço do Desespero? – A mulher-coruja riu descontroladamente. – Vou deixá-lo apodrecendo em meio as suas agonias, humano imbecil.

   Kazumi estava escutando tudo que a inimiga falava, mas não conseguiria fazer nada. Naquela forma, o fugitivo não passava de um “amigo imaginário” que somente o Hoshitake conseguia vê-lo e ouvi-lo.

   Dentro da mente do assistente, num mundo que ele mesmo havia criado, uma voz parecia chamar por ele. Uma voz feminina que passava a sensação de firmeza e, ao mesmo tempo, envolta de uma ternura imensurável.

   Era Gilliard.

   O espião olhou para os lados e voltou a olhar sua general. Confuso, ele começou a andar até ela em passos largos até que, não aguentando mais, o assistente começou a correr.

 - Gilliard, o que faz aqui?! – Hoshitake perguntou inconformado.

   Porém a resposta não foi ouvida. A morena estava parada e sussurrava algo que ele não conseguia ouvir, não importa o quanto corresse. Depois de um tempo o espião percebeu que sequer estava saindo do lugar: Quanto mais ele corria, mais distante a general ficava. Aquela situação não parecia ter sentido algum.

   A general fez uma expressão de dor profunda e foi ao chão. Uma figura apareceu atrás dela, com penas por todo o braço e um sorriso maligno.

 - O que fez com minha general, sua idiota! – Hoshitake berrou. – Se fizer mais alguma coisa à ela, eu juro que não vai sobrar nem sua alma pra contar história! – Ele tentou avançar contra a oponente, mas nenhum dos seus membros o obedecia.

 - Algo me diz que você não vai conseguir me impedir. – Disse Havenna ainda exibindo um sorriso zombeteiro. – Tenho uma surpresinha para você. – A coruja abriu seus olhos lentamente.

 - O-o quê?! Tenho certeza de que feri seus olhos a ponto de não conseguir abri-los. O que está acontecendo afinal?!

 - “O que está acontecendo?” ou “O que foi que você fez?”... Sempre as mesmas perguntas! Há tempos que não me divertia assim, mas você tinha que vir com uma frase tão clichê. Me deixa até enjoada.

 - Mas isso é impossível! Não tem como você ter se curado! E como Gilliard encontrou esse lugar? Quando ela chegou aqui?

 - Cale-se! Quantas perguntas! Não tenho motivos para te responder isso então fique quieto e espero sua hora de morrer.

   Hoshitake estava muito confuso e gritava em vão pelo nome da general caída. Nenhum dos membros do espião se mexia, o que tornava tudo mais complicado. Havenna caminhava em direção a ele arrastando Gilliard, que gritava ao ser puxada pelo longo cabelo cacheado. Aquela situação estava piorando cada vez mais e parecia que tudo estava acabado.

   Até surgir uma voz.

   Era fraca e repetitiva. Inicialmente não se ouvia o que era dito, mas depois de um tempo, a voz começou a ficar forte e intensa. Tudo que estava ao redor do Hoshitake começou a desmanchar como água jogada numa pintura que não havia secado.

   O espião abriu os olhos lentamente e enxergou o rosto do Kazumi aos prantos.

 - Graças à Deus! Achei que cê tinha morrido Falx! – Disse Kazumi entre soluços. – Eu te chamei tanto, mas cê não se mexia! Achei mesmo que cê tinha...

 - Cala a boca! – Gritou o assistente. – De novo de chamando de “cê”? Eu já não te falei que tenho um nome e que não suporto essa sua mania?

 - Desculpa, mas...

 - Mas nada! Quer dizer que a voz irritante que eu ouvi era a sua. – Hoshitake fez uma expressão muito desajeitada e voltou a falar olhando para os lados. – Mas pelo menos eu pude sair daquela ilusão que me torturava... Bem, você já fez sua boa ação do dia, agora me deixa resolver uns assuntos pendentes aqui. – Ele falou levantando-se enquanto olhava a oponente.

 - Ora ora... – Falou a mulher-coruja. – Não é que esse vermezinho está de volta ao mundo dos vivos. Pois bem, vamos terminar logo com isso. Tenho que te separar por partes logo, porque a hora do café da manhã está bem próxima e estou sem comer desde ontem.

 - Não se preocupe. – Disse o espião com um olhar perigosamente ameaçador. – Isso vai terminar antes do que você imagina.

   Uma luz fraca vinda do assistente clareou parcialmente aquele poço. Era hora do contra-ataque.


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