Everlasting escrita por Fernanda Redfield


Capítulo 8
Capítulo 7: À Beira do Abismo


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoas lindas... Happy Valentine's Day!
Antes de tudo, gostaria de pedir desculpas em relação a demora. Tive uma semana agitada e nem tive tempo de escrever, mas prometo recompensá-los com esse capítulo (assim espero, né!). Ah, obrigada pelos reviews e as recomendações, mais uma vez.
Devo avisá-los que esse capítulo promete emoções muito fortes e sinto que alguns vão querer me matar. Mas entendam que é necessário.
Gostaria de indicar 3 músicas a vocês: Down (Jason Walker), Raining in New York (SPAN) e I Gave You All (Mumford & Sons).
Espero que aproveitem o capítulo, boa leitura!



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Madrugada. 22 e 23 de novembro de 2012. Lima, Ohio.

“I know I'm gonna fall down. I thought I could fly, so why did I drown?”

(Down - Jason Walker ft. Molly Red)

            Rachel estava olhando para frente como se alguma coisa realmente estivesse chamando a atenção dela no auditório escuro e silencioso. Estávamos ali há horas e em nenhum segundo, eu consegui tirar as minhas mãos do pequeno corpo dela, também não consegui parar de olhá-la.

            Tudo pelo que eu vivia estava ali, seguro em meus braços.

            Ajeitei-me na poltrona acolchoada em que eu estava, em algum momento, nós duas tínhamos saído do piano e fomos para a platéia. Alguém apagara as luzes e o ambiente teria ficado escuro senão fosse pelas luzes de emergência do auditório. Meus olhos saíram da face de Rachel e foram para as nossas mãos, entrelaçadas sobre o encosto entre nós.

            A pele morena e a pele branca destoavam uma da outra, eram bastante diferentes e, ainda assim, pareciam ser perfeitas uma para a outra. Apertei as mãos dela e corri meu polegar pela pele, Rachel soltou uma pequena gargalhada e encostou a cabeça em meu ombro. Meu coração acelerou quando a respiração dela tocou a pele sensível de meu pescoço.

            Tão quente... Tão viva... Tão Rachel!

            - Você provavelmente sabe que estamos aqui há horas, não é? – Rachel perguntou com um ar divertido e eu sorri diante do ar brincalhão que ela tinha naquele momento. Eram momentos como aquele que eu queria levar comigo, eram momentos como aquele, onde a minha felicidade vencia o meu medo e eu me sentia viva de novo...

            Rachel trazia o melhor em mim, sempre foi daquela forma e não seria agora que iria mudar. Ela me fazia querer ser melhor, ela me fazia acreditar em algo. Rachel me fazia ter fé na vida e nas pessoas. E naquele momento, com a ausência de luz e de obstáculos entre nós, ela me fazia ter fé no que sentíamos. Fazia-me ter fé na eternidade do nosso sentimento.

            Eu me aproximei dela, levantando o encosto para braço que nos separava, Rachel se aconchegou em meu peito, afundando o rosto em minha camisa enquanto eu afagava seus cabelos. Ouvi um gemido preguiçoso dela e dei mais uma risadinha antes de beijar o topo de sua cabeça e responder:

            - Sei, mas o tempo parecer ter parado.

            E realmente, para mim, o tempo tinha parado. Eu não escutava mais o tique-taque que ecoara em minha cabeça nos últimos dias, estava tudo tão silencioso e tão calmo como se eu nunca tivesse sentido o que sentira. O buraco escuro e frio em meu peito estava sendo substituído por um calor que eu sabia vir só de Rachel. Rachel estava me inundando com vida de novo.

            - Mas ele não parou, Q. Nós vamos ter que ir embora em algum momento. – Rachel murmurou preguiçosa de encontro a minha pele e acariciando a minha barriga. Pousei minha mão sobre a sua para depois, levá-la aos meus lábios e beijar sua palma. Rachel abriu os olhos e me olhou, eu ainda me surpreendia com a profundidade daqueles olhos castanhos. Rachel era daquelas que falava com os olhos. – Mas isso não quer dizer que tenha que ser agora...

            - Como sempre, contraditória né, Berry? – Murmurei irônica em seu ouvido e ela fez aquela cara emburrada. Abriu a boca para começar seu monólogo, mas eu não deixei e a interrompi com uma sequência de beijos em seus lábios. Rachel acabou rindo e anunciou:

            - Se você começar a interromper meus monólogos dessa forma, eu vou querer falar muito sempre.

            - Independente dos seus beijos, eu também gosto da sua voz. Prometo não interromper sempre. – Observei Rachel corar, envergonhada por causa das minhas palavras. Dei mais algumas risadas diante da atitude dela e afaguei-lhe o rosto, olhando séria dessa vez. Rachel parou de sorrir e também me olhou, com os lábios entreabertos e a expressão hesitante.

            Aproximei-me lentamente, sentindo aquele cheiro doce e a respiração quente dela a me invadirem. Minha mão deslizou da sua face para o cabelo, massageando-os enquanto ela fechava os olhos, completamente entregue. Mordi meu lábio inferior e, desviando os olhos brevemente, apanhei a mão dela que ainda repousava sobre a minha barriga e a apertei. Com nossos rostos próximos, mordi seu queixo e pincelei os nossos narizes.

            Rachel rompeu a distância que nos separava e foi a minha vez de ofegar quando senti a boca carnuda dela sobre a minha. Nossas mãos se separaram e a dela encontrou a barra da minha blusa, apertando-a sobre os seus dedos. Levei a minha até seu rosto e segurei a sua face, aprofundando o beijo e sentindo a língua dela aprisionar a minha e lutar por espaço. Rachel beijava muito bem, ela sabia encontrar os pontos que me faziam gemer e eu me sentia impossibilitada nos braços dela...

            Ela se separou, mordendo meu lábio e sorrindo vitoriosa com a minha expressão entorpecida e minhas bochechas vermelhas. Rachel juntou a minha testa a dela e deslizou a mão sobre a minha face, contornando cada detalhe do meu rosto, demorando-se nos meus olhos e em minha boca. Beijei a ponta de seus dedos e ela disse, em transe:

            - Você é linda, Quinn.

            - Eu não sou linda, Rachel... E mesmo que fosse, ficaria bem atrás de você. – Respondi com um sorriso de lado e a puxando para um abraço, ouvi um suspiro pesado enquanto ela apertava meus braços que envolvia seu pescoço. Ela afundou a cabeça entre meus cabelos e respirou fundo ali. Eu sorri diante das atitudes dela. Rachel estava exposta, jogando suas cartas na mesa e me obrigando a jogar com ela. – Afinal, não tem como comparar a beleza com a perfeição, não é?

            Rachel se afastou de mim e tinha uma expressão atônita nos olhos, algo que mesclava entre a surpresa e o medo. Baixei meus olhos e tirei a minha mão de seu rosto, sentindo a bolha em que estávamos se romper. Rachel estava insegura, era óbvio e eu estava a pressionando com a minha pressa e minha afobação.

            Mas o tempo era nosso inimigo. Não só porque ele corria diante dos meus olhos fazendo o tique-taque recomeçar incômodo em minha mente, mas porque, parecia que o tempo andava diferente para nós duas. De certa forma, era isso mesmo. O tempo para que Rachel compreendesse os seus sentimentos por mim ainda não chegara... As cartas estavam expostas, mas não jogadas.

            Rachel tinha o jogo nas mãos.

            - Quinn, eu...! – Lógico que ela tentaria dizer alguma coisa, ela é Rachel Berry e as palavras fluem quando ela fica nervosa e quando tenta não magoar as pessoas. Eu me desviei dela e fiquei em pé, sentindo-me tonta e mais uma vez, sendo consumida por aquela dor chata que mesmo machucando-me, provava que eu estava “viva”. Pude perceber, na escuridão, que Rachel se levantara. Ela segurou meu braço e entrelaçou nossos dedos, podia senti-la tremendo. – Me desculpe, eu...

            - Não precisa falar nada, ás vezes, o silêncio diz mais do que qualquer palavra. – Respondi um pouco ressentida, mas senti um sorriso chegar aos meus lábios quando vi a expressão dela, contorcida pela angústia, dissolver em um sorriso tímido. Afaguei seus cabelos e a puxei para um abraço, Rachel grudou em mim enquanto eu sentia o corpo dela queimar sobre o meu. Ardendo. – Vem, acho que é a hora de vir embora.

            Entrelacei a minha mão a dela e caminhamos para fora do auditório vazio, enquanto escutávamos o barulho das mulheres da limpeza ao caminharmos para fora do McKinley High.

###

               De uma coisa eu sempre irei lembrar: a noite após o auditório foi uma das poucas em que eu consegui adormecer naquela segunda passagem pela Terra.

            Quando cheguei em casa, minha mãe estava trancada no antigo escritório do meu pai, trabalhando ou fingindo estar concentrada em seu novo projeto de designer. Eu podia não ter uma boa relação com a minha mãe e podia não me esforçar para isso, mas eu reconhecia que ela estava tentando se recuperar depois do divórcio doloroso entre ela e meu pai.

            Portanto, mesmo frustrada com a ideia de não ter coragem para falar tudo o que eu queria e mesmo diante da minha covardia em ver o tempo passar e nada fazer, eu me recolhia ao meu mundo e me isolava dela. Subi as escadas e entrei no meu quarto, trancando a porta em seguida.

            Tudo ficou em silêncio, escutei a porta do escritório se abrir no andar debaixo e alguns passos arrastados pela escada. Mas eles acabaram tão rápido quanto começaram e retornaram ao escritório.

            Meu coração apertou porque, no fim das contas, minha mãe era mais forte do que eu. E quando deveria ser o contrário, era ela quem estava me protegendo.

            Eu acordei na manhã seguinte um pouco nervosa, mas fiz toda a minha higiene matinal e me peguei escolhendo a roupa para usar naquele dia. Gargalhei quando escolhi minha melhor saia na altura dos joelhos e a minha melhor blusa, calcei as sapatilhas e desci as escadas com a mochila nos ombros.

            Mamãe não estava em casa e eu suspirei aliviada, tinha um pouco de bacon com ovos na frigideira. Fui até a geladeira e peguei um suco qualquer enquanto me servia do que restava e escorava no balcão e comia meu café-da-manhã morno.

            Sorri para o canto dos pássaros e fechei os olhos enquanto mastigava. Imediatamente, Rachel veio a minha mente. Rachel e a insegurança dela me assustavam, mas eu estava segurando naquilo que julgava ser o mais verdadeiro nela: os olhos. Aqueles olhos castanhos que povoaram meus sonhos e que pareciam conter toda a verdade quando ela se assustara com meus sentimentos no auditório. Os olhos chocolate transmitiam toda a intensidade do que ela estava sentindo.

            Os olhos escuros me diziam que Rachel sentia algo e que se recusava a lidar com aquilo no momento. Mas o beijo, a música... Rachel podia não estar pronta, mas ela ao menos tinha uma noção do que se passava entre nós. Qualquer um perceberia. O que nos unia era diferente e eu diria que era até estranho para os olhos dos outros, porque era intenso e real... Algo verdadeiro e que podia ser percebido ao longe por nossas trocas de olhares e sorrisos, algo que, na verdade, não parecia pertencer aquele mundo talhado em aparências e mentiras.

            E, de fato, não pertencia aquele mundo mesmo.

            Terminei meu café da manhã e me dirigi para a escola, caminhando. Carros tinham tornado-se assustadores para mim desde o que supostamente acontecera comigo e toda vez que eu me aproximava de um, sentia minha cabeça rodar e doer... Estava evitando aquilo por enquanto, estava querendo me manter sóbria para Rach.

            Cheguei a escola alguns minutos depois, a sineta ainda não tinha sido tocada e alguns surpreenderam-se ao me ver caminhando pelo estacionamento. Apertei a alça da bolsa e subi as escadas da entrada rapidamente. Não encontrei Rachel pelo corredor e suspirei magoada, apanhei o celular e enviei uma mensagem.

Bom dia, espero que tenha dormido bem. – Q.

            A resposta chegou assim que a sineta tocou e pareceu me alertar que existia alguma coisa muito errada ali. Pois, ao ler a mensagem de Rachel, meu coração de espremeu em meu peito e senti a náusea me tomar.

Tive pesadelos, mas estou bem. Bom dia. – Rach.

            Apertei o celular em minhas mãos e entrei na aula de Química Avançada, sentindo toda a minha esperança esvair-se do meu peito.

###

            Quando a última aula antes do almoço acabou, eu estava entediada e muito preocupada. Ao contrário da noite anterior, as minhas dores voltaram e elas pareceram ainda mais intensas do que antes... Meus braços estavam ardendo e quando eu erguera as mangas da minha blusa ainda na sala, notei que eles estavam vermelhos.

            Minha cabeça também não estava ajudando. Aquela mesma tontura estava incomodando, assim como o martelar do maldito tique-taque no meu cérebro. Sim, ele retornara e estava me assustando, porque ele parecia ainda mais ensurdecedor agora... O silêncio e a tranqüilidade que tinham me preenchido quando eu estava com Rachel tinham desaparecido, dando lugar aquele mesmo tique-taque, mesmo vazio e a mesma agonia diante do tempo.

            Apoiei-me na parede do corredor que levava a cantina e respirei fundo. Coloquei a mão sobre o meu coração e mesmo quando o bater lento e tranqüilo, eu sentia como senão existisse mais nada ali além do silêncio. Minha intuição me dizia que alguma coisa estava muito errada, algo apertava meu coração e me dizia que, a minha felicidade momentânea e épica, ia ser destruída.

            Não era pessimismo, eu já tinha uma situação-limite em minhas mãos e se surtasse, seria pior... Era mais como a realidade, como se existisse alguma coisa mais forte do que a minha “volta” e o que eu sentia por Rachel. Mas eu sabia que a amava, eu sabia que estava disposta a tudo por ela... Só que eu sabia o que eu sentia. Eu amava Rachel, eu voltei por ela. Ela me fazia sentir viva de novo.

            Só que ela também tinha a capacidade de me fazer sentir-me morta de novo. E isso, eu sentira na noite passada quando vi a confusão e a insegurança em seus olhos.

            Respirei fundo e esperei a multidão de alunos entrar aos poucos na cantina, senti uma mão forte apertar meus ombros. Virei para a pessoa e Puck me olhava com uma expressão divertida que, rapidamente, se dissolveu diante da minha palidez e dificuldade em respirar. Puck puxou os livros de minha mão e disse preocupado:

            - Você está pálida de novo, Q. E eu posso ver que está suando frio.

            - Eu estou bem, Puck... É só um mal-estar. – Tentei me desvencilhar das perguntas dele, mas Puck era um garoto que conseguia ler as pessoas. Ás vezes, ele usava isso da pior forma, como para ler a excitação das meninas em relação a ele... Mas ele conseguia me ler e depois de tudo que aconteceu entre nós, Puck sabia que tinha alguma coisa errada comigo. Puck me olhou com uma expressão desconfiada e eu revirei os olhos. – É sério, eu estou bem.

            - Quinn, você desmaiou há menos de 2 dias. E ontem, ficou tão mal que eu tive que te ajudar. Não minta para mim, eu sei que tem alguma coisa errada. – Puck estava com a expressão séria enquanto me puxava pela mão até a cantina. Eu tentava resistir, mas ele era mais forte e eu estava com muita dor. Por outro lado, eu queria contar a ele o que estava acontecendo. Mas como contar da minha suposta morte? Como contar que ele encontrara meu corpo? Parecia ser informação demais, mesmo para alguém tão durão quanto Noah Puckerman. Olhei para ele suplicante e disse:

            - Eu não quero falar sobre isso, de verdade. Talvez seja melhor que as coisas se resolvam antes de eu acabar falando alguma bobeira.

            Obviamente, Puck ficou indignado com minha resposta, mas nem por isso deixou de me apoiar. Ele me puxou para perto e afagou meus cabelos enquanto eu me enganchava a ele, Puck suspirou pesadamente e me conduziu até uma das mesas da cantina. Santana e Brittany estavam sentadas quando eu me coloquei em frente a elas. Puck sorriu para as duas e disse:

            - Meninas, cuidem de Quinn ok? Acho que a pressão dela baixou de novo, eu só vou ali apanhar algo para comer e já volto.

            - Você não a engravidou de novo, né Puckerman? – Santana perguntou maldosa e eu tive vontade de enfiar o garfo garganta abaixo nela, Puck bufou impaciente e jogou a mochila sobre a cadeira antes de dar as costas e entrar na fila. Santana voltou o olhar para mim e ria sem parar, Brittany olhou para nós duas e perguntou:

            - Beth terá uma irmãzinha?

            - Não, Britt-Britt. Quinn só está frustrada sexualmente. – Santana tornou a falar com aquele tom de voz irônico e sarcástico, dessa vez, fui eu quem revirei os olhos. Arqueei a sobrancelha para ela e respondi:

            - Não, B... Eu só estou passando mal.

            - Se você quiser, eu posso pedir para meu gato te ajudar. Ele me ajudou quando eu fiquei mal do estômago na semana passada. – Brittany murmurou inocente e prestativa, segurei a mão dela por cima da mesa e dei um sorriso agradecido. Brittany pareceu feliz com o meu gesto e abriu um sorriso aliviado, desmanchando a expressão preocupada de antes. Voltei para Santana que olhava para nós com ciúmes, mostrei-lhe a língua e sibilei:

            - Não precisa ficar com ciúmes, S. Pode ter certeza que a fidelidade de Brittany por você é maior do que a sua com ela.

            - Calada, Fabray. Senão, eu arranco esse sorriso presunçoso dos seus lábios. – Santana ameaçou entre dentes, mas eu vi a sombra de um sorriso nos seus lábios. Joguei um bolinho de Brittany nela e depois, ela riu enquanto eu desviava os meus olhos dela para a entrada da cantina.

            Finn e Rachel tinham acabado de entrar e, imediatamente, minha expressão saiu da felicidade por estar brincando com Santana para o desespero e a silenciosa agonia. Rachel sorria para ele e segurava a mão dele, da mesma forma que segurara a minha na noite passada.

            Meus olhos encheram-se de lágrimas, mas eu me recusei a limpá-las. Pude perceber Santana virando-se e voltando-se para mim, com a expressão preocupada e um pouco agressiva. Pude ver os lábios de Santana mexerem e senti a mão de Brittany sobre a minha novamente... Mas eu não conseguia ver e muito menos, compreender nada diante da cena que se desenrolava a minha frente.

            Rachel se recostava a ele da mesma forma que fazia comigo, ela parecia livre e solta enquanto era praticamente arrastada por Finn. Dentro de mim, eu sentia todos os meus sentimentos entrarem em ebulição e irem, aos poucos, queimando e destruindo cada pedaço de mim. Sentia minha alma sendo puxada através da minha pele e meu coração remoendo-se dentro do meu peito.

            De uma hora para a outra, parecia que tudo tinha perdido a razão e a lógica.

            Viver não parecia mais tão importante agora que eu a via com Finn. Onde estavam os toques? Onde estavam as palavras? Onde estavam os olhos sinceros dela a dizer que eu gostava de mim?

            Mas eu vi os olhos dela, brevemente, mas eu os vi. Rachel desviou os olhos de mim e do meu limbo pessoal enquanto Santana se levantava e me puxava para ela, em um abraço carinhoso e um tanto quanto possessivo. Eu permaneci imóvel e senti Santana me apertar, Puck chegou e tomou a minha visão com mais um sorriso morrendo em seus lábios. Ele olhou por cima dos ombros e pode ver Rachel beijar Finn.

            Meu estômago revirou e a minha cabeça doeu. Fechei meus olhos, tentando aplacar ou diminuir a dor, mas sem sucesso. A dor física tinha cunho emocional e até mesmo o meu peito estava doendo quando parecia ter sido apunhalado. Santana me sentou na cadeira e olhou por sobre os ombros, pegando Rachel a nos observar. A minha melhor amiga fez um gesto obsceno e virou-se para mim de novo, dizendo:

            - Você está passando mal por causa do hobbit, Q. Eu vou te levar para cara, você não está em condições de assistir a mais uma aula.

            - Claro que não, Santana! Eu não vou deixar que leve Q para casa, sabe-se lá o que você vai fazer com ela. Você não é confiável! – Puck respondeu na defensiva e sentando-se ao meu lado, me abraçando protetoramente enquanto afagava os meus cabelos. Eu afundei a cabeça em seu peito, as lágrimas vieram, mas eu não conseguia chorar... Parecia que algo me segurava, talvez fosse a força que Puck estava emanando para mim. Santana proferiu alguns xingamentos em espanhol e retrucou indignada:

            - Você tem treino hoje, Puckerman e sabe muito bem como a Coach Beiste odiaria se você faltasse. Eu vou levar Q para casa e vou cuidar dela, é o mínimo que eu posso fazer. Eu sei como ela se sente, eu posso lidar com isso.

            Senti quando os braços de Puck enrijeceram e quanto ele se afastou lentamente de mim. Abri meus olhos, nem sequer percebi que os tinha fechado, enquanto sentia uma mão apertar meus ombros, dando-me força. Olhei para cima e peguei a expressão guardiã e protetora de Santana Lopez a me observar, a latina me deu um sorriso gentil e estendeu a mão. Apoiou meu corpo no dela e me puxou para caminhar. Percebi quando os olhos escuros dela chegaram a Rachel que observava a cena preocupada, eu e Santana a ignoramos, pois Brittany perguntou:

            - Quer que eu vá com você, S?

            - Não, B... Você não pode perder mais aulas e Quinn precisa descansar. – Santana respondeu meiga para Brittany e eu dei um sorriso involuntário para as duas. Santana e Brittany eram almas gêmeas, eu podia sentir ao olhar para as duas. O amor de ambas podia ser estranho e até, anormal... Mas era sincero. Eu fui amiga das duas por tempo o bastante para ver a verdade entre elas. Britt acenou com a cabeça e abriu um sorriso, me desejando melhoras. Acenei com a cabeça para ela e Puck se ergueu, olhou sério para Santana e disse:

            - Não dê nada alcoólico para ela hoje.

            - Quinn não precisa disso. Ela precisa das palavras e eu sei quais dizer a ela nesse dia. – Santana murmurou severa antes de me puxar com ela para fora da cantina. Pude sentir os olhos de Rachel em minhas costas, eles me machucaram, eles tiraram as minhas asas e me fizeram cair.

            Porque aqueles olhos eram sinceros e diziam que me amavam.

            Por que ela estava com Finn, então?

###

            Eu não soube a que horas dormi, mas julguei ter sido no caminho de volta para casa porque, quando acordei, estava em meu quarto e coberta até o queixo. Santana estava sentada na cadeira da minha escrivaninha e eu notei que ela fazia alguns exercícios de Química, bastante concentrada. Tentei me ajeitar na cama, mas fui novamente atingida por uma pontada de dor em minha testa. Gemi irritada e Santana levantou os olhos dos livros e cadernos.

            Santana me ajeitou em meus cobertores e travesseiros, depois, pulou o meu corpo e deitou do meu lado, com o braço sobre os olhos. Ela respirou fundo enquanto eu a observava. Ninguém nunca nos entendera, mas por baixo das discussões e xingamentos, era no silêncio que nós encontrávamos uma a outra. Só escutava a respiração de Santana seguida pela minha.

            Ficamos assim por alguns minutos, Santana pensando no que falar e eu, acordando lentamente e sentindo todas as minhas dores voltarem. O embrulho no estômago também voltou e eu engoli em seco, sentindo-me enjoada.

            - Sua mãe gosta de você, Q... Assim que chegamos, ela me ajudou a te colocar na cama para sair em busca de ingredientes para cupcakes. Disse que os seus preferidos são de chocolate e morango. – Santana estava escolhendo suas palavras e escolheu-as bem, porque elas me atingiram, em cheio. Eu olhei confusa para ela e ela me retribuiu o olhar, com repreensão. – Se eu estivesse assim por causa de uma garota, minha abuelita teria me expulsado de casa e não teria me oferecido bolinhos.

            - Acha que ela sabe? – Perguntei preocupada, despertando de vez do meu sono que, ao contrário da noite, tinha sido tumultuado por uma Rachel risonha a se afastar cada vez mais de mim. Santana agitou a cabeça negativamente e se sentou, ela afagou alguns cabelos meus e disse sincera:

            - Qualquer um entenderia que você está assim por causa da Berry, Q. Puck finge não saber, mas ele só quer que você conte a ele.

            - Não estou assim por causa dela, S... – Tentei negar a todo custo, com a voz firme e decidida, mas Santana me conhecia melhor do que ninguém e sabia quando eu estava mentindo. Ela revirou os olhos e sentou-se em minha frente, de pernas cruzadas enquanto eu recolhia as minhas. Santana olhou fundo nos meus olhos e disse decepcionada:

            - Eu não vou te julgar, Q. Eu sei que você gosta dela, mas também sei que isso está te fazendo mal, você tem passado mal desde que a viu com Finn. Não quer falar sobre isso?

            Eu estava prestes a responder que não quando a porta do meu quarto se abriu e por ela entrou o assunto da conversa. Rachel estava de cabeça baixa e arregalou os olhos quando me viu sentada com Santana. Minha mãe que acompanhara Rachel até ali, fez sinal para Santana e disse:

            - S, Rachel e Quinn precisam conversar. Preciso de ajuda com os bolinhos, Brittany está a caminho com Puck.

            Santana permaneceu calada e eu segurei a mão dela, tentando acalmá-la. Porém, ela mal olhava para mim e parecia vidrada em Rachel. Sem qualquer aviso prévio, Santana levantou-se agressivamente e marchou em direção a Rachel, ela estava prestes a agarrá-la quando eu saí do meu torpor e ignorando todas as minhas dores, a segurei em um abraço de aço pela cintura.

            - La voy a matar, esta perra está acabando con Quinn! Yo soy de Lima Heights Adjacents y saber qué podemos hacer? Cosas malas!

            Eu lutava contra a força demoníaca de Satan enquanto sentia minhas dores gritarem por ajuda. Minha mãe tocou Rachel para dentro do corpo, longe dos braços de Santana para vir em meu auxílio e carregar uma Santana possuída para fora. Fui até a porta do quarto e tranquei, escutando minha mãe berrar com S nas escadas.

            Assim que girei a chave na fechadura, permaneci encarando a madeira branca da porta, mordendo meu lábio e sentindo meu coração ir se curando com a evidência da presença de Rachel ali. Inspirei o ar profundamente, sentindo o cheiro doce que ela exalava preencher meu quarto.

            Pelo visto, essa noite não seria nada fácil.

            - Você está melhor? – Rachel perguntou um pouco envergonhada e eu tomei coragem para me virar. A morena estava em pé ao lado da minha cama e olhava nervosa para mim, respirei fundo e tentei conter a fúria desconhecida que começava a tomar meu corpo. Balancei a cabeça, o tique-taque quase explodiu em minha mente e respondi fria:

            - Não podia estar melhor, Berry.

            - Não fale assim comigo, Q! – A voz de Rachel soou estridente e eu a vi quebrar diante dos meus olhos, as lágrimas escorreram sem cerimônia pelos olhos castanhos e eu fechei meus punhos e olhos, incapacitada de vê-la daquela forma. Ouvi o fungado pesado de Rachel. – Eu não queria te machucar.

            - Você não me machucou. Aliás, por que poderia? A noite passada provavelmente não foi nada para você e você continua sendo namorada de Finn! – Respondi amargurada, mesmo diante dos protestos do meu coração, a minha dor era ainda maior e meu orgulho, ainda mais forte. Eu sabia que não tinha tempo para aquilo, mas eu não podia... Era a minha natureza defender-me daqueles que me feriam.

            Rachel ergueu os olhos para mim e se aproximou a passos curtos e rápidos, ela parou na minha frente e ergueu a mão para me tocar, afastei-me a contragosto e me encolhi de encontro a parede. Novamente, o cheiro que a preenchia e o calor que ela emanava fez um bem as minhas dores: calando-as, curando-as... Rachel tornou a se aproximar, mais decidida dessa vez e tocou, com a ponta dos dedos, o meu rosto. Fechei os olhos involuntariamente e ela selou nossos lábios com delicadeza. Contra todo o meu orgulho, mas em favor a minha vida, eu enlacei o seu corpo junto ao meu e apertei-a com força. As mãos de Rachel apertaram minhas costas e ela afundou a cabeça em meu peito, enquanto suspirava e pedia, silenciosamente, perdão sobre suas atitudes. Eu me amaldiçoei por ser tão fraca e tão idiota, eu simplesmente não queria perdoá-la.

            - Lembra quando eu te desafiei a me amar? – Rachel perguntou entre soluços, erguendo a face do meu peito e respirando com dificuldade. Eu apenas acenei afirmativamente com a cabeça, tocando os seus cabelos e beijando a sua testa. Ela me apertou ainda mais, a respiração quente em meu pescoço foi mais um sopro de vida naquela confusão toda. Rachel apertou a minha blusa. – Eu te desafiei porque eu sei muito bem quão difícil e confusa eu sou com meus sentimentos.

            - Não deveria ter me feito acreditar que você sentia algo por mim, aliás, que você me amava. – Minha voz estava fria e dura como aço, mas eu não podia controlar o estrago que ela havia feito em mim. Ela era a única que tinha o direito de dar e tirar a minha vida, ela estava brincando com aquilo... Rachel estava brincando com a minha eternidade. Mesmo com a vontade incrível de empurrá-la e dizer algumas verdades, algo bem mais forte me prendia a ela, me prendia ao seu calor e me fazia amaldiçoar o seu choro. Rachel ergueu os olhos para mim, incrédula e disse:

            - Eu não sei o que eu sinto por você, Quinn. Eu achava que amava Finn até você dizer as três palavras que mudaram a minha vida. Eu estou confusa, pela primeira vez, eu não sei o que eu quero. Eu tinha decidido te deixar para trás e seguir com ele, mas quando você saiu da cantina com Santana... A única coisa que eu consegui sentir, foi a sua dor amplificada em mim.   

            - E o que você quer de mim? – Perguntei machucada, sentindo toda a minha força esvair-se agora que a sentia separar-se de mim. Rachel parou há poucos milímetros de mim e segurou a minha face. Olhei profundamente para ela e, mais uma vez, aqueles olhos me disseram a verdade que seus lábios não podiam. Rachel passou o indicador pela minha boca e apertou a minha cintura antes de dizer:

            - Eu estou te desafiando a me provar que, esse sentimento forte e egoísta dentro do meu peito é amor. Eu estou, mais uma vez, te desafiando a me amar e me fazer entender que não existe nada além de você aqui dentro.

            E colocou a minha mão direita sobre o seu peito que estava descompassado e batendo ruidosamente contra a sua caixa torácica. Eu olhei incrédula para ela, procurando aqueles discursos que poderiam preencher o silêncio desconfortável entre nós. Mas eles nunca vieram. Eu me aproximei e ela, também, nós tocamos nossos lábios levemente antes de ela se separar de mim e correr porta a fora.

            Fugindo de mim, fugindo de nós, fugindo da eternidade... 


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Notas finais do capítulo

Posso ser sincera com vocês? Esse é o capítulo que eu acho mais bem escrito de todas as minhas fanfics, não sei se transbordei no sentimento como queria, mas eu realmente gostei do que fiz aqui e espero que vocês também.
Alguém mais está querendo matar a Rachel? Espero que não, na verdade, espero que a entendam.
E Santana e Puck? Verdadeiros anjos da guarda não é?
Espero que tenham gostado das músicas e dos capítulos, aguardo comentários... Beijos.