Não podia acreditar no que havia acabado de ouvir. Não era possível que os meus pais tenham dito aquilo. Cheguei um pouco mais perto para ouvir melhor.

  - Pare de gritar Allie!

  - Conte para Nicole então! Eu não aguento mais Paul, mentir para ela, é horrível. Imagine como vai ser pior se ela descobrir sozinha!

  - Você acha que é fácil virar para sua filha e dizer "Cuidei de você desde pequena mas você não é minha filha" ?

  Aquilo foi o suficiente... O suficiente para eu sair de lá naquele exato instante. Como eles puderam fazer isso comigo? Durante 17 anos eles mentiram descaradamente para mim, bem na minha cara, e a pior parte é... Eles nem fizeram questão de me contar, até agora.

  Corri para o meu quarto e fechei a porta lentamente para não fazer nenhum mísero barulho. Joguei a minha bolsa em cima da cama e joguei as minhas roupas em cima da bolsa. Cheguei até o banheiro e me olhei no espelho. Os olhos, o nariz, a boca, nem ao menos o cabelo, nada era igual aos meus "pais". Senti o nó na garganta, as lágrimas nos olhos. Lembrei de meses atrás quando, por mais que não tenha contado para ninguém, eu cortei meus pulsos. Mais uma idiotice de quando eu estava bêbada. Pensar em fazer aquilo de novo me enojava. Senti aquilo pela minha garganta de novo, mas dessa vez não era o choro. Vomitei, umas três vezes e fiquei por dois minutos ali no chão, chorando, abraçando minhas pernas, esperando apenas que tudo aquilo passasse. O melhor que eu podia fazer naquela situação era tomar meu banho e ir dormir. Então eu entrei no chuveiro e tomei um banho longo e quente na esperança de relaxar um pouco. Saí do banheiro enrolada no meu roupão e quando fui para o meu quarto me surpreendi com Allie sentada na minha cama.

  - Oi filha. Não vi você chegando.

  "Filha"... Como ela consegue ser tão cínica? - Eu entrei pela minha janela, esqueci as minhas chaves e não sabia que você estava em casa. Eu tô cansada, será que eu poderia ter privacidade e dormir?

  - Claro querida, só queria te desejar boa noite. Então... Boa noite.

  - Boa noite. - A expressão no rosto dela era de partir o meu coração, mas eu não conseguiria suportar mais nada hoje. Não queria mais vê-la... Nem ela, nem Paul. Ela saiu do quarto e fechou a porta, me deixando novamente sozinha com os meus pensamentos.



  Estava deitada, olhando para cima, não iria conseguir dormir, tinha certeza. Olhei para o relógio, duas horas da manhã em ponto. Me virei na cama e fechei os olhos. Muitas coisas estavam na minha mente, mas eu não conseguia me concentrar em nenhuma. Até que pensei, pensei em algo que iria me livrar de todos os meus problemas por um tempo. Peguei o meu celular dentro da bolsa e comecei a digitar o número de Matt. Olhei no visor mas desisti de ligar para ele, já havia lhe causado muitos problemas por hoje. Decidi ligar pra Jeremy, foi exatamente o que eu fiz.

  - Ei Nic... Aconteceu alguma coisa? - Me senti aliviada em ouvir a voz dele, mesmo que tenha sido a voz de sono.

  - Aconteceu, quer dizer, não exatamente. - Não sabia como ele iria aceitar o que eu ia dizer, mas com certeza, não ia ser tranquilo.

  - Como assim? Nicole, seja direta... São duas horas da manhã e eu, definitivamente, não estou afim de te decifrar.

  - Bom... Você consegue dirigir no escuro?




  - SAN DIEGO?! Por acaso você ficou louca pra querer ir agora pra San Diego? - Jer estava pasmo com a minha não tão brilhante ideia de fugir.

  - A única forma de eu não pensar nas coisas que estão acontecendo aqui é não estando aqui!

  - Nossa, mas que ideia brilhante! Nicole, mudei de ideia... Você não está louca... Está doente, insana, com algum tipo de distúrbio, pois não é possível que você esteja falando sério!

  - Vai me levar pra lá ou não? Aposto que se eu pedir pra Matt ele me leva. - Sabia que se eu dissesse isso eu iria tirar Jeremy do sério.

  - Sabe de uma coisa? Tá, eu te levo...

  - Ai Jer.. Muito obrigada, eu... - Ele me interrompeu antes de eu terminar de falar.

  - Mas... Eu não vou te deixar lá sozinha, não sou louco!

  - Tá. Mais alguma coisa papai? - O sorriso nos meus lábios eram de deboche e ele sabia muito bem disso, mas pareceu não ligar.

  - Tem... Você está sobre os meus cuidados, então vai fazer, exatamente, tudo o que eu disser pra você fazer! E outra coisa... No meio do caminho você vai me contar o que está acontecendo!

  - Tudo bem. Agora, vamos antes que seja tarde. - Segurei ele pelo braço e puxei até a janela- porta do meu quarto.

  - Espera, eu tenho que ir em casa fazer as malas!- Ele parou até que eu comecei a puxar de novo.

  - Não, na verdade não tem. Eu tô com o meu cartão aqui pra isso. Vamos.