Samurai No Forbidden Love escrita por Kitty


Capítulo 12
Capítulo 12




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Capítulo doze

 

1

 

Quinze anos antes.

Região divisa entre os clãs Akanishi e Kamenashi.



As lanternas vermelhas foram acesas. O começo de mais uma noite. As casas de sexo uma ao lado da outra formavam um grande e estreito corredor por onde passavam todos os tipos de homens de diferentes níveis sociais. Naquela rua, por alguns instantes, as classes sociais se misturavam, tornando a se separar quando adentravam a casa escolhida. Os nobres ficavam logo nas primeiras casas, com cortinas produzidas da mais rica seda e fios de ouro. Os samurais, nas casas próximas, com uma decoração mais modesta, mas, ainda assim luxosa. Por fim, as últimas casas, sem qualquer outro adereço além das lanternas vermelhas e construídas com madeiras baratas eram frequentadas pelos demais níveis da sociedade: ronin e camponeses.

 

A primeira vez em que chegou a esta rua, ele sentiu medo. O perfume forte e adocicado das mulheres, bem como o cítrico do alcóol e a música alta o assustou. Sua mãe sempre o orientou a ficar longe dali, embora seus pai tivesse prometido que o levaria quando a idade chegasse. Contudo, Nishikido Ryo teve a sua primeira visita muito antes que tivesse a idade apropriada. Tinha onze anos e seus pais morreram seis meses antes.

 

Agora, aos treze anos, ele já tinha se acostumado com aquele ambiente. Ele conhecia os hábitos locais, o modo de agir das pessoas era quase automático; os que visitavam pela primeira vez estavam tímidos, tensos e ansiosos. Eram as vítimas perfeitas. Um encontrão, um aceno pedindo desculpas e desaparecia da vista do sujeito logo em seguida, perdendo-se entre labirinto de ruas estreitas e levando a carteira ou sacola roubada.

 

Ryo seguiu para o seu lugar preferido, uma rua atrás de um dos restaurantes meno popular. Ali ele sabia que já era seguro conferir quantas moedas de ouro havia conquistado. Dessa vez havia sido uma sacola de seda azul, bordado com fios de ouro e Ryo estranhou. Mesmo que seu alvo tenha sido um samurai, ele não usava trajes que combinassem com o material desta sacola. Provavelmente estava acompanhando o seu senhor e aquele era o dinheiro dele e não do samurai. Sorriu, pensando que tinha tirado a sorte grande e, quando verificou o conteúdo, não se decepcionou. Poderia ficar tranquilo pelo resto daquele mês.

 

Enfiando a sacola no bolso do seu hakama, ele apressou seus passos para se afastar daquela região. Não precisaria mais trabalhar naquela noite. Tendo assaltado alguém com tanto dinheiro, era melhor sumir por uns tempos. Os ricos são os mais avarentos e orgulhosos. Mais do que a quantia perdida, o que eles não podiam suportar era a ideia de ser enganado por uma casta inferior. Ryo sabia muito bem disso, muitos dos seus conhecidos desapareceram pouco depois de um grande furto. Assim, ele se afastou das ruas das lanternas vermelhas e se embrenhou na floresta. Era noite, mas ele já não tinha mais medo de fantasmas ou seres mitológicos. Tinha aprendido cedo demais que era dos vivos o que ele tinha a temer. Aproximou-se da árvore em que reconheceu a sua marca, o kanji da sua família talhado sutilmente entre os riscos naturais, e afastou as folhas caídas sobre a raíz e que escondido um buraco no tronco. Pegou o lampião escondido ali, bem como o fósforo, e a fraca chama o guiou mata adentro.

 

2

 

Novo dia, nova noite. As lanternas estão acesas novamente, atraindo mais uma vez todos os homens; A música alta vazando através dos shojis (paredes feitas com papel de arroz) percorre toda a extensa rua juntamente com os perfumes fortemente adocicados das mulheres carregados pelo vento.

 

Uma liteira ricamente decorada parou diante da casa principal e despertou a atenção dos traunseantes; as cortinas de seda escura da litera com desenhos bordados à ouro e prata foram delicadamente puxados para o lado e os serviçais ajudaram seu senhor a descer; naquele instante, seus samurais se aproximaram.

 

Encostado ao muro de uma das casas, Ryo observava a cena de braços cruzados. Calculava mentalmente o valor de qualquer objeto que pudesse conseguir daquelas pessoas e concluiu que valia a pena correr o risco. Tinha que ser rápido. Se fosse pego roubando samurais certamente seria punido severamente; uma vez que já tinha idade suficiente para entrar em um campo de batalha, em tese, ele também já era velho o suficiente para arcar com seus atos.

 

Seus movimentos foram graciosos quando se aproximou daquele grupo. Aqueles homens mal sentiram o toque entre os tecidos de suas vestes. Os olhares, geralmente atentos, estavam embaçados pela expectativa dos prazeres que experimentariam em breve e mal registraram a criança de cabelos bagunçados e pele suja que passou entre eles. Apenas um suave tilintar das moedas quando ele apressou os passos, mas o som deve ter passado despercebido também. Quando julgou que era o tempo, Ryo começou a correr, mesmo que não estivesse sendo seguido e alcançou a floresta.

 

Estava quase alcançando o lampião, dentro da árvore, quando escutou o som de metal pouco antes da voz poderosa:

 

— Ladrãozinho. Achou mesmo que seria capaz de roubar do nosso senhor?

 

Ryo apertou os maxilares e estreitou os olhos. Se fosse alguns anos mais velhos e muitos centímetros mais alto, talvez inspirasse alguma ameaça. Para aqueles três samurais, no entanto, ele não passava de um gatuno pirralho, maltrapilho e esfomeado. O tipo de pessoa inútil cuja existência era uma ofensa para os homens honrados e trabalhadores. O tipo de pessoa com a qual ninguém se importa se vive ou morre. O melhor alvo e divertimento que um guerreiro pode obter em dias tediosos de paz.

 

O brilho da lâmina de uma katana era tão atraente quanto o da mais preciosa jóia aos olhos de um samurai. Ryo, embora amedrontado, não desviou seu olhar enquanto a arma era desembainhada. Aquele gesto lhe trouxe recordações há muito esquecidas. Quando viu seu pai protegendo as terras de seu senhor, alguns meses antes de cometer o seppuku junto com sua mãe e o deixarem para trás.

 

Essa lembrança, aliada à situação em que se encontrava, provocou o espírito de Ryo. Ele era um filho de samurai, afinal. Ele não era qualquer pessoa, como zombava aquele homem à sua frente com aquele olhar de desprezo.

 

— Eu estava mesmo precisando testar o fio da minha katana. - comentou o samurai, para ninguém em particular. - Nada melhor do que rasgando a pele humana.

 

O que se seguiu aconteceu de forma muito rápida. Ryo olhou para a sua volta e mal registrou um galho mais grosso próximo ao seus pés. Quando o homem veio em sua direção, ele se agachou, pegou o pedaço de madeira e atingiu o orgão genital do samurai, que congelou seus movimentos, os braços acima da cabeça. Os outros homens ficaram surpresos e não reagiram. Ryo, também surpreso, não perdeu muito tempo, contudo. Levantou-se e atingiu com violência as mãos que seguravam a katana, que produziu um som agudo quando caiu em cima de algumas pedras.

 

— Esse pirralho… - murmurou um dos samurais, recuperando-se do choque e colocando a mão em sua espada ainda embainhada. Mas não conseguiu sacá-la. Alguém segurou sua mão.

 

Ryo não entendeu as expressões assustadas e, talvez, envergonhadas dos samurais. O recém chegado era mais novo que os outros samurais, mas usava vestes nitidamente mais caras. Percebeu, então, que se tratava de alguém importante, apesar da pouca idade. Era um samurai que devia estar se aproximando da casa dos trinta e era bonito.

 

— Tenho certeza de que Sasaki-dono não deseja envergonhar Inoue-dono. - o jovem disse e sua voz rouca, apesar das palavras formais e educadas, era carregada de arrogância. - Afinal, é apenas uma criança. Inoue-dono é perfeitamente capaz de lidar com ele.

 

A mão próxima à bainha relaxou e o jovem o soltou. Em seguida, o jovem se colocou entre Ryo e Inoue, recolhendo a katana do samurai e o entregando com respeito.

 

— Também tenho certeza de que Inuoe-dono já está satisfeito com a lição aplicada.

— É um ladrãozinho! - ele resmungou. - Eu acho que…

— Eu acho que nosso senhor deve estar preocupado com a demora de seus samurais. Porque não se juntam à ele primeiro para aproveitarem esta noite, cujo principal objetivo é entreter nosso senhor e afastá-lo de suas preocupações? A primeira rodada de sakê já foi paga. - a sua expressão, assim como sua voz, não combinava com tais palavras amigáveis. Mas elas surtiram efeito e os samurais foram embora. Inoue ainda resmungou, mas seguiu aquela ordem.

 

O jovem samurai os observou enquanto se afastavam e só depois que eles sumiram de vista, ele se virou para Ryo. E a sua expressão séria se desmanchou e começou a rir. Ryo ficou ainda mais confuso com aquela atitude.

 

— Foi um belo golpe. - ele disse, enfim - Seus movimentos são rápidos e precisos, dignos do estilo Nishikido.

 

Ele piscou. Aquele samurai conhecia a sua família?

 

— Embora esteja um pouco desgastado, o brasão em suas vestes ainda é perfeitamente reconhecível para qualquer samurai decente. - ele explicou e tocou na gola rasgada e suja. - Embora os samurais de Murakami tenham se tornado ronin após a morte de seu líder, eles continuaram fiéis ao senhor e a maioria cometeu seppuku junto com ele. Apenas uma família ficou para trás. Os Nishikido. Eles defenderam as terras de Murakami até o último segundo, para só então cometerem o seppuku. O único sobrevivente ainda não tinha idade para começar oficialmente como um samurai, mas, pelo que pude perceber esta noite, o seu pai já o treinava desde cedo.

—... Desde os seis anos. - ele praticamente murmurou, ainda incerto com aquela situação.

— Depois da morte deles, o clã Kato quis adotá-lo, mas você fugiu.

— Nenhum samurai aceita se submeter a um novo senhor, principalmente quando é o responsável pela morte do seu verdadeiro líder.

 

O jovem samurai sorriu para aquela resposta carregada de orgulho. Nishikido Ryo ainda não era um samurai, mas possuía o espírito vibrante e honrado de sua família.

 

— E é melhor viver como um ladrão?

—... Eu preciso me alimentar. Mas também não é algo que pretendo para a vida toda. - ele afirmou com uma convicção que muitos adultos não possuíriam - Vou conseguir recuperar a honra da minha família.

— Sim, você vai. Mas não desta forma. - o samurai disse - Vou adotá-lo.

— Me recuso. Acabei de dizer que pretendo recuperar a honra do nome Nishikido.

— Ora! Quem disse que lhe darei meu sobrenome? Acredito que tenha um bom potencial, mas não o suficiente para isso, seu arrogantezinho. Vou adotá-lo para que seja devidamente treinado pelo melhor samurai da região.

— Que seria quem?

— … Insolente. Claro que sou eu. - ele sorriu de canto.

 

Nishikido o olhou desconfiado, principalmente porque aquele samurai não era tão mais velho, havia menos de duas décadas entre eles, para se auto proclamar como o melhor samurai da região.

 

— Por que está fazendo isso?

— Como samurai, não posso permitir que seu talento com a espada seja desperdiçado dessa forma. E nunca sabemos o que virá com o nascer do Sol.

— Eu com certeza retribuirei este favor.

— Eu também tenho certeza disso.

— Dono sabe meu nome… Como devo chamá-lo?

— O meu nome… Você nunca deverá esquecê-lo a partir de agora… Me chame de…

 

3

Acordou com dor de cabeça. Não tinha um pesadelo havia muitos anos, ainda mais sobre seu passado. Ainda estava escuro, o dia ainda não tinha começado; ele acendeu uma vela para iluminar o quarto. Estava molhado de suor e Ryo xingou a si próprio. A guerra estava a um passo de começar e ele não podia fraquejar.

 

Por aquele homem, aquele samurai, Ryo aceitou esta missão. Não importava o quanto era arriscado, afinal, ele foi o responsável por permitir que o nome Nishikido se tornasse novamente samurai. E, o mais importante, por causa da sua posição social, um samurai reconhecido até mesmo pelo Shogun, ele conseguiu comprar as terras que pertenciam ao clã Murakami e tinham sido tomadas pelos Kato injustamente. E as entregou para Nishikido.

 

Se não houvesse este conflito entre os Kamenashi e os Akanishi, provavelmente Ryo estaria mais preocupado em reorganizar a família Nishikido. Porém, quando os rumores de que a guerra seria inevitável, ele partiu em busca do sucessor dos Murakami para que este reassumisse o clã. E, ainda, adotou um jovem para que continuasse o nome Nishikido caso vier a falecer durante a guerra. Assim, estando tranquilo em relação a sua responsabilidade com seu antigo clã e sua família, ele poderia se concentrar completamente à guerra. Por causa daquele samurai.

 

— Você está se sentindo mal?

 

Nishikido olhou para o canto oposto do quarto e viu Akanishi sentado sobre os joelhos. Há quanto tempo estaria acordado? O samurai se recriminou por não ter percebido que ele tinha acordado e se movimentado. Era o prisioneiro quem deveria estar dormindo profundamente e não ele.

 

Mas Nishikido não pode deixar de observar também que era a primeira vez que aquele rapaz lhe dirigia a palavra. Desde o incidente com aqueles samurais estúpidos que tentaram atacar Akanishi, Ryo havia solicitado a Kamenashi-dono para cuidar pessoalmente do prisioneiro. Assim que ele passou a dividir aquele quarto, mas Akanishi, até então, apenas agradeceu por tê-lo salvo e se calou. Passaram os dias seguintes em silêncio, com Akanishi ocupado com as artes; ele lia, escrevia e até mesmo haviam fornecido material para sua pintura. Nishikido revezava entre a meditação e a prática de sequências com uma espada de bambu. Era um quarto pequeno, mas ele não precisava de muito espaço de qualquer forma. E também não se esforçava para quebrar aquele silêncio.

 

— Estou bem. - ele respondeu, deixando um sorriso irônico surgir em seus lábios. - Não deveria se preocupar com seu inimigo. Akanishi-sama persiste em seus erros.

— Um inimigo que salvou a minha vida. - ele mencionou, mas sem muita emoção em sua voz, algo que fez o samurai perceber o quanto estava abatido.   

 

Nishikido havia concluído que o silêncio de Akanishi se devia ao fato de serem de clãs rivais e pelo motivo óbvio de ser um prisioneiro. Mas agora se questionava se o silêncio era algo de sua própria vontade ou se Akanishi não conseguia mais falar. Talvez o seu deteriorado espírito estivesse prejudicando também a sua saúde e, como um animal doente, estivesse evitando contato com quem quer que fosse. Fez uma nota mental de que precisava aumentar o número de visitas do médico do clã Kamenashi para acompanhar melhor o estado do prisioneiro. Seria uma lástima se ele falecesse antes que a guerra terminasse.

 

4

 

Tegoshi estava admirado com aquela cena. Não era a primeira vez que estava enfileirado, vestindo sua armadura de metal, entre tantos guerreiros do clã do Akanishi e tendo Kimura-dono discursando para eles e os motivando para o resgaste de Akanishi-sama. Mas havia algo diferente desta vez. A atmosfera entre os homens reunidos ali parecia grandiosa. Ele próprio se sentia mais forte e vibrante, como se uma corrente calorosa percorrese todo seu corpo e lhe entregasse mais confiança e coragem. Naquele momento, Tegoshi sentia que seria capaz de enfrentar o mundo para trazer de volta o herdeiro do clã e vingar Masuda.

 

Foi quando ele percebeu. Agora, mais do que antes, mais do que quando a guerra começou, Kimura os incitava com um objetivo mais nobre: resgatar Akanishi Jin-sama. Porque a disputa pelo título de daimyo, embora importante, não seria necessariamente uma questão de justiça. Mas resgastar Akanishi-sama, uma pessoa dócil e benevolente num corpo frágil, depertava nos seus samurais a indignação necessária para que eles lutassem com mais vigor.

 

Buscou com o olhar por Yamashita. Imaginava que ele deveria ser um dos mais eufóricos, porém, quando o encontrou, ali, na linha de frente, próximo a Kimura e Tanaka, Tegoshi levou um choque. O semblante continuava impassível como sempre, mas havia algo em seu olhar que o fez ter certeza de que aquele samurai não era mais o mesmo. E, talvez, nunca mais voltasse a ser. O olhar de Yamashita parecia alheio ao discurso de Kimura, parecia atravessar o samurai mais velho e visualizava seu verdadeiro inimigo. Tegoshi cogitou, corretamente, que Yamashita devia estar desejando a sua morte naquele momento e de uma forma terrível. O jovem samurai, no entanto, não imaginava que o alvo desse ódio estivesse bem ali, com eles, bradando com vigor a cada intervalo das palavras de Kimura.

 

Yamashita Tomohisa não desviava o olhar de seu pai.

 

5

 

Você nunca deve se esquecer a quem a sua lealdade pertence. Uma vez que você se distancia de seu referencial, na verdade, você estará perdendo a si mesmo.

 

Lembrava-se da época em que aperfeiçou sua habilidade com a espada. Aquele samurai que o resgatou enquanto roubava era, de fato, um exímio espadachim e ele o invejava e admirava. Quantas noites deixara de dormir para treinar por causa de uma ilusão infantil em querer se aproximar do seu nível? Ainda hoje, Nishikido estava ciente que não seria capaz de derrotá-lo em um campo de batalha. Para sua sorte, ele não era um de seus inimigos.

 

O som da porta corrediça chamou sua atenção. Ele viu Kusanagi-sensei deixando o quarto do prisioneiro e se dirigir até ele.

 

— Ele se encontra bem no momento. Não me parece que a sua apatia seja reflexo da sua doença, mas apenas da situação em que se encontra. É claro que isso pode prejudicar a sua recuperação… Eu sugiro mais passeios ao ar livre para distraí-lo.

 

Nishikido assentiu. Não devia ser um problema levá-lo para caminhar pelos jardins do palácio. Dificilmente o clã Akanishi seria imprudente ao ponto de tentar um ataque surpresa. Assim que, quando enviou a solicitação para Kamenashi-dono, logo recebeu a autorização. Aproveitou que o dia ainda estava claro e Akanishi não se recusou, mas tão pouco se mostrou entusiasmado.

 

A sua presença ainda despertava a atenção entre aqueles que habitavam o palácio, Nishikido pode comprovar enquanto passeavam. Os samurais não disfarçam seus olhares, muitos deles recheados de cobiça; outros com admiração, como os criados; até mesmo entre seus superiores a curiosidade crescia quando passavam por eles. Foi o caso de Kamenashi Yuichiro, com quem se encontraram ainda nos corredores do palácio e Nishikido se curvou educadamente para recebê-lo. Akanishi também abaixou o seu rosto, demonstrando a educação com a qual havia sido criado, sem perceber ou se deixar sensibilizar pela a atenção que recebia do herdeiro do clã Kamenashi.

 

— Espero que Kamenashi Yuichiro-dono tenha realizado uma viagem segura até aqui. Viajar durante a noite não é recomendável em tempos como o que vivemos. - Nishikido disse.

— Nishikido sempre foi um dos nossos melhores samurais. É claro que perceberia que minha viagem foi feita com urgência. Não vou lhe esconder, apesar de que não posso contar os detalhes agora, mas vim para ajudar meus pais a preparar o velório de nosso caçula.

 

E, pela primeira vez em dias, Akanishi pareceu despertar e levantou o rosto para o Yuichiro. Era um belo homem, na casa dos trinta e poucos, os cabelos longos escuros presos em um coque. Ele tinha um rosto severo, que parecia ainda mais autoritário com o bigode e o cavanhaque. Ainda vestia a sua armadura vermelha empoeirada pela longa viagem.

 

— O que… Kamenashi Kazuya-dono… Está morto? - Nishikido fez a pergunta antes que o próprio prisioneiro o fizesse, esquecendo-se de sua condição.

— Sim. Ele cumpriu bem a sua missão. - Yuichiro disse, fixando o olhar em Akanishi - Nossa vitória é representada pela estadia da jóia do clã Akanishi em nossa humilde residência.

 

Ele fez uma ligeira mesura, carregada com tamanha ironia, que fez com que Akanishi desejasse possuir uma espada naquele momento. Mas a sua irritação se foi junto com Yuichiro, quando este se afastou em direção aos aposentos de seus pais, e então Akanishi se pôs a pensar naquela informação.

 

Kazuya… Morto?

 

— Akanishi-sama não deveria demonstrar tanta preocupação com um inimigo. Oh! Esta é a segunda vez em menos de vinte e quatro horas que eu lhe dou esta recomendação. Realmente… Akanishi-sama sempre repete seus erros.

 

Apesar das palavras, Nishikido sorria.

 

E Jin pensou que até mesmo Nishikido conseguia sorrir gentilmente. Embora tal gesto fosse totalmente despropositado naquele momento.

 

6

 

A frieza daquele casal era surpreendente. Yuichiro mantinha uma postura formal enquanto anunciava aos seus pais que o terceiro filho estava morto. Ele achou que seria natural seu pai se mostrar tão indiferente, mas acreditava que toda mãe vacilaria diante de uma notícia dessas. Não aquela mulher, pelo visto, em cujas veias devia correr apenas água gelada.

 

—... Ele cumpriu com a sua missão. - foi o primeiro comentário de seu pai - Seppuku?

— Não. Morto pelos inimigos.

 

Um ligeiro incômodo transpareceu no rosto do mais velho e um leve movimento em seus ombros revelou que não estava satisfeito com aquela informação. Mas parecia aceitar essa situação porque ao menos Kazuya havia sido capaz de lhe entregar o grande trunfo contra os Akanishi.

 

— O corpo foi entregue para os homens de sua unidade. Recebi uma mensagem do principal samurai de Kazuya, Taguchi Junnosuke, de que estavam preparando o corpo para o velório. Indagam quando será possível transportar o corpo para o palácio.

— … Os homens de Kazuya continuam acampados na floresta próximo ao clã Akanishi?

— Sim. Aguardam ordens desde que Kazuya foi capturado, muitos morreram na batalha em que capturaram Kazuya, mas ainda é uma quantidade razoável de trezentos homens.

— Vamos mandar duas mensagens. - afirmou o líder do clã - Uma destinada aos Akanishi. Avise-os de que vamos iniciar as negociações após a cremação do corpo de Kazuya. A outra, para o exército de Kazuya, eles devem se dirigir para o castelo para depois viajarem até onde se encontra o seu exército e o de Kouji. Vamos concentrar as negociações nessa região. Não deveremos mais ter batalhas, eles certamente priorizarão a vida de Akanishi Jin, mas um grande exército de prontidão inibirá qualquer tentativa de um ataque depois que eles tiverem sua jóia de volta.

— Entendido, meu senhor. Quando será realizada a cremação?

— Dentro de dois dias.  

 

7

 

Dois dias.

 

Era o que estava escrito no fim daquele bilhete, que ele dobrou delicadamente e o guardou dentro de seu quimono. Assentiu para o mensageiro, que partiu em seguida. O olhar de Nishikido deixou o mensageiro após ele desaparecer no horizonte e caiu sobre as costas do prisioneiro, sentado à sua frente no gramado e observando as carpas nadando tranquilamente no pequeno lago de pedras. A suave brisa balançava os poucos fios sedosos que estavam soltos. Era um cenário repleto de tanta tranquilidade que era possível acreditar que a guerra entre os clãs não passava de pura fantasia de alguma mente criativa do rakugou¹. (1. narração de histórias)

 

— Akanishi-sama?

— Hai?

—... O senhor deve retornar para sua casa dentro de dois dias, não se angustie mais.

 

Não viu um rosto alegre, nem uma exclamação de alívio. Pelo contrário, Nishikido apenas percebeu o suspiro resignado que ele deixou escapar. E, sem se virar, disse:

 

—... Você quer dizer que em dois dias eu carregarei a vergonha da derrota do clã Akanishi. O que me disse só pode me trazer mais angustia, como espera que eu fique aliviado sabendo quando o seu clã subjugará o meu?

 

De costas, não foi capaz de perceber o sorriso dele. Caso o notasse, certamente Akanishi pensaria que estava sendo motivo de escárnio novamente, mas, para si mesmo, Nishikido admitia que estava contente em testemunhar que até mesmo o coração puro de Akanishi-sama carregava um sentimento mesquinho como o orgulho ferido. Ele era humano, afinal.

 

— Achei que Akanishi-sama ficaria contente com o final da guerra. Muitas vidas serão poupadas. Não era isso que Akanishi-sama mais desejava?

— Eu odeio esta guerra. Ela desde o seu início foi completamente desnecessária. Nos fez lutar contra nossos amigos, nossos vizinhos. Mas uma vez tendo sido iniciada, eu nunca desejei a derrota de meu pai. E nem ser a causa dela. Como posso me sentir bem? Não posso nem ao menos me juntar aos homens do nosso clã para nos defender. Minha vida inútil só trouxe problemas para minha família desde que nasci. E, agora, é a razão para a vergonha do nosso clã.

— Se é o caso…

 

Ele andou passos lentos e maliciosos até se agachar, de forma atrevida, próximo o suficiente para lhe surrar:

 

—... Porque não comete o seppuku?

 

Jin virou seu rosto com surpresa, sentindo a respiração de Nishikido bater em sua face, seus olhos se alargaram com aquela sugestão. Não disse nada e apenas acompanhou o movimento das mãos do samurai, que desembanhou a sua espada curta. Ele a colocou no chão, sobre a grama verde, e a empurrou para perto das mãos de Akanishi. Jin a tocou de leve. A lâmina fria lhe provocou um choque, mais pelo seu significado do que pela diferença de temperaturas.

 

— Eu serei seu assistente, Akanishi-dono… Se não pode viver como um samurai, recupere sua honra com uma morte digna. Eu garanto que seu pai ficará sabendo sobre isso antes que possa tomar qualquer decisão irreversível. A guerra vai continuar de forma mais justa.

 

Olhava com bastante curiosidade para o rosto pensativo de Akanishi. Certamente era uma proposta tentadora. Ter um único, embora último, ato honroso como um samurai. Um ato que pudesse devolver a honra do seu clã, proporcionando-o mais uma chance de conquistar o título de Daimiyo para a sua família e, além disso era a chance de lutar dignamente como um homem; a chance de, apesar de doente, demonstrar que podia ser útil. Sim, era uma proposta tentadora, mas…

 

O rosto de Tomohisa rompeu todos seus pensamentos. Imaginou a decepção que ele sentiria ao descobrir que tinha tirado a própria vida. Como poderia recorrer ao método a que tinha proibido o seu samurai desde sempre? O seppuku, Tomohisa havia descartado completamente dos seus princípios apenas por um desejo seu. Poderia até mesmo enfrentar uma morte vergonhosa, nas mãos dos inimigos, apenas para seguir com seu pedido. Apesar de não estarem mais juntos, Jin sabia que o seu amigo seguiria com essa promessa para sempre.

 

— Sim, essa seria uma boa ideia. Poderia resolver muitas coisas com apenas a minha morte… - ele disse vagarosamente - Mas também… Não seria apenas uma fuga? - ele deixou de olhar para a arma e encarou o samurai - Fugir da vergonha, fugir da derrota. Fugir da realidade de quem sou? Posso estar cometendo um grande erro, talvez o maior de todos, mas… Quero encarar meu destino. - ele empurrou a arma de volta para Nishikido, que guardou a espada.

 

— Akanishi-sama… Se me permite dizer mais uma coisa… De fato, Akanishi-sama possui um corpo muito frágil, mas seu espírito não é tão delicado quanto a sua carne. - ele sorriu. - Existem diversas formas de lutar e de ser um guerreiro. Ao meu ver, Akanishi-sama há muito tempo descobriu a sua própria forma de lutar. Estou sinceramente grato por ter conhecido alguém assim. Peço mais uma vez que aguente apenas mais dois dias. E tudo vai terminar.

 

Jin não o respondeu. Observava o samurai, tentando entender quem era aquele homem de verdade. Ele lhe despertava tanto sentimentos contraditórios. Sentira raiva por ter sido capturado por ele, mas não podia deixar de ser lhe grato por tê-lo salvo do ataque dos samurais de Kamenashi em seu quarto. Costumava sentir medo em sua companhia, seu olhar era frio e traiçoeiro, mas também sentia-se seguro ao seu lado porque era inegavelmente um forte samurai. Sua voz, geralmente carregada de arrogância, também sabia ser suave e entregar palavras de conforto. Nishikido Ryo era realmente uma pessoa intrigante.

 

Quem seria ele de verdade?

 

E, o mais importante, de qual lado ele estaria realmente nesta guerra?


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