Contact escrita por Zchan


Capítulo 19
O filho de Melinoe


Notas iniciais do capítulo

Nome sem graça, né? Ah, nem demorei tanto tempo pra escrever, vai. Ou você queria um capítulo do tamanho do anterior? Aquilo foi um erro mesmo. O normal é isso aqui.
Espero que gostem do capítulo.



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Aquele idiota não estava colaborando em nada para me acalmar. Primeiro, me encarava como se fosse a primeira vez em sua vida que me via. Depois, não pareceu achar que resgatar Mike era um ato de urgência.

Eu disse que ele provavelmente estava morto, mas é claro que foi uma mentira. Todo mundo sabe que tipos irritantes como ele não morrem facilmente. Mike devia estar sob os escombros, com alguns ferimentos, rindo da cara dos campistas que passavam a centímetros dele e não o notavam.

Se eu estava preocupada? Essa é uma pergunta retórica. Não lembro de ter sentido tanto medo por outra pessoa em toda a minha vida. E o maldito filho de Hades que não sabe o significado da palavra “correr“.

Agora absolutamente todos os campistas do Acampamento, mais sátiros, dríades e sabe-se lá o que eram aquelas coisas indescritíveis se amontoavam em torno dos destroços da arena. Dois meio-sangues já haviam sido retirados de lá - inconscientes, porém vivos.

Eu corria e arrastava o príncipe zumbi na direção do amontoado de seres vivos. Puxei seu braço com força o suficiente para arrancá-lo fora, caso ele não tivesse passado de “andar rápido“ para “correr tropeçando“. Sinceramente...

-Seu paquiderme! - gritei - Anda logo!

Ele me olhou com uma expressão estranha, franzindo a testa.

-Você sabe o que é um paquiderme? - perguntou.

-Não faço ideia - respondi, sem nem me esforçar para lembrar - mas tenho certeza de que você não gostaria de ser comparado a um.

Ele revirou os olhos. Mas que merda. A culpa é minha se eu não tenho um QI 300?

Eu realmente preferia largá-lo babando na barriga do semideus morto-desacordado, mas sabendo como Mike é, tenho certeza que ele dará algum sinal de vida ao ouvir a voz do Nicholas. Não gosto disso, contudo é a mais pura verdade.

Chegamos mais ou menos do mesmo jeito que Mike chegara quando houve o tumulto com Holly. Dessa vez, porém, não fui eu quem caiu. O filho de Hades conseguiu tropeçar no pé de alguém e cair para a frente, levando dois semideuses inocentes e um sátiro junto.

Virei-me para a enorme pilha de mármore que outrora fora nossa arena. Inspirei e berrei com todas as minhas forças, minha voz se sobrepondo ao enorme barulho de conversas, choros e reclamações de dracmas roubados.

-MIKE! SEU ESTÚPIDO PREGUIÇOSO! SAIA JÁ DAÍ ANTES QUE EU ENTRE E TE DÊ UMA SURRA!

-Ele não pode te ouvir. - Nicholas falou, logo atrás de mim. Rosnei.

-Ah, ele pode sim. Só não deve querer ser salvo tão cedo. Tente você. Ele vai te ouvir. Ele sempre ouve. - acrescentei com amargura.

-Hã... Certo. Espero que você tenha razão. - ele tomou fôlego - MIKE! SE NÃO DER UM SINAL DE ONDE ESTÁ, COMO ESPERA QUE EU TE TIRE DAÍ?

Não houve resposta, nem nada que se parecesse com uça. Senti uma pontada no peito. Ele... estava mesmo morto? Não podia estar, né? Ele... não morreria por causa de algo idiota como um desabamento...

Meus joelhos cederam. Imaginei que simplesmenye cairia ao chão, mas alguém me segurou. Uma garota com um sorriso que se estendia de uma orelha à outra, que apontava freneticamente para os escombros. Seus cabelos azuis-roxos não permitiam que eu visse seus olhos, mas a única doida assim era a Megan.

Olhei para o lugar que ela apontava e senti lágrimas surgindo em meu rosto. O plano funcionara, afinal. Mike estava sendo retirado dos escombros por Nicholas e dois outros campistas de Apolo.

Senti que eu começava a sorrir, porém minha alegria durou pouco. Megan também desmanchou o sorrio, substituindo-o por um rosto de surpresa e horror. Nem imagino qual tenha sido a minha expressão. Se fosse refletir meus sentimentos, deveria estar com uma mistura de dor, medo, choro, raiva e todos os sentimentos negativos imagináveis.

Mike estava coberto de sangue. O lado direito de seu rosto possuía um enorme corte na vertical. Com um arrepio, percebi que o corte atravessara seu olho. Seus braços pendiam de lado molemente, um deles dobrado num ångulo estranho. O mais assustador era sua perna direita. Ou o que restara dela.

Eu não quis olhar mais. Não fui a única. Vários meio-sangues deram as costas à cena, enjoados. Desta vez realmente caí de joelhos no chão, segurando a cabeça entre as mãos e preguejando em grego.

Aquilo era horrível. Até mesmo para semideuses. Senti meu corpo tremer em desespero. Lágrimas escorreram dos meus olhos. Ele estava vivo? E mesmo que estivesse, conseguiria se recuperar?

-Acalme-se - Megan me disse, com uma expressão séria - Vai... Vai ficar tudo bem.

-Mesmo? - minha voz saiu perturbada.

-Não - ela admitiu - mas se você entrar em pånico, será pior.

Respirei fundo. Megan tinha razão. Agora eu deveria me ocupar em chegar até Mike e avaliar se seu estado era ou não digno de desespero. Depois, falaria com Quíron a respeito de quem poderia ter derrubado a arena. Tinha de haver um culpado.

E acho que já da pra ter uma ótima ideia do que eu faria caso o encontrasse.

Levantei do chão e quase fui derrubada por um garoto que saiu correndo assustado, com medo da minha cara vingativa, provavelmente. Cuido dele depois.

Já estava chegando perto de onde um grupo de filhos de Apolo se amontoava, cuidando dos feridos, quando de repente um silêncio se abateu sobre o Acampamento. Até os animais na floresta pareciam ter parado de emitir som.

Me dei conta de que não podia me mover. Ninguém parecia conseguir, nem mesmo Quíron ou os filhos de Hécate. Senti um arrepio percorrendo minha coluna quando o barulho de passos ecoou.

Vinha obviamente dos destroços. Felizmente, eu estava ligeiramente virada naquela direção. Enxerguei de esguelha o moleque baixinho de cabelos         bagunçados andando calmamente por cima do que restara da arena.

Ryan.

Mas não era o Ryan que eu conhecia. Podia tê-lo conhecido há pouco tempo, porém já sabia o suficiente a seu respeito para compreender que aquele sorriso cínico não combinava com sua personalidade.

Ele chegou à base, abriu os braços e deu uma gargalhada, inclinando a cabeça para trás, como um daqueles vilões clichês. Riu até acabar seu ar. Quando terminou, ajeitou o corpo e encarou o grupo de meio-sangues perplexos com algo que parecia ser pura repulsa estampado no rosto.

-Já podem se mover, se quiserem. - disse - Ainda não tenho poder o suficiente para segurá-los por mais de um minuto. É claro que é só uma questão de tempo até que eu o consiga. Foram alertados sobre mim, se não me engano. Ninguém acreditou, não é? Esta foi sua recompensa por isso.

Os campistas continuaram em silêncio. Alguns pareciam tentar murmurar algo com os amigos, entretanto o choque nos paralizara muito mais do que o feitiço de Ryan. Finalmente, Quíron se pronunciou, cauteloso.

-Garoto. Não sei quem é e muito menos porque faria essas coisas, mas creio que esteja ciente de que agora é um inimigo nosso.

-Eu sei. - Ryan retrucou - Como se isso fosse grande coisa. Eu posso fugir, se quiser. Minha mãe me deu essa opção. Mas ainda tenho alguns servicinhos pra terminar antes...

-Que se dane! - alguém gritou - O que estamos esperando? Pra cima dele!

Todos atacaram ao mesmo tempo, sem qualquer estratégia. Foi o caos. Era atropelar ou ser atropelado. Corri para o lado, me desviando da horda raivosa, na direção onde Mike e os outros feridos estavam.

Um pequeno grupo de campistas se amontoava ali, assistindo à cena sem se envolver.

-Francamente! - uma garota de Atena bufou - Não vão conseguir pegá-lo assim. Eu apostaria que o suposto filho de Melinoe já escapou, se não tivessem roubado meus dracmas.

Não consegui chegar mais perto. Logo os campistas se acalmaram. Aquela garota acertara, Ryan conseguira fugir. Não havia sinal algum dele.

Novamente, tentei espiar Mike por entre o amontoado de semideuses. Por que não o levavam para a enfermaria logo? Quando estava quase conseguindo enxergá-lo, alguém interrompeu minha visão, me abraçando e chorando desconsoladamente. Haviam retirado um quarto corpo dos escombros, entendi em meio aos soluços, um corpo morto.

Tentei afastar a pessoa várias vezes, até que me vi obrigada a atirá-la rudemente de lado. O meio-sangue xingou, caindo no chão e sendo pisoteado por uma manada. Ops. Espero que não tenha acontecido nada grave.

Chutei mais quatro semideuses para longe, finalmente chegando perto dos filhos de Apolo e dos feridos. Uma garota se debruçava sobre Mike, passando algo nas feridas em seu tronco. Tinham tirado sua camisa e a perna esquerda da calça fora cortada um pouco acima do joelho, deixando a metade sobrevivente de seu tornozelo à mostra - enfaixada, mas as bandanas já estavam cobertas de sangue.

Tive náuseas. Senti meu corpo cambalear. Meus membros pareciam não querer mais responder aos meus sentidos. Reparei que havia uma quantidade considerável de meio-sangues, sátiros e até mesmo algumas dríades espalhados no gramado ao lado, visivelmente desmaiados. Certo, logo vou acabar me juntando a eles.

- Annelise - uma voz familiar, rouca, me chamou. Virei imediatamente, abalada demais para mandá-lo não me chamar assim. O filho de Hades olhava de mim para Mike, atordoado. – Eu... sinto muito. Não tinha te reconhecido antes. E...

- Tudo bem – cortei. Não queria ficar ouvindo desculpas esfarrapadas. Não tinha importância, no momento.

- Espere! É que... eu acho que talvez não seja uma boa ideia você se aproximar... de mim e de Mike... de novo. – ele parecia meio confuso – Não entendi direito ainda, mas parece que tudo isso que está acontecendo é por causa de nós, e Leon. Você deve ter notado que... é perigoso...

- E quem você acha que eu sou? A mocinha indefesa que vive na torre? – bufei, irritada. Segurei-o pelo colarinho da camisa e ergui-o no ar, mesmo ele sendo cerca de dez centímetros mais alto do que eu. – Você conhece minha fama e sabe que ela é verdadeira. Mais do que isso, você também sabe que eu não vou com a sua cara. Se continuar tentando me deixar de lado, posso garantir que não vai dormir tranquilo por um bom tempo. Um bom. Tempo.

Ele tentou se libertar de minha garra, porém apenas conseguiu quase se esganar. Desistiu e olhou para mim com uma expressão estranha... Temor? Pena?

- Eu sei por que você não gosta de mim. É como antes. Somos quatro... E você está como se fosse no lugar da minha irmã. Você não gosta de mim porque sente ciúmes de Mike, não é?

Meus olhos se arregalaram. Antes? Acontecera algo parecido com isso antes? Quando? Irmã? Ele não tinha uma irmã. Não mais nova, e não no Acampamento. E o que tinha sermos quatro? E daí? Podiam ser cinco. Na verdade, levando em conta que Ryan também está envolvido nisso, somos cinco.

Meu momento de surpresa demorou somente o tempo para que eu processasse a última frase.

- Não é da sua conta – sibilei – Cale a boca antes que eu te atire no lago com uma pedra presa ao pescoço.

- Então é verdade – ele concluiu – merda. Eu não quero que você morra. Só vai piorar a situação.

- E por que eu iria morrer?

- Porque... Ah, não vai fazer sentido para você. De qualquer jeito, é sério. Acho que ainda dá tempo de você se afastar. Por favor.

- Idiota. Eu não vou morrer. Não vão conseguir matar Annie tão facilmente. E pare com essa cara de preocupação, está me dando nos nervos. Já sei. Seu único amigo e seu fantasma estão inconscientes. Aí agora você está tristinho e quer impedir que ocorra uma tragédia maior com os outros, que nem foi com você? – ele permaneceu em silêncio. Continuei falando – Que meigo. Não sabia que um zumbi idiota que nem você se importasse com a vida das pessoas.

- Pare – ele disse, a expressão ficando sombria – Me largue. Certo, eu tentei. Não sabia que você era tão cínica assim. Foi perda de tempo. Espero que aproveite bem o que está fazendo a si mesma.

Antes que eu pudesse retrucar, o filho de Hades se soltou e desapareceu na multidão. Olhei em volta várias vezes, mas não consegui avistá-lo. Que se dane, também. Não preciso dar ouvidos às preocupações de um babaca como ele.

Percebi que finalmente estavam levando os feridos para a enfermaria. Eram necessários três garotos para levar Mike sem deixá-lo pendurado com a cabeça raspando no chão. Comecei a correr na direção deles, pretendendo acompanhá-los, porém é claro que alguém me atrapalhou.

Não tinha percebido que passava na orla da floresta até que uma mão surgiu da escuridão e me puxou para lá. A princípio, não consegui perceber quem era, até que o garoto falou, a voz ainda num tom irreconhecivelmente sádico.

- Annie, Annie – Ryan sorria, me olhando como se eu fosse uma presa – Você deveria dar ouvidos aos conselhos dos outros, sabe. Agora vai ter que me dar uma ajudinha.

Senti o ódio percorrendo meu corpo. Aquele pirralho havia ferido Mike. Fechei o punho e soquei-o com força o suficiente para quebrar a parede de meu chalé. Sei disso porque já fiz.

Ele não estava mais lá. Virei, e Ryan me olhava por trás, parecendo se divertir. Ataquei mais uma vez, e mais uma vez ele sumiu.

- Que diabos..? – comecei, mas não pude terminar. Só tive tempo de ver o enorme martelo de bronze celestial descendo em direção à minha cabeça.


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Notas finais do capítulo

Então, acho que tenho a previsão de 25 capítulos para a Contact. Espero que tenham gostado desse, e que continuem gostando dos próximos.
Agora... será que alguém vai deixar review?