A Esperança Dos Renegados escrita por Aldneo


Capítulo 34
CAPÍTULO XII: Novos passos em uma antiga jornada




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Alguns dias depois, enquanto lampejos de um fraco sol matutino entravam por entre as frestas das folhas da janela fechada daquele quarto, Alan desperta. Se levanta lentamente, já estava completamente recuperado, fisicamente, porém era claro que alguma coisa ainda o incomodava. Ele sai do quarto e segue pela singela casa de seu amigo que o estava hospedando. À medida que se aproximava da oficina improvisada no cômodo inicial da casa, um som começa a se alastrar pelos cômodos, uma música simples, na qual, em um alegre ritmo folk, o refrão era repetido por diversas vezes: - “Dal'she deystvovat' budem my!”, ao entrar na oficina, ele vê o velho Esquyeu trabalhando com uma solda em algum equipamento numa bancada, enquanto que em outra bancada, não muito longe dele, via-se uma gambiarra em volta de um velho drive de CD, que era alimentado por um acumulador elétrico de um lado, e, por outro, emitia sons através de um cone de altifalante, estando as três peças sobre a mesma mesa e interligadas por fios.

Provavelmente por estar concentrado no trabalho e distraído com a música, o velho na cadeira de rodas leve algum tempo até perceber a entrada de seu hóspede no recinto. Ao vê-lo, o reconhecimento é amigável. Alan lhe questiona sobre a música, ao que o técnico responde: - “É antiga, mas gosto dela, tem um bom ritmo... Se eu não me engano o refrão diz algo como 'Agora somos nós quem mandamos'... Acho que combina com o momento, não?” Alan apenas força um certo sorriso. Percebendo que o rapaz parecia querer algo, Esquyeu se adianta: - “Bem, vejo que já está melhor, não?”, ao que lhe é respondido: - “É já estou pronto para ir embora...”

— “Então você vai mesmo... Devo avisar o garoto?”

— “Não... eu lhe disse antes... ele fica, você o ensina... o que for preciso.”

— “Não sei se gosto dessa ideia... Mas acho que você já está decidido... Bem, também acho que não estaria aqui ainda se não houvesse algo mais que quisesse...”

— “Bem... tem algo... A corrente que me deu da última vez, ela é boa, mas é bem difícil de seguir com ela...”, Alan comenta apontando para o equipamento, que repousava sobre uma pequena mesa, em uma outra bancada nas proximidades dos dois. Ao que Esquyeu sorri e comenta:

— “É claro que ela é! Tem pelo menos uns 3 metros de corrente ali, puro metal! Mais o mecanismo... Aquilo eu fiz para você pôr, usar numa missão ou algo do tipo e depois tirá-lo, não fazia ideia que você acabaria exilado... Não é equipamento para vagar por ai no exílio. Mas tenho trabalhado em algumas coisas novas, acho que você gostaria de algumas delas.”

— “Desculpe, velho, mas não estou afim de voltar a ser cobaia de seus experimentos... Da última vez que provei um de seus inventos, acabei com o braço quebrado.”

— “Hey, aquilo foi um acidente... Teste e erro, oras! Aquilo precisava, e admito que ainda precise, de alguns ajustes... Mas creia-me, ainda vou achar um jeito de pôr uma canhão de 40 mm no seu pulso, sem que o recuo do disparo desloque seu braço... Mas o que queria lhe mostrar seria algo distinto, bem mais simples, mas creio que você acharia bem útil.”

O técnico então o chama para segui-lo até um armário próximo à parede no final do cômodo que estavam. Ali, ele abre uma das portas do móvel de madeira e procura por alguns instantes até encontrar uma caixa, que entrega para Alan, pedindo que ele coloca-se. Após o que, lhe é dado mais instruções: “Coloque a anilha do cordão em algum dos dedos da mão e dê um movimento para puxá-lo.” Ele o fez, e uma pequena arma é estendida até sua mão, ele contempla o pequeno revolver, e se volta para o técnico com uma expressão de “mas, o quê?” no rosto, ao que este lhe explica: - “É uma pequena arma, 9 mm, com capacidade para uma bala, fica escondida na manga, então você ativa o mecanismo e tam, a arma é posta na altura certa para você empunhá-la, simples, mas muito prático, não é?” Diante da explicação, Alan demonstra certa admiração, ainda que acabasse por rechaçar: - “Uma única bala?”

— “Hey, isto não é uma arma de assalto, é tipo um último recurso... Imagine que tu seja capturado, e o adversário pegou suas armas e o está ameaçando, você então tem, literalmente, esse truque na manga, com essa bala você pode abatê-lo de surpresa ou pelo menos usar como distração e ganhar tempo para recuperar uma das outras armas ou fugir. Também pode ser bem útil para um ataque surpresa, não crê?”

Diante da descrição, Alan acaba por aceitar o acessório, ao que Esquyeu lhe diz, meio irônico: “Custa 600.” O rapaz lhe encara desconcertado, ao que ele se justifica: “O que foi, este é meu sustento. Ok, por ter me devolvido a corrente inteira e funcionando, te deixo pela metade do preço. Tem mais alguma coisa que queira?” Alan guarda silêncio por alguns instantes, antes de lhe dizer: - “Gostaria de saber o que houve com os outros. Digo, os do templo, os demais monges e imortais...” Diante da pergunta, Esquyeu toma um tom mais sério, e se põe a lhe dizer:

— “Bem, quanto Paulo começou a voltar as pessoas contra os monges, muitos estavam dispostos a acabar com ele; mas acabar com ele implicaria em dar o mesmo destino aos que estavam se juntando a ele, e não eram poucos. O desgraçado era um filho da puta, mas tinha lábia e sabia convencer. Não preciso lhe dizer que Jeremie não aceitou a ideia de atacá-los, aquele velho tolo, com seu discurso de 'jamais se voltar contra aqueles que havia jurado proteger e conduzir'. Ele tentou negociar, mas sem resultados, quando os homens de Paulo começaram a atacar parecia inevitável a carnificina... Mas ele evitou, se recusou a lutar até o fim, prometeu a Paulo que se entregaria em troca de todos os imortais poderem sair deste campo em segurança para buscarem outro lugar em que seguirem com suas vidas. E assim foi, Jeremie foi muito nobre, como sempre. Mas é claro que não se poderia esperar qualquer nobreza de um bastardo como Paulo, depois que os demais monges partiram, ele montou todo um verdadeiro festival, para comemorar a 'liberdade' que conquistara para o campo... E o ponto alto do festival seria a humilhação de Jeremie... Me lembro de Paulo tentando zombar do velho, esbravejando e lhe perguntando o que sua religião lhe diria sobre aquilo, enquanto Jeremie, austero, apenas recitou o Livro: 'O demônio cria esperança com suas promessas, mas tudo é mera ilusão', não preciso dizer que isto irou muito Paulo, que puxou sua arma lhe retrucando 'você não manda mais aqui velho, já não está no controle, posso acabar com sua vida agora, e, me diga, se Deus faria algo para impedir isto', e novamente Jeremie calou a todos respondendo 'só o que a Divindade faria seria receber minha alma no Éden', e estas foram suas ultimas palavras, mas foi o suficiente para muitos se voltarem contra Paulo.”

— “Não creio que os imortais abandonaram Jeremie assim... Ele era nosso líder...”, Alan contesta, ao que lhe é respondido: “Exatamente, ele era o líder, e essa foi sua decisão, sua vontade, muitos dos demais até relutaram, mas obedeceram e se retiraram, afinal todos o respeitavam e ninguém ousava questionar suas ordens. E sua ordem foi que a menor quantia de sangue fosse derramada.” Alan se pôs a refletir um pouco, ao que perguntou também: - “Sabe o que aconteceu a outros monges... com... Samaria?” Esqueyu se silencia por um pouco, antes de responder: “Ela foi atrás de você... Foi uma das que obedeceram Jeremie sem concordar com ele. Mas ela fez mais que isso, juntou alguns outros monges que concordavam com ela e foram buscar você, acreditavam que se alguém poderia mudar a ideia de Jeremie, esse alguém seria você, afinal, era praticamente o filho dele.” Alan se perturba com o relato, mas insiste em questionar se ele saberia algo a mais do que haveria ocorrido com o grupo, ao que lhe é dito com visível pesar na voz: “Não sei... Bom estou certo que eles não o encontraram, não é... Nunca mais vi qualquer um deles... Mas... Bem, não sei se é creível, mas há umas 2 ou 3 semanas, alguns de meus fornecedores me contaram uma história interessante. Contaram que teriam visto uma jovem vagando por entre os rochedos à sudoeste daqui, dizem que estava com roupas maltrapilhas, mas que lembravam trajes de uma monja... Falaram que foram atrás dela para lhe tentar ajudar, embora creio que, pelo tanto que os conheça, eles foram atrás dela buscando mesmo é outra coisa... mas, isso não vem ao caso. A questão é que eles disseram que quanto conseguiram encontrá-la e se aproximaram dela, ela os atacou e puderam ver que estava apresentando os sintomas iniciais de contaminação... Pelo que me descreveram, ela lembraria bem a Samaria...”

Alan senta-se em uma cadeira próxima, visivelmente abalado. Ele murmura consigo mesmo “é minha culpa...” Esquyeu tenta lhe falar palavras de consolo, porém estas lhe são ignoradas, até que ele parece voltar a si, e lhe questiona: “Você ainda tem algo que possa disparar dardos?” Surpreso com a reação, o técnico apenas responde: “Tenho uma Viper de ar comprimido, posso adaptá-la para dardos... Mas... mas... Espera, eu sei o que está planejando, e você sabe tão bem quanto eu que não dará certo! Não há como salvá-la! O máximo que poderia conseguir seria lhe dar consciência durante uma morte agonizante!” Porém, Alan apenas lhe responde seriamente: “Não posso deixar que ela se vá sem que eu lhe peça perdão.” Diante da afirmação, o técnico acaba se rendendo e, ainda que demonstrasse certa relutância, declara que lhe prepararia o que pediu. No dia seguinte, ainda de madrugada, antes do sol romper a alva, Alan reúne suas coisas, e parte.

Algumas horas depois, Ezequiel também desperta e ao andar pela casa se encontra com Esquyeu na oficina, o qual parece não ter dormido nada por toda a noite. O jovem lhe questiona por Alan, pois os dois dividiam o quarto de hospedes da casa e Ezequiel não o encontrara, ao que o técnico lhe responde: - “Ele foi fazer uma loucura, talvez se matar...”, antes que o jovem o pudesse responder, Luize chega na oficina carregando algumas coisas, ela questiona o técnico: - “É verdade mesmo o que me mandou dizer?”, ele confirma, ao que ela demonstra descontentamento e se volta a Ezequiel: - “Desculpe, mas preciso que você vá atrás dele.”, o jovem mal consegue falar, mas se mostrava visível que ele não entendia o que estava havendo, ao que ela lhe informa: - “Creio que Alan está perturbado... e perdido..., Preciso que alguém vá atrás dele e... o salve... ou pelo menos tente lhe devolver o juízo... E você é o único que temos de momento.” O jovem tenta se esquivar dizendo não estar preparado, ao que Luize lhe oferece a bolsa que carregava, lhe dizendo: - “É o que posso lhe oferecer, algumas doses de vacina, mantimentos para alguns dias, uma espingarda e algo de munição. Não é muito, mas deve ser o bastante até alcançá-lo. E se você esteve com ele nestes últimos tempos, deve ter aprendido o suficiente para sobreviver pelo menos alguns dias.”


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