A Esperança Dos Renegados escrita por Aldneo


Capítulo 35
CAPÍTULO XIII: Motivações




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/178257/chapter/35

Tarde da noite, no laboratório-búnquer, Yosef trabalha na fabricação de diversas doses de vacina, sendo assistido por Deborah em todo o momento. Ambos trabalham até tarde, embora a garota não faria muito mais que assistir. Alta madrugada, o velho doutor se alegra em terminar. “Agora que temos uma quantidade considerável”, ele comenta com sua nova assistente, “você poderá levar até os demais sobreviventes e distribuir entre eles. E esta nova fórmula tem mais tempo de duração e acarreta em menos danos colaterais. Tenho certeza que lhes agradará ao ponto de, pelo menos alguns deles, se proporem a nos ajudar a produzir mais e continuar pesquisando. Talvez com o apoio e materiais adicionais eu consiga até mesmo chegar a uma cura definitiva.”

A garota sorri e concorda com ele: “É, isto seria muito bom... Faremos o possível não é mesmo. Bem acho melhor descansarmos um pouco. Quero sair amanhã bem cedo, de preferência antes de amanhecer, para evitar ao máximo encontros com infectados, irei até algum dos campos de sobreviventes mais próximos, para lhes oferecer estas vacinas”. Yosef concorda com ela e lhe diz para ir descansar o restante da noite, prometendo que deixaria tudo pronto para sua partida de manhã.

Pouco antes do amanhecer, enquanto ainda estava escuro, Yosef desperta a garota e a conduz, em meio aos bocejos dela, até a sala antes da saída do búnquer. Ali ele lhe indica, sobre uma bancada, as coisas que havia preparadas para sua jornada. Ela, devido a sonolência, demora algum tempo para compreender o que tudo aquilo significara, porém, de forma quase que automática, apanha suas armas e a mochila que o doutor lhe havia preparado. Ela reclama sobre o peso, ao que ele lhe explica: “Bem, ai estão algumas doses da vacina para você distribuí-las, junto com mantimentos para alguns dias e alguns equipamentos que achei que lhe poderiam ser úteis, como granadas de gás contra infectados e ferormônios de camuflagem, afinal estes itens já lhe mostraram sua valia, não foi. Inclusive lhe preparei também uma refeição especial de peixe assado com vegetais, que você parece ter apreciado.” A garota agradece o esforço e a atenção do doutor, toma coragem e se dirige ao lado de fora do búnquer, deixando a promessa de seu retorno. Algum tempo após deixar a proteção do local, e se afastar alguns tantos metros, ela comenta consigo mesma, com aparente euforia: “Eu vou ficar rica! Imagine só por quando eu vou poder vender essa vacina... E depois é só convencer o bom doutor a fabricar mais, eu vendo mais, e mais dinheiro para mim. Finalmente minha sorte está mudando! Também posso ver se vendo algumas destas granadas... e do... feniormo... desse negócio que faz os infectados não me perceberem... Com certeza darão um bom dinheiro, mas só se eu achar os compradores certos...”, ela então se põe pensativa, raciocinando consigo mesma: “Mas onde eu deveria ir primeiro... Acho que deveria evitar a área dos abrigos; já tive muita encrenca por lá... Talvez nos campos a sudoeste daqui... Parecem um bom lugar mesmo, e além disso, nestas áreas os Assassinos quase não tem influencia...” Decidido o destino ela logo se põe em marcha, atravessando aquele distrito industrial e deixando a cidade enquanto o sol ainda estava começando a despontar no horizonte.

Ela atravessa largos campos inóspitos e estéreis, ao longo do curso de uma antiga rodovia de quatro faixas, separada por um canteiro central, com duas faixas em cada sentido. Ao longo da rodovia, vez e outra se despontavam alguns veículos abandonados e já parcialmente corroídos pela ferrugem, além de que, em alguns pontos, também se podiam ver algumas placas e sinalizações de trânsito, caídas ao longo da pista ou mesmo ainda em seus postes, os quais já não se mostravam mais tão firmes quanto algum dia teriam sido. Nas laterais da pista também se podiam notar em diversos pontos, restos mortos e decompostos de vegetação e algumas construções abandonadas, algumas simples, como meras paradas de ônibus e outros maiores, como galpões que poderiam ter abrigado armazéns ou pequenas fábricas. Tudo ao longo daquele caminho nutria a atmosfera local de completo desolamento, inclusive o perpétuo e mórbido silêncio que dominava aquelas paragens, ainda que este fosse interrompido ocasionalmente por estranhos e distantes urros e alaridos.

Passadas umas 5 ou 6 horas de caminhada; o calor começava a se tornar sufocantes, embora o céu se mostrasse repleto de nuvens, havia uma sensação abafada de mormaço. O cansaço começava a avançar sobre Deborah a medida que ela avançava ao longo daquela antiga rodovia. O ambiente ao redor também começaria a mudar, aos poucos, trechos de pequenas cidades abandonadas despontavam no horizonte, que iam, aos poucos, mostrando colinas e vales no lugar dos largos campos de antes. Cidadezinhas que seriam os destinos das saídas da rodovia que surgiam em certos intervalos de distância. Em certo ponto, a margem direita da rodovia também passaria a ser acompanhado pelo leito seco do que um dia teria sido um sinuoso rio, no qual, o solo seco e rachado parecia alimentar ainda mais a sensação térmica abafada, ao ponto da garota nem perceber quanto passaria por cima de uma placa de sinalização, caída no chão, de uma coloração marrom, já bastante despotada e parcialmente oxidada, mas onde ainda se podia ler a indicação: “CAVERNAS DO DIABO 5 KM”.

Ela continua avançando, até chegar em um lugar que parecia ter sido uma parada de caminhões no passado. O local possuía um amplo pátio asfaltado, “protegido” por uma cerca de alambrado, o que teria sido um posto de combustível, dois galpões abandonados que não se podia definir exatamente o que seriam (provavelmente instalações de alguma oficina) e um terceiro prédio, o qual chamaria mais sua atenção, era uma construção com uma pintura branca (que já se mostrava bem despotada) e em seu todo ainda se via parte da inscrição com grandes letras vermelhas “LANCHONETE E RESTAURANTE 24 HRS”. Ela então decide adentrar o local para fugir um pouco do calor e descansar antes de prosseguir, já que ela sabia que ainda teria uma jornada considerável pela frente. Ela atravessa o pátio, que apresentava rachaduras no asfalto e uma boa quantidade de lixo espalhado por ele, onde ainda se podia ver uns dois caminhões, com suas carretas, abandonados no local.

Ela adentra ao “restaurante” cautelosamente, atravessando a porta dupla de vidro, que demonstrava já estar quebrada e arrombada a um bom tempo, e se depara com um ambiente escuro, ainda que a luz do dia adentrasse pelas amplas janelas da parte frontal, as quais o vidro já estava esmiuçado, e dos quais se podiam perceber alguns cacos espalhados pelo chão. Tudo ali se via sujo e em estado de total abandono. Havia diversas mesas e cadeiras, com pratos e talheres, copos e garrafas e outros trastes cujo estado de deterioração mal permitia identificar o que um dia teriam sido, e só poderiam ser definidos como lixo mesmo, espalhados por toda parte. No fundo do salão, havia um balcão empoeirado, antecedido por algumas banquetas, várias delas já quebradas ou caídas ao chão, e, por detrás dele, junto a parede, algumas prateleiras, onde ainda se viam algumas garrafas e potes. Não muito longe do balcão, também se via a porta dupla que, ao que tudo indicava, daria acesso a cozinha. Ela observa tudo ao derredor, embora, de fato, ali não se mostrava nada que chamasse a atenção, e mantinha os ouvidos atentos, que apenas capitavam o absoluto silêncio do local, tudo indicando que o local estaria seguro. Ela então segue até uma das mesas mais próximas ao balcão, testa um pouco sua solidez e, após comprová-la, põe a mochila que carregava encima dela, para descansar do peso, também deixa ali encima a Uzi que carregara na cintura, antes de pegar uma cadeira, caída nas proximidades, levantá-la, e se assentar, para descansar um pouco. Ao relaxar um pouco e se estirar na cadeira, ouve-se ecoar pelo local o roncar de seu estômago. Rendendo-se a fome, ela puxa para perto de si a mochila, buscando nela algo de comer que Yosef lhe asseguraria ter posto entre seus mantimentos.

Quanto ela parecia ter encontrado o vasilhame com a refeição em sua mochila, ela ouve passos se aproximando e, num relance, se volta para a porta de entrada, onde se depara com Alan a encarando friamente. Logo ocorre o reconhecimento hostil, com ambos soltando um: “Você!”

Deborah rapidamente tenta apanhar sua arma que estava sobre a mesa, juntamente com suas demais coisas, porém Alan percebendo o que ela faria, rapidamente saca sua espingarda e dispara contra a mesa, que é atingida em cheio e jogada ao chão, espalhando as coisas da garota pelo chão do local. Enquanto que ela rola pelo chão, numa outra direção, e se aproximando do balcão, salta por sobre ele, apoiando uma das mãos por sobre o tampô para facilitar o movimento, se ocultando por detrás dele. Um segundo disparo atinge o balcão. A estrutura já fragilizada pelo desgaste do tempo, acaba por desmoronar na parte atingida. Por sorte a garota ainda consegue se esconder por detrás da parte que continuava inteira. Enquanto ela se lançava para detrás dele, mais um disparo é realizado, atingindo as prateleiras da parede detrás do balcão. A carga de chumbo faz a estrutura deteriorada desmoronar, fazendo com que garrafas, potes e lascas caíssem ao chão junto com ela, e por sobre ela também, levantando um nuvem de poeira. Enquanto o som de objetos caindo e rolando pelo chão ainda ecoavam pelo salão, se ouvia, ao fundo, Alan bombeando a arma e o cartucho vazio, ejetado pelo bombeio, caindo e quicando algumas vezes pelo chão. Ele se aproximava, passo a passo, do balcão. Ao chegar nele, em um rápido movimento ele verifica o seu outro lado, com a arma empunhada, porém constata que ela já não estava atrás daquela estrutura de madeira, provavelmente teria se deslocado ao longo dele para alguma de suas extremidades. Antes que o justiceiro decidisse qual verificar primeiro, uma velha garrafa voa em sua direção, atingindo-o próximo ao rosto. Neste instante a garota o ataca com um chute, forte o bastante para derrubar sua arma, vendo-o desarmado, ela intenta fugir. Porém Alan investe contra ela, alcançando-a, conseguindo agarrá-la com o ombro na altura da cintura e, usando do impulso da investida, a lança por sobre uma das mesas. Deborah rola por cima da mesa e cai por detrás dela, com o impacto a mesa também desaba, encobrindo com seu tampo a garota. Alan ainda recorre ao revolver que carregava em um coldre do lado direito da cintura e dispara três vezes contra o tampo, as balas o atravessam, sendo que o terceiro disparo passa a centímetros da garota, que se comprimia contra o chão, por detrás da mesa, tentando se proteger.

“Você não tem como escapar”, Alan a intima, e o fato era que Deborah reconhecia isto. Já sem opção, a garota toma coragem e se levanta diante dele, e mesmo demonstrando pavor, ela ainda consegue espasmar algumas palavras: “Eu tô aqui... Você estava me buscando, pronto! Pode concluir sua honra ou sei lá o quê!” Alan percebe lágrimas sendo seguradas pela garota, embora aquilo não lhe afetasse. Ele puxa o martelo do revolver, engatilhando-o, engando mira e lhe diz friamente: “Como ousa falar de honra, você não passa de uma ladra.”, ao que ela simplesmente replica, num misto de coragem e desespero: “É, mas não sou eu que estou apontando para alguém desarmado.” E, apesar daquilo ter sido um acidente, palavras impensadas, acabaram saindo no momento certo. Tal frase perturbara o justiceiro que encarando a garota, percebeu a espada que ela carregava na cintura. “Você não está desarmada... Vamos ver se realmente é digna de alguma honra.”; ele diz, guardando o revólver de volta em seu coldre e desembainhando o sabre que carregava no lado esquerdo de sua cintura.

Percebendo a chance que se mostrava a garota desembainha sua katana e se lança em ataque, porém, seus movimentos, mesmo sendo incrivelmente ágeis, conseguiam ser broqueados por Alan. Por sua vez, os potentes ataques dele eram esquivados sem muito esforço pela garota, de forma que o enfrentamento se mostrava surpreendentemente equilibrado. Aproveitando que possuía agilidade superior, Deborah insistia em lançar sequencia atrás de sequencia de ataques, com movimentos bem sincronizados e até mesmo graciosos, mantendo seu adversário na defensiva com movimentos amplos de sua espada. Por fim, em um de seus giros ela consegue abrir a guarda dele, e aproveita, lhe acertando um chute na altura do estomago. Este tem força suficiente para afastá-lo e fazê-lo se dobrar, ao que ela intenta um forte golpe de corte vertical. Porém o golpe é broqueado, por Alan. Mesmo encurvado, ele consegue erguer seu sabre na horizontal, apoiando o contra-gume da lâmina no ante-braço esquerdo, dando assim mais rigidez a defesa. Com o sabre nesta posição ele consegue se levantar e empurrar a garota para a frente, dando-lhe algo de espaço. Encarando-a friamente ele lança um novo ataque, primeiro um golpe ascendente na diagonal que ela ainda consegue broquear, porém ele aproveita o impulso deste golpe e, girando o sabre por sobre a cabeça, desfere um segundo, a garota tenta broquear este também, porém o potente impacto faz com que sua guarda baixe, vendo a oportunidade, ele lhe acerta com o pomo da arma no tórax, lançando-a para trás e ao chão, lhe fazendo soltar a katana.

Vendo-se novamente a mercê de seu perseguidor a garota novamente o intima: “Ao que parece você conseguiu... Tanto tempo para acabar assim... Você finalmente conseguiu o que buscava e vai conseguir... seja lá o que você vai ganhar me apanhando...” Diante de tais palavras, Alan se põe pensativo. Após algum tempo de silêncio, ele torna a embainhar o sabre e se vira para a saída, deixando a garota ali, no chão. Ela, vendo que ele lhe dera as costas, puxa uma lâmina e avança contra ele. Entretanto, pouco antes de ser atingido, Alan se vira e lhe desfere uma cotovelada no rosto, derrubando-a novamente no chão. Caída no chão ela reclama, com certa jocosidade: “Hey, eu sou uma garota sabia!” Ao que ele, sem se voltar para ela, apenas virando parcialmente o rosto para o lado e a observando pelo canto do olho, lhe diz friamente: “Não abuse da sorte, ladra. Simplesmente a deixo pois não tenho mais porquê executá-la. Deveria fazê-lo para poder voltar ao meu lar, mas não tenho mais para onde voltar... Então, qual a diferença... Mas não provoque.” Dito isso, e deixando-a, ele segue até onde sua espingarda estava caída no chão, a apanha e se dirige à porta, saindo sem olhar para trás.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Esperança Dos Renegados" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.