O Amor É Clichê escrita por Juliiet


Capítulo 28
O Amor É Complicado


Notas iniciais do capítulo

Heeeeey gente, tudo bem?
Ok, antes de tudo, MUITO obrigada à Feeh e à Anaaluq pelas recomendações tocantes e lindas. Adorei, meninas, muito obrigada *.*
Bom, eu gostei desse cap. Milagreeee! Mas ele tá confuso, então prestem atenção, ok? O tempo vai e volta...e acho que é o maior cap de OAEC até agora D:
LEIAM AS NOTAS FINAIS.
Boa leitura :)



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Passei os olhos pelas roupas na arara, indecisa. Mordia os lábios e inclinava a cabeça, passando os dedos pelos diferentes tecidos e texturas, sem saber o que escolher.

– Anda logo, Valentina, não temos o dia inteiro! – reclamou Narcisa, batendo um pé no chão repetidamente. – Qual o problema? Por que não se decide?

Não importava o quanto eu pedisse, ela nunca me chamava de Maria Valentina. Dizia que meu nome era muito grande e ela desperdiçaria um terço da vida dela toda vez que precisasse me chamar.

– O problema é que eu não sei o que escolher – confessei.

Estávamos no Crisul Shopping Center fazendo compras para a festinha de aniversário do irmão da Narcisa, que seria no dia seguinte, e a criatura insistente estava me obrigando a comprar uma roupa nova para usar, já que, segundo ela, eu só tinha lixo no armário.

Vovô apoiava Narcisa totalmente e os dois conspiraram contra mim, dizendo que eu só podia voltar para casa depois de comprar algo decente pra vestir.

– Vamos, eu vou te ajudar – Narcisa disse, sorrindo pra mim com aqueles grandes olhos azuis e me empurrando para poder olhar melhor as roupas. – Que estilo você prefere?

Eu pensei sobre isso por um segundo e a resposta foi automática:

– O meu.

Ela rolou os olhos.

– Não querendo ser rude, amiga, mas seu estilo é péssimo – disse, olhando depreciativamente para minhas calças de moletom folgadas e para minha camiseta extra grande com estampa de patos.

De novo, não.

Ei, eu precisava ficar confortável para fazer compras, certo?

– Não foi isso que eu quis dizer – eu tentei explicar. – O que eu quero é algo que...bom, seja bonito, mas não roube minha identidade. Eu quero poder me reconhecer, não mudar e negar quem eu sou. Se for para comprar roupas novas, que elas tenham a minha cara.

Certo, eu estava vomitando besteiras, eu sabia. Mas aquele era meio que um assunto sério para mim.

Narcisa sorriu e assentiu. Eu já havia contado todo o drama da minha vida para ela e a garota entendia. Ela sabia o quanto aquilo era importante para mim, eu queria me orgulhar de ser exatamente quem eu era, sem precisar fingir ser outra pessoa. E eu queria que isso pudesse ser refletido nas roupas que eu vestia.

– Vamos lá, vamos escolher algumas coisas juntas – ela disse, puxando-me de volta para perto da arara de roupas. – As roupas não mordem, não precisa ficar com medo, Val.

Mais um apelido...é, eu sei, mas não tinha como dizer não para Narcisa.

Eu sorri e depois suspirei. Eu era ruim nesse departamento. Muito ruim. Mas estava na hora de parar de ser criança e deixar de ser insegura em relação a esse tipo de coisa. Eu era uma garota, não, uma mulher. Precisava começar a agir como uma.

– Relaxa, garota, você não tá indo pra guerra – murmurou Narcisa, rindo.

Assenti e me forcei a relaxar. Talvez eu ainda estivesse meio traumatizada com tudo o que aconteceu desde aquele fatídico dia em que minha irmã me arrumou para ir à festa do primo da Petra. Mas agora era diferente, eu não queria ficar linda ou ser outra pessoa, eu só queria ser eu mesma.

Depois de ficar repetindo isso na minha cabeça a cada minuto, as coisas ficaram mais fáceis e eu até me diverti. Narcisa era meio impaciente e teimosa, mas eu podia ver que ela estava se controlando ao máximo para não bater minha cabeça na parede a cada vez que eu não gostava de algo que ela havia escolhido.

Eu adorava aqueles momentos com ela. Era divertido. Éramos divertidas juntas. Bobas, desocupadas e talvez um pouco infantis. Eu conhecia a garota há apenas seis meses e ela já era como uma irmã pra mim. Narcisa era muito irritante, sempre queria as coisas do jeito dela, impaciente, impulsiva e, apesar de não parecer num primeiro momento, extremamente maliciosa. Contrastava muito com meu jeito tímido, receoso, quase calculista. A garota havia me colocado em cada enrascada nos últimos meses...mas havia me tirado brilhantemente de todas. E era isso o que eu mais gostava nela, apesar do seu jeito descuidado, ela se preocupava com os amigos e os protegia do seu jeito.

Mas confesso que muitas vezes fui eu quem precisou ajudá-la a sair de certas situações. E eu descobri que adorava me sentir útil.

Nunca imaginei que uma amizade podia ser desse jeito. Que pudesse brotar do meio do nada de repente e se tornar tão indispensável. Sim, eu tive e tenho amigos em casa, mas são todos amigos que conheci a vida toda, amigos com os quais eu tive tempo de construir uma amizade. Uma amizade em especial que eu considerava forte e sólida, mas que desmoronou com o primeiro sopro forte. Não, eu não podia culpar apenas uma pessoa por isso. Eu fui tão culpada quanto Petra, cometi tantos erros quanto ela. E acho que o maior deles foi achar que ela estaria ao meu lado quando eu precisei.

E por mais que eu não a odiasse, por mais que eu, mesmo agora, só desejasse a felicidade dela, no fundo eu sabia que nossa amizade havia sido destruída a um ponto em que não havia jeito de reconstruí-la. Eu nunca olharia para aquela garota que eu considerei minha melhor amiga do mesmo jeito. Eu sofria toda vez que pensava nisso, mas era tarde demais para nós.

É muito triste pensar que alguém que você amava, que esteve com você em todos os seus piores e melhores momentos, que te fez sorrir tantas vezes, te fez feliz e fez sua vida mais bonita...agora é praticamente uma estranha.

– Como vão as coisas no mundo da lua? – Narcisa perguntou, balançando uma mão na frente dos meus olhos.

Eu pisquei e percebi que tinha ficado perdida em pensamentos enquanto ela falava comigo e empurrava roupas em mim para que eu experimentasse.

– Anda logo, nós não temos o dia todo – ela reclamou, praticamente me empurrando para dentro do provador. – Adam não vai esperar a gente pra sempre, sabe?

Assenti e dei um sorrisinho pra ela enquanto entrava no provador com os braços cheios de roupas. Adam era o namorado dela. Ou eu poderia dizer, o amor da sua vida. Narcisa era uma boa namorada, mas às vezes quase tratava o garoto com indiferença, por ser tão apaixonada por ele que morria de medo que suas ações mostrassem isso.

Por que tudo relacionado ao amor é tão complicado?

Nunca ouvi falar de um amor que fosse fácil. Se existia, ainda não havia chegado aos meus ouvidos. Mas pela minha experiência, amar era horrível. Complicado, difícil, impossivelmente irritante.

E mesmo com todas as dúvidas, mesmo estando longe do meu objeto de afeição... eu havia começado a amar estar apaixonada. Conforme os meses foram passando, a dor da ausência dele foi aumentando, mas com ela veio a certeza, a segurança.

Ele estava esperando por mim.

Sim, eu agora acreditava que havia um garoto nesse grande pequeno mundo que me amava, cujo coração batia e respirava por mim. E ele me esperava. Talvez – provavelmente – as coisas não fossem ser fáceis quando finalmente nos encontrássemos de novo. Mas eu não queria que fossem fáceis. Se fossem, não seria amor. Não o amor complicado e intenso que eu sentia. Não o tipo de amor pelo qual vale a pena esperar, pelo qual vale a pena ultrapassar todos os obstáculos e sentir a dor de todas as feridas.

– Já, Valentina? – ouvi a voz da Narcisa através da porta do provador. – Vamos ficar aqui pra sempre mesmo?

Balancei a cabeça e disse a mim mesma para parar de devanear, me apressando em tirar minhas roupas.

– Espera só mais um pouquinho – pedi e só recebi um bufo impaciente como resposta.

Logo depois, eu abri a porta e saí para ela me ver, dando uma voltinha.

Narcisa me olhou de cima à baixo quase clinicamente e então fez uma careta.

– Tira isso, por favor – pediu e eu ri.

Eu estava vestindo uma saia até o joelho e uma blusa de renda cheia de lacinhos. Terrível e nem um pouco a minha cara, então não me importei de fazer o que minha amiga pediu. Voltei ao provador e tirei a roupa, colocando outra.

O processo todo levou pouco mais de uma hora. A minha impaciente amiga me fez correr para escolher tudo o que eu precisava e pagar. E depois, com as mãos carregadas de sacolas, corremos até o McDonald’s, onde Adam nos esperava – ao contrário do que Narcisa havia afirmado – feliz e pacientemente.

– Demoramos, não? – ela foi logo dizendo enquanto se inclinava para beijar o namorado na bochecha. – Culpa da Valentina.

– Eu acabei de chegar, na verdade – Adam respondeu, sorrindo e dando um pequeno aceno com a cabeça para mim. – Oi, Maria Valentina.

Retribuí o aceno e o cumprimento e sentei em frente aos dois numa das mesas gordurosas da lanchonete.

– O que vocês vão querer? – ele perguntou, levantando-se. – Eu vou lá comprar e trago pra gente.

Depois que eu e Narcisa dissemos o que queríamos – Adam nem se assustava mais com a quantidade de comida que eu consumia – ele se afastou para o balcão, parecendo bem feliz. Bom, ele sempre tinha aquele sorriso idiota na cara quando estava perto da namorada.

Os dois faziam o casal mais fofo que eu já havia visto. Adam era baixinho como a gente, apenas poucos centímetros maior que Narcisa (eu e ela tínhamos a mesma altura), e também tinha os cabelos lisos num tom loiro pálido quase idêntico ao da namorada. Mas enquanto os olhos dela eram de um azul aberto e brilhante, os dele eram castanhos, mas bem clarinhos com pequenos pontinhos verdes perto da pupila. Narcisa sempre ficava danada quando as pessoas perguntavam se eles eram irmãos, o que acontecia com muita frequência.

– Por que me apressou tanto? – perguntei, mas sem esperar resposta. – Aposto que se a gente chegasse aqui só amanhã, o Adam ainda estaria aqui, com aquele sorriso bobo na cara.

– Ah, cala a boca – Narcisa disse, corando.

Eu sorri e ela me acompanhou, mas seus olhos estavam no menino de cabelos loiros e suéter verde musgo na fila do balcão.

Eu estava invejando a sorte dela – não pude evitar, ok? – quando o meu celular vibrou no bolso da calça. Peguei-o rapidamente e li a mensagem.

– Droga – resmunguei, fazendo minha amiga virar os olhos para mim.

– O que foi, Valentina? – ela perguntou, perplexa ao me ver levantar e pegar todas as sacolas com minhas roupas novas. – Aonde você vai?

– Peça desculpas ao Adam por mim, ok? – eu pedi, já de pé, pronta para sair correndo. – Eu preciso ir, mamãe aprontou de novo.

Narcisa balançou a cabeça e sorriu.

– Tudo bem, pode ir. Eu queria ficar um pouco sozinha com o Adam mesmo...

– Sem vergonha.

– Mas você me ama.

Rolei os olhos e saí do McDonald’s, correndo para pegar o ônibus a tempo.

Precisava impedir que minha mãe causasse um ataque do coração no meu avô.


...




Não, não foi fácil.

Acho que já deixei claro que nada que realmente vale a pena é, mas quando eu digo que não foi fácil, eu quero dizer que foi a coisa mais difícil que já enfrentei.

Sim, isso inclui deixar o amor da minha vida para trás.

O fato é que reencontrar a mãe que eu perdi há tanto tempo foi completamente diferente do que algum dia eu imaginei que seria. Na parte da minha cabeça que ainda pensava como uma criança, eu imaginava que ela sorriria para mim e abriria os braços, e eu me jogaria neles, sentindo-me amada e protegida. E então, seríamos felizes para sempre, como uma família de novo.

Mas eu não mais era uma criança. E, por mais que eu quisesse, minha vida não era um conto de fadas.

Ela era muito bonita. Bonita como nos meus sonhos, nas minhas lembranças enevoadas e distantes. Suas mãos eram delicadas como eu me lembrava. Exatamente do jeito que eu ainda podia ver se fechasse os olhos e forçasse as memórias. Seus cabelos estavam um pouco mais curtos do que eu me lembrava, sua boca não estava esticada em um sorriso, suaves marcas de expressão marcavam suas feições. Seus olhos, tão iguais aos meus, eram tristes e sem luz.

Foi tão repentino que minha primeira reação ao vê-la foi simplesmente não ter reação.

Apenas fiquei estática, fitando-a com – eu desconfiava – olhos arregalados. Ela se aproximou vagarosamente e eu percebi que ligeiramente menor que eu. E era tão estranho vê-la assim, quando em minhas memórias eu sempre precisava levantar a cabeça para olhar seu rosto, tão alto e distante. Ela parecia tão alta, grande, segura. E a mulher parada à minha frente parecia pequena, frágil, triste. Derrotada.

– Ratinha – ela disse, e era como se eu nunca tivesse esquecido o tom da sua voz suave, exceto que agora ela parecia quebrada e emocionada. – Você cresceu.

E então foi como se todas as lembranças me afogassem de repente, como se estivessem presas em uma caixa de vidro que se quebrou sem aviso. Lembranças de quando aquela mulher era uma mãe amorosa, que me segurava no colo e dizia que eu era uma linda “ratinha”. Sua voz cantada sussurrando histórias de príncipes e princesas na hora de dormir. Sua mão – as unhas sujas de tinta – afastando o cabelo da minha testa. Os “eu te amo” que ela sempre fazia questão de nos dizer todos os dias. “Eu amo vocês, pequeninas, muito assim” ela costumava dizer e abrir os braços largamente, arrancando sorrisos de mim e de Geny, que nem entendia direito o que aquilo significava.

Eu também não entendia, nem naquela época nem agora. Se ela nos amava tanto assim, por que foi embora? Por que nos deixou para trás tão facilmente?

Mas não, não foi facilmente. As lembranças não paravam de fluir em minha cabeça, lembranças de como papai e mamãe quase nunca estavam juntos e, quando estavam, sempre pareciam tensos e preocupados. Inclusive uma lembrança longínqua e meio irreal – dessas que você não tem certeza se aconteceram mesmo ou foram só um sonho – de suas vozes alteradas discutindo, que me acordaram no meio da noite. Eu dividia o quarto com Geny e mamãe sempre deixava a porta um pouquinho aberta, para que uma fresta de luz do corredor impedisse o quarto de ficar na total escuridão. Eu me levantei, assustada com os gritos que ouvia, enquanto minha irmãzinha continuava ressonando tranquilamente, e espiei pela abertura da porta. Não podia vê-los e nem lembro do que escutei, mas a aflição que senti naquela noite me parecia bem vívida agora.

E, logo antes de mamãe nos abandonar, eu agora lembrava da última briga. Estávamos à mesa do jantar, como em todas as outras noites, e o papai gritava com a mamãe. Eles não costumavam brigar na nossa frente, eram frios um com o outro, mas raramente perdiam o controle quando estavam perto de nós. Talvez por isso – agora – essa fosse a lembrança mais vívida em minha cabeça. Mamãe ficou calada, apenas olhando para o seu prato, mas parecia cada vez mais tensa e seus olhos não continham as emoções doces que eu costumava ver neles. Era como se eles não pertencessem à minha mãe. Brilhavam com ódio, com fúria contida. Ao fim do jantar, ela olhou para o papai com esses olhos cortantes e disse:

– Seu amor sufoca, machuca. Mata. Você está destruindo o que devia proteger.

E então, no dia seguinte, ela não estava mais lá.

– Acho melhor eu ir embora – uma voz se fez ouvir, ainda que distante, através da névoa que parecia cobrir minha mente. – Eu volto outra hora.

E eu “acordei” a tempo de ver a garota loira acenar tímida e hesitantemente para mim, já a caminho do portão.

Meu coração batia tão forte no peito que eu desconfiava que podia ser ouvido à distância. Mas ao mesmo tempo, uma estranha apatia havia tomado conta do meu corpo, era quase como se eu não o sentisse, como se eu estivesse flutuando, com a consistência de uma nuvem. Virei-me para a mulher quase sem sentir, e surpreendi duas grossas lágrimas desprendendo-se dos seus olhos.

– Me perdoe, ratinha – ela disse, enquanto mais lágrimas acompanhavam as primeiras. – Eu...eu...só me perdoe, filha.

E então eu não conseguia mais respirar.

O ar era como um veneno, queimando minha garganta e pulmões. Porque doía. Doía como eu nunca pensei que pudesse doer. Doía como se eu ainda fosse criança, como se ainda importasse. E importava. Durante anos, eu pensei que compreendia o motivo que levou mamãe a me abandonar. Durante anos, pensei que eram válidos, que eram...compreensíveis. Pensei que, no seu lugar, eu talvez pudesse ter feito o mesmo. Pensei que a entendia, que a perdoaria. Que não doeria tanto.

E eu estava tão enganada.

Não, eu não entendia. Eu não aceitava. Eu não perdoava. E eu soube imediatamente que, mesmo que ficar me matasse lentamente, eu nunca abandonaria as pessoas que eu amava. Se fosse para fazê-los sentir aquela dor, a dor que me corroía naquele momento, eu nunca...

Só que eu fiz.

De longe, eu escutei vozes agitadas, ouvi meu nome sendo chamado e alguém me segurando quando minhas pernas não suportaram mais o meu peso. Meus olhos estavam abertos, arregalados, mas eu não enxergava nada, era como se tudo fosse de um branco ofuscante, cegando-me completamente. Eu não sentia nada, mas minha cabeça continuava flutuando.

Eu abandonei todos que amava. Meu pai, minha irmã.

E ele.

Vicente, que engoliu seu orgulho. Que me pediu para ficar. Que disse que me amava. Que me queria ao seu lado, mesmo depois de tudo o que fizemos um ao outro.

Eu podia achar que tinha todos os motivos do mundo. Precisávamos de tempo, precisávamos perdoar um ao outro...no fundo, eram só desculpas. Eu me convenci que eram razões sólidas, verdadeiras, só para mascarar a verdade.

Eu era uma covarde. Como minha mãe, eu fui fraca e covarde. E deixei meu grande amor para trás.

O ar, que antes parecia me envenenar, de repente me fez perder toda a sensibilidade. E depois, os sentidos.


...




– O que ela fez agora, Aurelia? – perguntei enquanto entrava em casa e largava as sacolas descuidadamente no Hall.

A mulher alta, com os cabelos escuros presos numa trança, correu até mim, parecendo ao mesmo tempo irritada e aflita.

– Ela quer abrir a gaiola dos passarinhos – disse rapidamente, ignorando as sacolas de compras e me empurrando para o solar, onde ficava a saída para o jardim em que o vovô criava sua coleção de pássaros exóticos.

Sim, eu nunca disse que minha família era a mais normal, certo? Algumas pessoas colecionam selos, bonecas, elefantes em miniatura. Meu avô colecionava pássaros.

– É sério? Ela enlouqueceu? – soltei, exasperada, correndo para tentar evitar a catástrofe. – Vovô ama aqueles bichos!

Eu não podia acreditar naquilo. Tudo bem que se eu fosse um pássaro, eu provavelmente não gostaria de ficar engaiolada, mas será que mamãe não tinha aprendido nada com tudo o que aconteceu durante todos esses anos? Será que ela não percebeu que amar é, às vezes, segurar bem forte e impedir que quem se ama – no caso do vovô, suas aves esquisitas – vá embora? Nós conversamos tanto durante esses meses, ela me disse tantas vezes que...

Meus pensamentos foram interrompidos quando eu saí para o jardim e parei, estática.

Era apenas o início da noite e o céu ainda estava claro. As noites de verão na casa do vovô eram quase sempre bonitas e agradáveis, com uma brisa morna acariciando suavemente as folhas das grandes árvores do jardim. Agora, essas mesmas árvores estavam enfeitadas com várias lâmpadas japonesas coloridas, dando ao lugar uma aparência mágica, como se fadas fossem aparecer por trás delas a qualquer momento. Várias mesas estavam dispostas pelo jardim, enfeitadas com flores e fitas, os arranjos feitos provavelmente pela minha mãe. De alguma forma, eu podia ver o toque dela naquela decoração. Além disso, o lugar estava cheio de velas colocadas em pequenos recipientes de vidro, fazendo um caminho até a escada de pedra que dava ao solar, exatamente onde eu estava parada.

– Pegamos você direitinho, não foi, Val? – Narcisa soltou, com um sorriso travesso.

Não só ela estava ali, Adam também, segurando sua mão com carinho e sorrindo. Eles devem ter vindo tão rápido que com certeza Adam levou algumas multas. Além deles, estavam os pais dela e o seu irmãozinho, os vizinhos preferidos do vovô. Vovô também estava lá, sorrindo ternamente ao lado da minha mãe, que vestia um lindo vestido cor do mar e me fitava com olhos brilhantes.

Ah, e não podia esquecer de perceber quase todos os meus colegas da escola sorrindo e acenando para mim.

– M-mas... – comecei, atônita, colocando a mão sobre a boca sem nem mesmo perceber o movimento, e entortando meus óculos sem querer. – Mas o que é isso? Por que estão todos aqui?

Aurelia surgiu na escada atrás de mim com um sorriso iluminando suas feições.

– É sua festa de despedida, querida – ela disse, colocando suas mãos em meus ombros e me fazendo descer até o jardim. – Ou achou que seus amigos a deixariam ir embora sem se despedir?

Olhei surpresa e chocada para ela e depois para o vovô, que se aproximou e me deu um carinhoso beijo na testa.

– Vovô, é verdade? – sussurrei, incapaz de acreditar. – Eu vou poder voltar? Finalmente, eu vou voltar para casa?

Ele riu e bagunçou meus cabelos, que caíam soltos sobre meus ombros.

– Você não é muito lisonjeira, minha ratinha – ele disse, fingindo ter ficado chateado com o meu tom ansioso. – Assim eu vou pensar que você mal pode esperar para se ver livre desse seu velho avô.

– Ah, vovô, não é nada disso! – eu o assegurei, abraçando-o. – Eu só...eu só...

Ele sorriu mais uma vez e ajeitou os óculos no meu rosto.

– Você só quer voltar para casa, não é? Não se preocupe, eu entendo. Apesar de ser difícil acreditar que minha pequena ratinha cresceu.

– Do que o senhor está falando?

– Só uma mulher pode ir embora deixando deliberadamente seu coração para trás. Você já não é uma criança, Maria Valentina. E chegou a hora de ir buscar o que é seu.

Eu mal podia controlar as lágrimas. Não queria chorar na frente de todas aquelas pessoas, que continuavam me olhando alegremente, esperando o momento em que meu avô me liberaria para falar com eles. Mas era difícil. Eu sentia uma felicidade tão grande, com uma pontinha de dor amarga, que era quase impossível me conter.

Desde o momento em que vi mamãe pela primeira vez, seis meses atrás, no portão daquela casa, decidi que tinha que voltar para casa. Que sim, havia cometido o mesmo erro que ela, mas que não era tarde demais para consertar. Insisti naquilo com uma determinação quase insana, mas nem o papai nem o vovô concordaram que eu deveria voltar. Fiquei quase dois meses com raiva dos dois, sem falar com ambos. Foi nesse período que eu passei a ficar mais tempo fora de casa, para evitar o vovô, passando a andar com a Narcisa. Foi quando nos aproximamos. Eu não queria falar com o papai, com o vovô, muito menos com aquela mulher que havia me abandonado. Achei que estavam todos contra mim.

Foi Narcisa quem me fez abrir os olhos. Foi ela que me fez pensar, pela primeira vez desde que mamãe apareceu, a ouvir aqueles que pareciam estar só tentando me proteger.

– Se sua mãe não se importasse com você – ela havia dito numa tarde. – Por que se daria ao trabalho de vir aqui depois de tantos anos? Por que iria a sua casa todos os dias, se você continua se recusando a falar com ela? Por que ela ainda tentaria?

Aquilo martelou na minha cabeça durante alguns dias, até que eu resolvi conversar com o vovô numa noite, depois do jantar. Não só eu estava furiosa com ele por concordar com o papai quanto a minha permanência na Romênia, como por ele ter mantido contato com minha mãe pelo que eu pensava terem sido anos. Sim, ele que contou a ela que eu estava ali. Ele quis que eu a visse. Ele a convenceu a vir.

Meu avô era um homem gentil e sábio. E, enquanto eu fui preparada para brigar e acusar, ele foi preparado para se desculpar, tentar me entender e me fazer entendê-lo. Contou-me que não queria que eu fosse embora por causa da minha mãe, me disse que se eu desse às costas a ela estando tão transtornada como eu estava, talvez nosso relacionamento ficasse quebrado para sempre. Aquela era a última chance que eu tinha de obter as respostas para as perguntas que eu me fazia há mais de dez anos. Aquela era a última chance que eu tinha de perdoá-la e tê-la de volta em minha vida. Ou de simplesmente superá-la e seguir em frente.

Ele me fez perceber que se eu não a ouvisse agora, não a ouviria nunca. E nunca conseguiria me perdoar por isso depois.

Eu tinha muito a agradecer àquele velho charmoso.

– Eu te amo, vovô – eu disse, abraçando-o e escondendo minhas lágrimas no seu suéter verde.

Ele me abraçou de volta e beijou o topo da minha cabeça.

– Também amo você, ratinha.

Quando soltei-me dele, tinha controlado o choro, a maior parte das minhas lágrimas haviam ido parar na roupa do vovô e eu só desejava que meus olhos não estivessem muito vermelhos.

Mamãe se aproximou e nós dois sorrimos para ela. Então o vovô, casualmente demais, disse que tinha que falar com Aurelia e nos deixou.

Ainda era difícil agir com naturalidade com ela ali. Mas nós estávamos tentando. E eu queria que desse certo.

– Você está linda – ela disse, colocando uma mexa do meu cabelo para trás da orelha.

– Eu estou horrível – eu ri e ela riu também.

– Tudo bem, não seria ruim se você colocasse uma das roupas lindas que Narcisa me disse que vocês compraram.

Eu balancei a cabeça, pensando em como tinha caído naquela. Afinal, quem iria ligar para o que eu estivesse vestindo num aniversário de criança? O provável era que eu acabasse com sorvete de chocolate na roupa mesmo.

– Vocês me pegaram direitinho – eu disse, mas o sorriso nunca abandonava o meu rosto.

Já o da minha mãe vacilou.

– Maria Valentina – ela disse, apertando suavemente meu ombro. – Seu pai odiou esse nome quando eu o escolhi.

Não falei nada e, por uma fração de segundo, o olhar dela pareceu perdido. Mesmo com todas as nossas conversas nesses últimos meses, mamãe raramente mencionava o papai.

Eu tinha certeza de que ele a amava, de que ele nunca a esqueceu, nem só por um minuto. E, quando eu finalmente conheci minha mãe, pude ver nos olhos dela que o sentimento era recíproco. Ela o amava tanto quanto ele a amava.

É estranho como duas pessoas que se amam tanto podem machucar um ao outro dessa maneira.

Eu sabia do que estava falando. Claro que em escalas diferentes, mas eu havia sentido como o amor machucava.

– Maria era o nome da minha mãe – ela disse e eu fiquei surpresa. Nunca soube nada da família dela. – E eu sempre amei o nome Valentina. Juntei os dois. Seu pai ficou bem irritado, mas cedeu. Eu ficava horas apenas chamando o seu nome quando estava grávida. Gostava de pensar que você podia me escutar.

Talvez fosse por isso que o papai nunca me chamava – nem minha irmã – por nenhum apelido, mesmo não gostando dos nossos nomes. Supondo que ele também não gostasse do da Geny. Talvez fosse porque mamãe o dizia inteiro. Talvez fosse porque ela o tivesse escolhido, porque gostava dele.

Eu costumava odiá-lo. Agora amo meu nome. Porque quem eu amo gosta dele.

É, dá para entender meu pai. Total.

Eu sorri para a mamãe e segurei a mão dela que estava no meu ombro, apertando-a um pouco. Ainda me surpreendia um pouco perceber o quanto sua mão era pequena, o quanto aquela mulher parecia frágil. Um pouco da tristeza que a envolvia naquele primeiro dia havia sumido, deixando-a mais jovem e menos “quebradiça”, mas algo nela ainda a fazia parecer extremamente vulnerável, pequena.

– Vou sentir sua falta, filha – ela terminou, os olhos brilhando.

– O quê? – soltei, surpresa.

Ok, era óbvio.

Como isso não me passou pela cabeça antes? Sério, como? Eu iria embora e minha mãe...não. Justamente quando começávamos a nos dar bem, a nos conhecer...eu iria embora. Por que pensei que ela iria comigo? Parecia o normal, o certo, como se ela devesse me acompanhar, ficar comigo. Talvez nossa relação nunca fosse como uma relação normal de mãe e filha, mas eu queria pelo menos o que nós já tínhamos. Amizade.

– Você não vai, não é? – gaguejei, apertando mais sua mão.

Ela sorriu tristemente.

– Você consegue imaginar que cara seu pai faria ao me ver? O que ele diria ao saber que eu tenho estado aqui com você? Sabe, não sou a pessoa preferida dele.

– Você é minha mãe! – insisti, sentindo algo pesado no coração. – Ele não pode te impedir de me ver. E eu já sou grande o bastante para tomar minhas decisões.

Ela assentiu e fez eu soltar sua mão, para voltar a passá-la por meu cabelo.

– Sabe, eu realmente adorei essa franja e seus óculos novos – disse.

Há uma semana, eu tinha cortado as pontas do cabelo e resolvi fazer uma franja curtinha, cobrindo as sobrancelhas. Parecia combinar perfeitamente com meus novos óculos, grandes e quadrados.

Lentes de contato eram trabalhosas demais e faziam meus olhos coçarem. Além do mais, como as lentes novas dos óculos eram mais finas e sem reflexo, meus olhos não ficavam escondidos atrás delas.

Ainda era eu mesma, mas um pouco diferente.

– Sabe – eu disse, rolando os olhos para a mamãe. – Você realmente não é sutil quando tenta mudar de assunto.

Ela riu e Narcisa apareceu de repente entre nós.

– Ok, tenho certeza que o papo está ótimo – começou, puxando-me sem rodeios. – Mas se você não reparou, Val, tem uma festa esperando por você. E você ainda nem está vestida para ela!

– Se alguém tivesse me avisado, talvez eu pudesse estar preparada para a ocasião – eu retruquei.

– Se alguém tivesse te avisado, não teria graça nenhuma – ela fez uma careta para mim, como se eu fosse bem estúpida por não perceber o óbvio.

Eu ri e olhei para a mamãe.

– Pode ir, meu bem – ela disse. – Vamos estar esperando.

Assenti e já estava seguindo com Narcisa para dentro de casa, quando me virei e disse:

– Sabe, mamãe, acho que você está errada.

Ela me olhou interrogativamente, assim como algumas pessoas que estavam lá, já que eu não estava falando exatamente baixo.

– Se o papai tem uma pessoa favorita, definitivamente é você. Ele só precisa lembrar disso, eu acho.

Então eu sorri ao ver sua expressão mortificada e entrei em casa com Narcisa.


...




Qual foi a grande explicação? O grande motivo? O que iria compensar o passado, desculpar seus erros, solucionar todos os problemas?

Por que minha mãe foi embora? Por que abandonou suas filhas? O que a fez nos virar às costas e sair pela porta?

Na verdade, nem tudo tem uma razão.

Mamãe era apenas jovem demais, inconsequente demais, infeliz demais. Ela estava vivendo uma vida que nunca pensou que iria viver. Casamento era um conceito antiquado e sem graça para ela. Amor era um que ela gostava muito mais. Paixão, romance. Era isso que ela queria. Se casou com o papai porque o amava muito, mas não estava preparada para aquilo. Não foi apenas culpa dela. Ele também não percebeu o erro que ambos estavam cometendo. Ele não tentou mudar nem um pouco o seu jeito rígido e certinho por ela. Ele achava que ela tinha que mudar por ele.

Ninguém deve mudar quem é por causa de outra pessoa. Não há problema em mudar, desde que seja porque realmente se quer isso. Por si mesmo, não pelos outros.

Talvez, se mamãe tivesse aparecido em outro momento da minha vida, eu não pudesse entendê-la como agora. Talvez esse tenha sido o momento perfeito, no fim das contas.

Ela errou. Se arrependeu. Mas achava que era tarde demais. Tinha medo do papai, tinha medo de chegar perto dele. Porque o amava demais. Porque temia que ele a fizesse voltar, que a prendesse de novo.

Ela não me disse isso, mas acho que o que ela mais temia era querer ficar. Era querer negar sua existência livre e ser uma feliz prisioneira.

Não que todo amor seja uma prisão. O do meu pai é. Vai entender.

Mas eu acho isso porque quando eu contei a ela sobre o Vicente, ela sorriu, triste, e disse:

– Queria poder ter tido a sua cabeça quando era mais jovem.

E eu perguntei:

– Por quê?

Ela virou de costas para mim e ficou olhando a janela. Estava chovendo e as gotas escorriam pelo vidro.

– Para poder ter tido certeza do que realmente queria, como você tem – foi o que ela disse.

– Eu só quero ser feliz – retruquei.

– Eu achava que queria isso também – e então ela virou e tinha lágrimas no rosto, como as gotas de chuva no vidro atrás de si. – Mas procurei pela felicidade no lugar errado.

Eu já tinha começado a perdoá-la. Eu já tinha começado a gostar dela. Mas acho que foi só nesse momento que a amei pela primeira vez. Como minha mãe. Foi nesse momento que quis protegê-la, fazê-la feliz. Foi nesse momento que realmente me senti uma filha preocupada com a mãe.

Quando criança, você sempre pensa que seus pais são invencíveis. Você pode amá-los ou temê-los, tanto faz. Ainda assim, você cria essa imagem meio irreal deles, meio idealizada. Quase como se eles não fossem humanos. Pais não choram, pais não sentem dor, pais não tem o coração partido.

E é sempre difícil quando nós crescemos e descobrimos que eles são só pessoas. Eles erram. Para falar a verdade, às vezes eles ferram com tudo mesmo. Eles são idiotas, fracos, irresponsáveis, insensatos. Eles são humanos. Choram, se machucam, amam, sofrem.

Sim, é difícil enxergar isso, mas quando finalmente eu enxerguei, consegui seguir em frente. Sim, eu aprendi muito sobre perdoar nos últimos meses. É uma merda. Dói. Mas quando eu finalmente perdoei minha mãe por ter sido simplesmente humana...eu me senti tão leve como se pudesse tocar o céu.

Eu finalmente tinha uma mãe. Eu finalmente podia amá-la livremente e ser amada por ela. Ainda era estranho, ainda estávamos nos conhecendo, não era como se todo o passado pudesse ser apagado rápido assim.

Mas o mais difícil tinha ficado para trás. Íamos conseguir.


...




A festa acabou bem tarde. Tudo bem que “festa” não era o termo exato. Tomamos ponche sem álcool e comemos sanduiches e o maravilhoso bolo de nozes da Aurelia. Eu tinha feito vários amigos na escola por causa de Narcisa. Apesar de sua personalidade extremamente difícil, ninguém conseguia ficar longe dela.

Claro que ela teve que me fazer trocar de roupa e colocar uma calça jeans escura e uma camisa azul estampada com diminutos coelhinhos. Ambos do meu tamanho, nada de roupas largadas. Eu me senti bonita e confortável.

Mamãe, vovô e Aurelia ficaram em uma mesa com os “adultos” e, depois que estes foram embora, entraram em casa. Meus amigos da escola e eu ficamos sentados em uma mesa conversando, rindo, relembrando os momentos mais inesquecíveis de nossa amizade tão recente. Fiquei feliz por ver aquelas pessoas sorrindo para mim e relembrando momentos que passaram comigo – depois que eu parei de ser uma estranha chorosa e antissocial. Percebi que me alegrava saber que eu havia passado pela vida deles, feito uma – pequena – diferença. Senti-me acolhida em saber que eles sentiriam minha falta. Porque – e eu não havia percebido até aquele momento – eu também sentiria a falta deles. Principalmente do Adam e da Narcisa, que eu já amava como se fossem meus amigos há séculos.

E foi por isso que, uma semana depois, eu chorava copiosamente ao me despedir dela. Que não chorava, porque era durona demais para isso, mas tinha os olhos úmidos e os lábios dela tremiam.

– Eu estou falando sério – ela ia dizendo enquanto eu a abraçava com força. – Se você passar um dia sem me mandar uma mensagem, eu juro que nunca mais falo com você!

– Ok, eu prometo – disse entre as lágrimas. – Não vou esquecer de você nem por um dia.

Ela bufou, mas sorriu.

– Como se me esquecer fosse possível.

Eu ri junto com ela.

– Você não se acha nem um pouco, não é?

Ela me mostra um sorriso brilhante e faz duas covinhas nas bochechas com os dedos, mostrando o quanto é adorável.

– Eu vou sentir sua falta, Val – ela fala, parecendo subitamente triste e baixando as mãos.

– Eu também vou sentir sua falta. Estranho, mas nunca pensei que encontraria uma amiga ao vir pra cá.

– Uma melhor amiga – ela me corrigiu.

Eu sorri e assenti.

– Uma melhor amiga.

E era verdade. E eu me sentia mais feliz por isso do que podia dizer, por isso só a abracei de novo.

– Agora vai logo falar com sua mãe e seu avô enquanto eu procuro pelo Adam – ela disse e continuou murmurando. – Juro, se esse garoto se perdeu no estacionamento de novo...

Eu sorri e fui até mamãe e vovô, que me olhavam com tristeza e resignação, nessa ordem.

– Vamos lá, não é pra sempre – eu disse, tentando animá-los. – São só durante as férias de verão. Logo logo eu volto.

– Vamos sentir sua falta do mesmo jeito, ratinha – meu avô disse e minha mãe assentiu.

– Também vou sentir saudades – eu disse e minha voz saiu embargada. Meu rosto ainda estava marcado pelas lágrimas, mas eu não queria mais chorar. Não era bem um adeus. Era um até logo.

Depois de despachar minha mala e me despedir de todos – inclusive Adam que chegou arfando e se desculpando pela demora enquanto Narcisa ralhava com ele por se perder no estacionamento – eu fui em direção à sala de embarque. Antes de virar, porém, eu olhei pra trás. Vovô estava falando com Narcisa e Adam, mas mamãe olhava diretamente para mim. Eu sorri para ela de longe. As pessoas passavam por nós, os ruídos de passos, malas sendo arrastadas, conversas e até a voz irritantemente mecânica da mulher que chama os voos estavam entre nós.

Eu movi os lábios sem som dizendo “eu te amo, mãe”.

E vi duas grossas lágrimas escorrerem dos seus olhos enquanto ela fazia a mesma coisa, dizendo “eu também te amo, filha”.

Sorri e entrei na sala de embarque.

Sentia-me tão diferente da última vez em que estive naquele aeroporto. Apenas seis meses atrás, mas pareciam anos, décadas, vidas. Eu havia mudado tanto. Eu me sentia tão diferente. A menina confusa, perdida, quebrada e assustada que havia descido de um avião naquele lugar tão longe de casa, sem esperar nada... havia crescido.

E estava indo para casa.

Para ele.

– Vicente – eu sussurrei para mim mesma. – Eu finalmente vou poder te dizer o que não disse há seis meses.

Eu te amo.

Esse amor maluco e imprudente. Esse amor complicado. Mas que vale a pena.

Eu te amo, Vince Müller.

Espera por mim.







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Notas finais do capítulo

Então, peguem um chá/café/refrigerante e relaxem porque eu vou falar pra caramba. Quem acha chato ficar lendo o que eu escrevo aqui, nem precisa ler, mas depois não fique me cobrando por capítulos, ok? Eu tô na TPM e sem vontade de explicar mil vezes a mesma coisa --'
Bom, no capítulo passado eu perguntei como vocês gostariam que eu postasse (1- do mesmo jeito de sempre, postando sempre que acabava de escrever ou 2- escrever todos os capítulos que faltavam pra poder postar mais rápido depois) e a MAIORIA escolheu a segunda opção. E foi por ISSO que eu demorei tanto pra postar. Eu tive que escrever QUATRO capítulos ao invés de UM. E é claaaaaaaaaaro que eu ia demorar mais, né? Então, desculpa se eu demorei, gente, mas vocês escolheram isso :(
Outra coisa, fiquei muito triste com a falta de reviews no capítulo passado. Então agora só depende de vocês, o próximo cap tá quase pronto, só falta ajeitar algumas coisas. Comentem bastante que eu posto :)
Ah, uma última coisa. Minha vida deu uma reviravolta e eu vou mudar de estado mês que vem, pra quem se interessa. Então eu vou demorar um pouco mais pra responder aos reviews (estou respondendo aos dos dois caps passados ainda, mas vou conseguir, prometo :D) e talvez até pra responder MPs. Desculpa pra Yas, se ela estiver lendo isso, vou responder você logo, prometo!! Mil beijos pra Lê, que voltou dos mortos eeeeeeeeeeee....é só. Desculpem a tagarelice.
Beijooooooooooos :*