Já havia anoitecido, ele ainda estava no chão da sala enquanto eu o olhava da escada meu medo dele ainda não havia saído de meu coração, mas também estava com receio de não ter pedido desculpas a ele por ter me salvado do Ishida, respirei fundo e levantei da onde estava me aproximei dele devagar, sentia meu medo cada vez mais esvair de meu coração a cada passo que dava até ele, baixei no chão e o peguei no colo o levando até o meu quarto onde o sentei na minha cama.

Por mais que eu tentasse o medo dominava meu coração e me impedia de chegar mais perto dele, mas aqueles olhos, aqueles olhos que me chamam a atenção não transmitem ameaça e nem o mal, pelo contrario transmitem solidão e também receio de algo. Decidi sentar na cama ao lado dele e lentamente passei a mão em seu cabelo ele era completamente diferente quando se esta perto dele. Demônio? Nesta altura já duvido muito...

– Me desculpe... – sussurrei

– Você não é a primeira pessoa que faz isto - comenta me olhando - Também não será a ultima.

– Por que você esta falando comigo agora e quando o trouxe para o quarto você não disse nada? – pergunto, o olhando

– Me movo e falo com as pessoas quando elas têm certo afeto por mim... Fascinação, ternura... Mas quando este afeto acaba e se transforma em ódio ou medo eu perco esta vida temporária... – responde, ficando humano novamente - Mas no fim de tudo, acabam tendo medo quando falo com elas... Quando tento de uma maneira em vão de me aproximar delas... Volto a ser um boneco normal... Antes mesmo de dizer seus nomes...

– Isso deve ser horrível... – comento pondo a mão na boca - Você tem nome?

– Já tive vários... Entretanto nunca tive um... A partir do momento que sou passado para outro mestre deixo de ter o nome anterior... - responde

– Acho melhor eu te chamar de... – sussurro, tentando olhar algo que me venha na mente um nome, mas tudo que vinha em mente eram os capítulos daquele livro que tanto leio e nunca consigo parar - já sei... Ulquiorra... É o nome do capitulo que mais gosto do livro que leio Aquele Que Chora... – respondo

– Ulquiorra... - sussurra ele olhando o teto

– Você come alguma coisa? – pergunto

– Talvez... – responde

– Vou descer pra fazer algo pra comer e depois disso te ajudo a escolher uma roupa do meu irmão, deve ser ruim ficar com esta roupa pra sempre... Se bem que nem sei se vão servir... – comento me levantando da cama

– Pensei que iria me devolver a minha antiga dona... – comenta me olhando serio

– E eu vou... Mas até amanhã cedo você está sob meus cuidados... – respondo sorrindo

– Então não se incomode em me arrumar algo para vestir... Não preciso de tais coisas. - fala me olhando mais serio ainda

– Desculpe... Estava apenas... Deixa pra lá... – falo

Ele não disse nada apenas voltou a olhar o teto com os olhos perdidos como se estivesse pensando em algo, gostava mais de quando era do tamanho de um boneco, no fundo ele não era o monstro que todos falam talvez ele apenas esteja à procura de uma pessoa especial que o mantenha vivo com afeto, seria completamente chato se eu lhe perguntasse sobre a garota do banheiro ou será que não?

Na cozinha preparava um macarrão instantâneo nesta altura acho que era a única coisa que se dava pra fazer em quinze minutos, quando o escutei entrando na cozinha, olhei pra trás e o vi encostado na porta da cozinha me olhando como se quisesse perguntar algo ou falar algo embora não tivesse coragem, eu sorri para ele e fechei a panela com a tampa indo em sua direção.

– O que foi Ulquiorra-san? – pergunto

– Enquanto você dormia ontem eu andei pela sua casa inteira, precisava conhecer mais a casa da minha nova mestre e acabei encontrando algo que me chamou a atenção... – responde mostrando duas presilhas minhas

– Estão concertadas? – sussurro me levantando da cadeira indo até ele - Meu irmão as deu para mim quando era pequena, vivia dizendo que eram para criança e então as joguei na parede e as quebrei... Como você as arrumou?
– Um pouco de imaginação e paciência talvez. – responde olhando para o lado

– Obrigada, Ulquiorra-san... – falo sorrindo

Sai de perto dele quando senti o cheiro do macarrão quase pronto, depois que olhei pra a porta eu não o vi ali com certeza ele devia ter voltado pro quarto ou ido para a sala, olhei as presilhas em cima da mesa, realmente elas me traziam as piores lembranças do meu irmão de quando briguei com ele dizendo que não gostava dele e que nunca iria usá-las, uma lagrima caiu dos meus olhos e a limpei com a manga da minha blusa.

Alguns minutos depois terminei de comer e lavar a louça subi a escada indo para o corredor do meu quarto, não escutava nada apenas o barulho do relógio já era noite e a pouco luz da lua que passava pela janela era um pouco difícil de ver o que tem logo a frente.

Entrei em meu quarto e me sentei na cama, ele não fitava meus olhos e também não dizia nada, apenas estava sentado na beira da janela em forma de boneco olhando a lua, parecia que a idéia de devolvê-lo para sua verdadeira dona o irritava, se bem que não conseguia ver nenhuma expressão em seu rosto apenas aquele olhar gélido.

– Boa noite... Ulqui-kun... – sussurro, deitando em minha cama

Ele não respondeu nada e nem tirou os olhos da lua, não conseguia dormir imaginando que ele estava olhando para mim e se ele me atacasse no meio da noite? Passaram-se dez minutos quando senti algo me cutucar fazendo-me despertar, abri os olhos para ver quem era. Dois orbes verdes esmeraldas iluminados apenas com a luz da lua que passava pela minha janela aberta foi o que vi, acendi a luz do abajur para olhá-lo melhor e desta vez ele estava na forma de brinquedo o que o deixava muito fofo.

– Ulqui-kun?... O que... Quer? – pergunto esfregando meus olhos

– Não precisa ter medo de mim... Não irei fazer nenhum mal a você, preciso de seu afeto para viver... – fala olhando para o lado - E também... Não quero que tenha medo de mim como todos os outros...

– Me desculpe, mais é um pouco difícil dormir... O que você fez com aquela garota aquele dia? – pergunto olhando para ele

– Lisa... - sussurra - Era este seu nome, ela me comprou em uma loja qualquer... Depois de um mês com ela comecei a me mover como sempre... Sua reação foi medo quando me viu se movendo não é surpresa para mim, depois de um tempo a cada dia que passava ela se distanciava mais e mais de mim me evitando a todo o momento... Foi então que a vi falando com uma amiga que iria se livrar de mim...

– Céus... – exclamo o olhando

– Não queria machucá-la, quando ela entrou no banheiro foi o único momento que estávamos a sós então decidi falar com ela... Mas antes que eu dissesse algo ela começou a gritar comigo... Tentei segurar seu pulso para fazê-la olhar para mim mais ela chorava de mais... Foi então que ela me empurrou, mas seu corpo foi para trás e bateu no espelho... Sua mão cortou no vidro... E antes que eu pedisse desculpas do que quer que fosse que eu tivesse feito... Seu amor por mim se transformou em ódio e medo então antes que eu dissesse seu nome me transformei em boneco e minha vida temporária desapareceu... Quando acordei estava em seu colo e ela já havia sumido... - fala ele fechando os olhos depois fitando os meus

– Sinto muito... – falo

– Sou apenas um boneco para os humanos... – fala ele virando as costas para mim caminhando até o fim da cama - Não irei machucá-la, portanto não precisa ficar acordada com medo que eu a ataque no meio da noite...

– Ulquiorra... – sussurro - meu nome é Inoue Orihime

– Por que me diz isso? – pergunta me olhando serio

– Não gosto quando me chama de mestre ou mulher... – falo sorrindo - Boa noite...

– Boa noite... - fala ele voltando a olhar a lua - Orihime...

Sua ultima palavra foi meu nome aquela noite, ele havia-o sussurrado como se estivesse soletrando, sorri e voltei a deitar na cama, seu passado era triste embora agora soubesse o motivo de sua solidão e tristeza. Devia ser difícil ver o amor ou afeto se transformar em ódio e medo... Rezo para que um dia ele encontre uma pessoa que o faça feliz, este é o meu desejo.