Anne Bergerac: As Portas Da Contradição escrita por Ana Barbieri


Capítulo 7
Capítulo 7




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Capítulo 7

   Ajustar as roupas de Holmes, para que ficassem justas em mim, não foi o trabalho mais difícil do mundo. Tudo o que tive de fazer foi acentuar mais a curva da cintura do colete e da camisa. A calça deu um pouco mais de trabalho, mas por fim eu consegui terminar. Me vesti e desci correndo até o hall, arrumando as pressas meu cabelo em um rabo de cavalo, com uma fita de seda preta. Fico imaginando como vai ser ficar sozinha com Sherlock Holmes, trabalhando em um caso, sem ter Watson para resolver nossas diferenças. Cheguei até a sala e os dois cavalheiros me olharam de cima a baixo. Me lembrei das reações deles quando me viram com o vestido azul.

        _ Outra vez não. Já não bastou me olharem assim ontem à noite? Se for para ser assim toda a vez que eu tirar o avental, vamos ter problemas. – explodi. Ao mesmo tempo em que ria, corava e ficava zangada.

        _ Desculpe Anne. É que, você está... Diferente vestida assim. Mais assustadora. – obrigada Watson. Sempre disseram que eu assustava criancinhas, mas agora, a verdade veio à tona. Eu assusto adultos também.

        _ Quando você diz assustadora... Quer dizer...?

        _ Imponente. – cortou Holmes. – Ficou ótimo em você. Mas não se acostume. É a primeira e última vez que deixo você usar as minhas roupas.

        _ Oh, acredite-me, jamais ousaria violar a santidade do seu armário. Que por falar nisso, parece que não é arrumado há anos. Sabe quanto tempo eu passei organizando os seus ternos na semana passada? Muitas horas.

        _ Mexeu no meu armário?

        _ Não pense que eu me diverti com isso. Foram ordens da Sra.Hudson.

        _ Aquela mulher. Quantas vezes eu tenho que dizer, para não mexer em nada. Tudo está sempre no lugar. – claro. Se aquilo for arrumado para ele, eu não quero conhecer o bagunçado.

        _ Enfim, vamos logo? Ou vai passar o discurso moralístico sobre a Sra.Hudson antes?

        _ Muito bem. Watson, você vai até a mansão dos Stanpleton. Acha que dez minutos são suficientes?

        _ Acredito que sim. – respondeu ele tentando não contrariar a ordem de tempo do nosso amigo.

        _ Ótimo, você sabe onde nos achar. – e depois disso, eu vi Watson saindo de Baker Street, pegar o cabriolé e partir para a sinistra mansão dos Stanpleton. – Quanto a você, Anne Bergerac. – por que ele tem que ser tão sinistro comigo? O que eu fiz? O armário estava mesmo bagunçado, eu vou mentir e dizer que não?

         _ Quanto a você Sherlock Holmes. Se formos trabalhar juntos neste caso, quero que retire esse tom rude que tem, toda vez que pronuncia meu nome.

         _ Cale a boca e me escute. Para você pode ser apenas uma chance para se divertir e sair da rotina doméstica, mas para mim, é uma questão de vida ou morte. Não pense que me esqueci da promessa que me fez. Fará o que eu mandar. Não questione meus métodos, não questione o modo como falar com você. Tem sido assim antes de você chegar a esta casa e vai continuar assim, fui claro?

         _ Uma pistola, por favor. – ele me olhou furioso.

         _ Escutou o que eu disse?

         _ Eu não sou surda, é claro que escutei. Vou cumprir minha palavra e irei obedecer. No entanto, em prol de qualquer eventualidade... Preciso de uma pistola. – disse sorrindo delicadamente.

         _ Aqui está. – disse me entregando a arma. – Não vou perguntar se sabe como usá-la, porque já me mostrou que sabe. – sorri e ao mesmo tempo bufei ao saber que ele ainda se lembrava daquele belo dia em que quase me deixou morrer. – Vai querer sua capa?- perguntou abrindo a porta.

         _ Só iria me atrapalhar mais. – respondi olhando desconfiada para a porta aberta. – Não vai chamar o...

         _ Cabriolé? Não. Acho melhor irmos andando. Chamaria menos atenção. Além do mais, você mesma disse que era difícil andar com o vestido. Já que resolveu o problema, não vejo porque poupá-la do prazer de poder andar livremente. – disse saindo a minha frente.

         _ Seu... – contive a última palavra e sai atrás dele.

         Passamos pela porta da Scotland Yard, onde estavam parados Gregson e Lestrade. Ao me ver, Lestrade não conteve o riso, o que me deixou bastante desconcertada. Já o seu companheiro, pareceu mais surpreso.

         _ O que é isso senhorita Anne? – antes que eu pudesse responder Lestrade o fez.

         _ Ora meu caro Gregson, vai me dizer que nunca ouviu falar das excentricidades da senhorita Bergerac. Quando seu pai me disse que gostava de se vestir assim Anne, não achei que fosse verdade. Caiu como uma luva. – eu ri. Não sabia que meu pai falava de mim entre seus companheiros.

         _ Gosto tanto quanto a rainha gosta de usar as jóias da coroa. – Holmes já estava a meio passo na minha frente. – Depois falamos Lestrade, certas pessoas estão impacientes esta manhã. – e saí correndo atrás dele, segurando-o pelo braço. – Poderia me esperar?

         _ Enquanto você fica se gabando com seus amiguinhos da Yard? Não mesmo. – me soltei dele e continuei a andar, com as duas mãos no bolso. Até que refleti sobre uma coisa.

         _ Primeiro, ouve uma conversa minha com um dos amigos do meu pai, na Yard. Este amigo, como você sabe, era Gregson. Depois, fica observando ao longe, outra conversa minha com Lestrade, dizendo que me estava “escoltando” até em casa. – ele se virou para mim e perguntou um tanto confuso.

         _ Onde pretende chegar com isso?

         _ Por acaso, desaprova minha amizade com os integrantes da Scotland Yard Holmes?

         _ De maneira nenhuma. – não me convenceu.

         _ Porque, agora que refleti sobre o assunto, me parece que sempre que estou por lá, você aparece do nada, como se estivesse me vigiando. Pode ser apenas equivoco meu, contudo, parece que tem... Ciúmes de mim...

         _ Minha nossa Anne. Conseguiu! Descobriu meu segredo! Sim, morro de ciúmes por você, porque, sabe, você é uma pessoa tão importante, que pode ser comparada a rainha. – o tom de sarcasmo foi tão grande, que por um instante eu senti que um tapa seria menos doloroso.

         _ Você não é capaz de simplesmente responder que não, não é? – perguntei, tentando disfarçar o choque que aquelas palavras me causaram.

         _ Observe a pergunta que você me fez e me responda por você mesma. É possível responder apenas que não? Pelo amor de Deus, Anne. Eu esperava algo mais racional de sua parte. Ciúmes, francamente.

         _ Você faz soar como se não gostasse nem um pouco de mim. – disse soltando uma risada afetada.

         _ Para falar a verdade, às vezes eu gostaria de poder dar umas boas palmadas em você. Não por ser do jeito que é. Mas por ter a língua que tem.

         _ A sua língua não é melhor que a minha.

         _ Uma navalha, é isso que você tem na boca.

         _ Se eu tenho uma navalha, você tem uma pistola. – ele parou e me segurou pelo braço. Ficou bastante tempo me olhando nos olhos. A força que depositava em mim era tão grande que pensei que ele fosse me dar às palmadas que comentara. Até que por fim ele me soltou e eu notei uma coisa. Estávamos andando todo esse tempo, olhando um para outro, mas andando. Por isso a força, ele estava me guiando no meio dos que passavam. Estávamos agora, na frente do Bordel.

         _ Se eu soubesse antes, que este era o único jeito de fazê-la calar... Bem, aqui estamos.

         _ Meu Deus, eu acho que você deslocou meu braço. – estava doendo mesmo. – E para onde vamos? Para os fundos?

         _ Primeiro vamos dar uma olhada em volta do prédio. Venha. – com um braço doendo e com a possibilidade de ficar com o outro doendo também se começasse a discutir, o segui sem rodeios.

         O prédio era uma construção moderna. Não lembrava nem um pouco aquelas casas conservadoras de anos atrás. Bem bonito, se não estivesse descascando e com algumas tábuas caídas no chão. Parecia que não iríamos achar nada, até que bem nos fundos do prédio, havia encostado-se a uma parede, um machado. Holmes correu até ele e o examinou.

         _ Lembra-se do tipo de corte que foi feito no corpo da senhorita Gautier? – acenei que sim e fiquei olhando o machado. – Fino e profundo... Exatamente o tipo de corte, feito por um machado.

         _ Mas o que explica o fato de ele não estar sujo de sangue? – perguntei analisando a possível arma do crime.

         _ Como o corpo da senhorita Gautier só foi identificado de manhã, ele deve ter tido tempo suficiente para limpá-lo, contudo, não para escondê-lo. Isso continua a ser um mistério para mim.

         _ Logo não precisará mais se preocupar com isso senhor Holmes. – eu gelei. A mesma voz do homem que tentara atirar em mim. Virei-me e era mesmo ele. Holmes não se levantou.

         _ Hoje veio caçar a senhorita Bergerac ou simplesmente, o mandante dessa caçada é o mesmo que quer este machado de volta? – ele estava com a pistola engatilhada. Por sorte, eu achei a minha e sem medo engatilhei-a também.

         _ Não atiraria se fosse à senhora. – disse lançando um olhar de soslaio para Holmes.

         _ Ora, não gaste meu tempo com chantagens. Diga logo para que veio. – minha voz saiu tão confiante ao dizer estas palavras, que até eu mesma me surpreendi. 

         _ Só quero o machado senhora. Depois os deixarei. – levantei a arma, ao rumo do olho esquerdo dele. – Se quiser engrossar. Também posso jogar esse jogo.

         _ Ouse tocar em um fio do cabelo dela e eu atiro. – Holmes já puxara o gatilho e estava pronto para atirar. O machado na outra mão.

         _ É mais fácil ele atirar em você do que em mim.

         _ Então estarei pagando uma promessa. – que hora horrível para querer fazer uma piada.

         _ O machado senhor Holmes.

         _ Primeiro vai me dizer, quem é o seu mandante.

         _ Posso ser um subordinado, mas não sou burro. Não vou falar nada. – eu olhei dele para Sherlock e murmurei para o segundo.

         _ Já vimos o machado, já sabemos que foi a arma usada no crime... Pelo amor de Deus entregue a ele. Não quero ver sangue logo pela manhã.

         _ Deveria ouvi-la. Está sendo sensata senhorita Bergerac. – o som do meu nome vindo daquela boca, gelou meu sangue mais uma vez.

         _Está bem. Aqui está. – e mandou o machado para ele, que pegou certeiramente. Confesso que esperava que o tivesse cortado a mão. – Agora vá.

         _ Não... Meu chefe foi muito claro. Pegue o machado e termine o serviço que começou. – agora ele apontava diretamente para mim. – Lamento, mas, não poderei deixa - lá passar daqui. Adeus, milady.

         Ele atirou. Por um momento eu cheguei a ficar trêmula e o único rosto que me veio à mente, foi o de meu pai. Frio no túmulo. A bala já estava bem próxima quando, eu virei o rosto, não queria vê-la atravessar meu peito. De repente, senti Sherlock Holmes entrar na minha frente. Me jogando no chão. Eu gritei. À bala não o tinha atingido em cheio, mas arrancou-lhe muito sangue. Fincada no braço. O maldito que atirara já estava longe e eu ficara sozinha, em uma rua deserta, com um enfermo nos meus braços.

          _ ANNE! – juro que nunca fiquei tão feliz por ver Watson. Estava aos prantos, tentando manter Sherlock consciente. Ajudei-o a erguer Holmes e o levamos até o cabriolé em que Watson viera.

          _ Sempre na hora certa. – eu disse entre um soluço.

          _ Seus gritos foram meu alarme. Escutei-os, enquanto estava chegando e mandei o cocheiro acelerar. Pensei que fosse tarde demais.

          _ Quase. – entramos e assim que eu me sentei não me aguentei mais. Senti minhas pálpebras pesadas e fechei os olhos. Havia desmaiado.



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Notas finais do capítulo

Ha-ha... só pra deixar o gostinho de quero mais. Para próximo capítulo DEIXEM REVIEWS!
É o q move esta autora!



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