" Ele assentiu, debruçando-se sobre o corpo. Depois, ergueu-se, demonstrando um certo desgosto.

- Não é bonito. Alguém deve ter ficado ali e apunhalado uma, duas, três vezes... Quantos ferimentos há exatamente?

- Contei 12."

- Doze! Que tipo de animal apunhalaria alguém doze vezes? - exclamou Karminna, perplexa, com os olhos em seu livro.

- O que disse? - perguntou Lua, virando-se para trás e franzindo o cenho. Seu irmão olhou Karminna também e fez a mesma cara; era até cômico.

- Ela está citando um trecho de Agatha Christie - comentou Brad, sem tirar os olhos do quadro negro. Nas aulas, ele utilizava óculos de grau do estilo anos 80, com aro preto. A professora Dolly encontrava-se parada, encarando os alunos. Estes agiam como se ela não estivesse presente.

- Como você sabe? - Karminna levantou uma sobrancelha. - Já leu?

- É lógico que já - Brad sorriu com o canto da boca. - Me sentiria mal se nunca tivesse lido.

- Nossa, tá bom então - disse Lua, revirando os olhos, desenhados com uma maquiagem preta pesada. - Vão fazer o clube do livro em outro lugar, por favor.

Aishi levantou a cabeça. Estava dormindo um sono pesado na carteira ao lado da de Karminna. Seu cabelo estava bagunçado e ele tinha aquela cara de quem havia acabado de acordar.

- A aula já acabou? - perguntou ele, com a voz rouca.

Dolly terminara de passar a matéria no quadro negro, e agora encontrava-se sentada, ouvindo a conversa dos alunos distraidamente. Como era o primeiro dia de aula deles, talvez devesse dar um desconto.

- Não, Aishi, a aula não acabou ainda - disse Min, que sentava atrás dele. Havia um certo desprezo em sua voz. - Eu realmente não sei porque seus pais pagam essa escola pra você. Você não faz absolutamente nada.

Karminna lia seu livro, "Assassinato no Expresso do Oriente", com foco. Não ouvia bem o que acontecia ao seu redor.

- Não me lembro de ter perguntando alguma coisa a você - disse Aishi, com uma ponta de desprezo na palavra 'você'. - Minhas notas são muito melhores que as suas. Mesmo eu 'não fazendo absolutamente nada'.

- É... - suspirou a professora Dolly, de sua carteira. - Aishi é um cidadão sortudo...

Aishi riu. Sua risada atraiu a atenção de Karminna, que levantou a cabeça e encarou-o. Ela tinha aquela mesma cara de deboche e ironia, mesmo inconscientemente. Aishi percebeu o olhar de Karmin nele, e encarou de volta.

- Dormir na aula e decorar tudo um dia antes da prova não faz muito sentido - comentou por fim. Aishi revirou os olhos e resfolegou.

- Pelo jeito estão todos contra mim - ele sorriu e olhou para baixo.

- É, é bom que estejam - resmungou baixinho, Min.

Aishi abriu a boca pra falar alguma coisa, incomodado, mas Liyn interrompeu-os. Ele andava bem mal humorado naqueles dias, pois era Lua cheia e os irmãos Liyn e Lua aparentemente ficavam estranhos nessa época.

- Vão discutir a relação lá fora, ninguém aqui é pago pra ouvir isso. - ele disse.

- Oh! - exclamou Karminna, subitamente - Inacreditável.

- O que aconteceu? - perguntou Brad, deduzindo que ela lera algo de interessante no livro. - Em qual parte você está?

- Ratchett, seu... Seu... Não posso acreditar que ele sequestrou uma criança e quando seus pais pagaram o resgate, devolveu-a morta. Inacreditável. É bom mesmo que ele tenha morrido com doze facadas.

Brad assentiu com a cabeça. Agora fazia-se silêncio na sala e as pessoas olhavam para eles. A aula era de português, portando a professora Dolly não se incomodava tanto: eles estavam falando de livros! Era melhor do que ela esperava! Talvez Dolly fosse passiva demais.