Curada Para Ferir escrita por thedreamer


Capítulo 24
Capítulo 25


Notas iniciais do capítulo

Heeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeei meus queridos leitores, como se sentem? Muito bem, espero. Desculpem-me por tamanha demora, é que eu andava tão ocupada, e agora estou perto das provas... Chego muito cansada da escola... Ah, sinto muito! Mas, então, ESTOU AQUI! Fiquei tão, tão, mas TÃO feliz com sua recomendação 'Luce Luz' até me arrepiei quando li, sério, fiquei emocionada! Espero que me perdoem, e que apreciem o capítulo, ah e bem vinda 'maira22' ;)



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22


7 de fevereiro, 21:56, meu quarto, Carnegie Mellon

AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAH! Eu mato aquela garota, juro que mato! Você não sabe o que ela fez hoje, ela conseguiu ganhar de mim na aula de natação, como pode acontecer algo desse tipo? O mundo está virando de cabeça para baixo? O pior de tudo foi ter que ver aquele sorrisinho dela, uuuuuuuuuuuuuuurgh! Estou tão furiosa, que você nem imagina, eu vou armar uma que ela vai se arrepender por toda a eternidade, órfãzinha de quinta... Isso! Acabei de ter uma idéia genial, HÁ HÁ HÁ HÁ, como consigo ser tão esperta? Se tem algo que vai fazer ela cortar as asinhas é falar sobre os pais dela, óbvio! Sempre ficou toda irritadinha quando eu falava sobre o fracasso do pai dela, se eu usar esse truque mais uma vez, com mais ‘força’, chamando mais atenção... Vou dar um jeito para que todos a vejam humilhada. Claro! Vou imprimir informativos, convidado todos, mas para onde... Área de lazer! Isso! Vou fazer com que todos vão até lá, na data que eu informar, inclusive ela. Agora como usar os pais dela nisso... Vou falar sobre a morte! Nossa! Hoje eu estou mais inspirada que nunca, estou tendo super idéias, que tenho certeza vão deixá-la lá embaixo, ela vai se arrepender de ter colocado aquele sorriso no rosto por ter ganhado de mim. Será que ela viu o corpo dos pais? Ou será que a pouparam disso? Mas, se ela tiver visto foi apenas no IML, para reconhecer, ela não deve ter visto as fotos do acidente, mas e se ela tiver assistido o noticiário... Ah, certo. Mesmo se ela tiver visto no noticiário ela vai ficar afetada novamente, afinal do jeito que ela é, vai se acabar vendo seus pais ali inertes com todo aquele sangue, ECA! Vou conseguir essas fotos amanhã mesmo, e vou deixar tudo exposto na sexta-feira. Aposto que ela não espera por isso, vai passar o final de semana todo arrasada, pobrezinha L HÁ HÁ HÁ HÁ HÁ HÁ HÁ HÁ, que nada, vou achar muito bem feito, vou amar ver ela se acabando dia-a-dia. Argh! Agora vou dormir porque as insuportáveis que dividem quarto comigo querem apagar as luzes.

Beijos vitoriosos, Callie.

 Meu peito infla ao descobrir em cada linha como ela planejou tudo aquilo, e o pior de tudo, o ‘porque’. Tudo isso por eu ter ganhado dela em uma aula de natação... Como uma pessoa pode ser tão mal a esse ponto? Sorrir imaginando como eu ficaria ao ver meus pais mortos. Engulo seco, tentando ignorar o nó que ali se forma. Fecho o diário, pois não sei se vou agüentar em um mesmo dia ler o planejamento e a vitória dela. Respiro fundo para poder voltar ao quarto. Resolvo tomar banho para que elas não pensem o que estive fazendo aqui todo esse tempo.

 Tiro a blusa e foco meu olhar nos dois curativos ainda encontrados em meus pulsos, graças àquela megera. Os tiro cuidadosamente, analisando-os. Eles estão bem melhores, já está formando uma casca, que logo será substituída por enormes cicatrizes. Esses cortes cobriram todos os outros feitos antes, o que significa que agora terá apenas duas cicatrizes, mas não finas e ‘invisíveis’ como as outras, essas ficaram bem destacadas na minha pele alva. Lavo-os com o devido cuidado, para não correr o risco de se abrirem novamente. Seco-me e visto meu pijama de sempre, depois de renovar os curativos. Desfaço meu rabo-de-cavalo assim que saio do banheiro, escondendo o diário embaixo da minha grande blusa de moletom. Sorrio para Mariana, que passa por mim, substituindo-me no banheiro. Disfarçadamente tiro o diário e o guardo na primeira gaveta do criado, onde há uma tranca, que fecho e guardo a chave dentro da minha mochila, enquanto organizo os materiais de amanhã.

  Deito um pouco cansada por toda a adrenalina sofrida mais cedo, e agradeço por não ter sido pega, o que me traria um grande problema. Adormeço rapidamente. Tenho sonhos distintos e confusos durante toda a noite, acordando de tempos em tempos. Quando o despertador toca dormi ao equivalente a umas três horas. Sigo ainda sonolenta para o banheiro, escovo os dentes e me deparo com duas enormes olheiras. Eu odeio ter essa pele fantasmagórica! Lavo o rosto com esfoliante, depois passo o hidratante e enfim venho com o corretivo, seguido por base, pó... Passo um lenço seco para retirar o excesso, e pego as sombras. Hoje escolho uma de cor amendoada, passo por toda a pálpebra, pego uma de cor um pouco mais escura que passo somente no côncavo. Curvex, rímel, rímel, e mais rímel e por fim um batom de cor rosa, não muito escuro e nem muito claro. Penteio meu cabelo, deixando-o novamente solto. Visto meu uniforme e saio do banheiro.

 Calço minha meia, a sapatilha, coloco a mochila no ombro esquerdo enquanto espero Mariana terminar uma trança. Seguimos para o refeitório onde vejo Belinda sozinha. Nos sentamos ao seu lado enquanto ela nos cumprimenta com beijinhos.

 - Como estão? – Ela pergunta com aquele sorriso que costuma estampar.

 - Eu estou muito bem, obrigada. – Digo.

 - Eu também. – Mariana diz em seguida.

 - Eu queria agradecer Mel, graças a você agora compreendo tudo da matéria! – Sorrio feliz com a notícia.

 - Isso é ótimo! Então agora acha que vai se sair bem? – Pergunto retirando a manga da minha salada.

 - Sim. – Ela responde.

 - Senhorita Meester? – Viro a cabeça em direção ao som e meu coração salta, assustado ao ver a vice-diretora. Fico nervosa. Ela me olha com tranqüilidade, e acena para que eu me levante e a siga. Mari e Belinda me enviam olhares cheios de perguntas, mas apenas dou de ombros, seguindo a vice-diretora.

 Ela anda elegantemente em seu uniforme (um terno feminino com saia e paletó na cor preta, com o símbolo da escola no lado esquerdo do peito em cor amarela), e salto de mais ou menos dez centímetros. Em meio ao nervosismo me perguntei como ela agüentava ficar o dia todo com aquele sapato. Ela para, abre a porta e acena para que eu entre. Meu coração bate tão rápido que desconfio se ela não o escuta. A sala é tão elegante quanto ela. Tudo em seu devido lugar, com uma decoração super moderna, quem vê não diz que faz parte de uma escola, ainda mais tão antiga quanto esta. Após se sentar em sua cadeira ela sorri educadamente.

 - Sente-se querida. – Ela indica a cadeira ao meu lado, onde sento ainda desconfortável, apesar da maciez. – Você deve estar se perguntando porque lhe chamei até aqui, certo? – Confirmo, secando minhas mãos suadas na saia. – Não se preocupe, não é nada tão grave. – Ela dá ênfase na palavra, só aumentando meu nervosismo.

 - Aceita alguma bebida? – Ela pergunta, enquanto se serve de café.

 - Não obrigada. –Consigo dizer meio sufocada. Porque ela demora tanto? Vou acabar desmaiando.

 - Bom, então vamos direto ao ponto. – Ela coloca a xícara de lado e apóia os braços na mesa. – Recebi uma reclamação sobre você, querida. – Droga! A Callie desconfiou de mim de primeira? Fico em silencio e então ela prossegue. – Eu não vou lhe dar nenhum tipo de detenção, apenas lhe fazer um lembrete. É sobre sua maquiagem. – Ela explica por fim. Meu estômago despenca. Minha maquiagem? O que tem haver? – Você sabe que essa escola tem regras bem rígidas, certo?

 - Sim.

 - Então. De acordo com o artigo três, parágrafo 7, número 5... – Ela ergue um livro grosso e antigo. – Do livro de regras Carnegie Mellon... – Prendo a respiração, enquanto ela abre o livro e lê o artigo que acabou de citar. – ‘As alunas estão permitidas a usar maquiagem no recinto escolar, contanto que seja em tons claros, quase despercebidos’. – Ela ergue o olhar para mim, enquanto instantaneamente toco os lábios.

 - Meu batom... – Sussurro, mas num tom suficiente para que ela ouça.

 - Sim querida. Sua maquiagem está linda, tenho de admitir – Ela pisca com apenas um olho, e dá um meio sorriso. – Mas não posso permitir que a use no recinto escolar, devido à regra, e ao fato de nenhuma outra aluna poder usar, entende? – Aceno positivamente, um pouco aliviada. – Ah, ótimo! Era só isso, querida. Pode voltar para suas amigas, ou melhor dizendo, para a aula. – Ela diz olhando para o relógio no exato momento em que o sino toca. – Mas antes... – Ela aponta pra meus lábios e entendo a mensagem.

Sigo um pouco mais tranqüila para o banheiro. Por um momento pensei que fosse ser expulsa por ter pegado o diário da Callie. Tenho que tomar muito cuidado, aposto como foi ela quem reclamou com a direção. Aposto como neste momento estou com as bochechas mais vermelhas que meu batom, de tanta raiva que sinto. Essa era a principal característica da minha nova máscara, como se sem isso eu não fosse mais conseguir agir maldosamente. Abro a porta e agradeço por não ter ninguém. Limpo todo o meu batom, deixando minha boca ainda bastante rosada depois de ser tão ‘esfregada’.

 Assim que entro na sala, vejo o sorriso maroto nos lábios da Callie, mas sorrio mais ainda para ela, fazendo com que ela feche a cara. Sorrio para mim mesma, agradecida por alguma das meninas ter trazido minha mochila para a sala. Sento não muito no fundo e dedico toda minha atenção a aula. Assim que o último sino toca, corro para o quarto, ignorando meu estômago que ronca muito alto. Fico feliz por não encontrar ninguém, e imagino o quanto as meninas devem estar curiosas para saber o que aconteceu. Tranco-me no banheiro novamente, e abro o diário.

 Passo bastante tempo lendo, cada vez mais abismada, chocada e furiosa. Fico pensando em como uma pessoa pode ter tanta maldade no coração. Guardo o diário, sufocada ao reviver o meu maior momento de humilhação pela visão gloriosa de Callie. Atiro o caderno cor-de-rosa na parede do outro lado do banheiro enquanto as lágrimas escorrem pelo meu rosto. Brigo comigo mentalmente por estar chorando novamente. De repente vozes começam a gritar, dentro de mim: ‘Deixe der chorona, vá em frente e acabe com essa Callie, de vez’, ‘Você não é suficiente para nada. Afinal, você é um nada’, ‘ A Callie só tem inveja, é tudo inveja’, ‘Isso se lamente, afinal você nunca vencerá, é uma fraca, insolente’.

 - Não sou. – Digo em um gemido baixo, respondendo à voz que me tortura. Ouço a porta do quarto se abrir e me apresso em ligar o chuveiro.

 Aproveito a deixa e tomo um banho, usando toda a minha força para não criar novos ferimentos em meus pulsos. Depois disso, seco-me, certificando-me no espelho de que meus olhos não estão inchados e vermelhos, e então saio. Dou um sorriso fraco ao ver que foi Mari quem entrou.

 - Oh, Mel, como você some assim? – Suspiro e sigo para o armário para escolher uma roupa adequada. Escolho uma calça jeans, blusa de mangas e volto para o banheiro. Visto-me e então começo a contar tudo para a Mari.

 - Na verdade, foi tudo por culpa do meu batom vermelho. – Suspiro. Ela fica um tempo calada, até voltar a falar.

 - Sinto muito, eu havia me esquecido dessa regra... – Ela estreita os olhos como se tentasse lembrar.

 - É, eu também.

[...]

 Acordo bem disposta, depois de uma perfeita noite de sono. Olho no relógio e vejo que já são dez e meia da manhã. Tomo um banho, lavo meu cabelo e deixo a água escorrer bastante tempo em meus ombros, tentando relaxar; hoje só vou relaxar! Seco-me, passo meu hidratante e sigo para o closet, onde pego um dos poucos vestidos que tenho. Ele é de um tecido leve com estampa de cores claras. Calo uma sapatilha preta e coloco uma jaqueta jeans. Penteio meu cabelo e desço até a cozinha, a procura de Janaína. A encontro cortando verduras par ao almoço.

 - Bom dia, Janaína. – Digo sorrindo, e ela retribui sem demora.

 - Bom dia, minha querida. Dormiu bem? – Aceno positivamente enquanto começo a enrolar a beiradinha do vestido.

 - Sim, obrigada por perguntar. Janaína... Eu não queria te atrapalhar, mas... Posso te pedir um favor? – Digo olhando brevemente em seus olhos. Ela sorri abertamente.

 - O que quiser! – Sorrio presunçosa.

 - Obrigada, você é um anjo! Poderia fazer uma trança no meu cabelo? – Peço ainda acanhada. Ela vai até a pia, lava as mãos e se aproxima.

 - Em seu quarto? – Sorrio e aceno positivamente.

 Subimos para o meu quarto, onde me sento na cama enquanto ela observa meu cabelo e pensa em um penteado. Ela mexe de um modo que fico em dúvida se está fazendo uma trança, mas não ouso perguntar, apenas permaneço quieta. Ela reclama algumas vezes dizendo que meu cabelo é muito liso, fazendo com que a trança se desmanche toda hora. Ela usa uma laquê que até o momento ainda estava lacrado em meu banheiro e depois de alguns minutos, pede para que eu me vire, e sorri com o feito.

 - Ficou ótimo! Modéstia parte. – Ela diz, me guiando até o espelho.

 Fico fascinada com o que vejo. Apesar de a garota ali ainda ser eu, gosto do que vejo. Ela fez uma trança bem bonita, na lateral, deixando meu cabelo ainda solto. Uma trança em um formato de cascata, mechas caiam levemente. Ela conseguira prender até mesmo minha franja, coisa que eu só fazia com presilhas e olhe lá. A abraço bastante feliz.

 - Ah, muito obrigada mesmo! – Digo bastante agradecida. Pego minha bolsa e desço junto com ela, que praticamente me obriga a tomar uma xícara de chá antes de sair.

 Relutantemente tomo. E lembro de que não me despedi de Rodrigo, subo novamente para fazê-lo e acabo esbarrando em Vítor.

 - Ah, de novo não! – Ele diz nervoso. Ele para de repente e me olha de cima a baixo, fazendo-me corar totalmente.

 - Licença, Vítor. – Digo e o contorno seguindo para o quarto de Rodrigo. Bato na porta com os nós dos dedos e ele pede para que eu entre.

 O vejo sentado trabalhando em seu notebook com milhares de papéis a sua volta. Caminho até ele, explico que já estou de saída, e lhe dou um leve beijo no rosto. Desço e passo direto para a porta ignorando o olhar de Vítor enquanto passo. Caminho tranqüilamente para o shopping, tranqüila até demais. Rodrigo não mora muito longe, chego em cinco minutos, e sigo para a praça onde combinamos de nos encontrar. Sinto um leve frio na barriga ao ver a forma escultural de Bernardo de costas, fico tão encantada que levo algum tempo para perceber que Belinda não está ali.

 - Cadê a Belinda? – Indago sem delongas, fazendo Bernardo da rum pequeno salto assustado.

 - Ah...Er... – Ele também me olha de cima a baixo, não me deixando menos constrangida do que há pouco. – Oi, Mel! – Ele me cumprimenta com beijinhos e retribuo. – Você está linda! – Ele diz, deixando-me mais corada ainda.

 - Obrigada. – Ele morde o lábio e coça a cabeça.

 - A Belinda não pôde vir. Ela pediu para que lhe enviasse desculpas. – Estreito os olhos, desconfiada.

 - Porque ela não pôde vir? – Ele suspira.

 - Ela amanheceu com um mal-estar, mas tudo bem se não quiser mais ver o filme, te deixo em casa. – Ele diz olhando para o chão, quase como um sussurro.

 - Não...Eu... – Fico totalmente vermelha. – Eu não quis dizer isso! – Tento explicar. – É só que, como ela marcou... – Percebo que é melhor ficar calada. – Então, vamos? – Ele sorri me deixando meio hipnotizada.

 - Vamos! Já sabe qual filme quer assistir? – Balanço a cabeça negativamente enquanto olho para os cartazes.

 - Hum... Que tal ‘Motoqueiro Fantasma’? – Ele ergue a sobrancelha.

 - Sério? – Eu franzo a minha.

 - Seriíssimo, porque? Não gosta? – Ele dá uma pequena gargalhada.

 - Gosto. Achei estranho você gostar. – Apoio as mãos na cintura e paro.

 - Porque? – Ele para na minha frente.

 - Porque você tem cara de que gosta de, hum... – Ele coloca o indicador no queixo, pensando. – Filmes de romance. – Ele dá de ombros.

 - Há há. Bom, esse filme tem romance, também. – Digo ignorando o que ele quis dizer com isso.

 - Espera aqui, que compro, certo? Tivemos sorte, não tem fila alguma. – Sorrio e aceno positivamente, enquanto ele segue para o caixa.

 Ele usa uma blusa de maga comprida e gola ‘v’, deixando à mostra seu colar de couro com uma pequena cruz. Em vez de calça, optou por uma bermuda bege, pouco mais escura que a blusa, e um tênis preto. Seu cabelo está despenteado como sempre, mas ainda assim lindo, sobrepondo sua pele bronzeada e seus olhos cor-de-mel. Ele me pega olhando para ele, coro no mesmo instante e finjo estar totalmente concentrada na barra do meu vestido.

 - A primeira sessão é 12:00, quer dar uma volta, ou comer algo? – Mordo o lábio.

 - Acho que vou optar por comer, não tomei café da manhã. – Digo sentindo minha barriga protestando, e concordando.

 - Certo, então vamos.

 Seguimos para a praça de alimentação, onde levamos algum tempo para encontrar uma mesa vaga, por ser o horário em que muitas pessoas estão toando café, antes de um dia ‘feliz’. Encontramos uma mesa um pouco longe de onde queríamos lanchar, então combinamos dele buscar as esfirras e os sucos, no Habib’s, enquanto fico aqui guardando lugar.

 Depois de longos minutos ele aparece com a bandeja e a coloca sobre a mesa. Pego meu copo com suco de laranja, e avanço de uma vez. Bernardo sorri, e eu o acompanho. Comportei-me definitivamente como uma esfomeada, mas no momento eu realmente era uma. E de repente, de uma hora pra outra ele ficou sério. Já tínhamos terminado nosso lanche, e eu tinha minhas mãos em cima da mesa, quando ele delicadamente passou os dedos em meu pulso. Não pude evitar o salto. Fiquei totalmente pálida e sem falas, eu sabia que as cicatrizes estavam em ‘auto relevo’, o que não fazia muita diferença, pois ele já sabia de tudo.

 - Mel... – Ele começa, mas eu o interrompo.

 - O filme já deve estar pra começar, acho melhor irmos. – Ameaço me levantar, mas ele segura minha mão e me faz sentar.

 - Por favor, Mel! Quero conversar com você. E o filme só começa daqui uma hora! – Ele diz após olhar em seu relógio da mormaii. Suspiro e olho para baixo, não querendo conversar de jeito nenhum, não sobre isso. – Você fez de novo? – Ele pergunta e me recusa a responder. – Mel...

 - Não quero falar sobre isso, Bernardo. Não é da sua conta! – Acaba soando mais ríspido do que na minha mente, mas talvez assim ele me deixe em paz.

 - Na verdade, é, sim, da minha conta! – Esboço um sorriso de deboche.

 - Ah é? Desde quando? – Cruzo os braços e ele fica sério e com um olhar entristecido.

 - Desde quando isso te machuca. – Fico sem fala. – Olha, você não tem que encarar isso como algo extremamente estranho, e pensar que vou te criticar por isso. Ninguém faz isso sem motivos, e eu confio em você. Por isso queria que você também confiasse em mim, para que eu pudesse, quem sabe, te ajudar. – Perco-me em seu olhar que parece ser tão sincero, e acabo cedendo.

 - Eu não me sinto à vontade falando disso. – Digo sinceramente. – Ainda mais aqui... – Olho em volta, vendo quantas pessoas estão por perto, e quantas poderiam ouvir, por estarem sentadas tão próximas.

 - Quero que saiba que estou aqui pra te ajudar, seja no que for. Tudo bem se não quiser falar agora, mas peço que não deixe o assunto morrer definitivamente. – Ele diz acariciando minha mão. Aceno positivamente enquanto discretamente desvencilho-me de seu toque. – Que tal irmos a Cacau Show? – Ele fala empolgado e fico feliz por essa mudança repentina de assunto.

 - Eu adoraria! – Digo também empolgada. Se há algo que realmente gosto, e que faz tempo que não aprecio devidamente, isso é o chocolate.

 Ele passa o braço por meu ombro e seguimos conversando descontraidamente pelo shopping, subimos a escada rolante damos uma meia volta e encontramos a loja, que tem uma deliciosa cascata na vitrine. Fico babando por minutos até que ele me tira do transe aos sorrisos e entramos para saborear.

 Acabamos saindo com uma enorme sacola com uns trintas bom-bons de variados sabores. Bernardo ficou horas insistindo em pagar tudo sozinho, mas sou tão teimosa quanto, e paguei a metade. Ele pegou outra caixa em forma de coração que pagou e guardou separado. Fingi não ver, e ignorar o fato de que ele daria uma caixa de bom-bom em forma de coração para uma garota. Qual? Não sei, mas senti uma pontinha de ciúmes. Tá, uma pontona

 Enfim a hora do filme chega e subimos para o quarto andar. Nos sentamos na última fileira, tendo uma visão bem ampla de tudo. Lá pela metade do filme sinto a mão do Bernardo sobre a minha novamente, mas não consigo afastá-la, e me torno uma mescla de conforto e desconforto. Droga, porque ele ainda me deixa confusa? Resultado: Não consegui prestar atenção no filme desde então. Assim que o filme acaba me levanto, até rápido demais, para poder ‘recuperar’ minha mãe, mas percebo o quanto fui brusca tarde demais. Vejo um sorriso sem graça em seu rosto.

 - O que achou? – ele pergunta enquanto me entrega um McColosso.

 - Na verdade eu acho, que vou engordar dez quilos hoje! – Digo lambendo a calda de chocolate. Ele sorri.

 - Acho que você teria que engordar vinte quilos pra depois se preocupar em estar gorda. – Estreito os olhos e sorrio em seguida. – Vou te deixar em casa.

 - Não precisa! – Digo, querendo que ele me levasse, sim.

 - Ah, precisa sim que uma moça bonita assim não deve sair andando por aí sozinha! – Ergo a sobrancelha e começo a gargalhar. – O que foi? – Ele pergunta parecendo realmente confuso.

 - Esquece. – Dou um peteleco no ar enquanto saboreio meu sorvete.

 Caminhamos com passos curtos e me espanto ao ver que já havíamos chegado. Ele olha no relógio, antes de parar de frente para mim.

 - Tem algum problema eu te deixar aqui? – Balanço a cabeça negativamente.

 - Claro que não, obrigada! – sorrio abertamente. Nós ficamos um momento em um silêncio constrangedor, e então me atrevo a lhe dar um beijo na bochecha, com um belo estalo. – Esse foi o melhor dia da minha vida depois... De tudo o que aconteceu. – Tento não me lembrar do passado, pelo menos não agora. Ele esboça um sorriso que me derrete toda.

 - Foi a melhor tarde de toda a minha vida! – Ele diz e me entrega a pequena sacola que comprara horas antes. – Espero que não se esqueça de hoje. – Ele deposita um leve beijo em minha testa. Puxa uma pequena mecha do meu cabelo e segue para casa.

 Fico para ali como uma retardada por quase meia hora, só então cai a ficha e subo para o apartamento. Um enorme sorriso se implanta em meu rosto, simplesmente não consigo desmanchá-lo. Toco a campainha e quem abre a porta é Janaína. Dou um leve ‘oi’ e me sento no sofá, tão em êxtase que nem percebo a presença de Vítor, que muda de canal assim que chego.

 - Qual o problema? – Pergunto virando-me para ele, que me ignora. – Vai assistir ‘Kick Botowsk’ só porque estou aqui? – Ele me ignora novamente enquanto o fuzilo com o olhar. – Eu não sou mais uma criança, para a sua informação, posso assistir aos mesmos programas que você! – Continuo, indignada. Ele continua me ignorando, com o olhar fixo no desenha a sua frente. Reviro os olhos e subo para o meu quarto.

 Para que perder meu tempo assistindo com ele na sala, se tenho uma TV só para mim no meu quarto? Tranco a porta e jogo minha jaqueta na cama. Subo na cama, tirando as sapatilhas, e cruzando as pernas. Abro a sacola que Bernardo me entregou, constatando o que eu já sabia: a caixa de bom-bons em forma de coração. Minha! Ele comprou uma caixa de bom-bons em forma de coração, para mim! A abro apenas por curiosidade, pois estou farta de chocolate por hoje, e expresso mais um sorriso ao ver que há miniaturas no mesmo formato que a caixa, que irei guardar eternamente.

 Depois de muito tempo sonhando acordada, revivendo toda a tarde de hoje, tomo um banho e desço para o jantar, vestindo um moletom preto, e um rabo de cavalo. Encontro todas à mesa, inclusive o ‘senhor chatice’. Rodrigo pareceu estar longe o jantar inteiro, e tinha um olhar cansado em seu rosto. Não quis questioná-lo, então ficamos todos em perfeito silêncio. Depois do jantar, escovo meus dentes e deito, ligando a TV e varrendo todos os canais.

 Acabo dormindo rapidamente, mas acordando em pequenos intervalos, devido a pesadelos com a Callie.

 - Você vai me pagar, Melina! E muito caro, sua RIDÍCULA, MEDÍOCRE, BURRA! – Ela me puxa pelos cabelos, causando uma dor imensa, fazendo me revirar os olhos.

 - Ai, me larga! – Protesto, mas ela me ignora totalmente. Com uma força que eu jamais imaginei que ela teria, me joga no chão, fazendo-me cair de cara. Sinto meu rosto esquentar, o toco e vejo que novamente ela me fez cortá-lo. – Sua... – Ela em interrompe com um belo tabefe na cara.

 - Sua desgraçada! – Ela diz enquanto me atinge de todos os modos possíveis. Um soco no olho, chutes na barriga, atinge pedras em meu rosto. – Pensou que ia me fazer passar por aquilo e não pagaria? – Ela gargalha me causando arrepios. Depois de tanto me bater ela me puxa novamente pelos cabelos e me leva à beira de um precipício.

 - Não! Não, Callie, por favor, NÃO! – Grito o mais alto que consigo, mas não adianta, ela me solta e caio desesperadamente num precipício sem fim.

 Acordo assim que chego ao fundo, com a respiração a mil, levanto e vou até o banheiro, molhar o rosto. Olho-me várias vezes no espelho para me certificar de que não cortei rosto novamente, nem levei socos nos olhos. Foi tudo tão real e apavorante. Arrepio-me. Prendo todo o cabelo em um coque, sabendo que não vou conseguir pegar no sono de novo, tão cedo. Silenciosamente, abro a porta e desço para a cozinha. Pego um copo e o preencho com água gelada, que desce rasgando a minha garganta, que estava tão seca. Guardo a garrafa de água, coloco o copo na pia e volto para o meu quarto.

 Antes de me deitar novamente olho no relógio e vejo que são 3h: 17min. Cochilo de minuto em minuto, acordando assustada em todas às vezes. Depois de tanto resistir, por medo de sonhar novamente, acabo pegando no sono. Acordo com pequenos raios de sol em meu rosto. Viro-me e vejo que definitivamente consegui dormir, pois são 12:46. Fico ali por algum tempo curtindo a preguiça, e depois sigo para o banheiro.

 Tomo banho e visto uma blusa de manga azul claro, um short jeans e all star. Penteio meu cabelo, deixando-o solto e desço para sala de jantar, encontrando todos na mesa novamente.

 - Bom dia, Melina! – Cumprimenta Rodrigo. – Como foi o passeio? Desculpa não ter perguntado ontem, é que...

 - Tudo bem. Foi ótimo! – Digo me sentando novamente com aquele sorriso bobo no rosto. – Me diverti bastante. – Pego uma torrada, queijo branco e a geléia de morango.

 - Deve ter sido mesmo, afinal uma tarde toda com o namoradinho, não é mesmo? – Alfineta Vítor. Sinto vontade de jogar toda a geléia na cara dele, e gritar que o Bernardo não é meu namorado, mas fico calada. Ele me encara durante bastante tempo depois se volta para seu pedaço de bolo.

 - É, foi realmente ma-ra-vi-lho-so! – Me demoro na palavra fazendo com que ele revire os olhos. – Você devia ir ao cinema, Rodrigo. – Digo me virando para ele. – Tem ótimos filmes em cartaz, devia sair um pouco, se divertir. – Ele acena positivamente e dou de ombros. Não queria me intrometer, é só que... Você está sempre trabalhando. – Vejo de esguelha Vítor balançando a cabeça negativamente, e novamente quero jogar geléia nele.

 - Eu vou... Pensar. – ele diz por fim, sorrio para ele.

 Dispenso o almoço, por ter acabado de levantar, e tomo apenas um copo de suco natural de manga, e como a salada de frutas que Janaína fez para a sobremesa. Ela deixa a tigela ali e sai rapidamente, com uma certa tristeza em sua face. Olho para Rodrigo e Vítor, mas ao que parece só eu percebi. Espero todos terminarem e saírem da mesa, seguindo cada um para seu canto, e começo a ajudar Janaína a recolher os pratos.

 - Não precisa querida, vá descansar, mais tarde já tem que voltar para a escola...

 - Esquece Janaína, eu vou te ajudar. – Sorrio generosamente e ela retribui, porém o sorriso não chega até seus olhos. Seguimos para a cozinha onde ela começa a ensaboar os talheres e eu me coloco ao seu lado esperando.

 - O que foi, agora? – Ela pergunta.

 - Ué, vou te ajudar! – Dou de ombros, como se fosse óbvio.

 - Ah, vá descansar Melina, estou falando sério! – Ela força uma expressão séria que se desmancha rapidamente quando continuo quieta, sem mover um músculo. – Porque cismou com isso? – Dou de ombros novamente.

 - Acho que você quer conversar comigo. – Ela gargalha.

 - Eu quero conversar com você? – Ela ergue uma sobrancelha.

 - Sim, sobre essa tristeza em seu olhar. – Digo tornando sua expressão séria. Ela se vira para a pia. – Vamos, o que há? – Pergunto e ela faz que não com a cabeça.

 - Não é nada demais, e não é nada que a senhorita deva saber. – Ela diz em tom acusador. E eu sorrio.

 - Ah, por favor, Janaína! – Dou um peteleco no ar. – Vá, desembuche. – Ela novamente ergue a sobrancelha, as duas dessa vez. Ela respira fundo.

 - Certo, mas não pode contar para ninguém, okay? – Aceno positivamente com um enorme sorriso por ter conseguido convencê-la. – É que... – Vejo suas bochechas rosarem. -... Eu acho que estou... Gostando de alguém. – Minha boca se escancara em um sorriso surpreso.

 - Que ótimo Janaína! – Dou pulinhos e bato palmas, cheia de empolgação.

 - Não, não tem nada de ótimo, criança. – Ela diz totalmente oposta a mim, com uma expressão triste e desanimada. – Ele não sabe, e nem vai saber. – Faço beicinho.

 - Porque e porque? – Pergunto cruzando os braços e a olhando.

 - Porque isso é algo totalmente inapropriado, Melina! – Olho para ela como se tivesse falando grego. – Eu não posso me... Declarar! Seria ridículo.

 - Ridículo? Ah me poupe! – Reviro os olhos. – Ridículo é você estar apaixonada e ficar escondendo isso.

 - Faço isso há muito, porque não posso continuar? – Ergo a sobrancelha.

 - E porque esconde há muito? Poxa, Jana, bota isso pra fora, chega nele e assume! – Nem acredito que sou eu quem está falando isso, parece até uma garota determinada falando.

 - Não é tão simples quanto você está pensando, mocinha. Há muita coisa em jogo. – Ela suspira e enxágua as mãos. Percebo que não fiz nada até agora e me apresso em pegar a toalha e começo a secar. – Não precisa... – Empurro sua mão e continuo secando.

 - Então, quem? – Ela parece não ter entendido. – Quem é o cara? – Explico e ela cora novamente.

 - Não vou te contar! – Olho para ela boquiaberta. Totalmente chocada.

 - Como assim ‘não vou te contar’? – Ela dá de ombros.

 - Não vou. Já falei mais do que devia. – Termino de secar e me sento na banqueta, de frente para ela.

 - Como ele é? – Ignoro o que ela caba de dizer.

 - Não vou falar, Melina, não adianta. – Ela guarda as louças que acabei de secar e para diante a porta. – Vamos, tenho que terminar de arrumar as coisas e você tem que...

 - Pára de inventar desculpas, mulher! – Desço da banqueta e paço meu braço pelo dela. – O que tem que fazer agora?

 - Limpar a poeira. – Franzo o nariz.

 - Tenho alergia... – Ela dá um sorrisinho vitorioso. – Ah, por favor, você tem que me contar anda! – Ela balança a cabeça, retornando àquele olhar tão triste.

 - Você... Não ia ficar tão eufórica com isso, não há nada que deva saber sobre isso, agora vá, me deixe fazer meu serviço logo. – A liberto, mas sem me dar por vencida.

 - Mais cedo ou mais tarde eu vou descobrir, Janaína, daí sim você não vai ter sossego! Onde já se viu? Esconder algo de mim. Será que não sou confiável? – Apelo para o emocional, mas ela não cai nessa.

 - Vá na sorte. – Ela diz e me deixa sozinha. Fico boquiaberta com o modo que ela falou, e subo para o meu quarto, ainda indignada.

 Abro minha mochila e retiro vários livros, para estudar uma última vez, antes da semana de provas que estou preste a encarar. Já sei todos os conteúdos na ponta da língua, mas na falta do que fazer... Encontro meu celular perdido ali no fundo, e me surpreendo ao ver que há uma mensagem. Deixo os livros de lado, enquanto clico par ler.

Cuidado com quem confia, ou pode acabar se machucando novamente. Uma garota tão linda, meiga e inteligente assim, não deveria sofrer tanto, aprenda a olhar além dos sorrisos bonitos, e das atitudes fofas.


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Notas finais do capítulo

Mereço reviews? Espero que sim! Tá, eu sei, esse capítulo ficou uma MERDA! Nem devia ter postado, mas... Prometo melhorar no próximo, eu juro!



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