Mikaella escrita por no-chan


Capítulo 7
Abrindo trancas


Notas iniciais do capítulo

Depois da crônica Colateral...



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Mikaella estava deitada nas esteiras do ginásio descansando. O treino de Yamato incluía uma maratona de chutes e corrida que deixavam a italiana quase a desmaiar! Resistência. Essa era a palavra chave nesses últimos dias. Aguentar firme e não parar. Segurar a porrada que viesse. Bem, com todas essas viagens de lá pra cá, ela até que estava resistindo bem, mas algo estava faltando.

            - Treinar sozinha é uma droga. – murmurou ela se virando para a pilha de livros ao lado da esteira. Seria cômico ver a diferença entre eles. Moda, tecidos e designes de um lado, junto de esboços feitos pela própria. Do outro, técnicas de segurança, base investigativa, exercícios de lógica e o mais estranho... cadeados.

            Mikaella segurou um dos cadeados e comparou com as figuras nos livros que Martin arranjara. O garoto era incrível! Como alguém que nunca estudara o assunto podia aprender tão rápido?! E ainda ensinar! Não queria dar falsas esperanças ao jovem, mas ele estava sendo de grande ajuda.

Examinando a fechadura ela começou a tentar abri-la da forma que explicava no livro. Mais complicado do que parecia! Não conseguia encaixar a trava ao mesmo tempo que girava. As vezes não conseguia nem colocar a pinça de ferro na fechadura.

            - Eles fazem isso tão rápido nos filmes! Isso é injusto!– gritou a italiana irritada e jogou o cadeado em direção às portas virando emburrada.

            - É isso que você anda treinando? Arremesso de cadeado? - a voz grossa e fria fez Mikaella girar imediatamente. Ele estava de volta!

            - Romanov! – gritou ela assustada, mas ao mesmo tempo aliviada. Ok, ele era seu mestre, a sua vista praticamente invencível, mas nunca se sabe o que pode acontecer numa guerra. Mikaella estava preocupada desde seu aniversário e a falta de notícia dele a mais de quatro meses não ajudava. Ver ele ali, forte como uma rocha e são e salvo foi quase um presente. – Você voltou.

            - Só por uma semana. – disse ele curto e grosso aproximando-se com o cadeado na mão e observando os livros espalhados. – Pensei que tinha treinado uma lutadora, não uma bibliotecária.

            Mikaella riu da rara piada do russo, se é que era uma, e levantou-se rapidamente recuperando parte da energia que perdera nos treinos.

            - Vou te mostrar que é a bibliotecária aqui!

            Sem dizer mais nada, Mikaella avançou contra Romanov com um chute lateral. O russo já esperava uma recepção “calorosa”, o que o divertiu minimamente ao ver a italiana que a dois segundos parecia que cairia de tão cansada erguer-se para enfrentá-lo com a força recobrada. Lutar por prazer. Algo raro na vida de um soldado.

            Em meio a chutes e socos, Mikaella ia falando e falando. Contando o que acontecera no dia do torneio, no sangue do dragão, no sequestro do pai Ed. A cada coisa nova, Romanov se limitava a erguer a sobrancelha e meter um outro chute na defesa da garota. E ambos começaram a sentir a diferença um no outro.

            Mika sentiu o cansaço de Romanov. Ele era uma pedra realmente, mas a guerra... uma guerra deve tomar muito de um comandante. Algumas cicatrizes novas, uma hesitação a mais na perna esquerda. Pequenos detalhes que a luta lhe permitiu ver.

            Romanov por outro lado, ficou surpreso com a resistência da aprendiz. Em quatro meses ela pareceu aprender a segurar melhor os chutes que recebia. Sim, eles faziam um estrago imenso, mas ela ainda se mantinha de pé. Respirava fundo e seguia em frente, sem parar. Sua respiração mais espaçada, seu ritmo mais definido, a defesa um pouco mais fechada... e os olhos, mais determinados do que nunca.

            A cada palavra que ela dizia, ele só via o quanto mais ela se metia em problemas e acabava saindo deles com os Punhos. Mas ela estava chegando perto demais da Shadaloo...

            - Da pra acreditar que até o exército americano está querendo nossa ajuda agora? – perguntou Mika rindo e desviando e outro golpe – O tão falado Guile pediu a ajuda dos Punhos.

            Romanov estreitou os olhos por um segundo ao ouvir o nome daquele imitador americano, mas então entendeu a sátira na voz de Mikaella e a lateral de sua boca contorceu-se num sorriso mínimo.

            - Ele deve estar bem desesperado. – murmurou o russo.

            Mika riu novamente e continuou a contar as novidades. Parecia uma criança tagarela, mas era tão bom poder falar sobre o que ela passou com alguém mais que não se importou se ele estava ouvindo ou não.

            - Mas Ed ainda me preocupa. – disse ela mais hesitante e por um momento ela reviu a cena do grande rinoceronte branco perdendo o controle e quase matando o tigre. A visão que sempre vinha a sua mente quando Edward parecia tenso antes de uma luta. Ela não entendia o que estava acontecendo e isso era mais preocupante. Nesse momento de descuido, o chute de Romanov acertou em cheio e Mika foi arremessada longe com violência. Bem em cima dos livros e cadeados, espalhando tudo. – Aaaarrr... E eu achando que você estava cansado.

            - Hunf. Concentre-se na luta, é o melhor que você faz. – disse o russo friamente assistindo a italiana se levantar com dificuldade e suspirou irritado ao ver alguns cortes no braço da garota provocados pelas pinças de ferro e pontas dos cadeados. – Por quê trás essas coisas para o ginásio?

            - Ai... – resmungou ela tirando um pequeno ferrinho que entrara no cotovelo e vendo o sangue pingar – Como eu ia saber que você ia voltar hoje e me atirar em cima deles?

            Ignorando o sarcasmo da jovem, o russo pegou um kit de primeiros socorros para ajudá-la a se limpar. Mika limpou o ferimento e esperou Romanov fazer um rápido curativo. “Isso não é nada comparado a um ferimento de guerra.” Pensou ela.

            - Pra quê você quer isso? – perguntou o russo olhando os livros de segurança abertos.

            - Estou pensando em assaltar um banco. Que tal uma parceria, Alexander? – disse Mika e riu ao ver o olhar de poucos amigos do mestre, mas logo então ficou séria pegando um cadeado qualquer e tentando abri-lo com a pinça – Não sei ao certo. Receio talvez. Com todas as confusões que nos metemos até agora acho provável que precisarei abrir alguma cela no futuro. Brincadeiras a parte, já que estou envolvida nisso até o pescoço, quero ser útil. Eu prometi que encontraria provas contra a Shadaloo, mas elas não vão estar em cima de uma mesa aguardando serem pegas, não é? Provavelmente vou ter que invadir alguma coisa, destrancar uma porta, uma gaveta e sendo bem otimista... quem sabe um cofre. – riu ela novamente que logo se tornou uma careta – Mas isso não vai acontecer se eu não conseguir abrir nem um simples cadeado!

            - Empurre a pinça pra baixo.

            - Hum? Ah, não é tão simp... Abriu!

            Mikaella abriu um sorriso gigantesco e virou para Romanov abismada.

            - Como você sabia? – perguntou ela sorrindo e o russo apenas levantou a sobrancelha com um olhar de obviedade – Você costuma fazer muitas ligações diretas em carros, Alexander?

            O russo a olhou por um segundo e então balançou a cabeça cansado. Algo que Mika não costumava ver. O sorriso da jovem sumiu e ela se perguntou se algo estava errado.

            - Já estou começando a me arrepender de ter apresentado você aos Punhos.

            - O que? Mas por que?!

            - A confusão costumava vir até vocês, mas agora são vocês que estão indo atrás dela. Principalmente você! O karateca está tentando reerguer os dojôs de Chicago, isso é algo plausível que um lutador da área iria querer, mesmo que chame atenção. O rinoceronte está brincando de agente secreto, invadindo programas e dando informações a um jornalista, tudo por debaixo dos panos, não sei se por estupidez ou por querer consertar os erros do pai, mas isso ainda é mais seguro do que o que você quer fazer. Você está falando em invasão e espionagem, Mikaella. O que você quer? Ser presa?

            Mikaella ficou muda. Nunca, definitivamente nunca, havia visto Romanov falar tanto. Ainda mais com aquele olhar cansado e... puta que pariu, ele estava preocupado?!

            - Não sei o que a filipina esta fazendo. Espero que não pense a mesma coisa que você se não é mais uma louca. – continuou o russo e então encarou a italiana com um olhar penetrante - Você não sabe no que está se metendo, Mikaella. Você acha que é brincadeira, uma diversão, mas não é. O que você pretende afinal? Por que está fazendo isso?

            - Porque... porque eu quero. – respondeu ela ainda atordoada com o despejo de palavras do russo. Romanov fechou a cara com a resposta e ia se virando para ir embora quando Mika lhe segurou o braço – Espere. Ouça, não é mimo, ok? Eu quero fazer isso. Eu preciso fazer! Preciso fazer alguma coisa! Não posso ficar assistindo enquanto a Shadaloo destrói tudo o que toca! Não quero deixar passar impune! Não é justo. Não é justo comigo, com você ou com todas as pessoas de Chicago ou do mundo! Eles destroem vidas como eu faço compras! E tirando a comparação ridícula, isso é assustador!

            Mikaella respirou fundo e fechou os olhos. O aperto no braço de Romanov aumentou enquanto o remorso que se recusava a aparecer na frente dos Punhos tomava seu peito.

            - Se nós tivéssemos agido antes... Se não tivéssemos ignorado os indícios de que algo estava errado... Se tivéssemos ido investigar, conseguido mais informações, nós poderíamos ter impedido aquela noite! Podíamos ter impedido tanto sofrimento e destruição. – dizia a italiana apertando os olhos tentando apagar algumas lembranças e então olhou o russo com raiva – E se nós não estivéssemos lá? Alguém teria aparecido para parar aqueles chineses? Ou os navios? Eu acho que não. A guerra que você está lutando não é diferente da minha, Alexander. Ela te cansa, te revolta, faz você se arriscar todos os dias, mas você continua lutando porque acredita que pode fazer a diferença. Eu vou fazer a diferença.

            Mikaella soltou o braço de Romanov e o encarou. Ambos se estudavam    silenciosamente. Instrutor e aluna. Tão parecidos quanto a rocha se parece com a flor. Depois de um longo momento, o silêncio finalmente foi quebrado.

            - Você não vai fazer diferença nenhuma. – respondeu o russo com frieza passando ao lado da italiana fazendo-a baixar a cabeça decepcionada – Não se não aprender a abrir ao menos um cadeado.

            Mikaella virou-se de repente para ele só a tempo de ver o cadeado na mão de Romanov se abrir facilmente. Ela o olhou por um instante tentando entender o que ele dizia e só então abriu um sorriso se aproximando.

            - Vamos ver o que diferença você pode fazer na sua guerra.

            - Pode aumentar minhas chances se você me der outra granada de presente.


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