Mikaella escrita por no-chan


Capítulo 8
Dançando com sacos de areia


Notas iniciais do capítulo

Music Accompainiment. ^^



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Fiona andava lentamente pelos jardins da mansão dos Parllazzo. O sol do início da primavera forçava sua entrada no céu nublado de inverno, degelando os restos de orvalho nas flores novas. O canto dos passarinhos pairava gentilmente por todos os lados e pequenas borboletas dançavam sobre as tulipas dos arranjos recém colocados.

- Ah, que linda manhã. – murmurou a jovem governanta andando em direção ao ginásio com algumas toalhas – Se ao menos a senhorita Mikaella saísse daquele ginásio e aproveitasse o dia... !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Fiona abriu as pesadas portas do ginásio e tudo ao seu redor pareceu ser carregado por um tsunami de sons! Os pássaros e borboletas fugiram instantaneamente e, por um momento, a governanta se perguntou se não ficara surda com a altura da música que tocava.

- SENHORITA MIKAELLA!

O grito de Fiona se perdeu na imensidão da batida que ecoava no ginásio. O baixo timbrava tão alto que era possível sentir o corpo tremer. Mikaella estava lá, no meio do tatame, cercada por sacos de areia pendurados de forma espaçada ao seu redor.  A italiana mantinha os olhos fechados e seu corpo se movia sensualmente como se estivesse no meio de uma pista de dança numa noite badalada.

- SENHORITA MIKAELLA! – gritou Fiona novamente sendo ignorada, se é que fora ouvida.

De repente, Mikaella mudou a postura. Antes relaxada com a dança, agora seu corpo se movia em alerta. Ainda de olhos fechados, a italiana deu um chute certeiro em um dos sacos de areia fazendo-o recuar com o impacto e logo em seguida retornar num balanço rápido. Mikaella se manteve no mesmo lugar até o último segundo e então desviou chutando um outro saco, repetindo o mesmo ato.

Em alguns segundos, a italiana estava cercada de sacos de areia balançando perigosamente ao seu redor, mas continuava desviando de olhos fechados. Saia do caminho no último segundo com um movimento fluido e ritmado. Parecia... uma dança?

Com medo de se aproximar e ser acertada por um daqueles sacos de vinte quilos, Fiona tentou chamá-la mais uma vez, mas de nada adiantou. Resolveu então tapar os ouvidos e aproximar-se do gigantesco aparelho de som e puxou o fio da tomada com violência.

- Ai! Ai, ai! – gritou Mikaella.

Fiona se virou de repente, vendo a jovem italiana ser atingida no rosto por um dos sacos de areia e logo em seguida todos os outros ao mesmo tempo. Mikaella fechou o bloqueio e se jogou no chão para evitá-los.

- O que pensa que está fazendo, Fiona?! – gritou a jovem muito mais alto que o normal – Eu quase virei massa de pizza aqui!

- Até parece...

- O que?!

- É nisso que dá colocar o som nas alturas! Você está surda! – gritou Fiona se aproximando da italiana e tentando parar os últimos sacos de areia. – Afinal o que estava tentando fazer?

Mikaella se levantou e pegou uma das toalhas das mãos de Fiona enxugando o suor do rosto. Em seguida, colocou o cabelo atrás das orelhas e tirou os tampões de ouvido.

- O que dizia? – disse ela com a voz normal.

- Você nem estava ouvindo?!

- Ei, não grite, não sou surda. – murmurou Mikaella fazendo Fiona olhá-la indignada. A italiana riu da cara da governanta e esticou os braços num alongamento. – Não queria ouvir a música, queria sentir a batida.

- Como?

Mikaella tirou do bolso da calça um pequeno aparelho de som e ligou. A batida de uma boate começou a tocar e a jovem bateu o pé seguindo o ritmo. Num movimento rápido, chutou o saco de areia mais próximo fazendo-o recuar.

- Uma música sempre tem um ritmo e o ritmo sempre conta o tempo. Se eu sigo o ritmo e o movimento do balanço desse saco de areia... – disse ela e desviou no último segundo. – Consigo saber exatamente quando ele vai chegar em mim e posso desviar ou... Atacar!

A jovem Parllazzo moveu-se rapidamente para trás do saco de areia e chutou-o com uma força gigantesca. O saco fez um movimento violento para tás e voltou ainda mais rápido fazendo-a desviar novamente e repetir o movimento.

Fiona ficou impressionada. Mikaella sempre fora rápida, desde pequena e ainda mais quando começou a treinar com Romanov, mas não imaginou que podia ficar ainda mais. Muito menos em tão pouco tempo! Não fazia quatro meses que a vira lutar pela última vez e ela não estava tão rápida assim! Parecia que cada vez que se desviava, seu chute seguinte vinha mais rápido e ao seguir a música tudo se melhorava.

- Isso é incrível... Como? Em tão pouco tempo? – perguntou a governanta impressionada.

- Acredite ou não, quem me deu essa ideia foi a mamãe.

- O quê?!

**********

- Per favore, mama, tudo bem que eu sou uma dama, mas balé clássico está fora de minhas capacidades! – disse Mikaella choramingando ao entrar no estúdio de balé Cherri. – É muito chato...

- Comporrte-se, Mikaella! Estou ajudando você e seus amigos com seu evento sem sentido, então me ajude também. – disse Adrianne Collet virando-se para a filha séria - Você não tem noção como está sendo complicado fazerr aquela publicidade. A senhorrita não me contou o que se passou em Chicago a algumas semanas, não é mocinha? E eu esperro sincerramente que você tenha estado quietinha e em segurrança num hotel naquela noite.

- Bem... eu... – hesitou Mikaella.

- Não, parre! Não diga nada! Você mente muito mal e eu não querro nem saber. – cortou Collet voltando a caminhar. – Você acha que somos cegos, Mikaella, mas não nos subestime. Você deverria saberr a quem puxou.

- O que quer dizer com isso, mama? – perguntou a italiana receosa.

- Hunf. Não se deixe enganarr pelo sorrriso de seu pai. Paolo não é tão tolo quanto pa... Bonjour, Madame Vasely. – disse Adrianne interrompendo a conversa com a filha e cumprimentando docemente uma senhora de postura rígida e queixo erguido. Uma típica francesa, mas vestida com um colan preto de bailarina. – Deixe-me apresentá-la minha filha Mikaella, acredito que estará em boas mãos.

Mikaella estendeu a mão para cumprimentá-la, mas Vasely apenas a olhou e fez uma reverência formal de lady, virando logo em seguida para Collet e iniciando uma conversa em francês. Mesmo irritada com a postura da mulher, Mikaella preferiu não fazer uma cena na frente da mãe e ignorou a conversa, afinal ainda estava pensando no que a mãe dissera e mal entendia francês mesmo.

Depois de algum tempo e uma discussão velada, as duas francesas se separaram e Vasely não parecia feliz em seguir para o estúdio.

- Algum problema? – perguntou Mikaella.

- Você não ouviu a converrsa? Oh, Deus, Mikaella! Ainda não aprrendeu minha língua! Que desconsiderração com sua mãe...

- Mamãe... – interrompeu a jovem rindo ao ouvir a mágoa fingida de Collet fazendo-a rir também.

- Cerrto. Eu prreciso de algumas bailarrinas para a aberrturra de um evento, mas não querro qualquerr uma. Vasely esta furriosa porrque alega que todas as suas bailarrinas são perrfeitas e eu discorrdo. – dizia Collet em tom de negócios, mas sem esconder certa arrogância em relação à Vasely, a proprietário e professora do estúdio. – E é aqui que você entrra, Hera querrida.

- Hein? Como espera que eu ajude a escolher bailarinas se eu mal entendo o que é um pliê, mamãe?

- Você não vai escolhê-las, Mikaella. Você vai prrovarr a Vasely que uma novata pode serr melhorr que uma de suas bailarrinas.

A jovem Parllazzo encarou Collet chocada. Sua mãe só podia ter perdido a cabeça. Em que realidade Mikaella poderia superar, em só alguns dias de treino, uma bailarina que deveria ter dançado a vida toda?!

- Mas, mama...

- E nem me venha dizerr que é impossível. Dê um jeito. Se esforrce. Quando é parra trreinarr com Romanov você nunca reclama.

- É por que não adianta. – murmurou Mikaella relembrando o treino com os cachorros. Mesmo que ela gritasse todos os xingamentos em todas as línguas, Romanov jamais dera uma pausa. – Não é como se ele me ouvisse reclamar. Às vezes eu me pergunto por que ele aceitou me treinar. Eu não sou a pessoa mais tolerável do mundo mesmo que você seja pago para isso.

Collet apenas olhou a filha de soslaio e manteve-se calada. A francesa pegou uma muda de roupa nova na sacola de compras e entregou à Mikaella que ainda estava distraída em pensamentos. A italiana reconheceu um colan preto de mangas longas e a saia fina rodada. Hurg... o kit bailarina.

- Tenho mesmo que fazer isso? – perguntou ela chorosa.

Collet apenas encarou a filha com uma expressão calma e tranquila, mas escondia certa impaciência nela. Tudo bem que a francesa não estivera muito presente em sua educação, mas Paolo parecia tê-la mimado ao estremo!

Mikaella reconheceu a irredutibilidade no rosto da mãe e desistiu. Não havia como fugir agora. Pegou as roupas e seguiu para o banheiro para vesti-las. Collet a acompanhava e ajudava-a a calçar a sapatilha trançada enquanto Mikaella fazia um coque no longo cabelo.

- Às vezes você parece o Romanov, sabia? – murmurou Mikaella.

- Aprroveite isso e enfrrente essas aulas como um de seus trreinos. – disse Adrianne ignorando o incômodo de ser comparada com o brutamontes russo.

- Até parece! Isso é dança, não tem nada de útil para uma luta.

- Hu hu hu. Verremos.

*******

- Depois de levar uma surra daquelas bailarinas nos primeiros dias eu entendi o que mama queria dizer. – disse Mikaella terminando de contar a história para Fiona. – Por seguirem um ritmo, elas sempre sabiam o que fazer em seguida, o que só as deixava mais rápidas! Eu levei uma semana para pegar os passos e mais uma para realmente sentir a música, mas quando eu o fiz... Queria que tivesse visto a cara de Vasely!

Mikaella riu ao se lembrar da madame quase batendo o queixo no chão ao vê-la dançar ao fim de quatro semanas. E no fim, Collet estava certa. Realmente, Mikaella jamais poderia superar as bailarinas brilhantes do estúdio, mas nem todas eram brilhantes. Sempre haveria aquelas que não se esforçavam o suficiente, seja por incapacidade ou por pura arrogância, e destas, Mikaella se sobressaiu além das expectativas.

- Quando foi isso? Eu nem... Oh minhas férias. – disse Fiona compreensiva.

- Você também é humana, Fiona. – riu Mikaella – No seu mês de férias eu fui passar um tempo com mamãe em Paris, lembra?

- Mas não foi só dançando que você aprendeu isso. Se não todos os dançarinos seriam lutadores! – ironizou a governanta.

- Verdade. Mas para isso é que existe o treino. – disse a italiana com presunção – Você lembra da Rebba? Ela faz algo parecido, só que a música que ela usa é um tanto quanto... interiorana.

Fiona não aguentou segurar o riso com a tentativa de Mikaella de não insultar o estilo musical da ruiva. Mas então, ela mesma se lembrou das vezes que viu um lutador utilizar-se da música para manter seus golpes. Os brasileiros no torneio de Barcelona eram um exemplo delas.

- Que seja. Peguei meu próprio estilo musical e procurei entender como isso ajudava. Mas pra ser bem sincera, esse é o máximo que posso explicar racionalmente. No fim, pra mim, é tudo uma questão de sentir.

- E o que Romanov acha disso? – perguntou Fiona ainda se segurando para parar de rir.

Mikaella fez uma careta ao se lembrar da cara que Romanov fez ao vê-la treinando com a música. Sentiu um arrepio na espinha só de recordar o treino seguinte àquele e os maus bocados que passou. Engoliu seco e respondeu rígida:

- Ele acha que se eu quero “lutar feito uma bixa fresca” é melhor eu começar a aprender a desviar de suas granadas. NÃO RIA! ESTOU FALANDO SÉRIO!


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